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Derrame pericárdico em animais de companhia: estudo retrospetivo de 141 casos

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Academic year: 2021

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Derrame Pericárdico em animais de companhia: Estudo

retrospetivo de 141 casos

Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

FILIPA DANIELA MARQUES ALVES

Orientadora:

Professora Doutora Maria João Miranda Pires

Coorientador:

Doutor Luís Lima Lobo

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Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Derrame Pericárdico em animais de companhia: Estudo

retrospetivo de 141 casos

Dissertação de Mestrado Integrado em Medicina Veterinária

FILIPA DANIELA MARQUES ALVES

Orientadora:

Professora Doutora Maria João Miranda Pires

Coorientador:

Doutor Luís Lima Lobo

Composição do Júri:

Presidente - Professora Doutora Maria da Conceição Medeiros Castro Fontes

Vogais - Professora Doutora Felisbina Luísa Pereira Guedes Queiroga

- Professora Doutora Maria João Miranda Pires

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Sê todo em cada coisa. Põe quanto és No mínimo que fazes.

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Agradecimentos

No culminar de mais uma etapa importante não posso deixar de agradecer a todas as pessoas que de alguma forma contribuíram para a minha formação, quer profissional quer pessoal. Assim, agradeço:

À minha orientadora, Professora Doutora Maria João, por toda a disponibilidade, ajuda incansável, dedicação, conhecimentos partilhados e preocupação demonstrada durante a elaboração desta dissertação.

Ao Doutor Luís Lobo, meu coorientador, por me ter recebido no Hospital Veterinário do Porto. Obrigado pelos conhecimentos transmitidos ao longo do estágio, pelo seu apoio e disponibilidade prestada durante a realização deste trabalho.

A todos os docentes do Mestrado Integrado de Medicina Veterinária que tiveram um papel essencial para a minha formação como futura Médica Veterinária. Um enorme obrigado pelos conhecimentos partilhados ao longo dos 5 anos académicos.

A todos os médicos veterinários, enfermeiras veterinárias e auxiliares do Hospital Veterinário do Porto por todos os conhecimentos partilhados, pela amizade e carinho com que me receberam.

Aos meus companheiros de estágio no Hospital Veterinário do Porto. Por todo o companheirismo, boa disposição, amizade e incentivo que partilharam durante o estágio.

À Carina, minha melhor amiga, por todo o apoio incondicional, pela motivação, por todos os momentos de cumplicidade, ajuda e carinho.

Aos meus amigos, quer os que me acompanham desde criança quer aqueles que me receberam e ajudaram ao longo do curso. Agradeço toda a ajuda, carinho, cumplicidade e sinceridade. Obrigado pelos momentos proporcionados e pela amizade construída.

Às minhas companheiras de casa no meu percurso académico. Obrigado por me terem feito sentir sempre em casa mesmo fora do meu doce lar.

Por último, mas não menos importantes, à minha família por todo o apoio incondicional, por serem o pilar da minha vida e por tudo o que significam para mim. Um agradecimento muito especial ao meu Pai, pois a palavra “Obrigado” é pouco.

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vii

Resumo

O derrame pericárdico pode ter várias etiologias e, dependendo da espécie, estão descritas causas mais frequentes que outras. Em cães, está associado a neoplasias ou ao derrame pericárdico idiopático, podendo resultar em tamponamento cardíaco. Em gatos, sabe-se que esta doença é a alteração pericárdica adquirida mais frequente e está associada a insuficiência cardíaca congestiva mas os estudos de derrame pericárdico nesta espécie são mais limitados. De acordo com a etiologia, a apresentação clínica e as alterações encontradas nos meios complementares de diagnóstico vão ser diferentes de animal para animal. Assim, um dos objetivos principais deste estudo incidiu sobre a determinação das causas de derrame pericárdico mais frequentes, tanto em cães como em gatos, e comparação com a literatura. Pretendeu-se também associar as várias apresentações clínicas e a existência de tamponamento cardíaco com a causa de derrame pericárdico subjacente, assim como determinar as alterações radiográficas, eletrocardiográficas e ecocardiográficas mais frequentes em animais com derrame pericárdico.

Para este estudo foram revistos todos os registos ecocardiográficos realizados no Hospital Veterinário do Porto, entre Janeiro de 2002 e Março de 2016. Assim, foram selecionados 141 animais com derrame pericárdico, dos quais 97 são cães e 44 são gatos.

Nesta dissertação verificou-se que o derrame pericárdico é mais frequente em cães que em gatos. A principal causa de derrame pericárdico em cães foi a doença neoplásica, seguido da doença cardíaca, e nos gatos foi primariamente a doença cardíaca, seguido de doença neoplásica. Verificou-se também que o sinal clínico mais frequente em cães com derrame pericárdico foi a ascite, estando mais associada com a doença cardíaca como causa de derrame. Em gatos, a dispneia foi o sinal clínico mais frequente, estando mais associado a causas neoplásicas.

Comparando este estudo com a bibliografia consultada conclui-se que existem algumas divergências, nomeadamente a causa não neoplásica de derrame pericárdico mais frequente em cães foi a doença cardíaca, apenas uma pequena percentagem de cães apresentaram alternância elétrica e diminuição dos complexos QRS no exame eletrocardiográfico e somente dois gatos tiveram derrame pericárdico associado a insuficiência cardíaca congestiva.

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ix

Abstract

Pericardial effusion can be caused by many etiologies in small animals. In dogs is associated with neoplasia or idiopathic pericardial effusion and frequently causes cardiac tamponade. In cats the most common acquired pericardial abnormality is pericardial effusion and is associated with congestive heart failure. However, studies of pericardial effusion in cats are limited. Depending on the etiology, clinical findings based on history, physical examination and complementary exams will be different. So, the main objective of this study is to determine the most common cause of pericardial effusion in dogs and cats and compare with bibliography. Other objectives of this study included the association between the cause of pericardial effusion and clinical findings and also with cardiac tamponade. For this, we intend to determine the most common radiographic, electrocardiographic and echocardiographic findings.

In this study, the archive of cardiovascular disorders diagnosed in dogs and cats by the echocardiography service of the Hospital Veterinário do Porto was reviewed and were selected all pericardial effusions diagnosed between January 2002 and March 2016. Of 141 animals affected with pericardial effusion, 97 are dogs and 44 are cats.

In this work, it was verified that pericardial effusion was more common in dogs than cats. The most common cause of pericardial effusion in dogs was neoplasia and the second cause was cardiac disease. In cats, the most frequent cause of pericardial effusion was cardiac disease and the second cause was neoplasia. Ascites was the most common clinical sign in dogs and it was associated with cardiac diseases. In cats, the most common clinical sign was dyspnea and it was associated with neoplasia.

In conclusion, comparing this study with bibliography there are some differences: in dogs the most common non-neoplastic cause of pericardial effusion was cardiac disease; a small percentage of dogs presented electrical alternans and low-voltage QRS complexes; only two cats had pericardial effusion associated with cardiac heart failure.

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x Índice Geral Agradecimentos ... v Resumo ... vii Abstract ... ix Índice Geral ... x

Índice de figuras ... xiii

Índice de tabelas ... xiii

Índice de gráficos ... xv

Lista de abreviaturas, siglas, símbolos e acrónimos ... xvi

I. Revisão bibliográfica ... 1 1. Introdução ... 1 2. Derrame pericárdico ... 2 2.1. Etiologia ... 2 2.2. Fisiopatologia ... 7 2.3. Diagnóstico ... 10 2.3.1. Incidência ... 10 2.3.2. História clínica ... 12 2.3.3. Exame físico ... 12

