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O papel dos professores das séries iniciais na mediação das emoções expressas por seus alunos em sala de aula

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Academic year: 2021

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O PAPEL DOS PROFESSORES DAS SÉRIES INICIAIS NA MEDIAÇÃO DAS

EMOÇÕES EXPRESSAS POR SEUS ALUNOS EM SALA DE AULA1

Karine Aparecida Silva2 Karina Comelli Alberton3

Resumo: Ao ingressar no contexto escolar, os alunos não deixam em casa suas emoções e

sentimentos, pelo contrário, eles expressam esse fenômeno em sala de aula. Assim, este artigo teve por objetivo investigar como os professores das séries iniciais mediam as emoções expressas por seus alunos em sala de aula: se eles sentem dificuldades, quais as estratégias utilizadas pelos professores e se estes acreditam ser importante mediar as emoções. Para alcançar tais indagações utilizou-se como metodologia a pesquisa de campo de caráter qualitativo, com aplicação de entrevista semiestruturada com três professores das séries iniciais. Os resultados obtidos mostram que, quando os professores reconhecem que o contexto escolar é um local de saberes que ultrapassam os cognitivos, entendem que a educação transforma a sociedade, pois o que é apreendido naquele espaço auxilia no desenvolvimento integral dos indivíduos que ali se encontram.

Palavras-chave: Emoção no contexto escolar. Mediação das emoções.

1 INTRODUÇÃO

O contexto escolar é um rico espaço de encontro de conhecimentos que colaboram no desenvolvimento integral dos sujeitos que ali se inserem (SILVA, 2002).

Embora se esteja em pleno século XXI, essa visão que abrange a totalidade humana ainda é um dos aspectos a serem compreendidos pelo contexto escolar. Necessita-se ampliar o conhecimento acerca do aspecto emocional nas relações que esse ambiente apresenta, pois, ao ingressar nesse contexto, os alunos não deixaram em casa suas emoções e sentimentos, e saber compreendê-los ajuda-os a conviver com os conflitos recorrentes nesse espaço e fora dele (SILVA, 2002).

Segundo Silva (2002), por mais que os professores não tenham conhecimento teórico suficiente sobre como trabalhar com os aspectos emocionais de seus alunos, precisam arriscar em sua prática cotidiana, usando os conhecimentos baseados em suas experiências.

Porém, para que as mediações sejam eficazes, é preciso ampliar o conhecimento

1 Artigo apresentado como trabalho de conclusão de curso de graduação em Psicologia da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do título de Psicólogo (a).

2 Acadêmica Karine Aparecida Silva do curso de Psicologia da Universidade do Sul de Santa Catarina. E-mail: karinedsilva@hotmail.com

3 Professa orientadora Karina Comelli Alberton, Especialista em dependência química (UNIFESP) e terapia cognitiva comportamental (ICTC). E-mail: karinaalberton@hotmail.com

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da atmosfera emocional, não basta apenas mediar as emoções, é preciso que na sua formação os professores tenham contato com o conhecimento sobre o conceito do que é uma emoção, como é seu funcionamento, quais as maneiras de expressá-la (ALMEIDA, 1999).

Dessa forma, seria benéfico que as escolas incluíssem em seu currículo métodos científicos sobre como trabalhar as emoções, tendo como objetivo ampliar o fenômeno emocional na escola, pois é comum encontrar pesquisas que dão ênfase apenas aos aspectos emocionais e afetivos relacionados ao processo de ensino-aprendizagem e às formas de manifestação das mesmas, porém, nenhum estudo indicando como os professores estão mediando as emoções advindas de seus alunos.

Ao expressar uma emoção, a criança estará trazendo vivências muito particulares de sua vida, assim, é um território delicado, sendo importante desenvolver nas crianças, por meio de um olhar sensível e empático, a compreensão do que se passa no seu interior, pois se a criança sentir-se segura, poderá ter maior facilidade para expressar suas emoções e se tornar consciente para não agir por impulso (CAMINHA, 2014).

Nesse sentido, este estudo pretende contribuir futuramente com o contexto escolar, para que os professores percebam que as emoções que seus alunos expressam são como pontes, que auxiliam na compreensão de suas atitudes. Saber reconhecê-las e mediá-las é primordial para que a nova geração venha a se desenvolver emocionalmente saudável para lidar com os conflitos que vivenciarão fora dos muros escolares.

Assim, o objetivo geral desta pesquisa é investigar como os professores das séries iniciais mediam as emoções que são expressas por seus alunos em sala de aula. Para alcançar tal objetivo, foram elencados três objetivos específicos, a saber: identificar o conhecimento dos professores acerca da importância das emoções no contexto escolar; identificar quais estratégias os professores utilizam no momento da mediação das emoções; e averiguar quais as dificuldades que os professores encontram na mediação das emoções com seus alunos.

1.1 EMOÇÃO

As emoções são inerentes à espécie humana, “[...] sem exceção, homens e mulheres de todas as idades, culturas, níveis de instrução e econômicos, têm emoções” (DAMÁSIO, 1996, p. 72). Suas expressões são sempre acompanhadas de alterações orgânicas. Assim, ao se emocionar, a pessoa pode sentir seu coração batendo com mais intensidade, o ritmo de sua respiração mudar, ter dificuldades em digerir os alimentos, sentir secura na boca, essas sensações são sentidas pelo sujeito e somente ele observa essas reações

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em si mesmo. Porém, outras podem ser visíveis e o indivíduo, por meio delas, pode comunicar ao seu contexto o que está sentindo, com isso, podem ser percebidas alterações na mímica da face, em sua postura e na forma como são executados seus gestos (GALVÃO, 1995).

