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O estado puerperal como elemento caracterizador do delito de infanticídio: considerações a partir da legislação penal brasileira

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Academic year: 2021

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GRANDE DO SUL

ANGÉLICA BOTTEGA ALVES

O ESTADO PUERPERAL COMO ELEMENTO CARACTERIZADOR DO DELITO DE INFANTICÍDIO: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DA LEGISLAÇÃO PENAL

BRASILEIRA

Ijuí (RS) 2016

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ANGÉLICA BOTTEGA ALVES

O ESTADO PUERPERAL COMO ELEMENTO CARACTERIZADOR DO DELITO DE INFANTICÍDIO: CONSIDERAÇÕES A PARTIR DA LEGISLAÇÃO PENAL

BRASILEIRA

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia.

UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais

Orientadora: MSc. Ester Eliana Hauser

Ijuí (RS) 2016

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Dedico este trabalho aos meus pais, Vicente e Rose, e aos meus irmãos, William e Vinícius, pelo incentivo e apoio durante toda a minha jornada acadêmica.

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Em primeiro lugar agradeço a Deus, pois sem sua benção nada seria possível.

Agradeço aos meus amados pais, Vicente e Rose, que sempre estiveram presentes em minha caminhada me incentivando com apoio e confiança nas batalhas da vida.

Aos meus irmãos, William e Vinícius, por sempre me apoiarem em meus estudos, sendo fontes de inspiração para minha vida.

Aos meus amigos, pelo companheirismo e incentivo, tornando-se fundamentais e indispensáveis durante toda minha jornada acadêmica.

À minha orientadora Ester Eliana Hauser, com quem eu tive o privilégio de conviver e contar com sua dedicação e disponibilidade, me guiando pelos caminhos do conhecimento.

Por fim, agradeço a todos os professores da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - Unijuí, os quais despenderam de seu tempo durante a graduação, compartilhando de seus conhecimentos a fim de formar novos bons profissionais.

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“Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las.”

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O presente trabalho de conclusão de curso faz uma análise dos aspectos históricos, conceituais e legais acerca da penalização do crime de infanticídio no Brasil, investigando as mudanças trazidas nos dispositivos legais do texto penal, desde 1830, quando o primeiro Código Criminal do Império passou a prever o delito de infanticídio. Aborda a classificação jurídica do delito, seus elementos estruturais, os sujeitos do delito, a possibilidade do concurso de pessoas, o bem protegido, os elementos temporal e normativo do delito de infanticídio, e, por fim, as distinções entre este e os demais crimes contra a vida do infante. Estuda, em um segundo momento, o estado puerperal como elemento caracterizador do delito de infanticídio, analisando os conceitos adotados no âmbito jurídico e médico. Investiga a influência do estado puerperal na responsabilização penal do agente delitivo, bem como aponta as categorias estruturais do crime, sendo a tipicidade, a ilicitude e a culpabilidade. Finaliza concluindo que se deve buscar a prova de que a agente estava, no momento do crime, acometida pelos transtornos causados no estado puerperal, afim de que se determine a culpabilidade e responsabilidade penal desta, no delito de infanticídio.

Palavras-Chave: Infanticídio. Estado puerperal. Responsabilização penal. Culpabilidade. Inimputabilidade.

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The present course conclusion paper analyzes historical, conceptual and legal aspects about penalty of the crime on infanticide in Brazil, investigating the changes on legal arrangements of the penal text, since 1830, when the first Criminal Code of the Empire started to provide the crime on infanticide. It approaches the legal classification of the crime, its structural elements, the subject of the offense, the possibility of participation of other people, the protected interest, the temporal and legal elements on infanticide crime, and finally, the distinction between this crime and the other offenses against the infant‟s life. The paper studies, in a second moment, the puerperal state as a characterizing element of infanticide crime, by analyzing concepts adopted by the legal and medical framework. It investigates the influence of the puerperal state on the criminal liability of the criminal member, and also points out the structural categories of the crime, as typicality, the illegality and culpability. It concludes that one should seek evidence that the agent was, at the time of the crime, affected by disorders caused by the puerperal state, in order to determine the culpability and criminal liability of this person on the infanticide crime.

Key – words: Infanticide. Puerperal State. Criminal Liability. Culpability. Legal Disability.

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INTRODUÇÃO ... 8

1 A PENALIZAÇÃO DO INFANTICÍDIO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO: ASPECTOS HISTÓRICOS, CONCEITUAIS E LEGAIS ... 10

1.1 A penalização do infanticídio no Brasil: aspectos históricos ... 10

1.2 Os crimes contra a vida e o delito de infanticídio no Código Penal Brasileiro ... 12

1.3 A classificação jurídica do delito de infanticídio e seus elementos estruturais:... 14

1.3.1 Os sujeitos do delito e o concurso de pessoas ... 14

1.3.2 Bem jurídico protegido e o elemento subjetivo do crime ... 16

1.3.3 O elemento temporal e o elemento normativo “estado puerperal” ... 18

1.4. Distinções entre homicídio, aborto e infanticídio...19

2 O ESTADO PUERPERAL COMO ELEMENTO CARACTERIZADOR DO DELITO DE INFANTICÍDIO E SUA INFLUÊNCIA NA DETERMINAÇÃO DA RESPONSABILIDADE PENAL ... 21

2.1 O conceito de estado puerperal na visão da doutrina penal e da jurisprudência brasileira ... 22

2.2 O estado puerperal e os transtornos psiquiátricos puerperais no âmbito da saúde .. 24

2.3 Estado puerperal e responsabilidade penal no delito de infanticídio ... 27

2.3.1 As categorias estruturais do delito: tipicidade, ilicitude e culpabilidade... 29

2.3.2 A culpabilidade e a pena – critérios de determinação e de aferição do grau de responsabilidade penal ... 31

2.3.3 A influência do estado puerperal na determinação da culpabilidade e da responsabilidade penal no delito de infanticídio ... 35

CONCLUSÃO ... 38

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho apresenta um estudo acerca dos aspectos históricos, conceituais e legais do crime de infanticídio no Brasil. Verificou-se que o dispositivo do texto legal penal, passou por diversas modificações até se chegar ao texto atual, sendo tratado de forma distinta no Código Criminal do Império (1830), Código Penal dos Estados Unidos do Brazil (1890), até a chegada do Código Penal Brasileiro de 1940, vigente até o momento.

Para a realização deste estudo, foram realizadas pesquisas bibliográficas e por meio eletrônico, a fim de enriquecer a coleta de informações e permitir um aprofundamento no estudo do delito de infanticídio. A investigação acerca do estado puerperal se deu em vista de ser, este, elemento caracterizador do delito, sendo que com sua ausência, não se configura, em nenhuma hipótese, o crime de infanticídio.

As primeiras noções acerca do delito de infanticídio deram-se em busca de sua classificação jurídica, restando verificado que o delito é próprio, instantâneo, comissivo, material, de dano e de forma livre. Após, imprescindível a verificação dos sujeitos pré-determinados do delito de infanticídio, quais são, mãe e filho. Quanto à possibilidade de concurso de pessoas neste delito, verifica-se que há correntes divergentes na doutrina acerca da comunicabilidade ou não das circunstâncias e condições de caráter pessoal, a fim de esclarecer se a penalização do terceiro participante deve ser como incurso no crime de infanticídio ou como incurso no crime de homicídio.

A partir deste estudo, analisaram-se os elementos, temporal e normativo, do delito em questão, sendo o elemento temporal traduzido pela expressão “durante ou logo após o parto” e o elemento normativo traduzido pela expressão “estado puerperal”. Cumpre destacar que sem a presença destes, não resta configurado, em nenhuma hipótese, o delito de infanticídio. Deste

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modo, apresenta-se a distinção entre os possíveis crimes contra a vida do infante, quais sejam o infanticídio, o aborto e o homicídio.

No segundo capítulo foi realizada uma análise mais aprofundada acerca do elemento normativo, “estado puerperal”, no crime de infanticídio. Assim, são trazidos diferentes conceitos acerca deste, no âmbito jurídico, bem como no âmbito médico-legal.