2.3.4. Hemograma e análises bioquímicas ... 15

2.3.5. Radiografia ... 17

2.3.6. ECG ... 21

2.3.7. Ecocardiografia ... 23

2.3.8. Análise do fluido drenado ... 27

2.3.8.1. Análise física e química ... 27

2.3.8.2. Análise citológica ... 29

2.3.8.3. pH ... 31

(11)

xi 2.3.9.1. Biomarcadores cardíacos ... 32 2.3.9.2. Tomografia Computorizada ... 33 2.3.9.3. Ressonância Magnética ... 34 2.4. Tratamento ... 35 2.4.1. Terapia Médica ... 35 a) Pericardiocentese ... 35

b) Estratégias terapêuticas consoante a causa de derrame pericárdico ... 39

2.4.2. Tratamento cirúrgico ... 43

2.4.2.1. Cuidados após a cirurgia... 45

3. Prognóstico ... 45

II- Estudo Retrospetivo ... 49

1. Objetivos ... 49

2. Materiais e métodos ... 50

2.1. Animais admitidos ao estudo ... 50

2.2. Recolha de dados ... 50

2.3. Análise estatística ... 51

3. Resultados ... 51

3.1. Cães ... 52

3.1.1.Caracterização epidemiológica ... 52

3.1.2. Causas de derrame pericárdico ... 54

3.1.3. Relação entre a causa de derrame pericárdico e as características epidemiológicas ... 55

3.1.4. Sinais clínicos ... 61

3.1.5. Alterações radiográficas ... 65

3.1.6. Alterações eletrocardiográficas ... 66

3.1.7. Resultados ecocardiográficos ... 67

(12)

xii

3.1.9. Pericardiectomia ... 71

3.1.10. Evolução ... 71

3.1.11. Tempo médio de vida ... 72

3.2. Gatos ... 74

3.2.1. Caracterização epidemiológica da amostra ... 74

3.2.2. Causas de derrame pericárdico ... 75

3.2.3. Relação entre a causa de derrame pericárdico e as características epidemiológicas ... 77

3.2.4. Sinais clínicos ... 79

3.2.5. Alterações radiográficas ... 81

3.2.6. Alterações ecocardiográficas ... 82

3.2.7. Fluido pericárdico drenado ... 84

3.2.8. Pericardiectomia ... 85

3.2.9. Evolução ... 85

3.2.10. Tempo médio de vida ... 86

III. Discussão... 89

a) Limitações do estudo ... 99

IV. Conclusão ... 101

a) Considerações finais ... 102

(13)

xiii

Índice de figuras

Figura 1- Ilustração das várias camadas do pericárdio e de como está ligado ao coração ... 2 Figura 2- Comparação entre o pericárdio em condições fisiológicas e o pericárdio com derrame

associado. ... 8

Figura 3- Radiografia torácica latero-lateral direita de um cão com derrame pericárdico. .... 18 Figura 4- Radiografia torácica em projeção dorsoventral (DV) de um cão com tamponamento

cardíaco. ... 19

Figura 5- Eletrocardiografia de um cão com derrame pericárdico. ... 22 Figura 6- Ecocardiografia em modo 2D obtida num gato com HDPP e derrame pericárdico em

plano paraesteranal direito longitudinal. (A) – Imagem antes da pericardiocentese. (B) – Imagem depois da pericardiocentese ... 24

Figura 7- Imagem ecocardiográfica em plano paraesternal direito longitudinal de um cão, em

que se observa derrame pleural e pericárdico ... 25

Figura 8- Janela apical esquerda de um cão com uma massa na aurícula direita. ... 26 Figura 9- Imagem de ecocardiografia em modo 2D (A) e imagens de tomografia computorizada

(TC) por contraste em corte transversal (B), dorsal (C) e sagital (D) de um cão com hemangiosarcoma localizado na aurícula direita. ... 34

Figura 10- Pericardiocentese num cão com derrame pericárdico. ... 38 Figura 11- Imagens radiográficas em projeção latero-lateral direita de um cão diagnosticado

com quemodectoma e derrame pericárdico associado, submetido a pericardiectomia subtotal. (A) - Radiografia antes da pericardiectomia. (B) - Radiografia após a pericardiectomia. ... 45

Figura 12- Imagem post mortem do coração de um gato com linfoma cardíaco ... 77

Índice de tabelas

Tabela 1- Sinais clínicos em gatos com derrame pericárdico (n=140) ... 15 Tabela 2- Tipos de derrame pericárdico, suas propriedades bioquímicas e etiologias associadas

... 29

Tabela 3- Descrição estatística da amostra de cães estudada relativamente à raça, sexo e idade

... 53

Tabela 4- Relação entre a idade dos cães afetados com derrame pericárdico em função da

etiologia. ... 56

(14)

xiv

Tabela 6- Relação entre o sexo dos cães afetados com derrame pericárdico e respetiva causa.

... 58

Tabela 7- Relação entre o sexo dos cães afetados com derrame pericárdico e respetiva causa neoplásica. ... 59

Tabela 8- Causas de derrame pericárdico e as respetivas raças de cães afetados. ... 60

Tabela 9- Relação entre ascite e a causa de derrame pericárdico subjacente em cães. ... 62

Tabela 10- Relação entre a diminuição dos sons cardíacos à auscultação e as respetivas causas de derrame pericárdico em cães. ... 63

Tabela 11- Relação entre síncope e as causas de derrame pericárdico em cães ... 64

Tabela 12- Relação entre tosse e as respetivas causas de derrame pericárdico em cães. ... 64

Tabela 13- Registo eletrocardiográfico em 80 cães com derrame pericárdico ... 67

Tabela 14- Principais alterações ecocardiográficas verificadas em 97 cães com derrame pericárdico. ... 68

Tabela 15- Relação entre a causa de derrame pericárdico e a gravidade do derrame pericárdico verificado na ecocardiografia. ... 69

Tabela 16- Relação entre causa de derrame pericárdico e tamponamento cardíaco. ... 70

Tabela 17- Causa de derrame pericárdico e respetivo tipo de fluido pericárdico em 42 cães. 71 Tabela 18- Descrição do número de cães que morreram por morte natural em função da causa de derrame pericárdico e respetivo tempo médio de vida (dias). ... 73

Tabela 19- Descrição estatística da amostra de gatos estudada relativamente à raça, sexo e idade. ... 74

Tabela 20- Causas presuntivas de derrame pericárdico em 44 gatos. ... 76

Tabela 21- Relação entre a idade dos gatos com derrame pericárdico em função da respetiva causa de derrame pericárdico. ... 78

Tabela 22- Relação entre o sexo dos gatos afetados com derrame pericárdico provocado por doença cardíaca e doença neoplásica. ... 78

Tabela 23- Relação entre a dispneia e as respetivas causas de derrame pericárdico em gatos. ... 80

Tabela 24- Relação entre a ascite e as respetivas causas de derrame pericárdico em gatos. .. 81

Tabela 25- Relação entre a diminuição dos sons cardíacos e as causas de derrame pericárdico em gatos. ... 81

(15)

xv

Tabela 27- Relação entre a gravidade de derrame pericárdico em gatos e a causa subjacente.

... 83

Tabela 28- Relação entre a existência de tamponamento cardíaco em gatos e respetiva causa

de derrame pericárdico. ... 84

Tabela 29- Tipo de fluido pericárdico drenado em 7 gatos com derrame pericárdico e respetiva

causa de derrame pericárdico. ... 85

Tabela 30- Descrição de 10 gatos que morreram por morte natural em função da causa de

derrame pericárdico e respetivo tempo médio de vida (dias). ... 86

Índice de gráficos

Gráfico 1- Causas presuntivas de derrame pericárdico em 97 cães ... 54 Gráfico 2- Causas neoplásicas de derrame pericárdico em 39 cães e respetivos casos

confirmados e suspeitos. ... 55

Gráfico 3- Distribuição dos sinais clínicos de 58 cães com derrame pericárdico (número de

casos e respetiva %). ... 61

Gráfico 4- Alterações radiográficas em 44 cães com derrame pericárdico (número de casos e

respetiva %). ... 65

Gráfico 5- Existência de reincidências de derrame pericárdico em 49 cães ... 72 Gráfico 6- Tempo médio de vida (em dias) para cada causa de derrame pericárdico em 16 cães.

... 73

Gráfico 7-Gráfico q-q plot. Distribuição das idades dos gatos com derrame pericárdico... 75

Gráfico 8- Boxplot. Distribuição das idades dos gatos com derrame pericárdico. ... 75 Gráfico 9- Distribuição dos sinais clínicos de 37 gatos com derrame pericárdico (número de

casos e respetiva %). ... 79

Gráfico 10- Alterações radiográficos em 35 gatos com derrame pericárdico (número de casos

e respetiva %) ... 82

Gráfico 11- Tempo médio de vida (em dias) para cada causa de derrame pericárdico em 10

(16)

xvi

Lista de abreviaturas, siglas, símbolos e acrónimos

% – Percentagem <- Menor > - Maior ≥ - Maior ou igual ≤ - Menor ou igual 2D- bidimensional µl – microlitro

AST- Asparto aminotransferase

BID- Duas vezes ao dia

cels/ μl- células por microlitro

cm- centímetro

cmH2O- centímetro de água

cTnI- Troponina I cardíaca

cTnT- Troponina T cardíaca

ECG- Eletrocardiografia

g/dl- grama por decilitro

HDPP- Hérnia diafragmática peritoneu pericárdica

HVP- Hospital Veterinário do Porto

ICC- Insuficiência Cardíaca Congestiva

IV – Intravenosa

kg – quilograma

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xvii ml – mililitro

ml/kg- mililitro por kg

mmHg- milímetro de mercúrio

ng/ml- nanograma por mililitro

PCO2- Pressão parcial de dióxido de carbono

PD – Pressão Diastólica

PS- Pressão Sistólica

PIF- Peritonite Infeciosa Felina

PO – per os

PVC- Pressão Venosa Central

RMC- Ressonância Magnética Cardíaca

TC- Tomografia Computorizada

TID – Três vezes ao dia

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1

I. Revisão bibliográfica

1. Introdução

A maioria das doenças pericárdicas em animais de companhia está associada a derrames pericárdicos, ou seja, a uma acumulação anormal de fluido no saco pericárdico. Estes derrames levam muitas vezes a tamponamento cardíaco (Tobias e McNiel, 2008) quando a acumulação de fluido é suficiente para causar um aumento da pressão intrapericárdica ao nível do coração direito (Brown e Gaillot, 2008).

