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Palavras-chave: criança soldado; ISIS; Guerra Civil Síria. Grupo de Trabalho: GT01 Segurança Internacional, Estudos Estratégicos e Política de Defesa.

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FILHOS DO CALIFADO: O RECRUTAMENTO DE CRIANÇAS SOLDADOS PELO ESTADO ISLÂMICO NA GUERRA CIVIL SÍRIA

Daiane Guimarães Lôbo1

RESUMO

A participação de crianças em conflitos armados não é uma novidade, estando estes presentes em diversos momentos da história, contudo, após o fim da Guerra Fria, o surgimento das novas guerras tornou o recrutamento de menores de idade uma nova problemática para os Estados do sistema internacional. Portanto, o presente trabalho irá investigar o aumento da participação de crianças em conflitos armados, utilizando como estudo de caso o recrutamento destes nas bases do Estado Islâmico, enfatizando a atuação do grupo na Guerra Civil Síria e as consequências das hostilidades para a manutenção da prática. Um breve contexto geral sobre o conflito será apresentado, assim como o surgimento do grupo terrorista e a participação de menores de idade em eventos históricos, seguido por uma avaliação da prática do recrutamento feito pelo ISIS no conflito sírio e suas intenções a curto e longo prazo. A partir disso, o conceito de segurança humana, criado em 1994 pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), será utilizado como fundamentação teórica. Com objetivo exploratório, a pesquisa procura produzir conhecimento sobre uma área pouco abordada na academia. Ademais, foram utilizados procedimentos bibliográficos e documentais com o método dedutivo, procurando analisar, a partir do conflito sírio, a participação de crianças nas forças extremistas do ISIS e o impacto deste recrutamento para o futuro do autoproclamado califado.

Palavras-chave: criança soldado; ISIS; Guerra Civil Síria.

Grupo de Trabalho: GT01 – Segurança Internacional, Estudos Estratégicos e Política de Defesa.

1 Bacharel em Relações Internacionais pelo Centro Universitário IBMR e Pesquisadora do Núcleo de Pesquisa

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1. Introdução: A Guerra Civil Síria e Estado Islâmico (ISIS)

A história da Síria possui grandes marcos conflituosos entre o governo e sua população. O mais recente teve seu início em 2011, onde o povo sírio, inspirado pelos protestos da Primavera Árabe, reivindicava um regime democrático, direitos políticos, a diminuição do desemprego e o fim da corrupção no país (SOUZA et. al., 2017).

Contudo, é quando jovens começam a pichar muros com slogans revolucionários, que o governo resolve responder através de suas Forças Armadas, prendendo e torturando-os. Tal resposta motivou manifestações, até então pacíficas, por toda a Síria, a favor dos jovens, somada com as antigas reivindicações da Primavera Árabe e passando a defender, também, a renúncia de Bashar al-Assad e o fim de sua família no poder, que segue a corrente xiita alauíta do Islã e que está no governo desde a década de 1970. Todavia, o governo sírio escolhe reprimir fortemente tais manifestações, o que motivou o início do uso de armas pelos protestantes e a criação do Exército Livre da Síria, composto majoritariamente por sunitas, a oposição do governo, e demais membros que abdicaram do Exército da Síria. A partir daí uma guerra civil eclodiu no país, criando um cenário caótico que move até hoje a participação de diversos atores, estatais e não estatais, que influenciam no conflito com suas próprias agendas geopolíticas e/ou ideológicas, como Rússia, Turquia, EUA, o exército e as milícias curdas, a Frente Al-Nusra (ligada à Al-Qaeda), e o Estado Islâmico (SOUZA et. al., 2017).

O Estado Islâmico, também conhecido como ISIS (Islamic State of Iraq and Syria), é um grupo muçulmano de tendências extremistas, composto por islâmicos sunitas, criado em 2002 após a Guerra ao Terror liderada pelos EUA no Iraque. O grupo se tornou um ator no conflito sírio quando a guerra civil no país se instaurou, em 2011, criando uma “guerra dentro da guerra” e lutando contra, além das forças sírias, a Frente al-Nusra e o Exército curdo (SOUZA et. al., 2016, p. 7).

