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Osvaldo Por Ele Mesmo: Uma Crônica

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Academic year: 2021

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OSWALDO POR ELE MESMO: UMA CRÔNICA

Nasci no dia 15 de outubro de 1904. Meus pais, Adolpho Magalhães e Francisca Diniz Magalhães, junto à minha avó materna, Emília, moravam em casa espaçosa na rua Lins de Vasconcelos 361, no Méier. Mamãe foi a minha primeira professora. Era exigente em suas funções de mãe e mestra. Desde cedo nos mostrou o valor da disciplina e do

cumprimento dos deveres escolares. Éramos 4 irmãos: Cantídio, o mais

velho, eu, Oscar e Niralda, que nasceu muito depois, por isso não alcançou as traquinagens dos seus irmãos. Nossa casa tinha jardim e grande terreno com árvores frutíferas, onde corríamos e brincávamos. Meus pais e vovó eram religiosos. Num canto apropriado da sala,

mantinham pequeno oratório iluminado suavemente, à lamparina, aos pés 2 1

de um crucifixo e outras imagens sobre uma alva toalha de croché feita por mamãe. Até hoje, nas minhas meditações, evoco orações que nos ensinaram carinhosamente.

Gostávamos de ficar na grade do jardim aguardando a chegada do papai no bonde, à tardinha. Papai trazia freqüentemente uma surpresa

para nós. Quando o bonde aparecia na esquina da Rua Cabuçu, nós

repetíamos a frase: "Papai vem nesse bonde!" As quartas feiras, nossa

ansiedade era maior. Ele nos trazia, sem falhar, o querido Tico-Tico,

a revista infantil que adorávamos. Nosso irmão Oscar aprendeu a ler em pouco tempo, com mamãe, para poder lê-la também.

Na infância, uma das minhas brincadeiras prediletas era soltar papagaio. Era fácil comprar papel fino colorido e alguns novelos de

linha crua, forte e leve. As flexas menores eram encontradas na quitanda. Quem comprava, pagava e ainda fazia lindos papagaios era

mamãe. Eu era exigente: "Mamãe, o papagaio tem que ser grande, com um

metro de altura e com bandeirinhas nos "chifres". Meu irmão Oscar era

o ajudante, e o Cantídio dava palpites. Às vezes, era difícil arranjar

pano vermelho para fazer as tiras e formar o rabo do papagaio. Quando o vento era favorável, ele ia para bem alto e cada um segurava um pouco, até mamãe! Outra participação da mamãe nos nossos folguedos era

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para eu ver, fico esperando!" Voltei rapidamente como se tivesse numa

autêntica corrida. Nunca mais aquele guarda me viu. Parece que ainda sinto meu primeiro "sufoco..." Felizmente o trânsito, naqueles bons

tempos, era muito camarada.

Lembro-me, com saudade, do "Seu Jucá" encarregado de acender os lampiões de gás ao longo de nossa rua, com uma vara tendo na ponta uma

chama.,

À

tardinha,

diariamente,

um

sorveteiro,

apregoando

sua

mercadoria com voz forte e afinada, repetidamente ia cantando:

"Sorvete Iaiá é de coco e tem baunilha Sinhá!" Era uma festa! Cada um trazia seu copo torcendo para que ele enchesse bem. 0 preço variava de acordo com o tamanho do copo.

Muito comum, na época, os carros de boi, que nos entristeciam quando passavam. Percebíamos que os animais usavam toda a sua força para vencer a subida da rua.

0 carnaval de rua era animadíssimo. Três Sociedades

Carnavalescas se encarregavam de alegrar a multidão: Zeníamos (vermelho e branco), os Democráticos (preto e branco) e os Tenentes (vermelho e preto). Com seus carros alegóricos, muitos fogos, cartazes coloridos, iluminação festiva, serpentinas, confetes e mocinhas fantasiadas jogando beijinhos para todo o mundo, faziam o percurso da Avenida Rio Branco lotada de foliões. As batalhas de confete animavam

muitos bairros do Rio e atraíam os carnavalescos com suas fantasias, algumas muito engraçadas, tocando tambores e cometas. 0 Méier era um dos pontos preferidos pelos foliões e tinha seu carnaval próprio: muitos blocos cantando e tocando, fazendo uma grande barulhada. Papai costumava alugar uma sala no Ia andar de um prédio, de onde nós e uns amigos acompanhávamos toda a agitação. Ainda pequeno, ganhei uma fantasia de "Diabinho" toda vermelha, que tinha até rabo! A princípio não gostei de jeito nenhum mas depois, com as risadas que provocava, acabei apreciando o traje.

Gostávamos muito de ir ao Cine Mascote, no Méier, com vovó, que não esquecia o saquinho de balas.

Cursei a Escola Pública, na Rua Hermengarda, onde ingressei já alfabetizado. Mais tarde, entrei para a Escola Americana (professores

brasileiros). Meu irmão Oscar e eu estivemos internos por um periodo

no Colégio Silvino Leite, onde cedinho, praticávamos ginástica e jogos recreativos ao ar livre. Era um privilégio dos internos. no ginásio, estava no Instituto La Fayette. Fui escolhido pelo Diretor para ocupar o posto de "Sargento", aluno do Corpo dos Ciclistas do

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Instituto, que mantinha disciplina durante o desfile do batalhão militar dos alunos pelas ruas do bairro, comum na época.