O derrame pericárdico é uma manifestação importante de doenças pericárdicas adquiridas (French, 2010). Estudos realizados em unidades de referência mencionam que as doenças pericárdicas representam 8% de doenças cardíacas em cães e 6% em gatos (Tobias, 2005). Em cães está associado a tumores cardíacos e a derrame pericárdico idiopático e, consequentemente, o tamponamento cardíaco é bastante frequente. Já nos gatos, o derrame pericárdico ocorre mais frequentemente associado a insuficiência cardíaca congestiva e normalmente não culmina em tamponamento cardíaco, por ser um pequeno volume de fluido (Tobias e McNiel, 2008; Coleman e Rapoport, 2016). Apesar de ser a alteração pericárdica adquirida mais frequente, em gatos o derrame pericárdico é mais raro (Côté et al., 2011) e os sinais clínicos que apresentam são normalmente subjacentes à doença primária e não devido ao próprio derrame pericárdico (Tobias e McNiel, 2008; Coleman e Rapoport, 2016).

O pericárdio é um saco fibro-seroso fechado que envolve o coração e grandes vasos (Fossum, 2009) e é composto por duas camadas: uma fibrosa e outra serosa. A parte fibrosa é um revestimento externo, composto por colagénio e elastina (pericárdio parietal). Já a parte serosa é composta por uma fina camada de células mesoteliais (pericárdio visceral). Esta camada está junta do pericárdio parietal e também se sobrepõe ao coração. A área entre a camada visceral e a camada parietal denomina-se por cavidade pericárdica (French, 2010), ou espaço pericárdico, e normalmente contém uma pequena quantidade de fluido que consiste num ultrafiltrado de plasma claro e seroso (aproximadamente 0,25mL/kg peso vivo) a fim de lubrificar estas duas camadas (Ware, 2014) (Figura 1). As funções que se podem atribuir ao pericárdio são ajudar a manter o coração na sua posição anatómica, limitar a distensão do coração e providenciar uma barreira contra infeções e inflamações dos tecidos adjacentes (Shaw e Rush, 2007a; French, 2010; Ware, 2014), embora não haja consequências clínicas evidentes quando é removido (Ware, 2014).

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2

Figura 1- Ilustração das várias camadas do pericárdio e de como está ligado ao coração (Adaptado de Campbell,

2006).

2. Derrame pericárdico 2.1. Etiologia

O derrame pericárdio pode surgir associado a doenças congénitas e a doenças adquiridas e, como tal, compreender a causa subjacente é importante para providenciar o melhor tratamento e fornecer um prognóstico (Shaw e Rush, 2007a).

As doenças pericárdicas congénitas que podem contribuir para o derrame pericárdico são a hérnia diafragmática peritoneu-pericárdica (HDPP) e os quistos intrapericárdicos benignos (Tobias, 2005).

A HDPP é a doença pericárdica congénita mais frequente em animais de companhia (Miller, 2005) e é mais comum em gatos que em cães (Coleman e Rapoport, 2016). De facto, num estudo realizado por Burns et al. (2013) com 28 cães e 30 gatos, a prevalência de HDPP foi maior nos gatos do que em cães, sendo que os cães de raça Weimaraners e os gatos domésticos de pelo comprido foram as raças mais afetadas. Esta comunicação anormal entre a cavidade peritoneal e o saco pericárdico, que permite às estruturas abdominais como o fígado,

Pericárdio fibroso Espaço pericárdico Pericárdio fibroso fundido com o diafragma

Pericárdio fibroso ligeiramente em contacto com o diafragma

Trabécula Artéria e veia coronária

Endocárdio Miocárdio Pericárdio seroso: camada visceral

Espaço pericárdico Pericárdio seroso: camada parietal

Pericárdio fibroso

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3

o intestino, o omento, o baço, o estomago e o ligamento falciforme deslocarem-se para o espaço pericárdico, é exclusivamente uma anomalia congénita, ao contrário do Homem em que pode ser traumático (Tobias, 2005). Associado ao conteúdo herniado pode haver, então, derrame pericárdico e em gatos é comum haver herniação do fígado no saco pericárdico (Tobias, 2005; Burkitt, 2012). A HDPP normalmente não causa tamponamento cardíaco (Burkitt, 2012) e em muitos casos é um achado ocasional nos animais já adultos no momento de diagnóstico (Coleman e Rapoport, 2016).

Os quistos intrapericárdicos benignos são muito raros em cães (Coleman e Rapoport, 2016) e existe apenas um caso reportado num gato (Hodgkiss-Geere et al., 2015). Num estudo retrospetivo em seis cães jovens com quistos intrapericárdicos não neoplásicos, com sinais de doença pericárdica e de tamponamento cardíaco, verificou-se que dos 4 cães sujeitos a ecocardiografia, 3 apresentavam derrame pericárdio e no outro não havia fluido pericárdico, mas sim uma limitação ao enchimento cardíaco resultado da compressão direta do quisto intrapericárdico no coração (Sisson et al.,1993). Os autores referem que, apesar de a etiopatogenia ser incerta, estes quistos podem-se desenvolver em consequência de HDPP, aprisionamento do omento ou de uma porção de ligamento falciforme no saco pericárdico. No caso reportado por Hodgkiss-Geere et al. (2015) um gato Maine Coon com dois anos de idade foi diagnosticado com um quisto pericárdico acidentalmente quatro meses depois da resolução cirúrgica de HDPP, na sequência de uma consulta de controlo. O gato não apresentava sintomatologia nenhuma, apesar da realização de ecocardiografia, radiografia torácica e eletrocardiografia (ECG) sugerirem a presença de tamponamento cardíaco (Hodgkiss-Geere et

al., 2015).

Quanto às doenças adquiridas associadas a derrame podem ser neoplásicas ou não neoplásicas (Ware, 2014). Nas causas não neoplásicas incluem-se as doenças infeciosas, traumáticas, tóxicas, idiopáticas, a rutura do átrio esquerdo resultante de regurgitação crónica, a insuficiência cardíaca ou ainda a hipoalbuminemia (French, 2010).

No cão, a causa neoplásica mais comum associada a derrame pericárdico e, consequentemente, a tamponamento cardíaco é o hemangiosarcoma, seguido de tumores de base cardíaca (Ware, 2014). A doença não neoplásica mais frequente no cão, por sua vez, é o derrame pericárdico idiopático (Tobias, 2005; Shaw e Rush, 2007a). Num estudo feito por Berg e Wingfield (1984) as doenças neoplásicas foram a causa principal de derrame pericárdico em cães, seguindo-se o derrame pericárdico idiopático.

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4

Em gatos, o derrame pericárdico está mais relacionado com insuficiência cardíaca congestiva (ICC) resultante de cardiomiopatia e o tamponamento cardíaco é raro (Ware, 2014). Assim, torna-se importante descartar cardiomiopatia e ICC em gatos com derrame pericárdico (Hall et al., 2007).

Os hemangiosarcomas, os quemodectomas e os paragliomas não cromafins com invasão da base do coração, o carcioma da tiroide ectópico, o mesotelioma pericárdico e o carcinoma metastático são exemplos de neoplasias em cães que podem levar a derrame pericárdico (Miller, 2005). Estas doenças neoplásicas podem causar sintomatologia por obstruir o fluxo sanguíneo dentro do coração ou de grandes vasos ou ainda alterar a normal contratilidade do miocárdio (Coleman e Rapoport, 2016).

O hemangiosarcoma em gatos é muito raro (Ware, 2014), embora Aupperle et al. (2007) mencione um caso de hemangiosarcoma primário pericárdico num gato com 11 anos. Em cães, o hemangiosarcoma representa cerca de 60% a 75% de todas as neoplasias que levam a derrame pericárdico (Shaw e Rush, 2007a). Num estudo retrospetivo que se fez no Hospital Veterinário Universitário do Colorado, o hemangiosarcoma foi diagnosticado em 14 de 42 cães com derrame pericárdico (Tobias, 2005). Surge frequentemente ao nível da aurícula direita, o que leva a derrame por hemorragia dentro do espaço pericárdico, ou na parede do átrio direito, particularmente acima ou perto do sulco atrioventricular (Shaw e Rush, 2007a).