Contudo, foi em 2014 que o grupo atingiu o seu ápice, pois, com um ordenamento interno extremamente organizado e hierárquico liderado por Abu Bakr al Baghdadi, expandiu seu controle territorial sobre regiões sírias e iraquianas, proclamando seu califado islâmico governado pela sharia, e recebeu reconhecimento internacional pela sua “guerra santa” (jihad) declarada contra aqueles que não acreditam em seus valores, em especial grupos xiitas, católicos e as grandes potências, especialmente as ocidentais (EBC, 2015).

Logo, realizou grandes ataques, como os realizados em Paris em 2015, que matou 129 pessoas e deixou 352 feridos, e a igrejas e hotéis de luxo no Sri Lanka no feriado da Páscoa, em 2019, que matou 321 pessoas e deixou mais de 500 feridas (EL PAÍS, 2019), além de seus

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vídeos disponibilizados em suas redes sociais, onde mostram para o mundo o seu poderio bélico, recrutamento de novos militantes oriundos de diversos países, e assassinatos atrozes de prisioneiros, muitas vezes incluindo a participação de crianças (ESTADÃO, 2014).

As consequências humanitárias dessa guerra são grandiosas e as estatísticas são chocantes. Em 2018 o número de mortos chegou a meio milhão de pessoas e produziu cerca de 11 milhões de refugiados e deslocados internos. Dentre as crianças e adolescentes, houve mais de 19 mil mortes, 2.6 milhões de refugiadas, 2.8 milhões de deslocadas internas e 3.3 milhões vivem expostas a explosivos no território sírio e muitas tiveram suas escolas bombardeadas, além de 5 mil crianças terem sido recrutadas para o combate (O GLOBO, 2018; G1, 2020; UNICEF, 2020).

2. Conceito de Segurança Humana

O conceito de Segurança Humana foi criado, em 1994, através do Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH) do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), passando a ter merecida atenção após a Segunda Guerra Mundial e durante a Guerra Fria, quando houve o surgimento de novos atores e uma grande preocupação quanto às violações de direitos humanos que ocorreram nesta época, especialmente nos estados falidos (ALENCAR, 2015, p. 191).

Segundo Hansen e Buzan (2012, p. 308), o conceito de Segurança Humana é caracterizado como “pessoacêntrico” e possui quatro características essenciais: a segurança humana é uma preocupação mundial, sendo para todas as nações do mundo, uma vez que estas possuem diversas ameaças em comum, variando apenas em sua intensidade e os componentes que a ameaçam, como fome, poluição, tráfico de drogas, terrorismo e disputas étnicas. Além disso, são interdependentes e suas consequências sempre acabam por envolver outros países, não sendo mais fenômenos isolados. Também é mais fácil defender a segurança humana ainda em seu estágio de prevenção, não deixando chegar no nível em é que necessário uma intervenção e, por último, o conceito de segurança humana é voltado para as pessoas, na forma em que vivem, respiram, exercem seu livre-arbítrio, possuem acesso ao mercado e oportunidades, vivendo em paz ou em conflito (UNDP, 1994, p. 22).

Ademais, as ameaças contra segurança humana podem ocorrer nos setores da economia, alimentação, saúde, meio ambiente, segurança pessoal, da comunidade e política (UNDP, 1994, p. 24), e estes podem ser aplicados em duas categorias de segurança humana: o freedom from

want e o freedom from fear, o primeiro podendo ser traduzido como a “liberdade de

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“liberdade do medo”, protegendo-os de guerras, genocídios e limpezas étnicas (OLIVEIRA, 2009, p. 72).

Logo, pode-se concluir que o conceito de segurança humana objetiva trazer o foco da segurança para além dos interesses estatais, como sobrevivência e proteção fronteiriça, e passando a tratar os indivíduos, assim como seu bem-estar, suas liberdades e dignidade, como referências a serem garantidas pelo próprio Estado.

3. Crianças Soldados

O Direito Internacional vem há anos demonstrando preocupação com o tópico das crianças. Em 1989, foi criada a primeira Convenção do Direito das Crianças e, em 2000, foi assinado e/ou ratificado por 162 países o Protocolo Facultativo Sobre o Envolvimento de Crianças em Conflitos Armados (OPAC), considerado uma adição a Convenção de 1989. Houve também a criação da Convenção de Genebra, em 1949, e seus Protocolos Adicionais, que tratam das normas para tornar as guerras mais humanas, abordando também a participação de menores de idade e os Princípios e Diretrizes de Paris sobre Crianças Associadas a Forças ou Grupos Armados criado em 2007 (BENOTMAN; MALIK, 2016).

