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Introdução ao Estudo do Antigo Testamento

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 1

Introdução

ao Estudo do

Antigo

Testamento

Capítulo 1

O Que é o Antigo

Testamento?

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Introdução.

Este Capítulo trata de quatro questões fundamentais que todo estudante do Antigo Testamento deve responder:

 O Que é a Bíblia?

 Como a Bíblia foi escrita?

 Como a Bíblia chegou até nós?  Como interpretar a Bíblia?

I. Cânon: o que é a Bíblia?

A princípio, esta pergunta parece simples. Sabemos o que é a Bíblia. É uma coleção de sessenta e seis livros – trinta e nove no Antigo Testamento e vinte e sete no Novo Testamento. É o que há de Gênesis até o Apocalipse.

Mas nem sempre houve acordo sobre quais livros compõem a Bíblia. Os livros apócrifos – aqueles que aparecem nas Bíblias Católicas Romanas – fazem parte da Bíblia? E se arqueólogos descobrissem uma outra carta escrita por Paulo? Será que essa carta deveria ser incluída na Bíblia? De que forma os judeus primeiro e cristãos em seguida, inicialmente, decidiram quais livros deveriam fazer parte da Bíblia? Quando fazemos perguntas como estas, estamos levantando a questão do Cânon.

A. Definição de Cânon.

A palavra “Cânon” vem do hebraico -

qaneh

e do grego -

kânon

. Essas duas palavras, em seus sentidos originais, significavam uma vara ou medida. Assim como uma vara podia ser usada como padrão de medida, o Cânon bíblico também era um padrão de medida para a fé e a prática dos crentes. Isto era assim porque as pessoas podiam comparar suas vidas àquilo que era requerido pela Bíblia. Além disso, a palavra “cânon” também podia ter a conotação de um padrão dentro do qual os escritos bíblicos deveriam encaixar-se.

B. Testes de canonicidade.

Tendo em vista que Deus revelou Sua palavra por meio de pessoas comuns, tornou-se importante saber quais livros vieram dEle e quais refletiam apenas as opiniões humanas. Para distinguir um grupo de escritos de outro, vários elementos de teste foram sugeridos, com alguns destes elementos chegando a alcançar consenso entre os estudiosos. Os testes de canonicidade concentram-se em três fatores: autor, público e ensinamentos.

Teste 1 – Escrito por um profeta ou pessoa com o dom de profecia.

Para ser parte do cânon, o livro deveria ter sido escrito por um profeta ou uma pessoa com o dom de profecia. Os autores humanos não poderiam, de forma alguma, saber a vontade de Deus, se não fosse pela presença do Espírito assistindo-os em seus entendimentos. Era preciso que a mão do Espírito de Deus estivesse presente no

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 3

processo de redação. Sua presença asseguraria que o produto final fosse a verdade de Deus e que comunicasse fielmente a mensagem de Deus.

Teste 2 – Escrito para todas as gerações.

Um livro que fosse parte do cânon precisaria ter impacto sobre todas as gerações. A mensagem de Deus não poderia estar restrita a apenas um público. Se um livro era, a Palavra de Deus, então deveria ser relevante para todas as pessoas de todas as épocas. É possível que o autor tivesse escrito o texto para um público específico, como de fato aconteceu, mas, se era a Palavra de Deus, todos os que lessem esse texto, poderiam aplicar seus ensinamentos à sua vida de maneira proveitosa.

Teste 3 – Escrito de acordo com revelações anteriores.

Para ser parte do cânon, um livro não poderia contradizer a mensagem de outros escritos anteriores revelados por Deus. Se, por exemplo, um novo escrito dissesse ser de Deus, mas estivesse em contradição com os ensinamentos de Gênesis, este não poderia ser a Palavra de Deus. As verdades de Deus permanecem as mesmas para sempre e não entrariam em contradição. Novas revelações poderiam trazer informações adicionais sobre o plano e os propósitos de Deus, mas nunca ir contra revelações anteriores.

C. A formação do Cânon.

Ao aplicar os princípios acima, os hebreus determinaram, de um modo geral, quais livros pertenciam e quais livros não pertenciam ao Antigo Testamento. Ainda assim, existia alguma confusão entre o povo. Em certas ocasiões, os líderes judeus encontraram-se para tratar deste e de outros assuntos. Uma dessas reuniões parece ter ocorrido na cidade de Jâmnia no final do primeiro século d.C.

Jâmnia - atualmente chamada de Yavneh - está localizada na costa sudoeste de Israel. A cidade tornou-se um importante centro de influencia da comunidade judaica depois que Jerusalém foi destruída pelos romanos no ano 70 d.C.

Os estudiosos discutem o que exatamente aconteceu em Jâmnia, mas concordam que o concílio não determinou quais livros pertenciam ao Antigo Testamento. Na verdade, o concílio parece ter confirmado oficialmente os livros que a maioria dos judeus vinha reconhecendo, como inspirados, há várias gerações. Em outras palavras, o concílio deu o endosso oficial a certos livros, apenas confirmando o que eles criam ter sido sempre a verdade revelada por Deus.

Falaremos do cânon do Novo Testamento no estudo “O Que é o Novo Testamento?”

D. Seqüência de livros em hebraico e português.

O Antigo Testamento em hebraico e português contém rigorosamente o mesmo material. Os livros, porém, aparecem em uma ordem diferente. Não sabemos

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exatamente por que, apesar de existirem diversas teorias. Veja o quadro comparativo no “Apêndice A”.