Os quemodectomas são os tumores de base do coração mais frequentes (Campbell, 2006; Ware, 2014). A seguir ao hemangiosarcoma do átrio direito, é a neoplasia que mais frequentemente leva a derrame pericárdico em cães (MacDonald et al., 2009). O termo tumor de base do coração é utilizado para designar qualquer massa localizada na base do coração em associação com um grande vaso (Coleman e Rapoport, 2016), sendo que na literatura veterinária é sinónimo de tumor de base da aorta. Outros nomes para designar tumores de base da aorta são quemodectoma, paraglioma cardíaco e APUDoma (Ehrhart et al., 2002). Outros, não associados propriamente à base da aorta são o hemangiosarcoma, tumores da tiróide ectópico e mesoteliomas (Coleman e Rapoport, 2016). Ao contrário da prevalência dos cães, há casos destes tumores reportados em gatos mas é muito raro nesta espécie (George e Steinberg, 1989; Tobias, 2005).

O mesotelioma é também uma causa cada vez mais frequente e importante de derrame pericárdico (Tobias, 2005). Em estudos recentes, o mesotelioma tem sido responsável por mais de 21% dos derrames pericárdicos associados a neoplasias em cães (Coleman e Rapoport, 2016). Em gatos está descrito como sendo também uma causa de derrame mas é menos

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5

frequente nesta espécie (Tobias, 2005). Esta neoplasia representa, muitas vezes, um desafio em termos de diagnóstico uma vez que a sua diferenciação com o derrame pericárdico idiopático nem sempre é fácil, mesmo com a análise histopatológica do pericárdio (Tobias e McNiel, 2008). Por vezes, só quando os derrames pericárdicos ou pleurais são recorrentes ou mesmo quando os animais acabam por morrer é que os exames post-mortem confirmam o diagnóstico (Coleman e Rapoport, 2016). A suspeita de mesotelioma aumenta quando há quantidades significativas de derrame pleural cerca de 120 dias ou mais após a pericardiectomia (Stepien et

al., 2000; Tobias e McNiel, 2008). Por outro lado, se 120 dias após a pericardiectomia o animal

sobrevive sem quimioterapia adjuvante, a probabilidade de se tratar de mesotelioma vai diminuindo (Stepien et al, 2000).

Outras neoplasias com origem cardíaca têm sido reportadas como causa de derrame pericárdico, nomeadamente o linfoma cardíaco (Shinohara et al., 2005; Coleman e Rapoport, 2016), o rabdomiosarcoma (Venco et al, 2001; Coleman e Rapoport, 2016) e o fibrossarcoma, tanto em cães como em gatos (Coleman e Rapoport, 2016). Ware (2014) refere ainda que a histiocitose maligna em cães pode provocar derrame pericárdico, assim como ascite e derrame pleural (derrame tricavitário), não provocando tamponamento cardíaco. Também o diagnóstico de lipoma intrapericardico associado a derrame pericárdico e tamponamento cardíaco foi reportado num cão com 18 meses (Coleman e Rapoport, 2016).

Em gatos, dois estudos realizados por Hall et al. (2007) e Davidson et al. (2008) demonstram que a causa neoplásica é a segunda mais frequente de derrame pericárdico. Gidlewski e Petrie (2005) referem que o diagnóstico histológico mais comum de neoplasia cardíaca em gatos é o linfossarcoma, que normalmente invade o miocárdio e regra geral resulta em derrame pericárdico. De facto, no estudo de Hall et al. (2007) o linfossarcoma foi a neoplasia mais frequentemente encontrada, o que, segundo estes autores, coincide também com resultados de estudos anteriores. Para além do linfossarcoma, o linfoma extranodal envolvendo o pericárdio e a cavidade pleural com tamponamento cardíaco associado também foi reportado num gato (Zoia et al., 2004).

As infeções víricas, fúngicas e bacterianas estão ocasionalmente associadas a derrames pericárdicos, porém na maioria das vezes estas infeções surgem como consequência da penetração de corpos estranhos no pericárdio (Tobias e McNiel, 2008).

Shubitz et al. (2001) descrevem um caso de um cão com 4 anos, cujo diagnóstico definitivo foi pericardite constritiva secundária a Coccidioides immitis, no sudoeste dos Estados Unidos. Este mesmo animal à ecocardiografia apresentava derrame pericárdico sem sinais de

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tamponamento cardíaco. Os mesmos autores referem que a Coccidioidomicose deve ser considerada no diagnóstico diferencial de cães com insuficiência cardíaca ou derrame pericárdico que viajam ou vivam em áreas endémicas. Está também descrito um caso de miocardite fúngica e derrame pericárdico associado a Inonotus tropicalis (phylum

Basidiomycota) numa cadela Bulldog Francês com 9 anos, na Louisiana, com tamponamento

cardíaco associado (Ribas et al., 2015).

A peritonite infeciosa felina (PIF) também está relacionada ocasionalmente com derrame pericárdio em gatos, podendo ser em grande volume (Tobia e McNiel, 2008) e é uma importante causa de derrame pericárdico sintomático em gatos (Ware, 2014). De facto, no estudo retrospetivo realizado por Rush et al. (1990) em 66 gatos com doença pericárdica diagnosticada post-mortem, a PIF foi a doença mais frequentemente associada a doenças pericárdicas. Outras etiologias infeciosas reportadas em gatos que têm como consequência o derrame pericárdico são Esherichia coli, Staphylococus aureus, Streptococcus, Enterococcus,

Actinomyces e ainda Toxoplasma (Côté et al.,2011), com um caso reportado num gato com

toxoplasmose disseminada que apresentava miocardite e derrame pericárdico (Simpson et al, 2005).

O derrame pericárdico secundário a insuficiência cardíaca congestiva em pequenos animais é frequentemente detetado, mas em quantidade insuficiente para provocar tamponamento cardíaco e raramente requer pericardiocentese (Tobias, 2005; Shaw e Rush, 2007a).

A rutura do átrio esquerdo secundário a insuficiência mitral grave é uma causa pouco comum de derrame pericárdico e normalmente conduz a tamponamento cardíaco (Tobias, 2005; Tobias e McNiel, 2008).

As coagulopatias são causas raras de tamponamento cardíaco (Tobias e McNiel, 2008), existindo dois casos descritos de cães com tamponamento cardíaco secundário a toxicidade por rodenticidas (Coleman e Rapoport, 2016). Em gatos há relatos de derrame pericárdico secundário a coagulação intravascular disseminada, toxicidade por warfarina e outras coagulopatias (Tobias e McNiel, 2008).

Outras causas de derrame pericárdico incluem doenças endócrinas (Campbell, 2006), como é o caso de derrame pericárdico por hipercolesterolemia num cão com hipotiroidismo mencionado por Tobias e McNiel (2008) e uremia, quer em cães quer em gatos (Tobias, 2005). Há ainda a particularidade da pericardite efusiva constritiva, que mais não é que a presença de uma pequena quantidade de fluido no espaço pericárdico resultante de uma

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pericardite constritiva (Coleman e Rapoport, 2016). Ou seja, a doença pericárdica constritiva ocorre quando a camada pericárdica parietal e visceral estão fundidas por tecido fibroso e a pericardite efusiva constritiva é uma variante da anterior. Muitos dos casos são idiopáticos e outros desenvolvem-se meses ou anos na sequência de episódios consecutivos de derrame pericárdico idiopático. Os cães com pericardite efusiva constritiva desenvolvem na maior parte das vezes sinais de insuficiência cardíaca congestiva direita (Tobias, 2005). Em gatos, esta doença está pouco descrita e ainda não foi reportada (Côté et al., 2011).

O derrame pericárdico idiopático é um diagnóstico de exclusão (Tobias, 2005) e é definido como sendo um derrame pericárdico benigno e espontâneo (Campbell, 2006). Quando não há evidências de neoplasia, doença cardíaca, trauma, infeção ou uremia então estamos perante este diagnóstico (Shaw e Rush, 2007a). Tobias (2005) refere que 8 de 42 cães com derrame pericárdico foram diagnosticados com derrame pericárdico idiopático num Hospital Veterinário Universitário do Colorado. Em gatos o derrame pericárdico idiopático não foi reportado ainda (Tobias, 2005; Fossum, 2009).

2.2. Fisiopatologia

Em condições normais, a pressão existente no pericárdio é inferior à pressão no interior do coração, permitindo que o coração tenha a capacidade de enchimento máximo na diástole (Figura 2) (Campbell, 2006). O principal determinante para o enchimento de cada câmara cardíaca é a pressão transmural, influenciada pela pressão intracardíaca e pela pressão intrapericárdica (Tobias, 2005).