Verifica-se que o estado puerperal influencia diretamente na determinação da responsabilização penal da agente delitiva, a mãe. Dessa forma, indispensável é o estudo das categorias estruturais do delito, quais são a tipicidade, a ilicitude e a culpabilidade. Salienta-se que existem causas que excluem a culpabilidade do agente delitivo, quais são a doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado e a embriaguez completa proveniente de caso fortuito ou força maior, conforme se pode verificar no Código Penal Brasileiro.

Portanto, conclui-se que se deve buscar a prova de que a agente estava, no momento do crime, efetivamente acometida pelos transtornos causados no estado puerperal, afim de que se determine a culpabilidade e responsabilidade penal desta, no delito de infanticídio.

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1 A PENALIZAÇÃO DO INFANTICIDIO NO DIREITO PENAL BRASILEIRO: ASPECTOS HISTORICOS, CONCEITUAIS E LEGAIS

O crime de infanticídio encontra-se previsto no artigo 123 do Código Penal Brasileiro, no capítulo dos crimes contra a vida, tendo em vista que trata-se de um tipo de homicídio privilegiado em decorrência da mãe matar seu próprio filho enquanto sob a influência do estado puerperal. (CHRISTOFOLI, 2013)

Entre as peculiaridades deste tipo penal encontra-se o seu elemento temporal e normativo, “durante ou logo após o parto” e “sob influência do estado puerperal” e os sujeitos do delito que são pré-determinados (mãe e filho neonato ou recém-nascido). Ainda, há um grande debate doutrinário acerca da possibilidade do concurso de pessoas, quando um terceiro participa ou auxilia o agente para a execução do delito. (CHRISTOFOLI, 2013)

Destaca-se que o conceito do delito de infanticídio passou por diversas modificações até se chegar ao texto atual, sendo tratado de forma diferente nos antigos textos penais como o Código Criminal do Império do Brazil (Lei de 16 de dezembro de 1830), Código Penal dos Estados Unidos do Brazil (Decreto n. 847 de 11 de outubro de 1890), até a chegada do Código Penal Brasileiro (Decreto-Lei n. 2.848, de 07 de dezembro de 1940), vigente até o momento. (NUCCI, 2013)

Em decorrência das modificações trazidas ao dispositivo que trata do delito de infanticídio, ao longo dos anos, também ocorreram alterações quando aos elementos estruturais do referido delito, como por exemplo, o elemento temporal, o entendimento acerca da duração do estado puerperal, bem como quanto aos sujeitos do delito, que antigamente, podia ser qualquer pessoa que matasse algum recém-nascido.

1.1 A penalização do infanticídio no Brasil: aspectos históricos

Na atualidade o crime de infanticídio é punível com pena de dois a seis anos de detenção, conforme prevê o Código Penal vigente (Decreto-Lei n. 2.848, de 07 de dezembro de 1940), no entanto, nem sempre foi assim.

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Nos primórdios não eram penalizados os pais que matassem seus filhos quando estes fossem oferecidos em cerimonias religiosas, rituais ou quando apresentassem alguma deficiência que acarretasse na sua inaptidão para a guerra ou no caso da criança ser do sexo feminino.

No Brasil, o infanticídio era prática corriqueira dos povos nativos, vez que tal delito era tratado pelos mesmos como algo natural. Inclusive, nos tempos atuais ainda ocorre em algumas tribos indígenas brasileiras. (ESTEVES, 2012)

Importante lembrar que no Brasil, até 1830, não existia um Código Penal próprio, tendo em vista que se tratava, ainda, de uma colônia portuguesa e, deste modo, submetia-se às Ordenações Filipinas que trazia em seu texto o rol de crimes e penas que deveriam ser aplicados no Brasil. (ESTEVES, 2012)

O crime de infanticídio foi tipificado no Brasil, quando da criação do primeiro Código Criminal do Império do Brazil, em 1830, quando previu em seu art. 198, a penalização da mãe que matasse seu filho por motivo de honra (pena – um a três anos). Além desta previsão, era enquadrada no crime de infanticídio qualquer pessoa que matasse algum recém-nascido (pena – três a doze anos), quem ocasionasse o aborto por qualquer meio empregado interior ou exteriormente com ou sem o consentimento da mulher pejada (pena – um a cinco anos), ou quem fornecesse com conhecimento de causa drogas, ou quaisquer meios para produzir o aborto, ainda que este não se verificasse (pena – dois a seis anos). (LEI DE 16 DE DEZEMBRO DE 1830)

Após, em 1890, com a criação do “Código Penal dos Estados Unidos do Brazil” por meio do Decreto n. 847 de 11 de outubro de 1890, o infanticídio passou a ser previsto no art. 298, trazendo algumas mudanças em seu texto. A partir daí, o infanticídio passou a ser considerado o crime praticado por qualquer pessoa que matasse recém-nascido, nos sete primeiros dias de seu nascimento, quer empregando meios diretos e ativos, ou recusando à vítima os cuidados necessários a manutenção de sua vida a fim de impedir sua morte (pena – seis a vinte e quatro anos), ou quando o crime era perpetrado pela mãe para ocultar desonra própria (três a nove anos). (DECRETO N. 847, 1890)

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Em 1940 houve a promulgação do novo Código Penal Brasileiro, por meio do Decreto-Lei n. 2.848, de 07 de dezembro, vigente até o momento, o qual passou a prever em seu art. 123, o delito de infanticídio como sendo uma forma privilegiada ou especial de homicídio pela peculiaridade de ser praticado pela mãe contra seu filho, quando influenciada pelo estado puerperal com previsão e pena de detenção de dois a seis anos. (DECRETO-LEI N. 2.848, 1940)

Acerca do delito de infanticídio, leciona Alfredo Farhat, citado por Nucci (2013, p. 664):

Custa-nos aceitar, na generalidade dos casos, apesar de o momento puerperal acarretar excitações anormais, cuja graduação se pode medir, que variam de indivíduo para indivíduo, que não obedecem a um estalão certo, que, mais forte do que a sensação de ver, em forma humana, nova e diversa o próprio sangue e a própria carne, seja a vontade de não perder um conceito social, que se baseia numa convenção; que seja mais forte o egoísmo do que a

maternidade.

Destaca-se que na atual previsão do crime de infanticídio não existe qualquer fim “aceitável” para que a mãe tire a vida de seu filho a fim de se beneficiar, como era previsto nos antigos Códigos quando mencionavam a expressão “para ocultar desonra própria”, prevendo o estado puerperal como única circunstância elementar para a diminuição da pena. (NUCCI, 2013)

1.2 Os crimes contra a vida e o delito de infanticídio no Código Penal Brasileiro

O atual Código Penal Brasileiro traz em seu Capítulo I, os crimes contra a pessoa, e, dentro deste, o Título I trata dos crimes contra a vida, prevendo quatro figuras típicas: o homicídio, o induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio, o aborto e o infanticídio.

Destaca-se que a previsão dos crimes contra a vida no Código Penal tem como objetivo proteger, bem como penalizar aquele que atentar contra a vida humana.

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Conforme dispõe o art. 5º da Constituição Federal/1988, todos têm direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, sendo estes bens jurídicos amplamente protegidos.

Cumpre-se destacar que o bem da vida humana é o mais importante dos bens jurídicos mencionados, vez que, se violado, todos os demais também assim serão. O direito à vida já é garantido ao nascituro, ou seja, o indivíduo tem proteção a vida desde sua concepção, antes mesmo de seu nascimento, conforme prevê o artigo 2º do Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002).

Para a proteção da vida humana, como um direito fundamental, a legislação penal brasileira prevê a criminalização das condutas lesivas a este direito. Conforme se pode verificar no Código Penal Brasileiro, são aplicadas sanções rigorosas ao agente que atentar contra a vida da pessoa humana, seja sob a forma de homicídio, aborto, infanticídio ou participação em suicídio.