As emoções são diferentes em cada fase da vida, sendo estruturadas da seguinte forma: emoções primárias e secundárias. As primárias são experienciadas na infância e marcadas pela demonstração de alegria, tristeza, medo, raiva e nojo. Mesmo sendo as emoções primárias mais básicas, elas são cruciais para o desenvolvimento saudável das emoções na fase adulta. Isso é importante, pois as primeiras impressões do indivíduo são armazenadas em uma estrutura no seu cérebro que, ao serem invocadas, associam o conhecimento adquirido na fase anterior sobre a situação experienciada e elaboram reações corporais sobre o mesmo, ou seja, elaboram suas emoções (DAMÁSIO, 1996). Já na fase adulta, as emoções são nomeadas de secundárias (embaraço, ciúme, culpa orgulho), e as emoções de fundo (bem-estar ou mal-estar, calma e tensão) (DAMÁSIO, 1996).

Em relação às primeiras expressões emocionais, Werebe e Nadel-Brulfert (1986) referem que Wallon dizia que, por mais que a criança utilize a emoção para interagir com o seu meio e comunicar suas necessidades, dependerá do outro para resolver tais necessidades, e a emoção ainda não poderá ser nomeada como uma linguagem. Seu interesse nesse processo é apenas de conhecimento, ou seja, ela age instintivamente e as emoções que são expressas têm a função de eliminar o que ainda não conseguem dar significado. “Um exemplo seria o sorriso do bebê, que no início é puramente fisiológico” (GALVÃO, 1995, p. 61).

Com o tempo a criança inicia seu processo de associar suas reações às respostas que o meio fornece em atendimento às suas necessidades, surgindo assim “[...] o início da vida psíquica, [...] na qual vão se formando as primeiras imagens mentais e nas quais se imprimirão as primeiras marcas de sua individualidade” (DUARTE; GULASSA, 2000).

Em cada fase da vida as emoções são experienciadas de formas variadas e com intensidades distintas. Isso acontece em função das particularidades dos indivíduos, não se pode dizer que os gatilhos que desencadeiam as emoções são os mesmos para cada pessoa (EKMAN, 2011). Desta forma, “algumas pessoas apresentam uma resposta de raiva muito intensa, enquanto outras sentem raiva moderada ou suave (e não é porque a estão controlando)” (EKMAN, 2011, p. 240). O modo como os sujeitos experienciam e comunicam seus estados emocionais ao meio é determinado por seu perfil emocional (EKMAN, 2011).

Nesse sentido, “[...] os adultos não podem interpretar as emoções das crianças baseadas em si mesmos, em suas emoções, [..] a mesma emoção pode indicar sentimentos

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diversos” (BECHENCK; SCHNEIDER, 2004, p. 24). Ou, como explica Galvão (1995, p. 59), “[...] no adulto as emoções aparecem reduzidas, pois são subordinadas ao controle das funções psíquicas superiores”. Ou seja, a criança vivencia suas primeiras emoções de forma intensa, espontânea, sendo comum transitar de uma emoção para outra (BECHENCK; SCHNEIDER, 2004).

O papel do adulto nesse momento é mostrar à criança que suas emoções são importantes e que expressá-las é primordial para entendê-las e controlá-las (BECHENCK; SCHNEIDER, 2004).

As emoções infantis, quando não são compreendidas pelo seu contexto, podem gerar futuros problemas emocionais, como é o caso da autoestima. A criança precisa de algo a mais, necessita ser valorizada emocionalmente, pois, para que seu desenvolvimento aconteça de forma saudável, não dependerá apenas dos cuidados que os adultos acreditam ser essenciais a elas, como obter uma boa alimentação, ter conforto (BECHENCK; SCHNEIDER, 2004).

Por fim, emocionar-se faz parte do processo de sobrevivência humana. No início da vida, o indivíduo utiliza-se de reações corporais para suprir a falta da cognição que ainda está em processo de desenvolvimento(DUARTE; GULASSA, 2000).

1.2 AS EMOÇÕES NO CONTEXTO ESCOLAR

Com o início de sua vida escolar é comum a criança ampliar suas redes de relações, assim não ficam restritas apenas a seu meio familiar. A “[...] cada etapa do desenvolvimento define um tipo de relação particular da criança com seu ambiente, o que implica dizer que a cada idade o meio da criança se amplia” (GALVÃO, 1995, p. 101).

Para que a criança sinta-se segura nesse novo ambiente é necessário estabelecer uma relação de afeto com seus professores, como explica Freire:

Lido com gente e não com coisas. E porque lido com gente, não posso [..] recusar a minha atenção dedicada e amorosa à problemática mais pessoal deste ou daquele aluno ou aluna. Desde que não prejudique o tempo normal da docência, não posso fechar-me a seu sofrimento ou a sua inquietação porque não sou terapeuta ou assistente social. Mas sou gente. O que não posso, por uma questão de ética e de respeito profissional, é pretender passar por terapeuta (FREIRE, 1996, p. 144).