A acumulação de fluido no espaço pericárdico começa a causar sintomatologia quando a pressão intrapericárdica se iguala ou é superior à pressão intracardíaca, impedindo o retorno venoso e o enchimento cardíaco normalmente (Fig.2) (Ware, 2014). Assim, quando a pressão intrapericárdica excede a pressão intracardíaca está-se perante uma situação de tamponamento cardíaco (Campbell, 2006). O tamponamento cardíaco contribui para a diminuição do débito cardíaco, hipotensão arterial e, mais tarde, insuficiência cardíaca congestiva direita (French, 2010).

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Figura 2- Comparação entre o pericárdio em condições fisiológicas e o pericárdio com derrame associado.

Na imagem à esquerda visualiza-se o pericárdio em condições fisiológicas, com a respetivas pressões intrapericárdica e do coração direito. Na imagem à direita é possível visualizar as alterações nas pressões intrapericárdicas (diastólica/sistólica) devido ao derrame pericárdico, resultando em tamponamento cardíaco (Adaptado de Shaw e Rush, 2007a).

Tobias (2005) refere que a principal alteração fisiopatológica associada ao aumento da pressão intrapericárdica é o comprometimento da diástole ventricular, tendo como consequência a diminuição do volume sistólico. Já Ware (2014) afirma que o derrame não afeta diretamente a contratilidade cardíaca, mas sim a perfusão coronária durante o tamponamento, podendo então prejudicar a função sistólica e diastólica.

Perante um derrame pericárdico crónico e uma acumulação de fluido lenta, o pericárdio vai-se distendendo o suficiente para permitir conter esse fluido (Campbell, 2006; Ware, 2014) e a pressão intrapericárdica não aumentará abruptamente na fase inicial, permitindo alguma compensação por parte do organismo (Fossum, 2009). Porém, o pericárdio apenas se pode distender até certo limite, antes da pressão intrapericárdica começar a aumentar ainda mais (Campbell, 2006). O mecanismo exato da expansão pericárdica não é clara, mas pensa-se que possa incluir a proliferação de fibroblastos com deposição de novo tecido conjuntivo, remodelando ou acumulando-se no tecido conjuntivo pré-existente (Tobias, 2005). Pelo contrário, perante uma acumulação de fluido no espaço pericárdico de forma muito rápida ou em grandes quantidades há um aumento acentuado da pressão intrapericárdica, conduzindo assim a tamponamento cardíaco agudo (Fossum, 2009; Ware, 2014).

5 mmHg

4mmHg

0-4 mmHg

Pericárdio visceral

Miocárdio Pericárdio fibroso

Espaço pericárdico 30/12 mmHg 14/14 mmHg 15 mmHg

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O volume de derrame que pode ser tolerado sem causar tamponamento está intimamente relacionado com a taxa de acumulação de fluido. Coleman e Rapoport (2016) relatam que em estudos experimentais envolvendo cães, a rápida acumulação de líquido no espaço pericárdico e volumes entre 60 a 80 ml foram suficientes para causar sinais de tamponamento cardíaco. Já em cães que tinham uma acumulação de fluido no espaço pericárdico lento podiam ter um volume entre 1000ml a 1500ml sem que causasse sinais de tamponamento cardíaco. Este estudo demonstra a capacidade do pericárdio em se adaptar ao aumento de fluido pericárdico aquando de uma taxa de acumulação de líquido inferior e a um aumento de pressão intrapericárdica menos abrupta (Coleman e Rapoport, 2016).

Uma vez que o lado direito do coração (átrio e ventrículo direito) tem as paredes mais finas, elas são pressionadas em maior grau (Campbell, 2006) e, por consequência, há uma redução do volume sistólico e do débito cardíaco (Côté et al., 2011; Coleman e Rapoport, 2016). À medida que o fluido continua a acumular-se no espaço pericárdico, a pressão intrapericárdica, a pressão atrial direita e a pressão diastólica ventricular aumentam gradualmente e, eventualmente, podem-se igualar com a pressão diastólica ventricular esquerda (Côté et al., 2011).

Face ao declínio do débito cardíaco, há ativação de mecanismos de compensação, como a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona que faz aumentar a angiotensina II, aldosterona, vasopressina e estimula o sistema nervoso simpático, levando à retenção de água e sódio, taquicardia sinusal e venoconstrição (Tobias, 2005; Côté et al.,2011). Estes mecanismos, embora sejam destinados a melhorar o débito cardíaco e a atrasar o aparecimento de tamponamento cardíaco, são ineficazes com a progressão da doença e contribuem em parte para a progressão da mesma (Campbell, 2006). Por exemplo, o aumento da pressão venosa central (PVC) resultante destes mecanismos leva a uma transudação de fluido dos capilares sistémicos, conduzindo a ascite, a derrame pleural, a edema periférico e ainda a outros sinais de insuficiência cardíaca congestiva direita (Campbell, 2006; Fossum, 2009), tais como a distensão da veia jugular e a hipertensão ao nível da veia porta (Campbell, 2006).

O derrame pericárdico em grande quantidade pode causar sintomatologia mesmo sem tamponamento cardíaco evidente. Por exemplo a compressão traqueal e/ou pulmonar pode comprometer a ventilação e estimular a tosse, já a compressão esofágica pode causar disfagia ou regurgitação (Ware, 2014). Face à diminuição significativa do fluxo sanguíneo a nível pulmonar, resultante do baixo débito cardíaco, pode haver ainda hipoxia e taquipneia (Campbell, 2006).

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A condição em que o pericárdio se encontra, por exemplo a existência de fibrose ou de espessamento pericárdico, o volume de líquido no espaço pericárdico, assim como a taxa de acumulação deste determina a rapidez com que os sinais clínicos começam a surgir (Campbell, 2006; Daly, 2011; Ware, 2014).

Face ao débito cardíaco baixo, à hipotensão e à falta de perfusão ao nível dos órgãos pode-se considerar que o derrame pericárdico associado a tamponamento é uma situação crítica pois pode levar a choque cardiogénico ou mesmo à morte do animal caso a pressão intrapericárdica não seja aliviada e as condições hemodinâmicas restauradas (Campbell, 2006; Côté et al., 2011).

2.3. Diagnóstico

2.3.1. Incidência

Nos animais de companhia, o derrame pericárdico ocorre mais frequentemente em cães do que em gatos (Ware, 2014).

Tobias e McNiel (2008) referem que o derrame pericárdico foi a causa primária dos sinais clínicos observados em 87 cães no Centro Médico Veterinário da Universidade de Minessota entre Janeiro de 1999 e Dezembro de 2001, representando uma incidência de 0.43%. Os mesmos afirmam que o derrame pericárdico afetava machos e fêmeas quase por igual, ocorrendo mais frequentemente em cães de raça grande com a média de idade de 9,7 (±2,2) anos e peso médio de 31,2 (±12,6) kg.

De uma maneira geral, as raças mais afetadas incluem Golden Retriever, Labrador Retriever, Pastor Alemão, São Bernardo, Terra Nova e Gran Danois (Coleman e Rapoport, 2016).

Em gatos, a informação relativa à epidemiologia de derrame pericárdico é mais limitada do que em cães (Tobias, 2005). Um estudo retrospetivo realizado por Hall et al. (2007) relata que, desde 2000 a 2005, foram diagnosticados 146 gatos com derrame pericárdico no Hospital Veterinário da Universidade da Pensilvânia. Neste mesmo estudo mais machos que fêmeas foram afetados, ocorrendo mais em gatos domésticos de pelo curto (118 gatos eram domésticos de pelo curto) e de pelo longo (12 eram gatos domésticos de pelo longo), seguido de gatos de raça Maine Coon (5 gatos), Persa (4gatos), Himalaia (3 gatos), Siamesa (2 gatos), Bosques da Noruega (1 gato) e Sagrado da Birmânia (1 gato), com idades que variavam desde os 7 meses aos 23 anos.

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Como já referido, o derrame pericárdico tem por base outra doença subjacente, seja ela congénita ou adquirida. Portanto, a idade, a raça e mesmo a espécie do animal com derrame pericárdico está relacionado com a doença primária. Assim, Ware (2014) refere que em cães com uma idade superior a 7 anos são mais comuns os derrames hemorrágicos neoplásicos. De facto, Coleman e Rapoport (2016) mencionam que o hemangiosarcoma em cães é mais frequente nas raças grandes com idade média de 9 anos (Coleman e Rapoport, 2016), havendo uma predisposição racial no Pastor Alemão e Golden Retriever (Ware e Hopper,1999; Tobias, 2005; Coleman e Rapoport, 2016).