Ainda, convém lembrar que os crimes praticados contra a vida são tratados de forma tão rígida e excepcional, que em face da relevância do bem jurídico atingido, quando praticados dolosamente, são submetidos a julgamento perante o Tribunal do Júri em razão de determinação constitucional (art. 5º, XXXVIII, “d”, da Constituição Federal/88).

É a partir deste contexto que entra em cena a discussão acerca do infanticídio, delito cometido pela mãe contra o filho, pelo qual esta tira a vida do nascente ou recém nascido quando sob influencia do estado puerperal.

A palavra infanticídio tem origem na fusão das palavras infantis e caedere, que significam, respectivamente, “criança” e “matar”, ou seja, o termo infanticídio é definido como a morte de uma criança. (SOARES; PARAVINA, 2008)

Pode-se dizer que o infanticídio é um homicídio privilegiado, em que o legislador conferiu à autora do delito um tratamento menos severo tendo em vista o elemento caracterizador do crime (estado puerperal), ou seja, prevê uma pena reduzida em comparação ao crime de homicídio, podendo ser fixada de dois a seis anos de detenção.

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1.3 A classificação jurídica do delito de infanticídio e seus elementos estruturais:

Para Pedro Lazarini (2007), é possível classificar o delito de infanticídio como sendo: próprio, podendo ser cometido somente por agente especial, no caso, a mãe; instantâneo, tendo em vista que a consumação é imediata, não se prolongando no tempo; comissivo, por exigir ação por parte do agente para o resultado do crime; material, vez que somente se configura com o resultado descrito na norma, ou seja, a morte do nascente ou recém-nascido; de dano, pois para a ocorrência do delito o bem jurídico da vida do filho deve ser lesado; de forma livre, ou seja, não há menção expressa na norma acerca da conduta que causa o resultado, podendo ser livremente pensada pelo agente; e material, consumando-se somente com a efetiva ocorrência do resultado.

1.3.1 Os sujeitos do delito e o concurso de pessoas

Os sujeitos do delito no crime de infanticídio são pré-determinados, tendo em vista a peculiaridade do tipo penal. Assim, o sujeito ativo sempre será a mãe, enquanto que o sujeito passivo sempre será o filho, nascente ou recém-nascido, o que corrobora a afirmação de que o infanticídio trata-se de um crime próprio, não podendo ser praticado por qualquer pessoa, mas tão somente por aquela que preencha os requisitos mencionados no texto legal.

No entanto, importante destacar que, na atualidade, a doutrina tem entendido que é possível o concurso de pessoas no delito de infanticídio. Entende-se por concurso de pessoas a cooperação entre duas ou mais pessoas que participam, ciente e voluntariamente, para o planejamento ou execução do crime. Assim, na hipótese do crime de infanticídio, tem-se o concurso de pessoas quando um terceiro auxilia a mulher na prática delitiva de matar seu filho, como partícipe ou concorrente para o resultado morte do nascente ou recém-nascido. (CHRISTOFOLI, 2013)

Nesse contexto, há correntes divergentes na doutrina que discutem acerca da comunicabilidade, ou não, das circunstâncias e condições de caráter pessoal, a fim de esclarecer se a penalização do terceiro participante deve ser como incurso no crime de infanticídio, ou deve-se puni-lo como incurso no crime de homicídio.

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Segundo o entendimento de Rogério Greco (2008, p. 233):

Quando é a própria parturiente que, sozinha causa a morte do recém nascido, mas com a participação de terceiro que, por exemplo, a auxilia materialmente, fornecendo-lhe o instrumento do crime, ou orientando-a como utilizá-lo, ambos da mesma forma, responderão pelo infanticídio, já que a parturiente atuava influenciada pelo estado puerperal e o terceiro que a auxiliou conhecia essa particular condição, concorrendo, portando, para o sucesso do infanticídio.

No mesmo sentido, entende Fernando Capez (2014, p. 142) que “a „circunstância‟ de caráter pessoal (estado puerperal), na verdade, não é circunstância, mas elementar; logo, comunica-se ao partícipe”.

Verifica-se que o reconhecimento da punibilidade do terceiro participante como incurso no delito de infanticídio permitiria a ampliação do rol de sujeitos ativos do tipo, vez que o legislador ao criar a norma, não previu o crime cometido pelo agente que concorre no delito.

Outra corrente, defendida por longo tempo por Nelson Hungria, entendia pela incomunicabilidade das circunstâncias e condições de caráter pessoal, defendendo que o estado puerperal é circunstância personalíssima, o que determina que o mesmo não se comunica e, portanto, o partícipe da prática delituosa deve responder pelo crime de homicídio, e não pelo crime de infanticídio. Ocorre que próprio Hungria alterou, ao final da vida, este posicionamento concordando que a elementar estado puerperal tem natureza subjetiva e, deste modo, estende-se aos participantes do delito, conforme dispõe o artigo 30 do Código Penal. (HUNGRIA apud CHRISTOFOLI, 2013).

Referindo-se a esta questão Gonçalves (2011, p. 147) menciona que

Este, em verdade, é um dos temas mais importantes no estudo do crime de infanticídio. Com efeito, embora se trate de crime próprio, que, de forma direta, deve ser cometido pela mãe, a doutrina atual é quase unânime em asseverar que tal delito admite tanto a autoria quanto a participação. Esta conclusão deve-se, basicamente, ao que dispõe o art. 30 do CP: não se comunicam as circunstâncias e condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime. Por esse dispositivo, verifica-se que as elementares de caráter pessoal, obrigatoriamente, comunicam-se aos comportamentos que não possuam a mesma condição.

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No entanto, para que a comunicabilidade ocorra é necessário que a mãe tenha realizado algum ato executório do infanticídio e que o terceiro seja coautor ou partícipe na conduta. (GONÇALVES, 2011)

É de se destacar que o entendimento sobre o concurso de pessoas no crime de infanticídio não é pacificado, porém, cumpre-se mencionar que não parece justo que um terceiro, que não se encontra sob a influência do estado puerperal, seja punido com pena igual a da mãe, que age mediante alterações psíquicas e psicológicas.

Tentando sanar tal dificuldade, denunciada pela doutrina, existem projetos de lei que sugerem transformar o delito autônomo de infanticídio em modalidade de homicídio privilegiado, “de modo que o estado puerperal deixe de ser elementar do delito” e passe a configurar como circunstância de privilégio do próprio homicídio.

Já o anteprojeto de novo Código Penal Brasileiro, que tramita no Congresso Nacional, propõe a inclusão de um parágrafo único ao art. 123, excepcionando a regra do art. 30, excluindo sua incidência para o caso de infanticídio. (ANTEPROJETO DE NOVO CÓDIGO PENAL, 2012)

1.3.2 Bem jurídico protegido e o elemento subjetivo do crime

É sabido que o Direito protege a vida humana desde sua concepção. Neste sentido, ao tipificar o crime de infanticídio, o legislador pretendeu proteger o bem jurídico da vida extrauterina, tendo em vista que a vitima do delito é o nascente, aquele que esta nascendo, ou o neonato, aquele recém-nascido.

Destaca-se que para que se configure o infanticídio, a mãe deve matar o feto que se encontrar vivo ao iniciar-se o parto, caso contrário, responderá a mesma pelo crime de aborto.