Quando o professor olha para seu aluno, tem à sua frente um indivíduo que, assim como ele, pode passar por momentos difíceis, por crises emocionais que podem estar afetando

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seu desenvolvimento, e, ao realizar práticas que remetem a trilhar caminhos que são mais que pedagógicos, não estará ultrapassando seu limite, pois estará apenas estabelecendo uma relação de afeto e carinho com seus alunos (FREIRE, 1996).

Nessa perspectiva, esclarece Silva:

[...] estudar num ambiente favorável emocionalmente é uma grande garantia para a existência de relações interpessoais facilitadoras na aprendizagem, pois os alunos envolvidos nessa situação se sentirão mais seguros por lidarem com pessoas que lhes compreendam (SILVA, 2002, p. 53).

Dessa forma, é fundamental que o professor aprecie seus alunos, tanto no aspecto cognitivo como emocional, pois, segundo Almeida (1999, p. 13), “[...] tais aspectos se interpenetram dialeticamente, interagindo de maneira significativa sobre a atividade do conhecimento”.

É importante lembrar que o contexto escolar é um local onde estão presentes situações que permitem o desenvolvimento dos seres humanos em sua totalidade, ou seja, nesse espaço estão presentes atividades que “[...] atingem as várias dimensões que compõem o meio [...] são oferecidas oportunidades de interações sociais diferentes do seu grupo familiar” (GALVÃO, 1995, p. 101).

Por conseguinte, a criança, ao seu relacionar com esse novo ambiente, “adquire novos amigos, convive em grupo, obedece horários, respeita regras, sendo sua vida totalmente administrada em função dos interesses da escola” (ALMEIDA, 1999, p. 13). Assim, é comum que elas comecem a experienciar situações que geram conflitos emocionais, possibilitando-lhes expressar suas frustrações, medos, inseguranças, limites, enfim, suas emoções.

A mediação do professor nesses momentos é primordial, visto que contribui para o processo de desenvolvimento da personalidade infantil (ALMEIDA, 1999). Porém, segundo esse mesmo autor:

[...] uma atitude muito comum entre os professores para resolver os conflitos é demonstrar para o aluno que seu comportamento não os agradou. Em geral, os professores, quando em surto de cólera, deixam que os alunos o percebam, acreditando que lhes revelar sua vulnerabilidade resolve a situação. Tal atitude é apenas uma porta para a entrada no circuito (ALMEIDA, 1999, p. 93).

Por isso, o professor precisa estar atento às formas pelas quais os alunos estão expressando seus estados emocionais, pois interpretar uma emoção erroneamente fará com que a mediação atribua significados distorcidos, como, por exemplo, o professor pode cometer o engano de interpretar expressões de alegria como indisciplina (ALMEIDA, 1999).

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Galvão indica meios pelo quais o educador pode interagir nos momentos em que seus alunos estão passando por conflitos emocionais:

[...] com apoio de informações teóricas sobre as características do comportamento emocional e usando sua capacidade reflexiva, o professor deve buscar identificar, nos fatores implicados em cada situação, aqueles que agem como ‘combustíveis’ para o agravamento da crise. [...] é somente depois de tê-la ouvido, já fora do ‘calor’ do momento, que se torna possível a reflexão, a avaliação e uma possível compreensão da situação (GALVÃO, 1995, p. 105).

Assim, no momento em que uma criança expressa sua raiva, por exemplo, a conduta do professor que melhor caberá nessa ocasião será fazer com que o nível dessa emoção diminua e a leve a refletir sobre o porquê de estar expressando-a naquele momento. E não simplesmente oferecer alternativa de pedir desculpas ao que ocasionou tal emoção.

Galvão (1995) enfatiza que o professor é um grande aliado para lidar com a atmosfera emocional manifestada no ambiente escolar, “[...] pois tem mais condições de enxergar as situações com mais objetividade, e então agir de forma mais adequada” (GALVÃO, 1995, p. 105). Ou seja, o adulto, embora possa passar por conflitos emocionais, tem mais recursos para que suas emoções sejam controladas.

Ao mediar uma emoção é necessário estar atendo ao que diz Duarte (1988, p. 16):

Antes que o pensamento possa tomar qualquer experiência como seu objeto, ocorre já um certo ‘colocar-se’ em relação à situação, que envolve aspectos para além da consciência simbólica. Esse experienciar compreende então um envolvimento mais abrangente do homem com o mundo, em que se incluem percepções e estados afetivos, anteriores às simbolizações do pensamento. [...] há sempre uma região que permanece fora do alcance do pensamento e da linguagem. E esta região é o sentimento humano.

Desse modo, tentar compreender um comportamento emocional para mediá-lo é ir além do que está sendo expresso, ou seja, o ser humano é um ser simbólico que utiliza as emoções para expressar conteúdos que dizem respeito ao seu mundo interior, e “[...] a sala de aula é um ambiente onde as emoções se expressam, e a infância, é a fase emocional por excelência” (ALMEIDA, 1999, p. 103).

