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Representações sociais de direitos humanos produzidas por estudantes do Ensino Médio

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Academic year: 2021

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Ricardo Gonçalves Vaz de Oliveira

1

Caroline Rocha Pereira

2

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE

DIREITOS HUMANOS PRODUZIDAS POR

ESTUDANTES DO ENSINO MÉDIO

Palavras-Chave

representações sociais/ direitos

humanos/ escolas/ violações de direitos

SUMÁRIO

1. Introdução. 2. Referencial Teórico. 3. Par-ticipantes da Pesquisa e Coletas de Dados. 4. Forma de Análise dos Dados. 5. Carac-terização do Local. 6. Resultados. 7.Discus-são e Considerações Finais. 8. Referências.

Resumo

Este resumo tem por finalidade conferir abertura ao diálogo, à crítica, à tolerância, à compreensão e o respeito para com o outro, contribuindo, dessa forma, para a democra-tização e para a alteridade na escola, tendo em vista a cultura e a prática dos Direitos Humanos no campo educacional. Além dis-so pretende-se oportunizar a formação de sujeitos autônomos, conscientes dos seus

direitos e deveres, preparados para o pleno exercício da cidadania. Nesse sentido, a ótica principal de análise da presente pesquisa é: como os estudantes do ensino médio repre-sentam os Direitos Humanos e como estão assimilando seus direitos e deveres, na vida e na escola? A presente investigação encon-tra-se referenciada no método de análise das representações sociais, sistematizado por Moscovici (2003), Jodelet (2001) e cola-boradores, que se baseia na análise das prá-ticas discursivas dos participantes, estudan-tes do ensino médio, de uma escola pública. As entrevistas foram gravadas, transcritas e sistematizadas por meio do procedimento de análise de conteúdo (BARDIN, 1979), ob-tendo-se assim, dez categorias temáticas que foram analisadas e discutidas. Portanto, tem-se a ratificação da problemática rela-cionada ao ensino de Direitos Humanos na Escola, cuja missão de elaborar estratégia e métodos capazes de conscientizar e ge-rar consequentes mudanças seja o desafio principal para os educadores e para os pes-quisadores.

1Doutorando Direto em ciências pela Escola de Enfermagem de

Ri-beirão Preto da Universidade de São Paulo. Especialista em docência no ensino superior (2013) pelo Centro Universitário Barão de Mauá. Pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Enfermagem, Saú-de Global, Direito e Desenvolvimento -GEPESADES - da EERP/USP.

2Médica Veterinária pela Faculdade de Ciências Agrárias e

Veteriná-rias de Jaboticabal - FCAV/UNESP. Pesquisador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Enfermagem, Saúde Global, Direito e Desenvolvi-mento -GEPESADES - da EERP/USP.

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Ricardo Gonçalves Vaz de Oliveira

Caroline Rocha Pereira

SOCIAL REPRESENTATIONS OF HUMAN

RIGHTS PRODUCED BY HIGH SCHOOL

STUDENTS

Palavras-Chave

social representations/ human rights/

school/ violations of rights

Resumo

With the culture and practice of Human Rights in the educational field, it is intended to open spaces for dialogue, criticism, tolerance, understanding and respect for the other, contributing to democratization and otherness in school. It also seeks to provide opportunities for the formation of autonomous subject, aware of their rights and duties, prepared for the full exercise of citizenship. In this sense, the fundamental question that guides this research is: how do high school students represent Human Rights and how are they assimilating their

rights and duties in life and in school? The present research is based on the method of analysis of social representations, systematized by Moscovici (2003), Jodelet (2001) and collaborators, which is based on the analysis of participants’ discursive practices, students of high school in a public school. The interviews were recorded, transcribed and systematized through the content analysis procedure (BARDIN, 1979), thus obtaining 10 thematic categories that were analyzed and discussed. In conclusion there is a problem related to the teaching of Human Rights in the School, which comes as a challenge for educators and researchers, whose mission is to develop strategies and methods capable of generating awareness and change of reality.

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1. INTRODUÇÃO

Conforme definição da Organização das Nações Unidas (ONU, 2018), os Direitos Hu-manos (DH) “são direitos inerentes a todos os seres humanos, independentemente de raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, re-ligião ou qualquer outra condição”. Nessa perspectiva, incluem-se “o direito à vida e à liberdade, à liberdade de opinião e de ex-pressão, o direito ao trabalho e à educação, entre muitos outros. Todos merecem estes direitos, sem discriminação”.

Direitos Humanos são, segundo Henkin (1988), um termo de uso comum, mas não categoricamente definido cuja concepção se desdobra de forma a incluir reivindicações morais e políticas que, no consenso contem-porâneo, todo ser humano tem ou deve ter perante sua sociedade ou governo, sendo tais aquelas reconhecidas como “de direito”, e não apenas por amor, graça ou caridade. As leis, objeto de estudo das Ciências Jurí-dicas, são criações humanas que evoluem a partir da necessidade de resolver determina-das situações. Nesse sentido, leis refletem va-lores e esses são conceitos psicológicos bási-cos, que podem ser definidos como padrões para a tomada de decisões e, consequente-mente, para a própria quimera das leis.

Considerando os Direitos Humanos como um sistema de pensamento e parte de uma realidade social, a presente pesquisa tratou-os tanto como princípios avaliativos quanto representações sociais normativas, que permitem aos seres humanos organi-zar suas relações e interações, tendo como referência normativa a Declaração Universal dos Direitos Humanos (Doise, 2001).

As Representações Sociais (RS) referem-se a uma produção mental, dada por meio da

construção ou da transformação de um jeto. Por meio destas representações, o ob-jeto ou apresenta-se ou é substituído, torna--se presente e restauratorna--se simbolicamente, caracterizando o sujeito e a sua atividade, trazendo à tona a inserção social dos indiví-duos como fonte de variação das represen-tações (Doise, 2002).

Nesse sentido, por meio dos julgamentos de um grupo sobre os outros, as Represen-tações Sociais foram criadas. Por conseguin-te, o posicionamento do sujeito em relação ao meio social interferiria na forma como o indivíduo compreende a realidade. Então, percebe-se um tensionamento, conceitua-do como importante para a compreensão da sociedade, considerando as interações entre o nível psicológico e o nível sociológi-co sociológi-como fenômenos de mão dupla. Assim, as formações sociais são construídas dina-micamente pelo conjunto de RS e ações dos indivíduos que as constituem (Doise, 1982). Doise (1982) utilizou, ainda, o termo “repre-sentações sociais normativas” para designar as “ideias-força” em Direitos Humanos, ca-racterizando-as segundo um aspecto nor-mativo, nem sempre explicitado, envolto em definições jurídico-institucionais. Logo, os DH seriam representações dessas “ideias--força”, que podem orientar sobre os limites e as medidas das interações no grupo e en-tre os grupos, permitindo aos homens or-ganizá-las. Nesse caso, a visão e a intencio-nalidade dos DH é universal, ao menos no nível de sua formulação. Tais ideias são, pro-gressivamente, institucionalizadas e conti-das nos princípios explícitos na Declaração Universal dos Direitos Humanos, que deter-mina o respeito à integridade corporal do outro, sua liberdade e sua dignidade, além de seu acesso aos recursos necessários para viver dignamente e sua integração numa

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ordem social, assegurando proteção contra decisões arbitrárias (Doise, 2001).