Quanto ao elemento subjetivo do delito de infanticídio, temos o dolo, ou seja, a vontade do agente em produzir o resultado, no caso, a vontade da mãe de produzir como resultado a morte do seu filho nascente ou recém-nascido. Com relação ao dolo, cabe mencionar que existem duas espécies, o dolo direto e o dolo indireto. O dolo direto consiste

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na conduta do agente que, ao praticá-la, deseja determinado resultado, ou seja, objetiva um resultado preciso e pretendido. Já o dolo indireto ocorre quando o agente pratica uma conduta, porém não busca um resultado preciso ou definido, mas apenas assume o risco de produzir qualquer resultado. (CHRISTOFOLI, 2013)

Cumpre-se mencionar que, em regra, não existe modalidade culposa no delito de infanticídio, no entanto, há posições divergentes na doutrina acerca da matéria. A teoria adotada por Damásio E. De Jesus entende que, se culposo o delito, o fato será penalmente atípico. Já a teoria adotada por, Fernando Capez, Júlio Fabbrini Mirabete, Cezar Roberto Bitencourt e Nélson Hungria, entende que, se culposo o delito, o agente deverá responder pelo crime de homicídio culposo. (GONÇALVES, 2011)

Conforme leciona Mirabete (2012, p. 131), o crime culposo é “a conduta voluntária (ação ou omissão) que produz resultado antijurídico não querido, mas previsível, e excepcionalmente previsto, que podia, com a devida atenção, ser evitado”. Desse modo, o crime culposo ocorre quando o agente, por imprudência, imperícia ou negligência, assume o risco de produzir um resultado antijurídico.

Nesse sentido, há autores que acreditam que a mãe, influenciada pelo estado puerperal, pode vir a matar seu filho de forma culposa. Nessa hipótese defende-se a ideia de que a mulher, influenciada pelo estado puerperal, não queira causar o resultado morte de seu filho nascente ou recém-nascido, devendo, portanto, responder pelo crime de homicídio culposo e não pelo crime de infanticídio.

Acerca da culpa, leciona Fernando Capez (2014, p. 141):

O elemento da culpa é a quebra do dever objetivo de cuidado e a previsibilidade objetiva. A capacidade pessoal de previsão do agente (afetada pelo estado puerperal) pertence ao terreno da culpabilidade e não do fato típico. Por essa razão, sendo o fato objetivamente previsível e a conduta qualificada como imprudente, negligente ou imperita, quando comparada ao comportamento de uma pessoa normal, estará presente a culpa. As deficiências de ordem pessoal da gestante devem ser vistas posteriormente, na culpabilidade. Pode responder por homicídio culposo, portanto.

Ainda, é de se destacar que a consumação do delito dá-se com a morte do infante, durante ou logo após seu nascimento. Entretanto, segundo a lição de Capez (2014), por

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tratar-se de um crime plurissubsistente, ou tratar-seja, aquele em que vários atos podem vir a integrar a conduta do agente, admite-se a forma tentada quando, por circunstâncias alheias a vontade da genitora, não houver eliminação da vida do nascente ou recém nascido.

1.3.3 O elemento temporal e o elemento normativo “estado puerperal”

Quanto ao elemento temporal do delito de infanticídio, importante mencionar que este passou por diversas alterações desde que tal delito fora tipificado. O primeiro Código Criminal do Império do Brasil, previa que cometia crime de infanticídio, a mãe que matasse o filho recém-nascido. Deste modo, verifica-se que o elemento temporal do tipo não era claro vez que se deteve à expressão “recém nascido”, não prevendo até que momento tal estado duraria. Já o Código Penal dos Estados Unidos do Brazil, trouxe novo texto à tipificação do delito de infanticídio, mencionando que o mesmo estaria configurado quando a mãe matasse seu filho nos sete primeiros dias de seu nascimento, deixando claro, portanto, o elemento temporal do tipo.

Na atual legislação penal diz-se que o delito de infanticídio é aquele cometido pela mãe contra seu filho, durante ou logo após o parto. Entende-se por parto o momento em que inicia a dilatação do colo do útero da mulher até o momento da expulsão do feto de seu corpo. Sendo assim, o crime pode ser praticado quando o feto está nascendo, ou seja, desde o momento em que se inicia o parto, ou logo após seu nascimento, após sua total expulsão do corpo da mãe. (CAVALCANTE, 2013)

Cumpre-se destacar que a expressão “logo após o parto” é entendida pacificamente pela doutrina como sendo o período de duração do estado puerperal, não sendo pré determinado, tendo em vista que referido período é variável em cada mãe, devendo ser analisado em cada caso concreto. Contudo, apesar de não estipular prazo determinado, o legislador fixou um parâmetro para facilitar o reconhecimento do infanticídio, mencionando que o crime se configura quando a conduta delitiva da mãe ocorrer “logo após”, ou seja, num curto prazo de tempo. (CHRISTOFOLI, 2013)

Além do elemento temporal, o legislador trouxe ao texto legal o elemento normativo “sob o estado puerperal”, sem o qual alterar-se-ia significativamente a tipificação do crime de infanticídio.

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Conforme dispõe o art. 123 do Código Penal Brasileiro, somente configura-se o crime de infanticídio quando a mãe matar o filho, influenciada pelas alterações psíquicas e fisiológicas decorrentes do período do estado puerperal. Entende-se por estado puerperal uma condição emocional e fisiológica pela qual passa a mãe, que ocorre no momento do parto, ou seja, toda mulher passa pelo estado puerperal. Para Fernando Capez (2014, p. 139), “trata-se o estado puerperal de perturbações, que acometem as mulheres, de ordem física e psicológica decorrentes do parto”.

No entanto, cumpre-se salientar que a maioria das mulheres não sofre perturbações significativas a ponto de apresentar algum risco ao nascente ou recém nascido. Por isso, é importante lembrar que não basta que a mãe esteja no período de abrangência do estado puerperal para que cometa o infanticídio, mas sim, deve esta, estar sofrendo significativas alterações em seu estado psíquico, restando fortemente abalada em decorrência do parto.

Destaca-se que o legislador, ao fazer menção à expressão “sob a influência do estado puerperal”, pretendeu esclarecer que o delito de infanticídio somente ocorre quando a mãe encontrar-se efetivamente abalada por perturbações graves, físicas e mentais, capazes de oferecer riscos ao seu filho durante ou após o parto, decorrentes ao seu estado puerperal.

1.4 Distinções entre homicídio, aborto e infanticídio

Importante também fazer uma análise das principais distinções entre os crimes de homicídio, aborto e infanticídio, todos crimes contra a vida humana, tendo em vista a possibilidade de confronto entre os referidos tipos penais.

Inicialmente, é de extrema importância distinguir o delito de infanticídio do delito de aborto, tendo em vista as possíveis confusões ou dúvidas quando da determinação do crime que o agente criminoso deve responder. O infanticídio e o aborto se diferenciam, basicamente, pelo momento da ação do sujeito ativo do crime, sendo que, o primeiro ocorre quando a mãe matar seu filho durante ou logo após o parto quando influenciada pelo estado puerperal, enquanto que o segundo ocorre quando a mãe matar o filho antes de iniciado o parto.

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Com relação à distinção entre os crimes de homicídio e infanticídio, cumpre-se mencionar que, ausentes as alterações e abalos, psíquicos ou psicológicos, que qualifiquem o estado puerperal, o crime será de homicídio. Porém, se presentes referidas condições, o crime será de infanticídio.

Deste modo, é possível observar que o crime de infanticídio possui peculiaridades próprias que o distingue dos demais delitos contra a vida humana. Assim, encerra-se este capítulo enfatizando os elementos estruturais do delito de infanticídio que o diferencia dos demais delitos contra a vida.

Salienta-se que para uma melhor compreensão acerca da tipificação do delito de infanticídio, é necessário um estudo aprofundado sobre o elemento caracterizador do mesmo, o “estado puerperal”, e sua influência na determinação da responsabilidade penal do agente, o que será estudado em seguida.

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2. O ESTADO PUERPERAL COMO ELEMENTO CARACTERIZADOR DO DELITO DE INFANTICÍDIO E SUA INFLUÊNCIA NA DETERMINAÇÃO DA RESPONSABILIDADE PENAL

O estado puerperal é o elemento normativo, caracterizador do delito de infanticídio disposto no art. 123 do Código Penal Brasileiro. Conforme o dispositivo mencionado, tal delito somente ocorre quando a mãe, influenciada pelo estado puerperal, tira a vida de seu próprio filho, durante ou logo após o parto.