Para que uma mediação seja eficaz é necessário ir além dos adestramentos, é preciso fazer sentido para quem está apreendendo, como lembra Caminha quando menciona a metáfora do brinquedo bumerangue: “O que eu lanço volta para mim” (CAMINHA, 2014, p. 94). Nessa direção, Duarte (2007, p. 25) esclarece:

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Aprender não é decorar. Aprender é um processo que mobiliza tanto os significados, os símbolos, quanto os sentimentos, as experiências a que eles se referem. Já decorar, é algo assim como o que ocorre com o animal: uma resposta fixa, sem criatividade, a um estímulo fixo.

Nesse sentido, as atitudes geram consequências e é preciso se questionar sobre tais atitudes, ou melhor, sobre as emoções que foram expressas. “Quanto mais trabalhamos com esses fundamentos, mais acreditamos que as emoções deveriam ser ensinadas na escola, assim como se ensina matemática e ciências” (CAMINHA, 2014, p. 95).

Por isso, é pertinente que desde cedo as escolas trabalhem as emoções, pois “[...] quando a criança aprende a nomear e a reconhecer as emoções, sabe identificá-las não somente em si, mas também nos outros” (JANIRO, 2015, p. 4).

Ane Caroline Janiro, citada acima, é psicóloga e faz parte do projeto “Psicologia Acessível”, que tem por objetivo tornar a prática em Psicologia mais acessível a todas as pessoas, sejam elas profissionais da área ou não. Assim, qualquer profissional poderá baixar um caderno que traz uma amostra contendo dez atividades que auxiliam no aprendizado e no reconhecimento das emoções básicas. As atividades são mais indicadas para as crianças em fase de alfabetização ou já alfabetizadas.

Outro recurso que pode ser utilizado para mediar as emoções é o baralho das emoções criado pelos psicólogos Marina e Renato Caminha, esse material ajuda as crianças a acessarem suas emoções e a intensidade das mesmas. Esses psicólogos sugerem outras maneiras que podem ser utilizadas além das citadas:

[...] podem-se também utilizar bonecos, fantoches e figuras de revistas [...] trabalhar com personagens conhecidos de histórias infantis que expressam seus sentimentos por meio dos rostos ilustrados nos livros, como por exemplo, a expressão do porquinho que teve sua casa destruída pelo lobo mau, que pode sugerir medo, decepção ou tristeza (CAMINHA; CAMINHA, 2007, p. 50).

O desenho é também um grande facilitador na mediação da dimensão emocional, às vezes a criança não sabe expressar por palavras o que está sentindo, assim o “[...] desenho infantil consiste num meio pelo qual a criança consegue expressar suas vivências, seus conflitos, suas emoções, ou seja, todos os sentimentos que emergem a partir de situações de seu cotidiano” (SILVA, 2010, p. 453).

Logo, utilizar a sensibilidade nesse momento de mediação é encontrar o equilíbrio junto com o sujeito que expressa e entender o que e por que expressa.

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1.3 O PROFESSOR COMO PARTICIPANTE NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO

O professor é uma figura de grande importância para a sociedade. São os professores que dão vida e brilho aos conteúdos que podem ser buscados nos livros, internet, etc. Pode-se dizer que eles são grandes aliados para despertar e estimular capacidades adormecidas, enfim fazer os pássaros que ali se inserem acreditar que podem voar em busca de novos horizontes, novos conhecimentos. Como explica Alves (2002, p. 30):

Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas. Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados. O que elas amam são os pássaros em vôo. Existem para dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o vôo, isso elas não podem fazer, porque o vôo já nasce dentro dos pássaros. O vôo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado.

Portanto, um dos papéis da escola é “[...] ensinar as pessoas a aprender, outro papel não menos importante é ensinar a se relacionar, fazendo amigos e construindo solidárias correntes de afetividade” (ANTUNES, 2006, p. 10).

Pensar nessa perspectiva de ensino é acreditar que cada aluno é único, e seu “desenvolvimento depende não apenas dos aspectos orgânicos, mas, principalmente, da qualidade das interações que o indivíduo mantém com o meio em que vive” (ALMEIDA, 1999, p. 97). Assim, os conhecimentos que ali são ministrados serão utilizados dentro e fora da escola.

A Proposta Curricular de Santa Catarina (2014) ilustra essa visão de desenvolvimento humano:

Quanto mais integral a formação dos sujeitos, maiores são as possibilidades de criação e transformação da sociedade. A busca pela formação integral é, portanto, parte da experiência humana na qual a escolarização vai ocupando lugar central, e a educação é, nesse sentido, expressão do desejo e do direito humano fundamental (SANTA CATARINA, 2014, p. 25).

A Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010, no título II, art. 6º, dispõe: “Na educação básica, é necessário considerar as dimensões do educar e do cuidar, em sua inseparabilidade, buscando recuperar, para a função social desse nível da educação, a sua centralidade, que é o educando, pessoa em formação na sua essência humana” (BRASIL, 2010).

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no desenvolvimento de seus alunos, pois é um meio diversificado, rico em interações, e permite que os alunos estabeleçam relações simétricas entre seus pares e assimétrica com adultos (ALMEIDA, 1999).

Nesse espaço os professores deparam-se com situações desafiadoras, como os problemas familiares que influenciam o emocional dos alunos, originando dificuldades de aprendizagem e comportamentos rebeldes.