Passini (2014) revelou que direitos e deve-res são considerados, em uma perspectiva psicossocial, as bases da interação humana entre os indivíduos, de modo que nenhuma sociedade pode existir sem o estabeleci-mento de normas de comportaestabeleci-mento. Uma pesquisa desenvolvida pelo referido autor – a qual envolveu 134 adolescentes do ensino secundário de uma escola técnica da cidade de San Benedetto Del Tronto (Itália) – suge-riu que os alunos entrevistados possuíam noção de que os direitos eram importantes ferramentas de proteção de todos, porém, aqueles apresentaram dificuldades em li-mitar o exercício de seus próprios direitos em benefício de terceiros, ou seja, acredita-vam que seus direitos eram superiores aos de outros indivíduos na mesma condição. Outros dois estudos sobre representações sociais, realizados por Stellmacher, Sommer e Brahler (2005) em universidades alemãs – com cerca de quatro mil estudantes – enfa-tizaram a importância da educação em DH, ao demonstrar que o nível de conhecimento dos indivíduos sobre o tema e documentos afins era bastante baixo, sendo que somen-te 1% daquela população pôde ser casomen-tegori- categori-zada como ‘militantes’.

Conforme indicado nas pesquisas supracita-das, a mera existência de normas e tratados internacionais – inclusive nos quais o Brasil é signatário – não foi suficiente para afastar, entre os indivíduos, a existência de concep-ções negativas a respeito de seus direitos e deveres. Apesar de formalmente os DH se-rem codificados e estruturados sob a forma de tratados, convenções e outros instru-mentos do direito internacional, destacan-do-se, dentre esses, a Declaração Universal

dos Direitos Humanos, de 1948 – as pessoas comuns constantemente adaptaram e re-criaram seus próprios conceitos de DH, in-clusive com várias restrições e discrepâncias em relação a sua aplicação (Staerklé, Clé-mence, & Spini, 2015).

Em pesquisa desenvolvida por Veiga (2001), em que 294 estudantes foram abrangidos – de ambos os sexos e de diversas regiões de Portugal – identificou-se que tais alunos até reconheciam a existência de seus direitos, considerando-os fundamentais. Todavia, esta pesquisa constatou também que os estudantes habitantes de contextos esco-lares ou familiares adversos e desfavoráveis foram os mesmos a indicarem um menor grau de importância em relação aos seus di-reitos, sendo, inclusive, aqueles que menos perceberam a existência de tais direitos, nos ambientes escolar e residencial.

Para Maia (2014), é necessário desenvolver, durante a formação do aluno, uma consci-ência capaz tanto de tecer crítica quanto autocrítica, apoiada em saberes da filosofia, da história e das ciências sociais, embora se considerando a subjetividade como dialéti-ca entre o particular e o universal como con-cretizadora de uma singularidade.

Na tentativa de desvendar as característi-cas que cercam a moral, Piaget propôs que as características psicológicas do indivíduo passam por três fases de desenvolvimento, tal que cada uma sendo uma etapa de su-peração da anterior. Nesta teoria, a evolução de cada uma das fases se dá por meio da maturação biológica e por meio do contato com variadas experiências e vivências, por exemplo, as atividades desenvolvidas na es-cola (La Taille, 2014).

Contudo, como lembrado por Tavares (2007), antes de uma reflexão acerca das

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in-tervenções e estratégias educacionais capa-zes de impulsionar o aprendizado em DH, é primordial considerar localmente as repre-sentações que envolvem o tema, especial-mente a existência, no imaginário social, de representações com conotações negativas, as quais distorcem o real significado de DH. Buscando articular os aspectos supramen-cionados, o presente estudo visa compre-ender as representações sociais dos DH, segundo a perspectiva de discentes matri-culados no ensino médio provenientes de escolas públicas paulistas de um município do interior com o intuito de mapear, por meio dos discursos dos sujeitos-alvo do es-tudo, reflexões relacionadas ao fenômeno investigado.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

Diante do cenário apresentado, propôs-se a realização deste estudo com a finalidade de identificar, em uma perspectiva psicos-sociológica apoiada em orientação teórica e epistemológica, a TRS do autor romeno Serge Moscovici, na qual se sustenta o sen-so comum e o pensamento representativo como mediadores de novos conhecimen-tos e instrumenconhecimen-tos geradores de ação nas relações sociais (Moscovici, 2003).

As representações sociais – fenômenos sempre ativos e agentes na vida social – são compostas por elementos informativos, cognitivos, ideológicos, normativos, cren-ças, valores, atitudes, opiniões, imagens etc., os quais são organizados em uma espécie de saber sobre o estado da realidade, sendo este o ponto no qual se estabelece a presen-te pesquisa científica, presen-tendo como função a descrição, análise e explicação das dimen-sões, formas, processos e

funcionamen-to dessas representações sociais (Jodelet, 2001).

Para Moscovici (2003), as representações sociais são estruturas psicológicas constru-ídas a partir de símbolos compartilhados e enriquecidos por experiências empíricas, anteriormente vivenciadas pelos indivíduos, cujos conteúdos são produto de um longo processo que determina sua organização. Durante esse processo, isto é, durante essas experiências, novas informações e símbolos são transmitidos e recebidos durante a prá-tica cotidiana de comunicação derivada de estruturas informais. A função das represen-tações sociais, então, seria inovar agregando essas novas informações à estrutura de co-nhecimentos já existentes e dotados de cer-ta escer-tabilidade – por meio de mecanismos denominados como ancoragem e objetiva-ção – construindo as representações sociais, com a finalidade de recriar objetos, ideias e seres desconhecidos, tornando-os mais pró-ximos, familiares, compreensíveis e atuais. Para Jodelet (2001), durante a análise do material coletado, os dados de um indiví-duo isolado não são levados em considera-ção, mas as respostas individuais enquanto manifestações de tendências do grupo ao qual pertence. No entendimento da autora, o conteúdo a ser estudado refere-se a situa-ção social definida, possuindo uma história pessoal e social.

3. PARTICIPANTES DA PESQUISA E COLE-TA DE DADOS

Os participantes do estudo são discentes do terceiro ano do ensino médio e foram convidados a participar das entrevistas, após contato em momentos de interação pública em que o pesquisador foi a campo. Ao todo, a

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instituição possuía, no ano de 2017, quatro tur-mas de alunos formandos, 3 (três) no período da manhã e um no noturno, sendo a totalida-de totalida-destes totalida-de 127 indivíduos (informação for-necida pela Diretoria de Ensino de Sertãozi-nho/SP em consulta realizada no ano de 2017). Já no segundo semestre do ano de 2016, fo-ram realizadas três entrevistas e, no primeiro semestre do ano seguinte, mais 5 entrevistas, sendo interrompida a coleta por ter sido ve-rificado que os dados contidos nas entrevis-tas atingiram a saturação, ou seja, quando se constatou que os dados coletados, seja pela sua robustez ou repetição, são o suficiente para subsidiar a teorização almejada, não ne-cessitando de novos elementos para nela se aprofundar (Minayo, 2018).

A coleta de dados foi obtida por meio de en-trevistas semiestruturadas realizadas no local de estudo do entrevistado. Segundo Turato (2008), a entrevista semiestruturada é indica-da nesse contexto, pois permite maior troca de experiência entre entrevistador e entrevistado. As questões norteadoras das entrevistas bus-caram investigar as representações sociais sobre Direitos Humanos concebidas pelos integrantes supracitados, ou seja, os sujeitos do estudo, da mesma forma que a compre-ensão de como essas representações afetam ou influenciam nas relações sociais cotidia-nas dos indivíduos entrevistados.

Já as entrevistas foram realizadas em am-biente reservado, na sala dos professores, em horário em que o estudante não estava participando de nenhuma atividade acadê-mica, de modo a permitir o sigilo da entre-vista e não prejudicar suas atividades esco-lares. A coleta de dados somente foi iniciada após a assinatura do respectivo Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, no caso de participantes maiores de idade, ou do

Termo de Consentimento pelos responsá-veis legais e do Termo de Assentimento (pe-los participantes), em caso de adolescentes. A pesquisa teve seus dados analisados se-gundo a abordagem qualitativa. Conforme Minayo (2014, p. 22), pesquisas qualitativas podem ser entendidas “. . . como aquelas capazes de incorporar a questão do signifi-cado e da intencionalidade como inerentes aos atos, às relações e às estruturas sociais, . . . como construções humanas significativas”.