Segundo o Direito Internacional, “criança soldado” é qualquer ser humano abaixo dos 18 anos que faça parte de forças regulares e irregulares em conflitos armados. Tal definição é abrangente devido à variação de funções, como cozinheiros, mensageiros e escravos sexuais (TABAK, 2009). Contudo, com a chegada das novas guerras no pós-Guerra Fria, estas passaram a atuar de forma direta nas hostilidades, assumindo papéis como combatentes na linha de frente e tropas de choque, espiões, carregadores, sentinelas e bombistas suicidas (SINGER, 2005, p 19).

A razão de menores de idade não participarem diretamente dos conflitos, até agora, se deu por razões éticas, mas também práticas (SINGER, 2005, p. 15). Antigamente, crianças não possuíam a força e treinamento necessários para carregar armas, ao contrário dos adultos, todavia, hoje “armas pequenas são surpreendentemente baratas e facilmente acessíveis. Combinada com inovações tecnológicas que tornam as armas leves mais letais e fáceis de usar, essa proliferação facilita a conversão de crianças em combatentes” (SINGER, 1999, p. 565, tradução nossa).

Outros fatores que promovem o recrutamento são, a pobreza gerada pela guerra, a promessa por comida ou de uma chance para lutar pelo o que acredita, pela reputação ou proteção. Tal praticidade também envolve a mão de obra barata e a menor consciência que estes

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possuem das ameaças da guerra, fazendo com que haja a fácil coerção para realizar atividades perigosas (BENOTMAN; MALIK, 2016, p. 15). Além disso, o uso de crianças soldados também é estratégico para os senhores da guerra, uma vez que as forças inimigas, tendem a hesitar quando os vêem no combate, logo, criou-se uma tendência em usar os menores como escudos humanos (PAIVA, 2011).

Há diversos exemplos na história de conflitos com a participação de crianças soldados. Na Segunda Guerra Mundial, a Alemanha nazista possuía a Juventude Hitlerista (JH), onde o recrutamento obrigatório de jovens de 14 a 18 anos, a partir de 1939, fez com que 98,1% dos jovens pertencessem a JH e, de 100.000 membros no início de 1933, no final do mesmo ano, a JH possuía cerca de dois milhões de jovens recrutados (EL PAÍS, 2016). Nas Américas, grupos guerrilheiros colombianos são responsáveis pelo recrutamento de 11 mil crianças desde 1990. Tais crianças eram usadas para a coleta de informações, armar e desarmar minas, advertir tropas de emboscadas, atuar como soldados e etc. (SINGER, 2005, p. 21).

Atualmente, o uso de crianças soldados em confrontos se tornou tão comum que os números chegam a cerca de 300.000 menores de idade em mais de 30 conflitos armados ao redor do mundo, segundo a UNICEF. Os grupos extremistas são os que menos se importam com valores éticos. O Al-Shabaab, na Somália, por exemplo, força crianças de pequenas vilas a se juntarem ao grupo e a participarem de seus campos de treinamento, e na Nigéria, o Boko Haram é conhecido por forçar suas crianças sequestradas a atuarem como bombistas suicidas em mercados e locais públicos (EL PAÍS, 2018; AFRICA NEWS, 2018; ONU NEWS, 2016).

Este aumento no recrutamento nos últimos anos é fortemente influenciado pelo advento das novas guerras, que se tornaram comuns desde o fim da Segunda Guerra Mundial onde, dos 164 conflitos que ocorrem após a guerra, 77% se encontravam dentro dos Estados, realizados por grupos armados e rebeliões contra o governo. Contudo, as novas guerras eclodiram no mundo com o fim da Guerra Fria, ganhando espaço na agenda de segurança internacional e criando um novo tipo de preocupação aos Estados, o qual foge da forma tradicional de entender guerra, como a definida por Clausewitz após Vestfália (TABAK, 2009, p. 26).