É lamentável que tais situações ocorram, porém, como ressalta Alves (2002, p. 76-77), “[...] a despeito de todas as coisas ruins e andando na direção contrária, há professores que amam os seus alunos e sentem prazer em ensinar. [...] não acredito que exista coisa mais importante para a vida dos indivíduos e do país que a educação”.

É comum encontrar escolas em que os professores preparam suas aulas utilizando os fundamentos de um currículo rígido, que não vai ao encontro do aluno, não planeja caminho para olhar o aluno em sua especificidade, sua lógica é não respeitar o tempo e o modo como os alunos adquirem o conhecimento. No entanto, como nas palavras de Uczai (2010, p. 54), “[...] precisamos, mais do que nunca, avançar na contextualização, na problematizarão daquilo que está a nossa volta e nos é imposto”. Ou, como ensina Freire (1996, p. 39), “[...] é pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática”. Enfim, em qualquer profissão, é preciso que o profissional busque atualizar-se, aperfeiçoar-se e compreender que o mundo evolui e, consequentemente, as pessoas entram nesse mesmo processo.

E, por mais que os professores se deparem com os desafios de sua profissão, é preciso acreditar que “[...] a base do ensino, seja ela qual for, é o amor” (CAMINHA, 2014, p. 95). Esta é uma das emoções que mais transformam o ser humano.

2 MÉTODO

Este estudo caracteriza-se por ser uma pesquisa de campo e qualitativa. Quanto ao procedimento para coleta de dados, trata-se de uma pesquisa de campo, pois tem como objetivo “[...] coletar informações e/ou conhecimento acerca de um problema, para o qual se procura uma resposta, ou de uma hipótese, que se queira comprovar” (MARCONI; LAKATOS, 2002, p. 83).

Esta proposta assume caráter qualitativo, porque se preocupa com o conteúdo das variáveis e não com a quantidade delas. É possível também entender o problema do sujeito a partir daquilo que ele vivencia: “Tenta-se compreender um problema da perspectiva dos

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sujeitos que o vivenciam, ou seja, parte de sua vida diária, sua satisfação, desapontamentos, surpresas e outras emoções, sentimentos e desejos, assim como na perspectiva do próprio pesquisador” (LEOPARDI, 2002, p. 117).

Assim, através da pesquisa qualitativa busca-se aproximar do fenômeno, estudar suas particularidades para compreender como as emoções estão sendo mediadas no contexto escolar por seus professores.

2.1 PARTICIPANTES

Os indivíduos escolhidos para participar desta pesquisa foram três professoras das séries iniciais do Ensino Fundamental de uma escola pública municipal da região de Laguna/SC.

A escolha em entrevistar os professores das séries iniciais deu-se pelo fato destes estarem em contato com os alunos há mais tempo, sendo em sala ou outros locais da escola, visto que as crianças matriculadas nessas séries estão vivenciando seu processo de amadurecimento emocional e social, e o professor é um grande mediador nesse período em que é comum a imaturidade psicológica dos alunos.

2.2 INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS

A análise tem como objetivo organizar e sumariar os dados de forma tal que possibilitem o fornecimento de respostas ao problema proposto para investigação (GIL, 2008).

Assim, as informações obtidas foram categorizadas dentro de grandes grupos de acordo com o tema abordado, conforme os objetivos específicos e à luz do marco teórico apresentado nesta pesquisa.

Na concepção de Moraes (1999, p. 8), “[...] a análise do conteúdo é uma metodologia de pesquisa que ajuda a reinterpretar as mensagens e a atingir uma compreensão de seus significados num nível que vai além de uma leitura comum”.

O contexto escolar foi escolhido pelo fato de ser um local onde estão presentes situações que colaboram para o desenvolvimento humano de forma integral. Para ter acesso a essa instituição, foi necessário realizar contato através de ligações telefônicas a fim de se conseguir autorização da escola para a realização da pesquisa. Após autorização, foram explicados à instituição quais os objetivos da pesquisa e, em seguida, entregue a Declaração

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de Ciência e Concordância das Instituições Envolvidas.

A coleta de dados foi feita através de entrevista semiestruturada. Para Marconi e Lakatos (2002, p. 92):

A entrevista é um encontro entre duas pessoas, a fim de que uma delas obtenha informações a respeito de determinado assunto, mediante uma conversação de natureza profissional. É um procedimento utilizado na investigação social, para a coleta de dados ou para ajudar no diagnóstico ou no tratamento de um problema social.

A entrevista semiestruturada é bem explicada por Minayo (1998, p. 58):

As entrevistas podem ser estruturadas e não estruturadas, correspondendo ao fato de serem mais ou menos dirigidas. Assim, torna-se possível trabalhar com a entrevista aberta ou não estruturada, onde o informante aborda livremente o tema proposto; bem como as estruturadas que pressupõem perguntas previamente formuladas. Há formas, no entanto, que articulam essas duas modalidades, caracterizando-se como entrevistas semi-estruturadas.

Essas entrevistas são realizadas “para coletar informações e/ou conhecimento acerca de um problema, para o qual se procura uma resposta, ou de uma hipótese que se queira comprovar” (MARCONI; LAKATOS, 2002, p. 83).

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Expressando emoções no contexto escolar

Cada aluno que adentra os muros escolares necessita ser lido e compreendido em suas particularidades pelo contexto educacional. Assim, “é comum a criança trazer para o ambiente escolar toda a carga afetiva de seu desenvolvimento com a sua família, a sua história de vida, os seus conflitos emocionais” (OLIVEIRA, 2010, p. 13).