4. FORMA DE ANÁLISE DOS DADOS

Para melhor análise e compreensão das infor-mações colhidas, as entrevistas foram trans-critas e os dados obtidos classificados e orga-nizados por categorias fazendo uso da técnica de Análise de Conteúdo (Bardin, 1979).

A análise por categorias é o tipo mais antigo e utilizado em pesquisas; na análise temáti-ca, as categorias são construídas conforme os temas emergem do texto. Para se classi-ficar as informações em categorias é neces-sário identificar o que elas têm em comum, permitindo assim seu agrupamento. Nesse sentido, de acordo com Moscovici (2003, p. 63), “categorizar alguém ou alguma coisa significa escolher um dos paradigmas es-tocados em nossa memória e estabelecer uma relação positiva ou negativa com ele”.

5. CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL

O estudo foi desenvolvido em uma escola estadual subordinada hierarquicamente à Diretoria de Ensino da Região de Sertãozi-nho/SP, ambas localizadas no município de Sertãozinho/SP, cidade localizada na região nordeste do estado de São Paulo, cuja

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popu-lação era – tendo como referência o ano de 2016 – de 121.412 (cento e vinte e um mil qua-trocentos e doze) habitantes (IBGE, 2017). Foram encaminhados pedidos de informa-ções, por meio do Serviço de Informações ao Cidadão do Governo do Estado de São Paulo, protocolos nº 742161612326 e nº 686661710891, no qual se verificou no ano de 2017, a institui-ção onde se realizou a pesquisa possuía 588 alunos matriculados. Ao todo, a escola pos-suía em 2017, quarenta professores e quatro turmas de 3º ano do ensino médio, sendo três no período matutino e uma no período noturno. Juntos, todos os matriculados no 3º ano do ensino médio, somam 127 indivíduos, população de onde advieram os participan-tes do presente estudo.

6. RESULTADOS

As entrevistas tiveram um tempo médio de cinquenta minutos de duração, realizadas de acordo com o roteiro de entrevista. Após a conclusão da transcrição, iniciaram-se suas análises por meio de uma leitura minuciosa dos discursos. Após a extração de unidades de significado das principais enunciações, os dados obtidos foram interpretados e rela-cionados ao referencial teórico utilizado no presente estudo, formaram-se dez catego-rias temáticas, conforme segue:

6.1 Envolvimento e práticas em Direitos Humanos no contexto escolar

As marcas discursivas que formam esta ca-tegoria referem-se ao envolvimento dos en-trevistados com práticas ou atividades que consideram se tratar de temas relativos aos Direitos Humanos. O que se pode observar é a quase inexistência de comunicação, no

cotidiano dos alunos, sobre questões relacio-nadas a valores humanos, direitos ou obri-gações, sendo as poucas interações que ad-mitiram ter realizado, ocorreram dentro da escola, no momento do desenvolvimento de trabalhos, como parte de conteúdo ministra-do em disciplinas, pelos professores.

Destaca-se também que nas marcas dis-cursivas dos alunos não foram identifica-das a vivência em outras atividades (fora do contexto escolar), envolvendo a temática de Direitos Humanos, que possam estar re-lacionadas a EDH. Seguem os recortes que constituem esta categoria:

S1: “em sociologia a gente chegou na

par-te que tinha uma tabela pra genpar-te com-pletar perguntando dos direitos civis... di-reitos sociais e didi-reitos humanos”.

S2: “era em sala de aula falavam sobre

aborto e racismo só passava a matéria fa-lava sobre isso um pouquinho e parava”.

S3: “Na minha aula de sociologia esse ano

a professora tem discutido bastante so-bre isso [direitos humanos], soso-bre agres-são física, abusos dentro de priagres-são, sobre como que os detentos funcionam lá den-tro entendeu? Se sofrem abuso ou não. São essas partes que ela conversa com a gente”.

S5: “professor de filosofia também fala

sobre, sobre isso aí . . . tipo assim, “nois” separa quem é, quem é a favor e quem não é”.

S6: “quando eu ia na igreja, eles falavam

muito desses direitos”.

S6: “só em aula mesmo [conversou sobre

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S6: “a gente até fez um trabalho dos

direi-tos e deveres”.

S7: “não converso, mas eles botam em

prática o que deveria ser feito”.

S7: “não sou meio interativo com base

nisso”.

S7: “não me envolvi muito”.

S7: “debatia um pouco e mandavam a

gente pesquisar”.

S8: “só dentro da sala, com a professora

junto, aí nós discutimos sobre isso”.

6.2 Consciência de direitos e deveres

Os sujeitos da pesquisa reconhecem que são indivíduos dotados de direitos, deveres e obrigações impostos não só a si, mas a co-letividade, o que muito se aproxima da fun-ção exercida pela “cidadania”. Nesta catego-ria foram inseridas marcas discursivas que refletem as representações de direitos que são protegidos ou garantidos pelos Direitos Humanos. Inclusive, há a ideia de que os di-reitos essenciais deveriam ser de acesso a todas as pessoas.

S1: “você tem o direito de frequentar uma

escola, mas você também tem o dever se querer uma boa educação... de cobrar uma boa educação... você ter o direito de poder é expressar sua opinião mas você tem o dever de compreender a o outro e de respeitar... então ela é meio que isso... que nem você tem o direito de votar e o dever de participar da política também”.

S2: “todos deveriam ter direito a

educa-ção, saúde, trabalho”.

S3: “Mas as pessoas mereciam ter no

mí-nimo onde comer ou morar”

S4: “deveria ter mais... mais lugar para as

“criança” “brincar”, mano, isso é direitos humanos também”.

S6: “têm o dever de respeitar o próximo

como um igual, respeitar as leis, tipo leis de transito, não cometer crimes”.

S6: “cidadania, os direitos de voto, direitos

de educação, de saúde, essas coisas, eu acho que é Direitos Humanos”.

S7: “educação, deixa eu ver, saneamento

básico, . . . direito de ter seu título de elei-tor”.

S7: “pagar imposto é um dever da pessoa,

ir lá e se alistar na Junta Militar . . . dever de ir para a escola”.

S8: “educação é um direito de todos”. S8: “eu tenho que trabalhar”.

S8: “todos os seus direitos têm os seus

de-veres”.

S8: “você está trabalhando em uma

fir-ma, você tem o direito e você tem tam-bém os deveres de ir na firma”.

S8: “você tem um dever de vir na escola”.

6.3 Responsabilidade pela aplicação dos Direitos Humanos

A categoria é formada por marcas discur-sivas que indicam de quem, no imaginário dos estudantes, é a responsabilidade de promoção e defesa dos Direitos Humanos. Extraiu-se do material analisado, a compre-ensão de que a responsabilidade de lutar pela aplicação e proteção não seria isolada-mente apenas Estatal ou do individual, mas de ambos. Contudo, caberia ainda ao “povo”

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a responsabilidade de fiscalizar e cobrar do Estado a efetivação de tais direitos.

S1: “não tem eu acho que é de cada um...

tipo... todo mundo sabendo os seus direi-tos eu acho que eles sabem que eles têm que respeitar... têm que impor”.

S3: “Um morador de rua, ele não tem

onde morar, ele não tem nenhum tipo de benefício. Seria alguma coisa que eles poderiam estar fazendo. Gerar algum tipo de serviço pequeno, por exemplo. É um cara ir ali todo dia pintar um muro... var-rer uma calçada e ganhar algum dinhei-ro por isso. Seria uma ajuda. Não tem. Se ele não tiver um estudo... um currículo ou uma carteira ele não vai ter essa chance. Então cada um tem que ajudar no que pode”.