Destaca-se que o estado puerperal pode ser compreendido como alterações de ordem física, psicológica e psíquica ocorridas no corpo da mulher durante o parto. Em algumas mulheres, tais alterações não trazem grandes consequências, sendo que após o parto, o corpo gradativamente vai voltando ao seu estado pré-gravidez. (CAVALCANTE, 2013)

No entanto, em outras mulheres o estado puerperal pode trazer grandes problemas à sua saúde psicológica e psíquica, quando tais alterações são significativas, a ponto de levar a mãe a matar seu próprio filho enquanto influenciada por estas. É assim que ocorre o delito de infanticídio. (CAVALCANTE, 2013)

Cumpre-se mencionar que é imprescindível a comprovação de alterações na mulher durante o estado puerperal para que se configure o infanticídio. A prova de que a mãe praticou o crime influenciada pelo estado puerperal é o que determina sua responsabilidade penal no delito de infanticídio.

Ressalta-se que somente o fato de a mãe encontrar-se no período puerperal não significa que a mesma esteja sofrendo os transtornos ou alterações psíquicas causadas por este, até porque, em regra, na maioria das mulheres não ocorrem ou não são significativas tais alterações. Neste caso a mesma será punida penalmente pelo crime de homicídio, vez que lhe falta o elemento normativo que individualiza e especifica o delito de infanticídio.

Deste modo, apesar da extrema complexidade, resta a tarefa difícil à medicina legal, afim de que comprove a incidência ou não das alterações possivelmente trazidas pelo estado puerperal à mulher, em cada caso.

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2.1 O conceito de estado puerperal na visão da doutrina penal e da jurisprudência brasileira

Inicialmente, importante destacar o significado da palavra puerpério, que compreende o período que se estende entre o início do parto até o retorno do organismo materno a sua normalidade, ou seja, ao seu período pré-gravidez. (NUCCI, 2013).

Segundo Gonçalves (2011) o estado puerperal consiste, genericamente, nas alterações físicas e psíquicas provocadas no organismo da mulher no momento do parto, ou seja, o período compreendido entre a expulsão do feto e a volta do organismo da mãe ao estado anterior à gravidez.

É sabido que toda mulher encontra-se em estado puerperal no momento do parto, no entanto, a maioria não é afetada por alterações significativas a ponto de levá-las a tirar a vida de seus próprios filhos. (BITENCOURT, 2012)

A doutrina penal apresenta vários conceitos para a expressão “estado puerperal”. Segundo Fernando Capez (2014, p. 139):

Trata-se o estado puerperal de perturbações, que acometem as mulheres, de ordem física e psicológica decorrentes do parto. Ocorre, por vezes, que a ação física deste pode vir a acarretar transtornos de ordem mental na mulher, produzindo sentimentos de angustia, ódio, desespero, vindo ela a eliminar a vida de seu próprio filho.

No mesmo sentido, para Nucci (2013, p. 665), estado puerperal é “o estado que envolve a parturiente durante a expulsão da criança do ventre materno. Há profundas alterações psíquicas e físicas, que chegam a transtornar a mãe, deixando-a sem plenas condições de entender o que está fazendo”.

Para Mirabete (2003, p. 842), é:

o período que vai do deslocamento e expulsão da placenta à volta do organismo materno às condições normais, havendo discordância quanto ao seu limite de duração (de 6 ou 8 dias a 6 semanas). Não se trata especificamente de uma perturbação psíquica, mas de eventual diminuição da capacidade de a parturiente determinar-se livremente.

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Nas palavras de Alcântara (Apud MENEGUETTE, 2005, p. 115-116), o estado puerperal “é uma obnubilação mental seguinte ao desprendimento fetal que só se manifesta na parturiente que não recebe assistência, conforto e solidariedade, e é um quadro mais jurídico do que médico, embora haja algumas explicações etiopatogênicas”.

O doutrinador Heleno Cláudio Fragoso (1987, p. 76)leciona sobre a matéria:

O estado puerperal existe sempre, mas nem sempre ocasiona perturbações emocionais na mulher, que a possam levar à morte do próprio filho. O processo do parto, com suas dores, a perda de sangue e o enorme esforço muscular, pode determinar facilmente uma momentânea perturbação de consciência. É esse estado que torna a morte do próprio filho um homicídio privilegiado, nas legislações que adotam o critério fisiológico. É claro que essa perturbação pode ocorrer mais facilmente se tratar de mulher nervosa ou angustiada, ou de filho ilegítimo.

Para Farhat (apud Muakad, 2002, p. 156) “é muito difícil a verificação do estado puerperal; todavia, esse estado seria a emotividade resultante do parto, uma ligeira perturbação psíquica capaz de diminuir a responsabilidade”.

No mesmo sentido é o entendimento jurisprudencial brasileiro acerca da matéria:

Ementa: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO

QUALIFICADO. DESCLASSIFICAÇÃO. PRONÚNCIA. INFANTICÍDIO.

ESTADO PUERPERAL. COMPROVAÇÃO PERICIAL. PROVA

INEQUÍVOCA. RECURSO DESPROVIDO. 1. O estado puerperal caracteriza-se pela alteração psíquica da mulher em decorrência do parto, diminuindo-lhe a capacidade de completo entendimento ou de determinação perante a realidade. 2. O Laudo Pericial, elaborado por psiquiatra forense do Instituto Médico Legal, afirma que as informações constantes nos autos são suficientes para se diagnosticar a presença do estado puerperal na hipótese, sobretudo em razão do contexto da ação, da dinâmica dos fatos e do quadro de estresse reativo, com sintomas depressivos graves, apresentado pela ré após o delito. 3. Ainda que seja possível ao juiz decidir de forma diversa do que consta no laudo pericial, a discordância em relação à conclusão técnica deve estar embasada em razões firmes, o que não se afigura possível na hipótese em apreço, pois não há prova que possibilite conclusão diversa daquela externada pela psiquiatra forense. 4. Após a finalização da primeira fase do procedimento especial do Tribunal do Júri, é lícito ao juiz desclassificar a imputação formulada na denúncia, inclusive para pronunciar o acusado por crime doloso contra a vida diverso do capitulado na inicial acusatória (artigo 418 do Código de Processo Penal). 5. Recurso desprovido. (DISTRITO FEDERAL, 2015).

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No âmbito jurídico, compreendido pelas decisões judiciais, resta pacificado ao menos o entendimento de que o estado puerperal é, de fato, um período em que a mulher, pela alteração psíquica que lhe é causada em decorrência do parto, tem sua capacidade de entendimento acerca da realidade diminuído, podendo, por este motivo, vir a praticar o delito de infanticídio.

Resta reconhecido que a mãe, durante o estado puerperal, pode vir a agir até mesmo em estado transitório de desmoralização psíquica, vindo a eliminar a vida de seu filho, recém-nascido, por temor dos pais, vergonha, receio de desprezo social, entre outros motivos de “honra”. Senão vejamos:

Ementa: INFANTICIDIO. CERTEZA DA EXISTENCIA DO CRIME E INDICIOS SUFICIENTES DA AUTORIA. A CERTEZA DE MORTE VIOLENTA, CAUSADA POR ASFIXIA MECANICA, CONFORME AUTO DE NECROPSIA E DEPOIMENTOS DAS MEDICAS QUE ASSISTIRAM O INFANTE, CONVENCE DA EXISTENCIA DO CRIME. SE A CRIANCA NASCEU COM VIDA, RESPIRANDO E SE ALIMENTANDO NORMALMENTE, ASSIM PERMANECENDO ATE O OUTRO DIA, EM COMPANHIA DA MAE, NA MESMA CAMA, SENDO AI ENCONTRADA PASSANDO MAL, COM SINTOMAS DE ASFIXIA MECANICA QUE A LEVOU A MORTE, TAIS FATOS CONSTITUEM INDICIOS SUFICIENTES DA AUTORIA, PARA O FIM DE SUBMETER A RE A JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JURI. A GRAVIDEZ CLANDESTINA, MANTIDA OCULTA DOS FAMILIARES ATE O DIA DO PARTO, FATOR AGRAVANTE DOS DISTURBIOS FISIO-PSICOLOGICOS DENOMINADOS ESTADO PUERPERAL, E OUTRO INDICIO A APONTAR A RECORRIDA COMO AUTOR A DA MORTE DE SEU FILHO. (RIO GRANDE DO SUL, 1993).