Logo, o professor diariamente lida com situações emocionais diversas, trazidas por seus alunos, como demonstram as falas das participantes:

[...] eles expressam tantas emoções, temos revolta, violência [...] crianças que a mãe apanha, e que são arrastadas pelo cabelo, é criança de dizer principalmente as meninas que nenhum homem presta. [sic] (P1)

[...] a nossa realidade escolar, os nossos alunos têm uma realidade meio violenta, então eles acabam transmitindo isso em sala de aula. (P2)

[...] os alunos têm uma história muito difícil [...] se tu perguntar, levanta a mão quem tem pai e mãe em casa? Tu não consegue três. [sic] (P3)

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Olhar a emoção expressa e não tentar entendê-la é o mesmo que negar a existência daquele ser, e uma vez negado, ele não se sentirá fazendo parte daquele contexto. Assim, através das emoções os alunos estão comunicando ao meio externo conteúdos que dizem muito da sua subjetividade. Portanto, “na escola, como em qualquer outra instância social, o indivíduo está presente como pessoa completa, sujeito de conhecimento, sujeito de afeto” (ALMEIDA, 1999, p. 102).

Dessa forma, é necessário preparar o ambiente para receber esse aluno e permitir que aquilo que é manifesto não seja negligenciado: “[...] eu, enquanto professora de alfabetização, não tem como separar uma coisa da outra, como é que tu vai deixar uma criança triste, ou chorando ou eufórica demais e tu vai pedir que ela fique quieta, que agora não, não tem como” [sic] (P1)

A fase da alfabetização demanda que o professor seja transparente, estabeleça uma relação genuína de amor e respeito com seus alunos, “pois o aluno só se permite atingir seus objetivos se sente confiança no outro, se é bem aceito, acolhido e querido pelo outro” (OLIVEIRA, 2010, p. 18). Tanto é assim que confundir a figura do professor com as figuras parentais é algo que se torna comum nessas relações. Como se pode ver nas falas a seguir:

Na sala eles me chamam de vó, tia, mãe, oh, oh não é minha mãe, ai, tia, bem que tu poderia ser minha mãe, ne? [sic] (P1)

[...] eu sempre digo, que nós somos mãe, pai, psicóloga, enfermeira, professora. (P2)

Oliveira explica o fenômeno acima dizendo que “[...] quando o ambiente familiar não é acolhedor, quando há negligência, falta de carinho, de amor, a escola passa a ser um espaço de grande importância para esse aluno” (OLIVEIRA, 2010, p. 16).

Nesse sentido, os professores deixam marcas em seus alunos, são às vezes os únicos que declaram respeito e incentivo para com eles, como mostra o relato abaixo:

[...] eu digo pra eles que eu tenho uma menina que foi minha aluna aqui no primeiro ano que eu trabalhei, ela é enfermeira no hospital, e ela lembra de mim até hoje. Ela atendeu minha mãe faz quinze dias e ela ainda colocou: ‘Foi a melhor professora que eu tive na minha vida’. Marcou, marquei a vida dela, graças a Deus por bem. Aí, ela assim: ‘Professora, eu não esqueço de ti nunca.’ Ela assim: ‘Minha irmã não quis estudar, mas eu tô aqui [...] não consegui fazer a faculdade de enfermagem, mas eu sou técnica e eu vou fazer, vou buscar’. [sic] (P1)

Depois de muito tempo, as marcas deixadas por essa professora ainda estão presentes na vida dessa aluna, e ainda continuam pulsando desejos, sonhos, despertando habilidades que não foram esquecidas.

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O efeito deixado na vida de cada aluno é explicado por Tiba: “O professor se orgulha de ter sido tão importante na vida do seu aluno vencedor. O verdadeiro mestre se orgulha de ter colaborado para o sucesso do aprendiz, de ter sido um degrau na vida daquele que o superou” (TIBA, 2006, p. 71). Esses são os professores chamados “mestres”, pois, mesmo lidando com situações críticas e traumáticas, fazem com que sua prática exale amor e encantamento pelo outro.

[...] a gente tenta mostrar um outro lado, que a vida pode ser boa, que têm pessoas boas, que por algum momento eles passaram aquilo ali, mas aquilo não precisa se repetir, tentamos mostrar que através do estudo a gente consegue. (P1)

[...] professora do 1º ano tu tem que amar, porque tu vai marcar, então tu tens que ser boa, porque se tu marcar como uma professora ruim eles nunca mais vão querer saber de estudar. Mas se tu marca como uma professora boa, que legal é bom, ir para aula é bom. Porque eu podia fazer o contrário, podia lavar minhas mãos. Não, eu quero resolver a situação, eu quero que ela seja caprichosa porque se ela for caprichosa no 1º ano talvez quem sabe no 2º, no 4º, ela continue, então, nós elogiamos muito quando eles fazem bem feito. Pra dar valor a tudo que eles fazem. [sic] (P2)

É evidente que os educandos hoje esperam muito mais do que conhecimento, eles necessitam ser escutados, eles querem atenção, porque a maioria não tem isso em suas casas (OLIVEIRA, 2010). Assim, os saberes aprendidos no contexto escolar terão que ir além dos cognitivos, pois é primordial entender esse aluno, deixá-lo expressar seus sentimentos: “[...] se a gente não trabalhar com a emoção, com o coração com as crianças, a gente não consegue pegar eles. Eu penso que a gente tem que primeiro ser mãezona mesmo pra depois tu pegar teu objetivo com aluno que é a escrita e a leitura” [sic] (P1)

Por conseguinte, é “[...] necessário encarar o afetivo como parte do processo de conhecimento, já que ambos são inseparáveis” (ALMEIDA, 1999, p. 103).