S4: “Tem o governo. Porém, eu acho que

governo não ajuda, tem pessoas que lu-tam pra isso mas lu-também não adianta você lutar por alguma coisa que ninguém acredita. Aí essa obrigação fica com to-dos”.

S5: “A população é a responsável, porque,

tipo assim, o governo não vai ver isso aí, ele não vai se preocupar. Agora, se a po-pulação correr atrás disso, o governo vai prestar atenção e ele vai fazer as coisas”.

S6: “o povo tem responsabilidade de

co-brar dos governantes”.

S7: “é mais das pessoas, porque, por parte

de Estado, o Estado foi imposto pelo povo”.

S7: “seria o brasileiro, o povo brasileiro, mas

o povo brasileiro deixa muito a desejar”. 6.4 Violações de Direitos Humanos vivenciadas ou reconhecidas

Esta categoria reúne marcas discursivas na qual os entrevistados manifestam se já vi-venciaram ou não alguma situação em que consideram ter ocorrido alguma violação aos DH ou direitos da pessoa.

Os discursos dos participantes apresentam contradições, pois os entrevistados não se enxergam como potenciais vítimas de vio-lações de direitos, contudo, em outro mo-mento, ao longo do discurso, narram ter vivenciado situações que, em tese, carac-terizam-se pela ausência de direitos. Assim, aparenta que os participantes não se enxer-gam no contexto de vítimas ou testemu-nhas de situações envolvendo violações de direitos básicos.

É possível auferir que, para os entrevistados, as representações de “violações de direitos” estão relacionadas a situações em que ocor-rerem abusos e injustiças ‘realmente graves’ e não ‘meramente’ a ausência de algum “di-reito fundamental”.

S1: “comigo nunca aconteceu nenhum

tipo de violação de direitos. Também nunca presenciei nada disso, acho”.

S1: “Sempre houve aqueles casos né [de

violência na escola]... que nem... eu sei que ano passado roubaram a bicicleta do meu amigo na escola. Porque lá en-tra no portão e tem o pátio com o local pra amarrar a bicicleta. E no intervalo alguém/teve dois casos... no intervalo al-guém foi e jogou a bicicleta em cima do telhado... de um aluno... e no outro caso roubaram uma bicicleta e eu não sei do que que virou esse caso eu sei que meu amigo conseguiu outra bicicleta... acho que pegou a da irmã... não sei... mas não

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sei se foi feito algo a respeito pela escola”.

S1: “de preconceito por homofobia já teve

dentro da escola, teve um caso de tipo a pessoa ser gay levar uma cadeirada”.

S3: “Injustiça, você fala? Não. Injustiça

nunca presenciei na escola nem violação de direito”.

S3: “A minha [escola] ano passado era

muito violenta. Já teve tiro na porta, de borracha e tal. Era muito violenta sim. Hoje é um lugar onde é bem tranquilo. Ano passado e esse ano se teve algum tipo de briga foi cinco no máximo”.

S4: “Acho que nunca vi uma situação

des-sa [de desrespeito ou injustiça]”

S4: “Uma amiga minha, o namorado dela

bateu nela na frente da escola e a gente viu ela andando na rua, a gente passou por ela, ela tava chorando perguntou o que tava acontecendo e ela não quis fa-lar. Depois ela ligou pra gente pediu pra gente ir na casa dela”.

S5: “Eu já vi professora, inclusive que era

diretora, que tem preconceito com negro”.

S5: “acredito que sempre sou respeitado

em meus direitos”.

S5: “Não, nunca aconteceu comigo não”. S6: “não que eu me lembre [de ter algum

direito violado]”.

S6: “peguei muitos professores que não

estavam nem aí com os alunos”.

S7: “vejo crianças na rua, jogado, não

es-tuda, não faz nada, fica o dia inteiro na rua . . . saneamento básico . . . não tem como isso, é coisas jogadas na rua”.

S7: “nunca fui desrespeitado nessa parte

de Direitos Humanos”.

S7: “vi muito com amigos, com colega, eu

vi muito [violações de direitos]”.

S7: “vou para prender bandido, eu vou

para impor, para impor isso com minhas próprias mãos”.

S8: “passei uma vez só [situação de

des-respeito a direitos] . . . numa outra [em-presa] que eu trabalhava”.

S8: “só queria que eu fizesse aquilo, mas ele

era também um empregado, aí onde deu treta e acabou me mandando embora”.

6.5 Mediação e justiça restaurativa no contexto escolar

A violência é vivenciada no cotidiano dos alunos no próprio contexto escolar. No dis-curso discente, além de denunciar a exis-tência, demonstra-se também a descrença em relação as tentativas da instituição de ensino na tentativa de contenção ou dimi-nuição dentro do ambiente educacional. Projetos que buscam desenvolver valores de justiça restaurativa, como é o caso do professor mediador são considerados ine-ficientes, sendo tratados meramente como procedimentos burocráticos para os quais os alunos envolvidos em algum tipo de in-fração disciplinar são encaminhados.

S1: “eu já vi ela chamando os alunos do

fundamental na sala dela pra conversar e tudo mais... mas da minha sala eu nunca vi ninguém indo lá falar com ela que eu saiba ou ela chamando alguém”.

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[fazer algo para diminuir a violência] na medida do possível, mas não resolvia muita coisa não resolvia quase nada”.

S4: “A reunião [com a professora

mediado-ra] não mudou nada. Continuei a mesma coisa. Ela só conversou comigo pra eu não continuar fazendo aquilo porque tipo... foi muito assim e eu não era de fazer essas coisas. Eu era super calma e ela queria sa-ber o motivo que me levou a fazer aquilo. Mas depois/eu fiquei duas semana só. De-pois passou eu nunca mais fui”.

S4: “todo mundo que brigava ia falar com

ela [a professora mediadora] só para não levar suspensão e essas coisas”.

S5: “a minha mãe foi lá, na escola, “nois”

conversou, ela falou para eu pedir descul-pa descul-para a mulher, a mediadora falou, e eu falei que não vou, eu falei que eu “tô” cer-to. Falei: ‘como a mulher quer cobrar de mim uniforme, sendo que eu que . . .”.

S5: “pra mim eu acho que não [funciona]

esse negócio pra mediadora. Mas essa parte, tipo assim, a mediadora eu acho que é mais pra essa parte de aconteceu alguma briga ela vai falar com os pais”.

6.6 Respeito aos Direitos Humanos

Esta categoria contempla a perspectiva dos entrevistados no que se refere ao cumpri-mento dos/respeito aos Direitos Humanos. Os sujeitos compreendem que os direitos das pessoas não são respeitados, como re-gra, ou dentro de algum contexto. Obser-va-se ainda a existência de sentimento de conformidade dos entrevistados em acredi-tar que desrespeito às leis, aos direitos e aos

abusos tratam-se de algo comum.

S1: “hoje em dia ninguém respeita

nin-guém, acho que os Direitos Humanos não são muito não, eu acho assim”.

S3: “Na minha os Direitos Humanos não

são respeitados”.

S4: “Acho que nenhum tipo de direito

im-portante hoje é respeitado. Só tá lá, mas não tá respeitado”.

S6: “em países mais pobres, tipo a África,

não tem como as crianças terem educa-ção, então por um lado eles não respei-tam os Direitos Humanos”.

S6: “na escola eu acho que sim, eu acho

que é [respeitado]”.

S7: “pedaços de papel imposto para as

pessoas ver que tem uma lei”.

S7: “só penso em uma lei jogada de lado”. S7: “leis são impostas, mas nunca são

cum-pridas, muitas delas não são praticadas”.

S8: “o próprio empregado, o próprio patrão,

o encarregado, tudo abusa, não tem jeito”.

S8: “são poucas pessoas que respeitam”. S8: “você sempre vai explorar seu

te, quanto mais você explorar seu ajudan-te, você vai ficar de boa”.