Assim, como verificado, no âmbito do direito, o estado puerperal é entendido como as alterações físicas e psíquicas ocorridas no organismo da mulher, no momento do parto. No entanto, tendo em vista que o estado puerperal causa efeitos psíquicos na mulher, importante também é o estudo acerca do tema no âmbito da saúde, onde pode ser melhor compreendida a matéria.

2.2 O estado puerperal e os transtornos psiquiátricos puerperais no âmbito da saúde

A doutrina médico-legal tradicional não é consensual acerca da definição do estado puerperal, no entanto, tem como fato biológico bem esclarecido que a parturição desencadeia

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uma súbita queda dos níveis hormonais e traz alterações ao sistema nervoso central, promovendo estímulos psíquicos com subsequentes alterações emocionais. (MENEGUETTE, 2005)

Diz-se que ao longo do puerpério, período posterior ao parto caracterizado pela produção de alterações no corpo da mulher, pode esta, ser afetada também por alterações de estado de ânimo, capaz de reduzir ou excluir sua capacidade de compreensão e autodeterminação. Este seria o chamado “estado puerperal”.

Apesar do período de gestação ser, para muitas mulheres, um momento muito esperado que traz satisfação e bem estar, tendo em vista a chegada da maternidade e a felicidade em receber seu filho, o período perinatal não livra a mulher de sofrer transtornos físicos, psíquicos e psicológicos.

Na doutrina médica, é possível encontrar alguns transtornos psiquiátricos pós-parto existentes, quais são a tristeza puerperal, a depressão puerperal e a psicose puerperal. Senão vejamos em que consiste cada uma delas.

Acerca da tristeza puerperal, Demétrio (apud. RONCHI, 2013) entende:

A tristeza pós-parto é quase fisiológica. Dependendo da estatística, de 50% a 80% das mulheres apresentam certa tristeza, certa disforia e irritabilidade que têm início em geral no terceiro dia depois do parto, dura uma semana, dez, quinze dias no máximo, e desaparece espontaneamente.

A tristeza puerperal pode ser considerada a espécie de transtorno psiquiátrico pós-parto mais leve, sendo seus sintomas a “(...) irritabilidade, mudanças bruscas de humor, indisposição, tristeza, insegurança, baixa autoestima, sensação de incapacidade de cuidar do bebê e outros.” (IACONELLI apud. RONCHI, 2013)

Segundo a medicina legal, mulheres com quadro de tristeza puerperal não necessitam de tratamento com medicação, sendo suficiente um suporte emocional adequado, carinho e compreensão da família nos cuidados com o bebê. (SOARES, apud. RONCHI, 2013)

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Já a depressão puerperal ou pós-parto, inicia-se algumas semanas após o parto e deixa a mulher incapacitada para as tarefas do dia-a-dia. Esse transtorno psiquiátrico acomete cerca de 10% a 15% das mulheres e requer tratamento. (DEMÉTRIO, apud. RONCHI, 2013)

Quanto à explicação médica acerca da depressão pós-parto, Demétrio (apud. RONCHI, 2013) leciona:

O pós-parto é um período de deficiência hormonal. Durante a gestação, o organismo da mulher esteve submetido a altas doses de hormônios e tanto o estrógeno quanto a progesterona agem no sistema nervoso central, mexendo com os neurotransmissores que estabelecem a ligação entre os neurônios. De repente, em algumas horas depois do parto, o nível desses hormônios cai vertiginosamente, o que pode ser um fator importante no desencadeamento dos transtornos pós-parto. Mas esse não é o único fator. Todos os sintomas associados ao humor e às emoções são multideterminados, ou seja, não têm uma causa única. Portanto, não é só a deficiência hormonal que está envolvida tanto na tristeza pós-parto, quanto no quadro mais grave que é a depressão pós-parto.

A depressão puerperal é entendida como sendo um quadro mais severo, grave, de transtorno psiquiátrico, sendo imprescindível o acompanhamento médico e psicológico e psiquiátrico para seu tratamento. Dentre os sintomas apresentados estão a irritabilidade, mudanças bruscas de humor, indisposição, doenças psicossomáticas, tristeza profunda, desinteresse pelas atividades do dia-a-dia, sensação de incapacidade de cuidar do bebê e desinteresse por ele, chegando ao extremo de pensamento suicidas e homicidas em relação ao bebê. (IANCONELLI, apud. RONCHI, 2013)

A psicose puerperal é um quadro raro, iniciando durante a primeira semana depois do parto, quando a mulher passa a perder o contato com a realidade e começa a acreditar em coisas que não existem, ouvir vozes, ter a sensação de incorporações com entidades, delírios e crenças irracionais. Esta doença é gravíssima e bem distinta da depressão que começa várias semanas depois do parto e evolui gradativamente. (DEMÉTRIO apud. RONCHI, 2013)

Destaca-se que no transtorno psiquiátrico classificado como psicose puerperal é maior o risco de incidência do infanticídio, tendo em vista que a mulher, acometida por delírios e capacidade mental abalada, pode vir a matar seu próprio filho.

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Convém salientar que nestes casos, a real perturbação da saúde mental da mulher acarreta na redução de sua capacidade penal, sendo uma das espécies de semi-imputabilidade, conforme previsto no § único do art. 26 do Código Penal.

Importante mencionar que é de extrema importância a realização de perícia médico-legal a fim de verificar e comprovar que a mulher, ao tirar a vida de seu filho, realmente se encontrava sob os efeitos do estado puerperal, para que então se configure o crime de infanticídio e não o crime de homicídio.

Leciona Gomes (2004, p. 508), acerca do exame da puérpera:

O exame da mulher suspeita de ter praticado infanticídio deverá elucidar sobre a ocorrência de parto, e se recente ou não. O parecer psiquiátrico se impõe, como exame subsidiário, a fim de se pesquisar doenças ou distúrbios mentais preexistentes, agravados pela gestação, parto ou puerpério.

No entanto, a prova do estado puerperal é de extrema dificuldade para o perito, vez que os exames da puérpera são realizados tardiamente em relação ao crime, muitas vezes não restando vestígios que possam ser detectados. Pode-se dizer que é quase impossível a afirmação pelo perito, com a absoluta certeza de que o crime realmente ocorreu sob a influência do estado puerperal, a não ser que o exame tenha sido realizado imediatamente após o ato. (GOMES, 2004)

2.3. Estado puerperal e responsabilidade penal no delito de infanticídio

Cumpre-se destacar que o elemento normativo “influência do estado puerperal” determina a responsabilidade do agente para que seja penalizado como incurso no crime de infanticídio. Conforme já mencionado, se a mãe pratica o delito no período puerperal, porém, não se encontra influenciada pelas alterações psíquicas decorrentes do estado puerperal, a mesma será punida penalmente pelo crime de homicídio, vez que nesta hipótese, falta-lhe o elemento normativo que individualiza e especifica o delito de infanticídio.

Nesse contexto, resta claro que a prova de que a mãe praticou o crime influenciada pelo estado puerperal é o que determina sua responsabilidade penal no delito de infanticídio.

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Somente o fato de a mãe encontrar-se no período puerperal, ou seja, durante ou logo após o parto, não significa que a mesma esteja sofrendo os transtornos psíquicos causados pelo estado puerperal, até porque, em regra, na maioria das mulheres o parto não traz tais alterações.