O quemodectoma em cães tem uma predisposição racial em raças braquicéfalas (Cobb e Brownlie, 1992; Tobias, 2005) como o Bulldog Inglês, Boxer e Boston terrier, com a idade média na altura do diagnóstico de 10 anos (Tobias, 2005).

Já no caso do derrame associado ao mesotelioma não existe predisposição racial para este tipo de neoplasia (Tobias, 2005; Coleman e Rapoport, 2016), porém sabe-se que a idade média aquando do diagnóstico é cerca de 8,6 anos (Coleman e Rapoport, 2016) e que os machos são mais predispostos (Shaw e Rush, 2007a).

Os cães de raça média a grande estão predispostos a pericardite efusiva constritiva, com a idade média a rondar os 6,6 anos (Coleman e Rapoport, 2016).

A rutura do átrio esquerdo secundário a insuficiência mitral grave ocorre mais em raças pequenas de cães (Tobias, 2005; Tobias e McNiel, 2008).

Os cães de raça Pastor Alemão, Grand Danois, Golden Retriever e São Bernardo parecem ter predisposição para o derrame pericárdio idiopático, com a média de idade aquando do diagnóstico de 6 anos (Shaw e Rush, 2007a).

No derrame pericárdico associado a doenças cardíacas congénitas, a idade na altura do diagnóstico quando há sintomatologia é mais cedo. No caso da HDPP, a idade em que é diagnosticada varia entre 1 a 4 anos para gatos e 1,2 a 2,5 anos para cães (Coleman e Rapoport, 2016). Quanto aos quistos pericárdicos, no estudo retrospetivo realizado por Sisson et al. (1993) de seis cães jovens com quistos intrapericárdicos não neoplásicos, as idades aquando do diagnóstico variavam entre os 6 meses e os 3 anos.

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2.3.2. História clínica

A história clínica de um animal com derrame pericárdico depende sempre da etiologia e da gravidade da doença (Burkitt, 2012), sendo que nos animais em que há uma acumulação lenta de fluido no espaço pericárdico existe uma evolução crónica da doença, com ativação dos mecanismos compensatórios que permitem manter o débito cardíaco em função da PVC elevada (Coleman e Rapoport, 2016). Nestes animais os sinais de insuficiência cardíaca direita são predominantes e os proprietários normalmente referem letargia ou fraqueza, intolerância ao exercício físico, anorexia, distensão abdominal causada por ascite, sincope após alguma atividade física (Shaw e Rush, 2007b; Coleman e Rapoport, 2016), perda de peso acentuada e fraca condição corporal (Ware, 2014). Estes sinais tendem a progredir à medida que a capacidade de estiramento do pericárdio aumenta (Shaw e Rush, 2007b). É de salientar ainda que antes do desenvolvimento de ascite os sinais que surgem são inespecíficos (Tobias e McNiel, 2008; Ware, 2014).

Já nos cães com derrame pericárdico agudo é frequente os proprietários relatarem fraqueza, colapso, aumento do esforço respiratório ou mesmo choque, resultado da súbita diminuição do débito cardíaco (Coleman e Rapoport, 2016).

Em gatos a história costuma ser ainda menos específica do que em cães, sendo frequente haver relatos de fraqueza e letargia (Côté et al., 2011)

Sinais clínicos como tosse, vómitos, diarreia, poliúria e polidipsia são menos comuns mas podem existir perante um caso de derrame pericárdico (Coleman e Rapoport, 2016). A história de colapso pode ser mais frequente em cães com doença neoplásica (Ware, 2014) e por norma ocorre pouco tempo depois de haver alguma atividade física (Shaw e Rush, 2007b).

No caso de HDPP poder-se-á encontrar sinais gastrointestinais devido à encarceração de órgãos abdominais dentro do saco pericárdico (Burkitt, 2012).

2.3.3. Exame físico

Como já referido, os sinais clínicos são determinados pela taxa de acumulação de fluido no pericárdio e pela capacidade deste se distender face ao líquido acumulado (Côté et al., 2011). Assim, estes sinais estão relacionados também com as consequências do tamponamento cardíaco e insuficiência cardíaca direita (Fossum, 2009).

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Muitas vezes a história clinica de um animal com derrame pericárdico é inespecífica, logo a realização de um exame físico completo é fundamental para o diagnóstico de derrame pericárdico (Coleman e Rapoport, 2016).

Embora não haja nenhum sinal clínico no exame físico patognomónico de derrame pericárdico, a combinação de alguns sinais clínicos é fortemente indicativo de que se está perante um caso de derrame (Shaw e Rush, 2007b). Uma combinação de sons cardíacos diminuídos, distensão da veia jugular, pulso fraco ou pulsus paradoxus deve levar a uma forte suspeita de derrame pericárdico e estes três parâmetros alterados são conhecidos como a tríade clássica do tamponamento cardíaco (Fossum, 2009).

As membranas mucosas também podem estar pálidas, com o tempo de repleção capilar aumentado devido à baixa perfusão periférica e à diminuição do débito cardíaco (Campbell, 2006).

Outras alterações detetadas no exame físico podem incluir taquicardia, hepatomegalia, ascite, taquipneia ou dispneia (Shaw e Rush, 2007b) e ainda edema periférico (Fossum, 2009). A taquicardia e as membranas mucosas pálidas com tempo de repleção capilar aumentado são manifestações do tónus simpático aumentado (Ware, 2014).

Os cães com derrame pericárdico podem assumir a posição de decúbito esternal ou a posição ortopneica de forma a respirarem melhor e terem um melhor conforto (Campbell, 2006).

A distensão da veia jugular e/ou o refluxo hepatojugular positivo ocorre na maioria dos casos de derrame com tamponamento cardíaco associado (Tobias, 2005) e é uma consequência do aumento da pressão ao nível do átrio direito (Shaw e Rush, 2007b). Por vezes, a visualização da distensão jugular é facilitada com a tricotomia da região. Esta observação deve ser feita com o animal em estação e é uma técnica bastante útil e rápida para diferenciar causas de ascite de origem cardíaca de não cardíaca (Coleman e Rapoport, 2016).

O pulsus paradoxus corresponde a variações fásicas na qualidade do pulso associadas com a respiração (Tobias e McNiel, 2008). Tobias (2005) define este pulso como a diminuição da pressão arterial sistólica (≥ 10mmHg) durante a fase inspiratória da respiração, durante uma respiração normal, sendo bastante indicativo da existência de tamponamento cardíaco. Durante a inspiração ocorre uma redução na pressão intratorácica e o fluxo sanguíneo dirige-se para as veias pulmonares, átrio direito e ventrículo direito, resultando num maior enchimento ao nível do átrio e ventrículo direito durante esta fase da respiração (Tobias, 2005; Shaw e Rush, 2007b). Em detrimento deste enchimento, há um ligeiro abaulamento do septo interventricular em

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direção ao ventrículo esquerdo e, como o grau de distensão das camaras cardíacas está limitado pela presença de derrame, o enchimento do ventrículo esquerdo está comprometido, levando a uma diminuição do volume sistólico. Isto provocará, então, uma diminuição da pressão arterial sistólica durante a inspiração e como o oposto ocorre na expiração, a qualidade de pulso é mais forte na expiração (Shaw e Rush, 2007b). Em gatos, o pulso paradoxus não se verifica tanto como em cães (Burkitt, 2012).

A PVC também pode estar alterada e é provável haver hipertensão venosa sistémica, com valores superiores a 10 cmH2O, sendo que o normal é menos de 5 ou 6 cmH2O (Fossum, 2009).

Cerca de 49% a 63% dos casos com derrame pericárdico têm ascite associada (Coleman e Rapoport, 2016), sendo o resultado de insuficiência cardíaca direita (Chan, 2014). De facto, num estudo retrospetivo que envolveu 143 cães com derrame pericárdico, realizado por Johnson

et al. (2004), 68% dos cães apresentavam ascite. Porém, Tobias e McNiel (2008) referem que

a ascite quando está presente é normalmente leve e cerca de metade dos proprietários dos cães em que se deteta ascite ao exame físico não a reconhecem.

O derrame pleural também pode estar presente tanto em cães como em gatos com tamponamento cardíaco (Ware, 2014) e, consequentemente, à auscultação torácica os sons pulmonares podem estar diminuidos (Burkitt, 2012), principalmente os sons pulmonares ventrais (Ware, 2014).

A diminuição dos sons cardíacos verifica-se quando há um volume significativo de fluido no saco pericárdico (Ware, 2014).