6.7 Professor, o promotor dos Direitos Humanos

Esta categoria reúne marcas discursivas que traduzem a compreensão do aluno a respeito do papel desenvolvido pelo

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profes-sor, visto como um agente cuja missão seja transmitir aos alunos os conhecimentos re-lativos aos direitos e obrigações. É válido es-clarecer que a maioria das marcas discursi-vas foram respostas da pergunta elaborada pelo entrevistador, qual seja: “na sua visão, qual seria o papel da escola na proteção dos Direitos Humanos?”.

O que se percebe, seguindo a lógica identifi-cada nas representações dos entrevistados, é que o docente, por meio do ato de ensinar, é visto como um promotor dos Direitos Hu-manos no ambiente escolar. Assim, na visão dos alunos, para que haja uma maior pro-moção de tais direitos, deve-se investir mais na figura do professor, seja cobrando maior desempenho em suas atividades, seja por meio de sua valorização.

S1: “ela [professora] refez o grêmio... aí

chamou eu... chamou uns outros amigos meus e aí a gente começou a montar um projeto pra fazer”.

S1: “conversando sobre isso ele [o

profes-sor] tá tanto nos ensinando como expli-cando também... dando exemplos e se tem algum caso assim que acontece às vezes por alguma explicação dele ou por algum exemplo que ele dá acaba servin-do de exemplo pra pessoa e ela consegue tomar alguma decisão... fazer alguma coi-sa a respeito. Então o professor é quem vejo que consegue sim ajudar os alunos com esses assuntos assim... com esses te-mas... conversando e tratando na sala de aula ele consegue ajudar, eu acho”.

S2: “Poderia ter mais palestras na escola

né... poderia ter mais conversa sobre isso, tipo passar alguns vídeos, tentar entrar mais nesse assunto”.

S5: “escola como um todo deveria de

ou-vir o aluno, dele participar das aulas e dis-cutir isso na sala”.

S6: “para a escola se envolver um pouco,

é cobrar um pouco mais dos professores para que eles façam o serviço mesmo”.

S6: “professores são muito preocupados

em que a gente aprenda mesmo . . . acho que eles estão um pouco envolvidos nis-so”.

S6: “o problema está no governo, eles

meio que acabam com os professores, contradizem eles”.

S7: “Eles [os professores] passam a

infor-mação para sobre isso, sobre as leis tam-bém”.

S8: “colocar mais professores para falar

de direitos e deveres, Direitos Humanos, essas coisas”.

6.8 O papel dos estudantes

As marcas discursivas desta categoria con-templam o papel que os alunos teriam na proteção e promoção dos Direitos Humanos na perspectiva dos entrevistados.

Com base na análise das entrevistas realiza-das, percebe-se que, na visão dos alunos, a busca de direitos, por parte dos estudantes, poderá ocorrer através da construção de conhecimentos a respeito da problemática junto ao ambiente escolar e com o auxílio do professor.

Novamente se destaca a ausência de cita-ção de outras ferramentas democráticas de busca por direitos, como associações de es-tudantes, grêmios estudantis e a política.

(13)

S1: “os alunos poderiam buscar mais

di-reitos tendo bastante conversas com pro-fessor sobre essas coisas”.

S2: “eles têm que procurar estudar mais

sobre isso aprendendo e estudando so-bre o assunto”.

S3: “eu sinto isso. Que o governo e a

esco-la não conversa com a gente. Porque eles simplesmente mandam as coisas. Não têm noção do que tá acontecendo na es-cola”.

S5: “a gente deveria cobrar mais a escola

para ser democrática. Só aula, só aula não ‘vira’. Igual, tem professor lá que leva, sei lá, que leva para dar filme sobre o conte-údo do assunto”.

S6: “[os estudantes] poderiam buscar

mais, saber sobre o assunto, que a gente escuta falar em jornal”.

S6: “[os estudantes] deveriam se informar

um pouco mais, pesquisar, perguntar para os professores”.

S7: “correr atrás e saber dos seus próprios

direitos”.

S7: “atrás de pesquisa, livros,

perguntan-do informações para os professores, essas coisas”.

S8: “discutir com os professores sobre

es-ses direitos, deveres”.

6.9 Direitos Humanos é coisa de bandido

Existe entre os participantes um sentimen-to de que a legislação brasileira é branda no sentido de ser muito permissiva, o que acaba contribuindo para a situação de

vio-lência do país. Assim, os criminosos e até adolescentes infratores, conscientes dessas “brechas”, estariam se aproveitando da situ-ação para praticarem atos criminosos com a certeza de impunidade. Entre os próprios entrevistados, jovens e adolescentes, há um discurso tendente a tornar mais rígidas as leis que cuidam das medias socioeducati-vas e da persecução criminal.

S1: “Minha opinião [sobre os adolescentes

infratores] acho que isso é questão de ne-cessidade mudar a lei, tem muitos que é por causa de frescura que quer entrar pra ver como que é e fica nessa e se arrepen-de arrepen-depois.”

S2: “hoje em dia o jovem de quinze,

qua-torze anos, que quer trabalhar e não pode tem que trabalhar só depois dos dezes-seis anos tipo não é certo ainda e essa questão eu acho que devia diminuir sim porque geralmente essas pessoas que faz, que assalta, rouba, já faz pensando que não vai dá nada que não vai acon-tecer nada com eles. Só depois que fizer dezoito ano”.

S3: “se um ‘de menor’ vem e dá tiro em

um cidadão, aí ele vai pegar três anos preso e depois cumprir e fazer serviço beneficente aí. Não. Pra mim isso não é certo. Ele tem que pagar pelo que o outro tá pagando também. Ele tirou uma vida. Aquela pessoa não vai mais viver. Então é o certo ele pagar por isso sim. Os direitos humanos tinha que proteger o cidadão também”.

S3: “o massacre do Carandiru aquela vez.

Passou na mídia e tal. E os direitos huma-nos se revoltou por causa disso”.

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que tem que diminuir pra 14 nem pra 16 porque eu acho que hoje em dia tá cada vez menor aí. Ah porque eu sou menor aí eu posso. Então eu acho que tem que di-minuir mesmo. Eles aproveitam da lei”.

S4: “Eu sinto. Eu vejo isso. Todo mundo

fala. Ah você vê um menor sendo preso na TV ele mesmo fala ‘eu vou sair’... é por-que ele sabe por-que vai sair... não vai ficar... é vai preso dois meses na casa/como é que é FEBEM né?”.

S4: “não acredito em justiça porque hoje

em dia tem fianças. Você comete o seu crime você paga uma fiança e sai. Se ti-vesse justiça não existia fiança”.

S4: “lembro que também discutimos

so-bre o massacre do Carandiru né. Os po-liciais mataram eles [os presos], só que eles tavam pagando porque eles [os pre-sos] quiseram... e os policiais não tinham o direito de tirar a vida deles né, mas eles [os presos] também não tinha que fazer rebelião. Eu acho que isso assim é o que tem mais na cabeça de todo mundo so-bre os direitos humanos”.

S5: “quando eu ouço sobre Direitos

Hu-manos, acabo me lembrando da esco-la, das discussões sobre os presidiários. Lembro da escola (risos)”.

6.10 Representações Sociais sobre Direitos Humanos

As marcas discursivas surgiram nos dis-cursos dos participantes após serem in-dagados sobre “o que vêm em sua mente quando ouve falar em Direitos Humanos?”. Verificar-se que as unidades de significados

extraídas convergem em compreender os Direitos Humanos em algum tipo de código de condutas, sendo que a ausência signifi-caria a existência de violações da ordem so-cial. Apesar da visão deturpada sobre aque-les, que foge de seu conceito científico, sua objetificação é considerada como positiva dada sua importância.