A partir disso, entende Fernando Capez (2014, p. 139):

Haverá, consoante disposição legal, o estado puerperal, durante o parto ou logo após; contudo nem sempre o fenômeno do parto produz transtornos psíquicos na mulher, de forma que não é uma regra a relação causal entre ambos. Por vezes, a mulher mata o próprio filho nesse período de tempo sem que tenha qualquer deficiência psíquica produzida pelo puerpério, o que pode no caso configurar não o privilegium legal, mas o delito de homicídio, caracterizado pela frieza e perversidade. Assim, o tão só fato de a genitora estar no período de parto ou logo após não gera uma presunção legal absoluta de que ela esteja sofrendo de transtornos psíquicos gerados pelo estado puerperal, pois, via de regra, o parto não gera tais desequilíbrios. É necessário sempre avaliar no caso concreto, através dos peritos-médicos, se o puerpério acarretou o desequilíbrio psíquico, de modo a diminuir a capacidade de entendimento e autoinibição da parturiente.

Convém mencionar que apesar de não ser frequente entre as mulheres, em alguns casos o estado puerperal pode se revelar grave, ou seja, há possibilidade que o parto provoque transtornos psíquicos na mãe capazes de suprimir inteiramente sua capacidade de determinação e compreensão de sua conduta. Nesta hipótese, é possível que a mãe seja considerada inimputável, de acordo com o art. 26, caput, do Código Penal, que dispõe que

é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento restando isenta de pena.

No caso de a mãe perder parcialmente sua capacidade de autodeterminação e compreensão de suas atitudes, é possível a incidência do parágrafo único do art. 26 do Código Penal, que dispõe que

a pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

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No entanto, se comprovado que a mãe praticou o fato delitivo apenas influenciada por alterações e desequilíbrios psíquicos, sem que estes lhe tenham tirado a capacidade de entendimento de sua conduta ilícita, esta responderá pelo delito de infanticídio sem atenuação de pena, podendo ser fixada entre dois e seis anos de detenção, conforme prevê o art. 123 do Código Penal.

Assim, tem-se a especialidade do delito de infanticídio, que traz peculiaridades próprias, sem as quais se acarreta sua desclassificação para outro crime, de homicídio, por exemplo.

Portanto, verificadas as características próprias do delito de infanticídio, como o elemento normativo “estado puerperal”, resta clara a distinção entre este e os demais crimes possíveis contra a vida do infante, de modo a facilitar o enquadramento do agente delitivo como incurso no crime de infanticídio.

2.3.1 As categorias estruturais do delito: tipicidade, ilicitude e culpabilidade

Inicialmente, cumpre-se lembrar que a tipicidade nada mais é do que o enquadramento da conduta do agente delituoso ao tipo penal, previsto no Código Penal Brasileiro. Este enquadramento é feito considerando os aspectos objetivos (elementos objetivos) e também subjetivos do delito, que no caso do infanticídio é o dolo.

No delito infanticídio, temos a tipicidade quando o agente, ou seja, a mãe, durante ou logo após o parto, envolvida pelo estado puerperal, entendido como alterações físicas, psíquicas e psicológicas decorrentes do parto, tira dolosamente a vida de seus próprios filhos, nascentes ou recém-nascidos.

Destaca-se que a tipicidade se encontra na conduta da mãe/gestante, que envolvida por sentimentos variados causados pelo estado puerperal, acaba por matar seu filho nascente ou recém nascido. Ou seja, é a concretização, pela conduta da agente, do fato abstratamente descrito como criminoso no Código Penal Brasileiro.

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Ora, constatada a tipicidade do delito, presume-se a conduta do agente ilícita, tendo em vista que todos os tipos penais previstos na legislação penal são considerados ilícitos, até que se verifique motivo que afaste a ilicitude da conduta.

Gonçalves (2011, p. 387) leciona que “Cuida-se a antijuridicidade ou ilicitude da contrariedade do fato com o ordenamento jurídico (....) por meio da exposição a perigo de dano ou da lesão a um bem jurídico tutelado”.

Ainda, segundo o entendimento de Nucci (2009, p. 240), ilicitude é:

a contrariedade de uma conduta com o direito, causando efetiva lesão a um bem jurídico protegido. Trata-se de um prisma que leva em consideração o aspecto formal da antijuridicidade (contrariedade da conduta com o Direito), bem como o seu lado material (causando lesão a um bem jurídico tutelado).

Conforme dispõe o art. 23 do Código Penal, são considerados exclusos de ilicitude os crimes praticados pelo agente quando se encontra em estado de necessidade, quando age em legítima defesa ou quando age em estrito cumprimento do dever legal ou no exercício regular de direito.

Dito isto, resta evidente que o crime de infanticídio dificilmente se configurará em hipótese de exclusão de ilicitude.

Acerca da culpabilidade, Nucci (2009, p. 283) leciona:

Trata-se de um juízo de reprovação social, incidente sobre o fato e seu autor, devendo o agente ser imputável, atuar com consciência potencial de ilicitude, bem como ter a possibilidade e a exigibilidade de atuar de outro modo, seguindo as regras impostas pelo Direito.

No entanto, cumpre-se lembrar que o estado puerperal pode levar a mulher a perder inteiramente a capacidade de entendimento de sua própria conduta, e, desta forma, segundo entendimento doutrinário majoritário, é possível aplicar-se ao caso o art. 26 do Código Penal, que trata da inimputabilidade penal do agente, em conjunto com o art. 123 do Código Penal, tendo em vista a exclusão da culpabilidade. Cumpre-se lembrar as possíveis causas que excluem a culpabilidade do agente delituoso, quais sejam a doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, a menoridade, e a embriaguez completa

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proveniente de caso fortuito ou força maior, conforme se pode verificar no Código Penal Brasileiro. (DECRETO-LEI N. 2.848, 1940)

Entende Capez (2011, p. 333), acerca da doença mental, como sendo “a perturbação mental ou psíquica de qualquer ordem, capaz de eliminar ou afetar a capacidade de entender o caráter criminoso do fato ou a de comandar a vontade de acordo com esse entendimento”.

Assim como a doença mental, o desenvolvimento mental incompleto ou retardado também pode gerar inimputabilidade penal. Isso ocorrerá sempre que o agente, por força da perda da capacidade cognitiva ou volitiva (Capez, 2011), não conseguir compreender o caráter ilícito do fato ou determinar-se de acordo com este entendimento. Nos casos de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado que gerem inimputabilidade ficarão os agentes de delitos sujeitos a medidas de segurança previstas na legislação penal. Embora não sejam culpáveis, face à periculosidade, poderão ser submetidos a tratamento curativo.

Sobre a embriaguez proveniente de caso fortuito ou força maior, também chamada na doutrina por embriaguez acidental, Capez (2011, p. 341) leciona:

Caso fortuito: é toda ocorrência episódica, ocasional, rara, de difícil verificação, como o clássico exemplo fornecido pela doutrina, de alguém que tropeça e cai de cabeça em um tonel de vinho, embriagando-se. É também o caso de alguém que ingere bebida na ignorância de que tem conteúdo alcoólico ou dos efeitos psicotrópicos que provoca. É ainda o caso do agente que, após tomar antibiótico para tratamento de uma gripe, consome álcool sem saber que isso o fará perder completamente o poder de compreensão. Nessas hipóteses, o sujeito não se embriagou porque quis, nem porque agiu com culpa. Força maior: deriva de uma força externa ao agente, que o obriga a consumir a droga. É o caso do sujeito obrigado a ingerir álcool por coação física ou moral irresistível, perdendo, em seguida, o controle sobre suas ações.

Deste modo, tem-se que o agente que pratica qualquer crime previsto no texto legal penal sob as condições acima apresentadas é isento de pena, tendo em vista que não tem capacidade de compreender no momento da ação ou omissão, que sua conduta é ilícita.

2.3.2 A culpabilidade e a pena – critérios de determinação e de aferição do grau de responsabilidade penal

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A culpabilidade é um instituto polemico no âmbito penal, vez que não se tem um conceito pronto, formado, acerca do que seria tal instituto. Salienta-se que o senso comum pensa a culpabilidade como sendo um juízo de valor, uma noção de censura pessoal, ou seja, se o agente poderia e deveria ter agido diferente, mas optou por cometer ato típico e ilícito, mesmo que sem intenção, considerar-se-á, este, “culpável”.