Em 1917, aproximadamente, moramos na rua Campos Sales, em frente ao América Futebol Clube. Influenciado pela intensa atividade esportiva que presenciava no clube, pedi a papai para fazer parte do Departamento Infantil e poder, assim, aprender a jogar futebol e também freqüentar outros programas do clube. Meu uniforme, camisa vermelha com emblema bordado, calção branco e chuteiras, me deixava radiante e feliz. Em poucos dias, já conhecia meus companheiros e comecei a jogar na defesa aprendendo a driblar, passar a bola e chutar forte para a frente. Acompanhava as partidas do le time dos adultos e, em pouco tempo, já conhecia os nomes de toda a equipe. Vou tentar

recordar aqueles campeões: Álvaro, Paulino, De Paiva, Ademar, Witte,

Paula Ramos, Oscar, Gabriel, Lindinho, Nelson, só não me lembro o nome

de um deles.

Naquele tempo, a Educação Física ainda não tinha a eficiência técnica desejada. Eram poucos os professores preparados, e as atividades físicas não tinham o controle necessário. Com o passar dos anos, a Educação Física no Brasil alcançou nível técnico e pedagógico, 2 4 asseguarando ao nosso povo todos os meios de melhorar a saúde e

aumentar a sua capacidade de trabalho.

Em 1921, pretendia ingressar na Escola Militar, na época, situada em Realengo. Pouco tempo depois, porém, numa viagem de bonde, vi um cartaz colorido da Associação Cristã de Moços anunciando as atividades do seu Departamento de Educação Física: aulas de ginástica, de aparelhos, voleibol, basquete e outras práticas. Interessei-me e guardei o endereço: Rua da Quitanda n9 47. No dia seguinte, fui conhecer a sede da Associação e gostei de tudo que vi: desde a entrada até o segundo andar, onde funcionava o Departamento de Educação Física.

Sargento do Batalhão Militar do corpo de ciclistas

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Quando entrei no Departamento, fui recebido pelo Diretor Henry

Sims, risonho e acolhedor, que me levou para assistir a uma das aulas

de ginástica com música, que ia começar. Foi a primeira vez que vi

ginástica acompanhada ao piano. Todos sorridentes, muita disciplina,

exercícios

agradáveis. Fiquei entusiasmado! Quando me despedi do

Diretor, dei-lhe os parabéns pela perfeita execução da classe e lhe

disse: "Vou agora à secretaria, para assinar a minha proposta de sócio

da A.

C.

M."

Após aprovação do meu exame físico-antropométrico,

realizado pelo Diretor, recebi permissão para freqüentar as aulas.

Dias depois, fui convidado a conhecer o Corpo de Monitores, grupo de

alunos selecionados e preparados, capazes de ajudar os Professores das

diversas classes do Departamento de Educação Física. Essa colaboração

era gratuita e voluntária. 0 Professor Sims convidou-me para pertencer

ao Corpo de Monitores e, aceitando, fui conhecer os componentes desta

turma especial. Comecei como monitor, numa classe de jovens, de grande

freqüência. Tempos depois, tive ótima oportunidade: 0 Diretor

ofereceu-me o cargo de funcionário do escritório além da função de

monitor. Em poucos dias, já desempenhava devidamente minhas novas funções. Nos momentos oportunos, conversava com o Professor Sims sobre

os objetivos da Educação Física. Foram esses interessantes e repetidos

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diálogos que me fizeram mudar os planos da carreira militar pela forte

determinação de ingressar no Instituto Técnico das Associações Cristãs

de Moços Sul-Americanos. 0 Professor Sims empregava, com freqüência,

uma frase valiosa, que ainda guardo na memória: "A Educação Física é

necessária e benéfica em qualquer parte."

0 curso de Educação Física do Instituto Técnico, de nível universitário, era de 4 anos, sendo os dois primeiros realizados no

Rio e os 3a e 4a anos em Montevidéu, inclusive os cursos de verão realizados em Piriápolis, balneário situado ao norte de Montevidéu. Fui aprovado no exame de admissão. Iniciei o curso no Rio em 1924 e

terminei o 4a ano no Uruguai, em dezembro de 1927. Meu diploma, por

ser estrangeiro, foi oficialmente reconhecido pela Escola de Educação

Física do Exército após estágio em 1933.

Saudoso e grato, guardo ternamente, no coração, a inesquecível

Associação Cristã de Moços da Rua da Quitanda 47, onde conheci a

Sylvia e encontrei o meu caminho.

Em 1928, prestei o Serviço Militar no 2a Regimento de Artilharia

Montada,

na Vila

Militar,

onde colaborei

no programa

de

Educação

Física e no Forte do Vigia,

no Leme. No mesmo ano Sylvia e eu nos

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CAPITULO II A TRAJETÓRIA

Referências

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