S1: “Direitos Humanos ele meio que

en-globa um pouco os outros direitos como civis e políticos e é mais aquela questão de ter meio que o básico né... direitos hu-manos”.

S2: “não sei explicar o que é essa questão

de Direitos Humanos mas deve ser algo assim pra proteger os nossos direitos né”.

S3: “o que eu entendo é que os Direitos

Humanos ele tem o dever de proteger a integridade. É o principal foco dele. Eu acho que de certa forma é muito correto porque o que tá acontecendo lá dentro a gente não vê. Só que acho que eles deve-riam ficar só na integridade”.

S3: “então os Direitos Humanos é só uma

parte disso. É como se fosse uma terceiri-zada do governo”.

S5: “quando eu ouço sobre Direitos

Hu-manos, acabo me lembrando da escola, das discussões sobre os presidiários”.

S6: “pesquisadores poderiam fazer o que

eles quisessem com pessoas”.

S6: “Direitos Humanos, é o que traz nossa

cidadania”.

S6: “se não tivesse, o mundo iria ser uma

anarquia total”.

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soa cometeu o crime, repreende a pes-soa, não sabem nem o porquê, se está certo ou está errado”.

S7: “moral e ética, tem muito a ver, na

ver-dade os dois estão muito conectados”.

S8: “para você cobrar uma coisa, você tem

que ficar ciente que mais para frente, o que você cobrar de uma pessoa pode ser cobrado para você”.

S8: “se você fazendo uma coisa certa,

você vai ter os seus direitos, é a mesma coisa, eu vou discutir, desrespeitar e você vai me respeitar?”.

7. DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os dados coletados na observação em cam-po e os levantamentos realizados junto à Di-retoria de Ensino de Sertãozinho permitem concluir que, teoricamente, a unidade edu-cacional - onde ocorreu a pesquisa - desta-ca-se pela previsão de atividades e de ensi-no envolvendo Direitos Humaensi-nos e, nesse sentindo, contribuindo com a construção e transmissão de valores de cidadania e dig-nidade.

Considerando a boa vontade, nos aspectos formal e normativo da instituição, a criação ou sequer a busca de uma cultura em Di-reitos Humanos, no contexto escolar, não foi identificada na prática e na vivência, entre os alunos participantes ou entre os demais agentes sociais, educando e educadores, que contribuíram para uma melhor com-preensão do fenômeno aqui estudado. É válido destacar a suma importância da convivência durante o período de estudo junto ao ambiente escolar (observação de campo), fator este que permitiu

compreen-der mais a sensação de insatisfação e incon-formismo existente junto aos educadores (professores e outros servidores públicos). Tal sentimento, em síntese, presente nos discursos de boa parte dos educadores, foca no sentimento de revolta dos profissionais (servidores públicos), no âmbito do órgão empregador, o governo estadual, através de queixas frequentes, como falta de reposição salarial há mais de quatro anos e a existên-cia de uma sensação de abandono e de im-potência.

Para os educadores, a falta de estrutura per-mite que a educação funcione apenas em nível precário, ou seja, o aluno sai da esco-la, sendo ensinado (talvez não aprendido), o mínimo necessário para que possa desem-penhar atividades do mercado de trabalho ou a realização de processos seletivos, como concursos ou vestibulares. Assim, não ha-veria espaço ou estrutura necessária para realização de atividades de construção de saberes e ideias envolvendo as ideias de va-lores de cidadania e ética que forjam a teo-ria dos DH, cuja previsão (de ser trabalhada no contexto escolar) é formal.

Nesse sentido, conforme destaca Lapo e Bueno (2002), no jogo pedagógico, o insu-cesso de estratégias administrativas é sem-pre atribuído ao professor que, ao tentar se livrar da “culpa” normalmente a devolve para o Estado, a esvanece facilmente atra-vés de mecanismos diversos. No final do jogo, parece ficar para o docente a sensação nada agradável de incompetência ou de fracasso”. Para o autor:

O professor está na base desse sistema, e deve, por isto, responder às expectativas dos coordenadores, diretores, supervisores, além de outros superiores. Precisa, tam-bém, responder às expectativas dos alunos

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e dos pais desses alunos. Entretanto, essas expectativas nem sempre são coerentes e passíveis de conciliação. O professor conse-gue realizar ou chegar a um equilíbrio entre essas expectativas? Como assumir postu-ras diferentes, condizentes com a realidade e com as suas próprias expectativas, num sistema regulamentado e dirigido? (Lapo & Bueno, 2002, p.247).

Instala-se dessa forma uma tensão entre dever e crença. Surge um problema de di-fícil resolução: como poderiam os educado-res terem como obrigação funcional a con-cepção de criação de ideais sobre a filosofia e valores dos Direitos Humanos se não acre-ditam que a EDH no ambiente educacional funciona? Ou por meio do raciocínio crítico e científico-dedutivo (universo reificado) ou por meio comunicação e interação das RS presentes no imaginário popular (universo conceitual), a transmissão de valores da fi-losofia dos direitos em tela nesta discussão exige a crença do agente social, crer que aquilo é importante e crer que tal filosofia é um ideal a ser alcançado.

Essa situação ainda é reforçada pelo pensa-mento de responsabilidade que o professor carrega. Junto a categoria “professor, o pro-motor dos Direitos Humanos”, o docente é compreendido como um tipo de agente que tem a missão que transmitir aos alunos os conhecimentos relativos aos direitos e obri-gações, sendo o próprio ato de ensinar visto como meio de promoção dos DH. Tendo os alunos desta forma a visão de que, para que haja uma maior promoção de tais direitos, deve-se investir mais na figura do professor, seja cobrado maior desempenho em suas atividades ou por meio de sua valorização. Esse pensamento induz o discente ter so-bre o professor o sentimento de cobrança,

que muitas vezes pode ir além de sua res-ponsabilidade, como também demonstra a concepção da ideia do centralismo educa-cional clássico, de mera transferência de co-nhecimento e não de construção do saber, como é esperado que ocorra na educação contemporânea. Essa ideia sobre o papel que o docente assume e sua importância para o aluno, ficou bem desenhada em uma pesquisa desenvolvida por Cândido (2014), a qual relevou que, para os alunos que partici-param de seu estudo, a representação social do “bom professor” consistia no profissional engajado no futuro do aluno e que saiba transmitir o conteúdo, pois, os próprios dis-centes ansiavam por algo que deveria ser transferido.

A categoria “o papel dos estudantes”, com-plementa bem essa situação. Observou-se que para os estudantes, a única contribui-ção possível para a promocontribui-ção dos DH seria através dos estudos, cumprindo as obriga-ções escolares, acabando por reafirmar essa posição de centralismo na figura do profes-sor e de imaginário continuísta da transmis-são do conhecimento. Pela lógica dos parti-cipantes, a promoção dos direitos humanos poderia ser alcançada por meio da figura do docente e na busca individual do estu-dante junto a unidade escola (estudando), não sendo indicada nenhuma situação em que essa situação pudesse vir de atividades desenvolvidas por iniciativa própria dos alu-nos, sem dependência institucional.

Ao centralizar no professor o papel de pro-moção dos direitos básicos, a escola, en-quanto órgão administrativo e político, pode acabar eximindo-se de sua responsabilida-de, pois ocasionais cobranças dos alunos, enquanto cidadãos e usuários de serviços públicos, poderão ser insuficientes para que hajam eventuais mudanças administrativas.