Leciona Nucci (2009, p. 286-287):

A culpabilidade, pois, deve ser um juízo de censura voltado ao fato cometido por imputável, que tem consciência potencial da ilicitude e, dentro do seu livre-arbítrio (critério da realidade), perfeitamente verificável, opte pelo caminho do injusto sem qualquer razão plausível a tanto.

Para Capez (2011, p. 323), culpabilidade tem a seguinte definição:

quando se diz que “Fulano” foi o grande culpado pelo fracasso de sua equipe ou de sua empresa, está atribuindo-lhe um conceito negativo de reprovação. A culpabilidade é exatamente isso, ou seja, a possibilidade de se considerar alguém culpado pela prática de uma infração penal. Por essa razão, costuma ser definida como juízo de censurabilidade e reprovação exercido sobre alguém que praticou um fato típico e ilícito. Não se trata de elemento do crime, mas pressuposto para a imposição de pena, porque, sendo um juízo de valor sobre o autor de uma infração penal, não se concebe possa, ao mesmo tempo, estar dentro do crime, como seu elemento, e fora, como juízo externo de valor do agente.

Cumpre-se destacar que, apesar do Código Penal Brasileiro não conter um conceito à palavra culpabilidade, esta se encontra expressa em diversos artigos do texto legal, sendo considerada doutrinariamente como fundamento e como medida para a pena.

A culpabilidade como fundamento da pena tange à possibilidade ou não da penalização do agente que pratica um fato típico e ilícito, ou seja, proibido na lei penal, exigindo-se para tanto a presença de alguns requisitos como, capacidade de culpabilidade, consciência da ilicitude e exigibilidade de outra conduta, de modo que, ausentes qualquer destes elementos, resta impedida a aplicação de uma sanção penal. (GONÇALVES, 2011)

Nesse sentido leciona Nucci (2009, p. 287) acerca da culpabilidade como fundamento para a pena:

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Note-se, pois, que culpabilidade é fundamento e limite da pena, integrativa do conceito de crime e não mero presuposto da pena, como se estivesse fora da conceituação. Pressuposto é fato ou circunstancia considerado antecedente necessário de outro, mas não, obrigatoriamente, elemento integrante. Considerar a culpabilidade como pressuposto da pena é retirar o seu caráter de fundamento da pena, pois fundamento é base, razão sobre a qual se ergue uma concepção, ou seja, é verdadeiro motivo de existência de algo. Logo, a culpabilidade, se presente, fornece a razão de aplicação da pena e o crime nada mais é do que o fato típico e antijurídico, merecedor de punição, tendo em vista que o tipo incriminador é formado – e isto é inegável – pela descrição de uma conduta, seguida de uma pena (ex.: “matar alguém: pena – reclusão, de seis a vinte anos”, constituindo o homicídio). Portanto, torna-se incabível, em nosso ver, desmembrar a pena da conduta, acreditando que uma subsista sem a outra, no universo dos tipos penais incriminadores, ou seja, no contexto do crime. Um fato típico e antijurídico, ausente a culpabilidade, não é uma infração penal, podendo constituir-se um ilícito de outra natureza. Sem a reprovação da conduta, deixa de nascer o crime.

Em outras palavras, pode-se dizer que para que o agente delituoso seja considerado “culpável”, deve o mesmo ser imputável, ter consciência da ilicitude do ato que está a praticar, bem como optar por agir de tal forma, mesmo que possível ou exigível que aja de outro modo.

Nesse sentido, leciona Jesus (2002, p. 122) que “imputabilidade penal é o conjunto de condições pessoais que dão ao agente capacidade para lhe ser juridicamente imputada a pratica de um fato punível”.

Entende-se por imputável o agente capaz ou apto para ser culpável, considerando-se assim o agente que ao tempo de sua conduta possui discernimento suficiente para compreender o caráter ilícito desta. Nas palavras de Jesus (2002, p. 122), imputável “é o sujeito mentalmente são e desenvolvido, capaz de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento”.

Além da imputabilidade, para a configuração da culpabilidade deve estar presente ao caso a consciência do agente acerca da ilicitude da conduta, sendo esta entendida como a capacidade do sujeito de conhecer e avaliar a ilicitude de seu ato ao tempo em que o pratica.

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Para que seja considerado inimputável não basta que o agente seja portador de “doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado”. É necessário que, em consequência desses estados, seja “inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”.

No que tange à exigibilidade de conduta diversa, é necessário que o agente delituoso ao tempo de sua ação ou omissão, tenha possibilidade ou dever de agir de outro modo, mas por vontade própria, deixa de fazê-lo.

Nas palavras de Capez (2011, p. 352) tal elemento da culpabilidade “consiste na expectativa social de um comportamento diferente daquele que foi adotado pelo agente. Somente haverá exigibilidade de conduta diversa quando a coletividade podia esperar do sujeito que tivesse atuado de outra forma”.

Destaca-se que, caso ausentes tais requisitos no caso concreto, sendo o agente incapaz de entender a ilicitude de sua conduta, seja por doença mental, desenvolvimento mental incompleto ou retardado, ou ainda, em virtude de perturbação de saúde mental, exclui-se a culpabilidade, sendo considerado, este, inimputável ou semi-imputável, nos termos do art. 26 e § único do Código Penal.

Assim dispõe o art. 26 caput, e § único do Código Penal:

é isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento restando isenta de pena.

§ único - a pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Além de fundamentar a aplicação da pena, a culpabilidade também representa um critério de medida para a pena. Deste modo, é imprescindível a analise da culpabilidade para a determinação da quantidade de pena aplicável ao agente, vez que esta interfere diretamente na fixação da sanção penal visando submeter o agente delituoso à pena mais consentânea com sua conduta, promovendo-se o equilíbrio entre a reprovação penal e o ato delituoso. (CASTRO, 2013)

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Luiz Flávio Gomes e Antonio García-Pablos de Molina (apud. CASTRO, 2013, p. 570) dispõem:

A palavra culpabilidade, contida no CP, art. 59, expressa a posição do agente frente ao bem jurídico violado. Essa posição do agente pode ser: a) de total menosprezo (que deriva do dolo direto de primeiro grau); b) de indiferença (decorre do dolo direto de segundo grau ou dolo eventual) e c) de descuido (emana do crime culposo). As duas primeiras retratam o que a doutrina ou teoria complexa da culpabilidade chama de “culpabilidade dolosa”; a terceira espelha a “culpabilidade culposa”.

Somente assim será possível a correta aplicação da pena ao agente delituoso, sendo ele submetido a cumprir sanção penal ou não de acordo com seu grau de culpabilidade ou inimputabilidade.

2.3.3 A influencia do estado puerperal na determinação da culpabilidade e da responsabilidade penal no delito de infanticídio

Em síntese, pode-se dizer que se as alterações do estado puerperal influenciam a condição emocional ou agravam uma doença mental já pré-existente, ou se, somente pelo próprio estado puerperal a mulher perde completamente sua capacidade de entendimento de seus atos em vista das perturbações psíquicas causadas por este, a mãe que pratica o crime de infanticídio poderá ser considerada inimputável ou semi-imputável, tendo em vista a exclusão da culpabilidade, conforme dispõe respectivamente o art. 26 e § único do Código Penal.

Cumpre-se destacar que o elemento caracterizador, o qual determina o crime de infanticídio, chamado “estado puerperal”, conforme já verificado pode trazer alterações/transtornos psíquicos à mulher, os quais podem ocorrer de maneira grave, sendo, por exemplo, causados pela psicose puerperal.

A psicose puerperal é considerada uma doença mental, sendo possível que esta afete a capacidade de discernimento da mulher. Portanto, se a psicose é reconhecida no campo psiquiátrico como doença mental, e, o campo jurídico traz que é inimputável aquele que no momento do ato está acometido desta moléstia, restando incapaz de discernir o caráter ilícito de sua conduta, a psicose puerperal poderia ser a causa excludente da culpabilidade da mãe, restando esta, inimputável. (RONCHI, 2013)

Referências

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