Burkitt (2012) refere que nos casos de HDPP os sons cardíacos podem estar diminuídos assimetricamente e, em gatos, pequenos volumes de fluido nos derrames agudos podem causar tamponamento sem haver uma diminuição dos sons cardíacos. Porém, casos de tamponamento cardíaco em gatos são esporádicos (Côté et al., 2011).

Não é frequente identificarem-se arritmias à auscultação (Campbell, 2006) e, embora o próprio derrame pericárdico não cause sopros cardíacos, doenças cardíacas concomitantes podem fazer com que à auscultação se identifique algum sopro (Ware, 2014).

No estudo retrospetivo de Hall et al. (2007) em 140 gatos com derrame pericárdico, os sinais clínicos mais frequentes foram a taquipneia, os sons pulmonares alterados e o sopro cardíaco (Tabela 1).

Em alguns casos de pericardite infeciosa poder-se-á verificar febre associada a derrame pericárdico (Ware, 2014).

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Perante um caso de tamponamento cardíaco agudo, o fluido acumulado repentinamente pode levar a uma situação de choque e mesmo à morte, sem sinais óbvios ao exame físico de derrame pleural, ascite ou sinais radiográficos de cardiomegalia. Nestes casos, a distensão da veia jugular, hipotensão e edema pulmonar poderão ser os sinais mais evidentes (Ware, 2014).

Tabela 1- Sinais clínicos em gatos com derrame pericárdico (n=140) (Adaptado de Hall et al., 2007).

2.3.4. Hemograma e análises bioquímicas

Tanto o hemograma como as análises bioquímicas são testes laboratoriais inespecificos para o diagnóstico de derrame pericárdico (Ware, 2014) e as alterações que possam existir refletem a doença subjacente (Shaw e Rush, 2007b).

Uma anemia moderada pode ser secundária à perda de sangue ou pode estar associada a doença crónica (Shaw e Rush, 2007b). Já perante um caso de anemia não regenerativa pode-se pensar em doença neoplásica, inflamação ou infeção (Ware, 2014). De facto, num estudo retrospetivo em 143 cães com derrame pericárdico, realizado por Johnson et al. (2004), 40% dos 85 animais em que foi possível obter uma amostra de sangue apresentavam anemia, sendo que todos eles tinham anemia não regenerativa ou pouco regenerativa, provavelmente devido à cronicidade da doença. Os mesmos autores referem que num estudo anterior realizado por Berg e Wingfield (1984), 28% dos casos de derrame pericárdico tinham anemia moderada (Johnson

et al., 2004). Quando o derrame pericárdico é secundário a um hemangiosarcoma, é frequente

Sinais clínicos Percentagem

Taquipneia 59%

Sons pulmonares alterados 48%

Sopro cardíaco 46%

Ritmo galope 38%

Diminuição da qualidade de pulso 27%

Arritmia 16%

Bradicardia 6%

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haver anemia regenerativa, eritrócitos nucleados, esquisócitos, acantócitos e ainda trombocitopenia (Tobias, 2005; Shaw e Rush, 2007b).

As alterações bioquímicas encontradas estão associadas à doença primária ou à insuficiência cardíaca congestiva resultante (Fossum, 2009), como é o caso do aumento das enzimas hepáticas relacionado com a congestão hepática e da azotemia pré-renal (Tobias, 2005; Ware, 2014).

No estudo retrospetivo realizado por Hall et al. (2007), em 92 gatos com derrame pericárdico a atividade sérica de aspartato aminotransferase (AST) estava aumentada em 85% dos animais. Para investigar se esta alteração era específica para gatos com derrame pericárdico, foram avaliados também gatos diagnosticados apenas com cardiomiopatia, sem derrame pericárdico associado. Não houve diferenças significativas entre os dois grupos, concluindo que o aumento da AST não é específica para gatos com derrame pericárdico. Embora o aumento desta enzima possa ser observada em doenças hepáticas ou miopatias, outras doenças como hipertiroidismo, tromboembolismo arterial ou mesmo anorexia pode provocar de igual forma um aumento da AST (Hall et al., 2007). Em derrames associados a causas neoplásicas há um aumento mais acentuado das enzimas hepáticas (Ware, 2014).

A diminuição do débito cardíaco resultante do derrame pericárdico pode provocar também uma azotemia pré-renal, levando a um aumento das concentrações séricas de ureia e de creatinina (Shaw e Rush, 2007b). Para além disso, os cães com derrame pericárdico secundário a pericardite urémica têm um aumento acentuado das concentrações séricas destas enzimas (Shaw e Rush, 2007b).

Fossum (2009) explica que uma congestão venosa sistémica crónica associada ao derrame pericárdico pode provocar uma disfunção esplénica (hipoesplenismo funcional) e uma enteropatia com perda de proteína (linfangiectasia intestinal). Como consequência do hipoesplenismo, pode haver um maior número de plaquetas ativadas na circulação, enquanto a enteropatia com perda de proteína pode agravar a disfunção esplénica e reduzir os níveis circulantes de anti trombina III. Estas doenças facilitam o estado de hipercoagulação e os animais afetados são mais propensos ao tromboembolismo pulmonar (Fossum, 2009).

Quando há ascite, há diminuição do volume circulatório e é provável haver uma ligeira hiponatremia, hipocloremia e hipercalemia (Shaw e Rush, 2007b). Outras alterações bioquímicas relatadas em cães com derrame pericárdico incluem hipoproteinemia, hiperlactatemia, hiperglicemia e hipermagnesemia (Ware, 2014). No estudo retrospetivo de Johnson et al. (2004) citado acima, 22% dos 85 cães apresentavam hipoproteinemia, 16%

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hipoalbuminemia e 45% hipoglobulinemia. Segundo os autores, estas alterações podem estejar associadas à insuficiência cardíaca ou ao derrame noutras cavidades corporais, entre outras causas, e afirmam que estas alterações não são especificas do derrames pericárdico (Johnson et

al., 2004).

Em gatos com derrame pericárdico associado ao PIF é frequente encontrar neutrofilia, linfopenia e hiperglobulinemia (Tobias, 2005).

Para além de um painel analítico básico, quando há suspeita clínica de ingestão de rodenticidas é conveniente pedir um painel de coagulação, pois os animais com coagulopatia associada à ingestão de rodenticidas anticoagulantes têm tempos de coagulação aumentados (Shaw e Rush, 2007b).

Uma serologia para Coccidioides immitis deve também ser requerida em animais com doença pericárdica em áreas endémicas, pois esta pode ser a causa do derrame (Tobias, 2005; Shaw e Rush, 2007a).

2.3.5. Radiografia

Embora possa ser um fator agravante de stresse para animais com derrame pericárdico, a radiografia torácica é uma técnica imagiológica que pode ser usada numa primeira abordagem nos casos suspeitos de derrame pericárdico (Campbell, 2006; Tobias e McNiel, 2008).

A projeção torácica ventrodorsal é preferível à dorsoventral ou laterolateral uma vez que minimiza o stresse do animal (Campbell, 2006; Gugjoo et al., 2013). Tipicamente, a silhueta cardíaca perde o seu contorno característico e torna-se maior, mais arredondada (Campbell, 2006), com o bordo dorso-caudal mais convexo uma vez que o movimento sistólico e diastólico está condicionado devido à distensão do saco pericárdico (Figura 3) (Côté et al., 2013).

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Figura 3- Radiografia torácica latero-lateral direita de um cão com derrame pericárdico, em que se observa

cardiomegalia, perda de definição da silhueta cardíaca e o bordo dorso-caudal mais convexo (tracejado) (Imagem gentilmente cedida pelo Dr. Luís Lobo, HVP).

Quando há rutura do átrio esquerdo, o contorno normal das câmaras cardíacas pode não ser totalmente perdido e o átrio esquerdo, que está aumentado, pode ser identificável (French, 2010).

Por norma, também há sobreposição da silhueta cardíaca com o diafragma e um contacto bilateral entre o saco pericárdico e as margens costais (Figura 4) (Tobias e McNiel, 2008).

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Figura 4- Radiografia torácica em projeção dorsoventral (DV) de um cão com tamponamento cardíaco. É possível

observar uma sobreposição da silhueta cardíaca com o diafragma e ainda o saco pericárdico em contato com as margens costais (Imagem retirada de Côté et al., 2013).