(17)

Inclusive, permite uma injusta responsabi-lização do docente, em caso de insucesso da instituição na formação ética e moral do aluno, o que, na prática, exige um esforço e complexidade que dificilmente seria supe-rado apenas com o empenho do professor. Isso não significa, contudo, que o docente não exerça na EDH um posicionamento es-tratégico ímpar. Sem dúvidas, a fim de que aquela seja efetiva, se faz necessário estudar e buscar novas formas e estratégias que re-almente conduzam o profissional da edu-cação a acreditar nos programas que visam a construção dos valores trazidos pela filo-sofia dos Direitos Humanos. Partindo desta premissa, o ambiente escolar trata-se de lo-cal para realização de práticas que almejam a construção do sujeito. Ao professor, por-tanto, caberia o protagonismo da criação e da execução de estratégias pedagógicas que permitam o crescimento individual do aluno, embora seja sabido de que esse não é o único responsável.

O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos (Brasil, 2007) define não somen-te que a educação em DH deva ir além da mera aprendizagem cognitiva, mas tam-bém decorrer de práticas envolvendo a esco-la e a comunidade local, pois, na sociedade contemporânea, a escola é a localização da estruturação de concepções de mundo, de consciência social, de promoção de valores, da diversidade social e cultural e da forma-ção para a cidadania e dos sujeitos sociais. Nesse aspecto, duas categorias de análise dos discursos dos alunos denunciam o que já foi apontado pelos educadores durante a observação de campo. Tais categorias são “envolvimento e práticas em direitos huma-nos no contexto escolar” e a “mediação e justiça restaurativa no contexto escolar”.

Assim, verifica-se pela concepção dos alu-nos (categoria envolvimento e práticas em Direitos Humanos no contexto escolar) e pela observação em campo que a temática em si é basicamente trabalhada (ou reco-nhecida) apenas em sala de aula, não sendo identificado pelos participantes nenhuma atividade educacional que possa estar rela-cionada com essa construção de saberes e valores.

Ainda por esse ângulo, os resultados indi-cam que a principal fonte de informações dos estudantes sobre o direitos e obriga-ções provêm da própria escola, através de poucos exercícios que foram realizados em sala de aula ou na forma de conteúdo de disciplinas. Poucos alunos discutiram temas relacionados aos Direitos Humanos (na con-cepção do entrevistado), fora do contexto escolar (como na igreja, por exemplo). Essa revelação evidencia novamente o papel da educação no contexto de promoção dos DH. No tocante às atividades do professor me-diador, presente em diversas escolas obje-tivando o desenvolvimento de valores da justiça restaurativa, estas foram percebidas pelos alunos como mero instrumento bu-rocrático pelo qual são submetidos quan-do se envolvem em episódios de indiscipli-na . Desta forma, não aparenta haver para os alunos, compreensão da importância da implementação do Programa Sistema de Proteção Escolar do Governo do Estado de São Paulo.

Em consonância, a categoria “respeito aos Direitos Humanos”, traz a visão dos partici-pantes que não acreditam na lei e no siste-ma de justiça. A legislação é frágil e falha, na concepção do sujeito 7, trata-se de “pedaço de papel imposto para as pessoas verem que tem uma lei” e que “leis são impostas,

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mas nunca são cumpridas, muitas delas não são praticadas”.

Existe um problema crônico no Brasil de re-conhecimento das instituições de justiça e de aplicação do direito. O acesso ao sistema de justiça, em situação de igualdade trata--se do pilar do sistema democrático e dos Direitos Humanos. Este é o modo pelo qual o jurisdicionado pode reclamar ao Estado e solicitar intervenção frente a uma situação de violação de direitos. Esta prerrogativa foi democraticamente conquistada pelos ci-dadãos, sob a forma de “o mais básico dos Direitos Humanos”, conforme explica Spen-gler e SpenSpen-gler Neto (2011). O Estado falha em efetivar o direito aos cidadãos, no cum-primento do direito com justiça, na partici-pação social e assim, ao construir inspiração para o exercício e respeito aos direitos e da própria cidadania, abre espaço para a insa-tisfação e decepção sentida pelos indivídu-os, o que desestrutura e desgasta a credibi-lidade de que o nosso sistema ainda dispõe. Percebe-se também que os sujeitos do estu-do compreendem que situações de abusos e de violações a direitos são comuns; acre-ditam na existência de direitos universais aos quais todos deveriam ter acesso, porém acabam se conformando com o desrespeito dentro da dinâmica social. Essa mesma des-crença ao sistema de justiça e ao direito nos remete a categoria “direitos humanos é coi-sa de bandido”, na qual se aparenta que os estudantes, embora reconheçam a impor-tância dessa filosofia em outras categorias, ancoram suas compreensões na crença que os Direitos Humanos são frequentemente utilizados para a proteção de criminosos e outros infratores da lei. Para os participan-tes, os “bandidos” tem conhecimento das brechas que existem em nossa legislação (frouxa e permissiva) e se aproveitam dessa

situação para a prática de outros delitos. As filosofias dos Direitos Humanos encon-tram-se em constante evolução e, em razão disso, não são unanimidade em todo mun-do. Existem também aqueles que possuem uma visão equivocada sobre o assunto, en-tendendo que os defensores dos Direitos Humanos estão preocupados apenas em “defender bandidos”. Fato este que ratifica a importância da compreensão social sobre, pois a ideia, há tempos, partiu da premissa de que todos os humanos são iguais por na-turezas, tendo, desta forma, direitos iguais (Silva, 2009).

Os resultados encontrados se assemelham ao apontado na pesquisa elaborada por Queiroz (2001). Nesta, as entrevistadas, mães de estudantes, referiram-se aos Direitos Hu-manos como sendo “algo para atrapalhar a educação dos filhos e para defender bandi-dos”. Entre outros destaques, a pesquisa de Queiroz conclui que “em todas as questões, as classes referentes a uma visão negativa e mais restrita dos DH estão relacionadas a mães de classe socioeconômica baixa e de baixo nível de escolaridade” e uma “visão positiva e mais ampla dos direitos provém de mães de classe média e de nível de esco-laridade superior”.

Já em uma pesquisa desenvolvida por San-tos (2009), com a finalidade de compreen-der as representações de servidores de uma instituição ressocializadora, percebeu-se que as origens do conhecimento em direi-tos provem principalmente da escola e da mídia, sendo a última responsável por boa parte das representações deturpadas sobre o assunto. O resultado em questão se asse-melhou a pesquisa acima informada, em que se identificou uma concepção negativa. A explicação de Queiroz (2001) para

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justifi-car essa diferença consiste “as mães de clas-se média têm um acesso mais amplo aos di-reitos de modo geral”, enquanto as mães de classe baixa, sobretudo em função da defi-ciência do governo no provimento dos direi-tos, “vivenciam muitas situações em que se veem sem direitos ou em que esses direitos são violados”.

Uma pesquisa, elaborada no ano de 2016, envolvendo a análise das RS nos discursos de deputados federais (Oliveira et al, 2017), identificou que a ideia popular de descren-ça na justidescren-ça criminal é um dos elementos propulsores das tentativas de reformas vi-sando o enrijecimento da lei criminal, prin-cipalmente do Estatuto da Criança e Ado-lescente. Essa ideia especialmente daqueles que acreditam, inclusive, na legislação como responsável pela situação de violência que vitima a população brasileira. Assim, para os parlamentares, o anseio pelo fim das impu-nidades trazidas pelas ideias de direitos hu-manos é um desejo do “povo” que deve ser respeitado, por meio da mudança do orde-namento jurídico.

O desejo de punir os responsáveis pela práti-ca de um delito, é algo comum em qualquer sociedade. Contudo, destaca-se o mesmo arcabouço jurídico de direitos fundamen-tais que assegura a punição de um infrator, dentro do sistema de justiça pela prática de um crime, também reconhece que o mes-mo é sujeito de direito. Esse reconhecimen-to, de que todos possuem os direitos bási-cos, comumente pode ser alcançado por meio de uma educação pautada na promo-ção destes direitos. A EDH representa uma importante ferramenta reflexiva e de trans-formação da realidade, ainda que focada no aprendizado fora do contexto escolar.