Estas novas guerras trouxeram consigo diversas problemáticas, como a relativização da noção de fronteiras e a grande participação de civis nos conflitos, promovendo o alto recrutamento de crianças soldados. Inúmeras são as consequências das novas guerras que impactam essa prática: estas destroem as estruturas socioeconômicas das sociedades, fazendo com que estes menores não tenham acesso a serviços básicos, moradia ou escola, enfraquece o núcleo familiar, promovendo a violência dentro de casa, o aumento de crianças órfãs que perderam membros da família para o conflito e a constante perda de combatentes para a

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manutenção do conflito, sendo necessário a substituição dos mesmos, preferencialmente de forma barata e de fácil treinamento e coerção (TABAK, 2009, p. 36).

4. Crianças Soldados no ISIS

O cenário caótico da Guerra Civil Síria facilitou para que grupos terroristas, como o ISIS, começassem a exercer influência no território sírio e em sua população. As crianças são as mais afetadas, todavia, além destas serem os alvos de violência, estas também passam a ser os perpetradores da mesma (SINGER, 2005, p. 13).

O recrutamento de crianças soldados pelo ISIS envolve muito mais do que os fatores comentados nos tópicos anteriores. O cenário de crise humanitária promove o aumento da pobreza que, consequentemente, obriga menores de idade a trabalharem para o ISIS com o intuito de sustentar a si mesmos e suas famílias, e a violência constante que faz com que muitas sejam raptadas e forçadas a se juntarem ao grupo (PAIVA, 2011). Ademais, também há os casos de voluntários, como aqueles que viram seus familiares serem mortos e buscam por vingança, e aqueles que deixam seus países, mais comumente ocidentais, por acreditarem na causa do califado e, no caso das meninas, se casarem com combatentes do grupo. Além disso, a participação da família no grupo também promove lealdade para com a causa, uma vez que, incita sentimentos como amor e respeito dos menores por seus parentes combatentes (BENOTMAN; MALIK, 2016, p. 27).

Todavia, o recrutamento está envolvido com grandes planos para a consolidação do califado, pois utiliza as crianças também como forma de dar continuação ao futuro do grupo, ou seja, estes pensam no recrutamento como um investimento, um planejamento a longo prazo da manutenção de suas ideologias pois, quanto mais cedo tais pensamentos são apresentados aos jovens, estes crescem acreditando ser normal, criando assim uma nova geração de

jihadistas. Além disso, o ISIS acredita que estas crianças são mais “puras”, abençoadas por

Deus e possuem mais chances de se tornar mártires, pois nasceram dentro dos valores do ISIS e foram salvas da corrupção. Ademais, quando treinadas desde cedo, se tornam combatentes mais fortes e brutais que os adultos (BENOTMAN; MALIK, 2016, p. 28).

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Fonte: BENOTMAN; MALIK, 2016, p. 38

Tal prática não é atual. O grupo foi fortemente influenciado pelos “filhotes de Saddam”, as crianças soldados recrutadas no governo de Saddam Hussein, no Iraque. O regime baathista, nos anos de 1970, foi responsável pela criação da Futuwah, uma organização paramilitar formada por crianças a partir de 12 anos, com o intuito de treiná-las e doutriná-las dentro da ideologia do partido. No governo de Hussein também se tornou comum os acampamentos militares anuais de verão para meninos de 10 anos, onde estes passavam 14 horas por dia treinando e suas atividades incluíam espancamentos e barbaridades deliberadas em animais, com o intuito de dessensibilizá-los e torná-los aptos para o campo de batalha (BENOTMAN; MALIK, 2016, p. 25).

Outro fator que diferencia o ISIS de outros grupos extremistas é o uso da internet ao seu favor, onde utilizam redes sociais para recrutar jovens do mundo inteiro e a disponibilização de mídias violentas em que ocorre a participação de crianças, seja como executores de assassinatos ou apenas como espectadores. Estes vídeos possuem o objetivo de, além de apavorar a sociedade internacional quanto ao uso de crianças como combatentes, mandar uma forte e dura mensagem às forças estrangeiras que executam ataques aéreos contra o ISIS: “ataques aéreos não são efetivos contra a futura geração de combatentes, pois, enquanto vocês preparam seus exercícios, nós preparamos o nosso” (BENOTMAN; MALIK, 2016, p. 19, tradução nossa). 5. Estudo de Caso: A Presença do Isis e as Crianças Soldados no Conflito Sírio, e a Segurança Humana