No estudo retrospetivo realizado por Johnson et al. (2004), num total de 90 cães com derrame pericárdico que realizaram radiografia torácica, constatou-se a presença de cardiomegalia e aparência redonda da silhueta cardíaca em 87% dos casos (Johnson et al, 2004). Porém, em derrames pericárdicos agudos o saco pericárdico pode não ter tido tempo para distender e tal pode não se verificar (Campbell, 2006), pois o tamanho da silhueta cardíaca é afetada pela cronicidade do derrame (Shaw e Rush, 2007b) e, portanto, de acordo com a taxa de acumulação do fluido pericárdico e a distensibilidade do saco pericárdico (Côté et al., 2013). A capacidade do pericárdio se distender varia entre cães e a mesma quantidade de líquido pode provocar diferentes alterações no tamanho da silhueta cardíaca entre cães, por isso é que o derrame pericárdico pode por vezes não ser identificado nas radiografias torácicas de alguns cães (Côté et al., 2013). De facto, num estudo retrospetivo realizado em 50 cães com derrame pericárdico e tamponamento cardíaco estudou-se a prevalência de várias alterações radiográficas e estimou-se a sensibilidade e especificidade destas alterações para identificar cães com derrame pericárdico e tamponamento cardíaco (Côté et al., 2013). As conclusões deste estudo foram que, apesar de se saber das características típicas de uma radiografia torácica de um animal com derrame pericárdico, nenhuma das variáveis radiográficas estudadas (VHS

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(Vertebral Heart Score); aparência arredondada da silhueta cardíaca; convexidade do bordo dorso-caudal da silhueta cardíaca) tinham uma alta sensibilidade e especificidade para identificar cães com tamponamento cardíaco e, portanto, segundo os autores do estudo, as alterações radiográficas não devem ser consideradas muito fiáveis para identificar cães com tamponamento cardíaco e derrame pericárdico (Côté et al., 2013). Estas alterações hemodinâmicas não foram tidas em conta por Guglielmini et al. (2012) quando estudaram a precisão do valor do VHS e do índice de esfericidade em cães com derrame pericárdico, também através de um estudo retrospetivo com 51 cães. Neste estudo, verificou-se que a silhueta cardíaca era realmente maior e mais redonda em cães com derrame pericárdico, comparado com cães com outra doença cardíaca sem derrame pericárdico. Porém, os detalhes radiográficos para avaliar o tamanho e a esfericidade da silhueta cardíaca têm apenas uma precisão moderada para distinguir cães com derrame pericárdico e cães com doença cardíaca sem derrame pericárdico (Guglielmini et al., 2012).

O derrame pleural é frequente quando há derrame pericárdico, contribuindo ainda mais para a perda de definição da silhueta cardíaca (Tobias e McNiel, 2008). Por este motivo, Burkitt (2012) refere que por vezes pode ser necessário realizar uma pleurocentese e só depois avaliar melhor a silhueta cardíaca na radiografia torácica (Burkitt, 2012). Quando há insuficiência cardíaca associada, para além de derrame pleural, também é possível observar a distensão da veia cava na radiografia torácica (Campbell, 2006) e numa radiografia abdominal pode-se verificar hepatomegalia e diminuição do detalhe abdominal devido à ascite (Shaw e Rush, 2007b). Em situações de hipovolémia grave pode-se visualizar ainda a veia cava mais reduzida (Drobataz, 2012).

Nos gatos, uma vez que a quantidade de líquido que se acumula no espaço pericárdico é menor, os sinais radiográficos são menos acentuados que nos cães (Shaw e Rush, 2007b). A vasculatura pulmonar e o campo pulmonar podem ser consistentes com insuficiência cardíaca congestiva, principalmente nesta espécie (Côté et al., 2012).

Ware (2014) afirma que as opacidades pulmonares sugestivas de edema e distensão das veias pulmonares são alterações menos comuns na radiografia torácica.

Algumas anomalias congénitas e casos de cardiomiopatia dilatada causam alterações radiográficas semelhantes e, portanto, devem constar nos diferenciais. Perante um caso de derrame pericárdico por HDPP, é possível ainda visualizar o conteúdo abdominal herniado na silhueta cardíaca (French, 2010).

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Existem também tumores da base cardíaca que causam uma distensão do mediastino, podendo provocar um deslocamento da traqueia (Martin, 1999) e um efeito massa de tecidos moles (Ware, 2014). Para além disso, a radiografia torácica também é útil para demonstrar outras alterações como corpos estranhos intrapericárdicos radiopacos ou metástases pulmonares (Tobias e McNiel, 2008), nomeadamente em cães com hemangiosarcoma (Ware, 2014). Drobatz (2012) sugere que a radiografia torácica se realize antes da pericardiocentese, sempre que possível, para maximizar a visualização de possíveis metástases pulmonares, pois pode-se dar o caso de alguma quantidade de fluido na cavidade pleural se acumular após a pericardiocentese.

A fluoroscopia demostra ainda um movimento diminuído ou ausente da silhueta cardíaca (Ware, 2014). Também a pneumopericardiografia pode auxiliar na identificação de massas intrapericardicas (Bonagura, 2014), assim como a angiografia pode ser usada na investigação de doenças pericárdicas (French, 2010). Porém, estas técnicas já não são muito utilizadas pois foram substituídas pela ecocardiografia (French, 2010).

Apesar da utilidade da radiografia em situações de emergência, a ecocardiografia é preferida dada a instabilidade cardiovascular de alguns animais e pelo facto de esta ser uma técnica não invasiva acessível (Chan, 2014). É importante realçar também que a radiografia raramente fornece um diagnóstico da causa subjacente do derrame pericárdico (Drobatz, 2012) e, portanto, deve ser usada juntamente com outros meios de diagnóstico (Daly, 2011).

2.3.6. ECG

O ECG é considerado pouco útil e inespecífico para auxiliar no diagnóstico de derrame pericárdico. Porém, está indicado em animais que mostrem sinais de baixo débito cardíaco, quando se deteta no exame físico alguma arritmia e quando na radiografia torácica é verificada cardiomegalia (Tobias, 2005).

Os cães e gatos com derrame pericárdico têm geralmente um ritmo sinusal normal ou taquicardia sinusal (Tobias e McNiel, 2008; Côté et al., 2011), sendo esta última frequente nos casos de tamponamento cardíaco (Ware, 2014). Em cães as arritmias ventriculares podem estar presentes também (Tobias, 2005), sendo as extrassístoles ventriculares frequentes durante e após a pericardiocentese (Shaw e Rush, 2007b). Porém, podem ocorrer também ocasionalmente arritmias supraventriculares (Tobias, 2005).

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Nos cães, a baixa voltagem dos complexos QRS (< 1mV) é uma alteração frequente em todas as derivações (French, 2010) devido à diminuição da condutividade elétrica causada pelo derrame pericárdico (Shaw e Rush, 2007b). Shaw e Rush (2007b) referem que esta baixa voltagem foi reportada em 50% dos cães com derrame pericárdico num estudo retrospetivo realizado em 42 cães com derrame. No entanto, é preciso ter presente que esta baixa voltagem pode ocorrer noutras situações como derrame pleural, obesidade, hipotiroidismo (Tobias, 2005), em cães com a conformação torácica larga e ainda em gatos, que é fisiológico (French, 2010).

A alternância elétrica, isto é a variação no tamanho do complexo QRS (ou por vezes da onda T) a cada batimento de forma alternada, é sugestivo de derrame pericárdico (Figura 5) (Tobias, 2005; Ware, 2014), principalmente em cães com grandes quantidades de fluido no espaço pericárdico (French, 2010), estando presente em 20% a 64% dos cães com derrame pericárdico (Coleman e Rapoport, 2016). Esta alteração resulta do movimento do coração no saco pericárdico com fluido (French, 2010). Em gatos, esta alteração raramente se verifica porque a quantidade de fluido que se acumula no espaço pericárdico não chega a ser suficiente para permitir o movimento do coração no saco pericárdico (French, 2010).

Figura 5- Eletrocardiografia de um cão com derrame pericárdico (Derivação II, velocidade 25mm/seg;

sensibilidade 10mm/mV). Observa-se a alternância elétrica: variação na amplitude do complexo QRS a cada batimento (setas), característico de derrame pericárdico (Adaptado de Coleman e Rapoport, 2016).

Em Medicina Humana, a elevação do segmento ST é uma alteração frequente em estadios iniciais de pericardite, porém não é muito característica de derrame pericárdico em cães e gatos, apesar de num estudo ter sido detetado em cães (Coleman e Rapoport, 2016). No entanto, é importante salientar que um ECG normal não exclui a existência de derrame pericárdico (Shaw e Rush, 2007b).

Imagem

Figura 1- Ilustração das várias camadas do pericárdio e de como está ligado ao coração (Adaptado de Campbell,  2006)
Figura 2- Comparação entre o pericárdio em condições fisiológicas e o pericárdio com derrame associado
Tabela 1- Sinais clínicos em gatos com derrame pericárdico (n=140) (Adaptado de Hall et al., 2007)
Figura  5-  Eletrocardiografia  de  um  cão  com  derrame  pericárdico  (Derivação  II,  velocidade  25mm/seg;
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Referências

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