Já na categoria “consciência de direitos e

deveres”, os participantes da pesquisa re-conheceram que são indivíduos dotados de direitos, deveres e obrigações impostos não só a si, mas a toda coletividade, o que muito se aproxima do papel exercido pela “cidada-nia”. Nesta categoria, inseriram-se marcas discursivas que refletem as representações de direitos protegidos ou garantidos pelos Direitos Humanos.

Os entrevistados demonstram consciên-cia de que também possuem obrigações, cumprindo as normas sociais impostas pela coletividade, bem como aquelas advindas de lei (alistamento militar, pagar impostos, etc.). Nesse sentido, a escola também reafir-ma um importante papel de fomentar ativi-dades e práticas sociais destinadas a discus-são de obrigações e direitos.

Outro ponto válido citar são os exemplos de Direitos Humanos que foram lembrados pe-los alunos, dentre eles, o direito a educação. Tal resultado não é por acaso, pois, conforme percebe-se uma pesquisa sobre represen-tações sociais de estudantes do ensino mé-dio conduzida por Franco e Novaes (2001), a escola e a educação são os caminhos nos quais os jovens depositam a esperança para conseguir melhor situação financeira, em decorrente, por exemplo, de melhores em-pregos.

A categoria “violações de DH vivenciadas ou reconhecidas” demonstrou que os par-ticipantes possuem aparente dificuldade de se enxergar como potenciais vítimas de violações de direitos. As marcas discursivas com afirmações contraditórias por parte dos alunos revelam certa dificuldade sobre o reconhecimento acerca do que presen-ciaram ou foram vítimas, em linhas gerais, podem ser classificadas como violações de direitos. Inclusive, os entrevistados possuem

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conhecimento de que certas atitudes se tra-tam de violação de um direito, mas não tem a consciência de que estarem vivenciando tal realidade.

Ultrapassando a esfera política, a educação também tem o papel de desenvolvimento e conscientização. A palavra conscientização foi criada, segundo Paulo Freire, por uma equipe de professores do Instituto Supe-rior de Estudos Brasileiro, em 1964, mas foi Helder Câmara quem se encarregou de di-fundi-la e traduzi-la para o inglês e francês (Freire, 1980). Nessa perspectiva, o indivíduo tem percepção de sua realidade e de sua existência. Esta conscientização não ocorre de forma separada, ou seja, o ser humano toma consciência de si no mundo, pois nem sempre a realidade é apresentada de forma clara, sendo muitas vezes o que conhece-mos ser interpretado de forma falsa ou errô-nea (Freire, 1980).

Nesta lógica, “conscientizar significa ultra-passar a esfera espontânea de apreensão da realidade, até avançar a uma esfera crítica na qual a realidade se dá como objeto cog-noscível e no qual o homem assume uma posição epistemológica” (Freire, 1980, p.26). “A conscientização não se dá fora da prática. É através da conscientização que transfor-mamos a realidade. É a inserção crítica na história. Implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refletem o mundo” (Freire, 1980, p.26). A conscientiza-ção implica em ser capaz de emitir um juízo crítico sobre a realidade ou conhecimento produzido.

Feitosa (2009), em sua pesquisa sobre as concepções de Direitos Humanos, concluiu que o aumento da compreensão sobre, não se trata somente pelo acúmulo do conhe-cimento com o passar do tempo. Para o

pesquisador, a complexidade acerca das re-presentações sobre DH evoluem conforme os indivíduos vivenciam o que Piaget deno-minou como conflito sócio cognitivo, o qual trata-se do processo de desenvolvimento cognitivo e moral do indivíduo por meio do conflito de valores transmitidos pelos sujei-tos sociais durante as interações do cotidia-no.

Assim, admite-se que a forma como os es-tudantes refletem acerca do tema DH pode ser influenciada pela maneira como enxer-gam tais direitos em relação a suas próprias vidas e como são apresentados a eles, espe-cialmente no contexto escolar; No entanto, espera-se que as representações - acerca dos direitos - que estes jovens possuem, pos-sam ir se alterando na medida em que são convidados a trabalhar, refletir e a raciocinar no que tange à aplicação de tais direitos e deveres em seu próprio contexto social. As diferenças das percepções sobre Direitos Humanos entre os estudos podem estar na explicação de Doise (2003) sobre o tema, o qual teoriza as representações criadas pelo grupo sobre DH também relacionam-se às violações que os indivíduos já estiveram in-seridos. Em suas palavras, o autor explica que “é exatamente as violações dos direi-tos que acabam, muitas vezes, tornando as pessoas conscientes de que esses direitos devem ser aplicados, o que as tornam parte social da realidade”. Nesse seguimento, gru-pos que já foram vítimas da criminalidade urbana estão mais propensos a conceber DH como sendo “coisa de bandido”; visão esta também constatada no presente estu-do e discutiestu-do acima.

Conforme destaca Camino et al (2004), a visão do governo em não se empenhar na proteção dos Direitos Humanos é algo

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co-mum entre os cidadãos dos países da Amé-rica Latina. Em pesquisa conduzida pela referida autora com a finalidade de compre-ender as representações que universitários possuem sobre o envolvimento do governo com os DH, chegou-se ao resultado que o governo brasileiro é visto como “não-defen-sor dos Direitos Humanos”.

No cenário apresentado pelo presente es-tudo, na categoria “responsabilidade pela aplicação dos Direitos Humanos”, existe a compreensão de que a responsabilidade de lutar pela aplicação e proteção dos DH não seria isoladamente apenas do Estado ou do indivíduo, mas de ambos. Contudo, caberia ainda ao “povo” a responsabilidade de fisca-lizar e cobrar do Estado a efetivação de tais direitos.

Por fim, a categoria “representações sociais de Direitos Humanos”, traz uma visão de que os alunos possuem certa dificuldade em conceituar o significado ou ideia dos DH. É possível verificar ainda que as unidades de significados extraídas convergem em com-preender os DH em algum tipo código de conduta, sendo que sua ausência, significa-ria a existência de violações a ordem social; Apesar da visão deturpada sobre os DH, que foge de seu conceito cientifico, sua objeti-ficação é em algo considerado como posi-tivo e com importância. Pelos discursos, é possível identificar a ideia de valores éticos e morais que deverão ser adotados duran-te a escolha de algum tipo de conduta a ser adotada (certa ou errada), durante a busca de um “bem maior”, como no caso da busca por “cidadania” ou “justiça”.

Destarte, a associação de ideias identifica-das nos resultados na compreensão de Di-reitos Humanos, revela a visão de uma espé-cie de código de conduta, baseado na ética

e moral, cuja finalidade é a busca de cidada-nia e da justiça, para evitar a prática de abu-sos. Esse entendimento sincroniza-se com a teorização realizada por Doise (2003), o qual descreve o universo consensual construído em torno dos DH como sendo represen-tações sociais normativas, caracterizadas como normas sociais e princípios contra-tuais de comportamentos coletivos, que se encontram implícitos nas relações do coti-diano que lhes originam.

Sendo assim, interpreta-se que as visões trazidas pelos participantes estão baseadas em valores e símbolos extraídos do contex-to social. Iscontex-to é, não meramente a compre-ensão que DH são “direitos previstos em al-gum tipo de norma legal”, se afastando de sua conceituação científica, o que demons-tra, de certa forma, a existência de um ima-ginário coletivo sobre o assunto.

É possível concluir que há uma problemáti-ca relacionada a questão, sendo um desafio para educadores e para pesquisadores cuja missão consiste em elaborar estratégias e métodos de EDH capazes de gerar cons-cientização e mudança de realidade. Para isso, necessário far-se-á que realizem-se de maneira aprofundada maiores estudos e pesquisas, a fim de que se explore e trace o caminho para a eficácia do ensino aqui abordado.

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Data de submissão: 19/06/2018 Data de aceite: 23/10/2018

Referências

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