A história da sociedade síria tem sido marcada por grandes momentos de conflitos entre seu governo e a população, desde a década de 1970 com Hafez al-Assad no poder, até os dias atuais, com seu filho, Bashar al-Assad, o qual possui uma posição extremamente criticada perante a comunidade internacional, uma vez que, além de ignorar os clamores de sua população e responder com fogo as manifestações da Primavera Árabe, criando assim uma das maiores guerras civis e crises humanitárias do mundo desde a Segunda Guerra Mundial, este

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também foi contra os preceitos estabelecidos pela segurança humana, uma vez o Estado é o principal provedor da segurança, bem-estar, liberdades individuais e manutenção da dignidade de sua população (OLIVEIRA, 2009, p. 68).

Quanto os componentes do conceito de segurança humana, o freedom from want pode ser aplicado nas problemáticas da grave crise humanitária presente no território sírio, resultante da guerra e da presença de grupos extremistas, atingindo cerca de 13,5 milhões de pessoas, uma vez que muitas famílias tiveram suas casas bombardeadas, assim como os hospitais, tornando parte da população sem teto, com acesso à saúde básica e o atendimento médico precário, aumentando rapidamente os índices de pobreza e disseminação de doenças, como a atual COVID-19. Devido a isto, muitos menores de idade se veem obrigados a se juntarem a grupos extremistas, ou até mesmo sendo oferecidos pela própria família, na intenção de garantir, não apenas sua sobrevivência e de seus familiares, como também serviços básicos e alimentação que não são mais providos pelo governo (PAIVA, 2011).

Já as características do freedom from fear são aplicadas as consequências dos ataques do governo sírio e seus aliados, assim como as ações terroristas de grupos como o ISIS, Frente Al-Nusra e milícias curdas, contra a população, que promoveram uma crise migratória em alta proporção devido ao medo, fazendo com que tais cidadãos se deslocassem internamente ou para países vizinhos, somando cerca de 11 milhões em 2020 (G1, 2020).

Além disso, também pode se encaixar como freedom from fear a perseguição devido a diferenças étnicas presentes no conflito, como a minoria xiita alauíta, representada pelo governo de Assad, perseguidos pela maioria muçulmana sunita da população e pelo ISIS, além da perseguição a sociedade curda presente no território sírio (BBC, 2014). Tal categoria de segurança humana também pode ser aplicada à questão das crianças nestes conflitos e o momento em que perdem sua liberdade de escolha e são obrigadas a se juntar a grupos jihadistas, guiadas por razões que envolvem o medo da morte, quando sequestradas de suas escolas, recrutadas quando perdidas de suas famílias ou quando se veem órfãs devido aos confrontos (PAIVA, 2011).

6. Conclusão

É perceptível que o ISIS possui objetivos ambiciosos quanto ao futuro do califado, com planos de dar continuidade ao grupo através das próximas gerações, logo, algo que mereça grande atenção dos países do sistema internacional, não apenas devido aos perigos que o grupo representa, mas também pela geração de crianças que está sendo perdida, por conta, não apenas pela crise humanitária e de refugiados que ocorre como consequência da Guerra Civil Síria,

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mas também por aquelas que estão sendo usadas para propagar seus ideais extremistas, atuando como mártires de sua “guerra santa”.

Contudo, apesar do impacto para os próximos anos, também é notório a falta de interesse dos países em dar atenção a causa das crianças soldados, não apenas em grupos terroristas, mas também em outros conflitos armados que contêm a participação de atores estatais, os quais possuem a responsabilidade de proteger esses menores. Tal caso exemplificado pela guerra no Iêmen, que soma mais de 85 mil crianças mortas, é considerada a maior crise humanitária mundial e seus combatentes são jovens que foram terceirizados por atores do conflito, como Arábia Saudita, pois precisam de dinheiro para sobreviver (ESTADÃO, 2019).

Logo, pode-se concluir que é de extrema importância que ocorra a ampliação do tópico e que passe a ser abordado com maior precisão a participação de menores de idade em conflitos armados nas conversas, especialmente nos debates de segurança, uma vez que o foco geralmente é voltado para as questões militares e estatais. É devido a isso que surge o conceito de segurança humana, para dar voz aqueles que são marginalizados e sofrem com os conflitos e suas consequências.

REFERÊNCIAS

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