Algumas falas são típicas quando o acreditar, sonhar, desejar estão presentes na prática pedagógica, que os próprios alunos expressam por meio de palavras o seu querer estar no ambiente acolhedor: “[...] eles não gostam de ficar em casa, pra ti ter noção, nem com chuva e quando a gente diz que vão ter que ficar em casa, não tem aula, eles dizem, mas por quê? Eu não gosto de ficar em casa.” [sic] (P1)

Acolhendo as emoções no contexto escolar

A criança é verdadeira, ela expressa o que sente e sua realidade, e isso algumas vezes faz com que os professores sintam-se revoltados ou com sentimentos de impotência.

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[...] saiu daqui arrasada, a gente fica muito triste, até sentimento de impotência. (P3) [...] uma coisa que eu não fazia não, tá. Eu levava pra casa e sofria muito, porque tu não pode fazer, porque se uma criança tem fome, tu vai e dá um prato de comida, tu resolveu aquele momento, mas como que lá vai conseguir comida amanhã? Se tu for começar a pensar assim, tu acaba trazendo isso pra dentro da tua casa. Eu pelo menos penso, eu não tava me fazendo bem, eu tava me sentindo impotente. [sic] (P1)

[...] acho que meio que revolta, porque dá vontade de dizer: ‘Eu não acredito que isto está acontecendo contigo’. (P2)

Pensar no bem-estar dos alunos é algo rotineiro entre os professores e gestores da escola, seja da mesma turma ou de turmas diferentes, como relata uma das participantes:

Eu digo que nós duas somos a tampa e a panela, uma pensou e a outra está fazendo. A gente pensa muito na criança, o que fazer por eles, a gente vai fazer por eles e para eles, a gente não mede esforços. (P1)

Chego muito cansada [...] mais cansaço faz parte e tudo dá tão certo, isso motiva a gente a continuar. Um sorriso, a gente não quer muito, a gente não quer uma placa, o

status, a gente quer que o aluno aprendeu, reconhecimento do aluno. [sic] (P3)

O amor faz parte da profissão dos professores, a alegria de ver o bem que estão proporcionando. Identificar-se com a criança e se comover com seus problemas, ainda algumas vezes pedir auxílio para outros profissionais.

[...] eu cheguei a comentar com a direção da escola que a gente precisa ter uma psicóloga pra gente [...] me abalou muito. Eu fui obrigada a sair da sala, tomar um ar, dar uma respirada pra poder buscar energia pra poder passar coisa boa pra aquelas crianças naquele momento. [sic] (P1)

O professor, mesmo vivenciando sua fase adulta e tendo mais condições de mediar suas próprias emoções, em alguns momentos se vê como alguém que necessita também de auxílio para que suas emoções sejam compreendidas.

Diehle Marin (2016, p. 80) comentam, em seu estudo, que:

Frente aos problemas e demandas atuais, esses profissionais precisam de competência pedagógica, social e emocional e estimular a construção crítica dos indivíduos para que aprendam a ser e a conviver na sociedade como sujeitos conscientes, reflexivos e participativos, mas para isso é fundamental que também estejam física e mentalmente saudáveis.

É preciso cuidar também da saúde emocional dos professores, pois eles terão, em sua luta diária, emoções a serem acolhidas e mediadas.

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Mediando emoções no contexto escolar

Em função do tempo em que ficam expostos a esses problemas, os professores contam que uma das maneiras que utilizam é filtrar os problemas trazidos pelos alunos:

[...] eu disse pra diretora que procuro deixar no portão. Se eu levar isso pra minha casa, eu não vou ficar bem por uma coisa que eu não vou ter autonomia de resolver não [...] muitas situações tu não pode fazer mais do que as tuas palavras naquele momento, têm coisas que tu não pode intervir mais do que aquilo ali. [sic] (P1)

E continuam relatando:

[...] às vezes eles não querem que tu resolva e diga está errado ou tu está certo. (P2) Então, o que tu tem que fazer é acolher a criança naquilo ali, ter a palavra com ela de carinho, de momento de troca, mas tu não pode, vai te meter lá na família, tu não sabe de como aconteceu aquele fato. [sic] (P1)

Uma das participantes, por se sentir incomodada com alguns acontecimentos e não entender o contexto no qual estavam acontecendo as situações, utilizou o lúdico em sua prática e criou a seguinte estratégia de mediação:

[...] eu comecei a fazer isso numa turma que eles não falavam. Eu quero que eles me contem, que me relatem. No 1º ano que eu fiz a gente construiu com jornal e meia, aí teve um menino que disse que não queria levar a boneca. Então eu disse que não tem problema, têm pessoas que não querem ter filhos, agora eu não quero que saia com ela daqui pelos cabelos e vai embora que eu acho que isso não é modo de tratar ninguém. Então esse era meu objetivo, que eles sentasse e relatassem. [sic] (P1)

Essa estratégia auxiliou a professora a compreender de forma ampla seu aluno, seu comportamento, inseguranças, enfim, questões subjetivas que afetam tanto a aprendizagem como a autoestima do aluno.

Quando o professor lança táticas que ampliam seu modo de ver seu aluno, ele pode se deparar com realidades que dizem respeito à dinâmica familiar, e sua dificuldade nessa mediação é saber o que fazer com aquilo que é trazido, como demonstra a fala de uma das participantes: “[...] nós temos um menino na sala [...] e eu ouvi um burburinho de que os pais são homofóbicos, e o menino vai levar uma boneca pra casa e ela tem três meninos, aí eu tenho que dar uma amarrada nessa situação. Então é difícil, temos que analisar.” (P2)

Nota-se que por mais que os professores sejam psicólogos, eles lidam com situações que dizem respeito ao universo subjetivo da pessoa, assim, é pertinente que as

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graduações utilizem metodologias de ensino que possibilitem aos professores obter conhecimento científico sobre essas questões que são tão frequentes no espaço educacional. Os professores necessitam de norte, disciplinas que lhes permitam observar o fenômeno emocional de forma ampla, não somente nas questões do processo de ensino-aprendizagem, pois, “desde que não prejudique o tempo normal da docência, não posso fechar-me a seu sofrimento ou a sua inquietação porque não sou terapeuta ou assistente social” (FREIRE, 1996, p. 144).

É evidente, nos relatos das participantes, a busca por mediar as emoções trazidas por seus alunos por meio de suas vivências pessoais:

Eu faço refletir, induzindo ele ao pedido. Você acha que o que você fez não deveria ter um pedido de desculpas para a turma? É muito de mim isso na minha vida. [sic] (P3)

[...] eu fui mãe com 33 anos, então depois que tu é mãe muita coisa muda, até em sala de aula. Então, tu já consegue ter um vínculo maior, porque quando tu é solteira, que temos casos, tu até ama a criança, mas tu não sabe a emoção de ser mãe, e tu também não sabe a emoção que a criança sente quando não tem um amor de mãe. Então, tem muito a ver. [sic] (P 2)

Reconhecer suas próprias emoções é fundamental para entender a emoção do outro. Ter o amor embutido na educação é pensar na criança, não importando de onde ela venha, é querer proporcionar o melhor, pelo menos, no momento em que os alunos estão em contato direto com seus professores. Como revela a fala desta participante: “Porém, independente do espaço que tu está, acho que é dever, é cidadania, tu educar, ensinar, dizer como se faz, e quem já é professor então já ensina até numa loja.” [sic] (P3)

Segundo Chalita (2008, p. 192), os protagonistas da educação são pessoas com as seguintes atitudes:

Há pessoas que têm o dom de despertar em nós coisas boas, sentimentos tão nobres que chegam a nos emocionar. São pessoas que se fazem especiais porque nos fazem sentir mais inteligentes, mais felizes, mais bonitos, mais importantes, mais valiosos, mais estimulados a enxergar as nossas qualidades, virtudes e talentos, e também nos encorajam a superar as limitações, a enfrentar os medos, a lidar com as inseguranças, sempre com a certeza de que não estamos sozinhos e podemos contar com alguém.

Demonstrar tais atitudes auxilia o professor a desenvolver mediações que compreendam que cada aluno é único, que suas emoções são genuínas, e poder expressá-las é um ato de respeito e amor.

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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao desenvolver a presente pesquisa, pôde-se perceber que os professores acolhem as emoções que são expressas por seus alunos em sala de aula. Porém, as emoções que são expressas ocasionam emoções que geram sentimentos de impotência entre os professores, pois os problemas não podem ser resolvidos dentro dos muros escolares. São demandas que carecem do envolvimento familiar. Assim, as mediações realizadas durante o período em que os alunos se encontram no contexto escolar são de acolhimento, respeito pelo que está sendo expresso, incentivo e amor.

O professor, algumas vezes, passa a ser a única influência positiva na vida dos alunos, inclusive alguns alunos têm a escola como um lugar em que podem viver outro tipo de realidade. Assim, ficou evidente que os alunos desejam seus professores como alguém de sua família, que deixa marcas positivas capazes de impulsionar para transformar sua realidade futura.

Os professores compreendem que a família é o alicerce principal para o desenvolvimento saudável dos seus alunos, porém também entendem que, optando por serem professores, serão “[...] os construtores do futuro do Brasil, porque são mestres na formação dos cidadãos felizes, competentes, educados, éticos e progressistas” (TIBA, 2006, p. 175).

Logo, por mais que se sintam abalados pelas emoções que seus alunos trazem, os professores reconhecem que despertar saberes cognitivos não serão suficientes para que a futura geração venha a se desenvolver com qualidade e possam transformar a sociedade. Assim, é necessário ampliar o conceito sobre fenômeno emocional nas escolas, pois saber lidar com as emoções que os alunos expressam auxilia tanto no processo de ensino-aprendizagem como para o desenvolvimento de competências que precisarão utilizar para enfrentar os conflitos vivenciados fora dos muros escolares.

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