A versão hebraica do Antigo Testamento, divide os livros em três grupos, a saber: 1)

Toráh

- instrução ou ensino que é composta pelos cinco primeiros livros do Antigo Testamento, escritos por Moisés; 2)

Neviim

- os Profetas, composto pelos profetas Anteriores e pelos Profetas Posteriores e; 3)

Ketubiim

- os Escritos. A origem da organização dos livros na Bíblia hebraica não pode ser rastreada com precisão. Acredita-se que a divisão em três partes, corresponde às três etapas, nas quais os livros receberam reconhecimento canônico, mas não há evidências diretas acerca disto. Em português os livros são divididos em cinco grupos: Pentateuco, Livros Históricos, Livros Poéticos, Profetas Maiores e Profetas Menores. Esta divisão foi originalmente montada, quando da tradução das Escrituras do Antigo Testamento do hebraico para o grego, que ficou conhecida como Septuaginta - símbolo = LXX. Jerônimo, por sua vez, ao traduzir as escrituras para o Latim, adotou esta divisão quando produziu a Vulgata Latina e, depois disso, a grande maioria das traduções passou a utilizá-la.

E. Capítulos e versículos da Bíblia.

As Bíblias mais antigas não eram divididas em capítulos e versículos. Essas divisões foram feitas para facilitar a tarefa de citar as Escrituras. Stephen Langton, professor da Universidade de Paris e mais tarde arcebispo da Cantuária, dividiu a Bíblia em capítulos em 1227. Robert Stephanus, impressor parisiense, acrescentou a divisão em versículos, começando em 1551 e terminando em 1555. Felizmente, estudiosos judeus, desde aquela época, adotaram essa divisão de capítulos e versículos para o Antigo Testamento no original em hebraico.

II. Inspiração: como a Bíblia foi escrita?

A característica mais importante da Bíblia não é, todavia, sua estrutura e sua forma com as várias divisões propostas com o passar dos séculos e sim o fato de ter sido inspirada por Deus. Quando falamos de inspiração, não estamos falando de inspiração poética e sim de autoridade divina. Mas de que maneira exatamente o Espírito de Deus trabalhou em conjunto, com os autores, com fim de inspirar os escritos sagrados? Quando fazemos essa pergunta, levantamos a questão da inspiração. A palavra inspiração aparece somente duas vezes em toda a Bíblia: 1) Jó 32:8 onde é traduzida por “sopro” e; 2) 2 Timóteo 3:16 onde é traduzida por “inspirada”. Esta última passagem, de fato, afirma categoricamente que: “Toda Escritura é -

theopneustos

- inspirada por Deus, e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça - 2 Timóteo 3:16”. Esse versículo afirma, com todas as letras, que Deus é o Autor de todas as Escrituras e, por isso, elas são dotadas de autoridade divina para dirigir tanto os pensamentos quanto para a vida dos crentes. O autor de Hebreus nos diz que Deus falou no passado muitas vezes e de muitas maneiras pelos profetas – ver Hebreus 1:1. Neste contexto, outros versículos muito importantes são 2 Pedro 1:20 – 21: “sabendo, primeiramente, isto: que nenhuma profecia da Escritura provém de particular elucidação; porque nunca jamais qualquer profecia foi dada por vontade humana; entretanto, homens santos falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo”. Neste versículo nos temos a declaração de que tudo aquilo, que é ensinado pelo Espírito Santo, são palavras divinamente inspiradas. Paulo reafirma esta verdade ao dizer: “Disto também falamos,

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 5

não em palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas ensinadas pelo Espírito, conferindo coisas espirituais com espirituais – 1 Coríntios 2:13”. Esta atitude de conferir coisas espirituais com espirituais é exatamente o argumento que o apóstolo Pedro usa para provar que as palavras dos profetas não eram originadas por eles mesmos! – ver 1 Pedro 1:11.

Infelizmente, a Bíblia não descreve exatamente de que forma Deus inspirou os escritores. Que papel eles tiveram na redação das Escrituras? Até que ponto o Espírito de Deus lhes deu liberdade para escrever em seu próprio estilo? Aqueles que examinaram as Escrituras para resolver essas questões, propuseram diversas teorias. Abaixo encontram-se três das mais comuns.

A. Teoria do ditado.

A teoria do ditado, como o próprio termo deixa claro, sugere que Deus simplesmente ditou a Bíblia para escribas humanos. Deus escolheu certos indivíduos e lhes deu exatamente as palavras que ele queria. Esses escritores escreveram apenas o que Deus ditou para eles. Essa teoria não aparece em muitos escritos, mas é bastante comum em certos meios da Cristandade conservadora.

As Escrituras sugerem que, em algumas ocasiões, Deus pode ter comunicado a autores humanos uma mensagem de maneira precisa, palavra por palavra, - ver Jeremias 26:2; Apocalipse2:1, 8, 12, 18; 3:1, 7, 14. Outras vezes, Deus permitiu que os escritores expressassem sua própria personalidade à medida que escreviam – ver Gálatas 1:6; 3:1; Filipenses 1:3, 4, 8. Ainda assim, o Espírito Santo certificou-Se de que a obra completa comunicasse acuradamente a intenção de Deus. Assim, a teoria do ditado explica algumas evidências bíblicas, mas não todas.

B. Teoria da inspiração limitada.

A teoria da inspiração limitada afirma que Deus inspirou os pensamentos dos autores bíblicos, mas não necessariamente, as palavras que eles escolheram usar. Deus guiou os escritores à medida que eles escreviam, mas deu-lhes liberdade de expressar os pensamentos divinos à sua própria maneira. Por causa dessa liberdade, os detalhes históricos contidos nos escritos podem conter erros. Entretanto, o Espírito Santo protegeu do erro, as porções doutrinárias das Escrituras, guardando a mensagem divina da salvação.

A teoria da inspiração limitada reconhece que as Escrituras contêm certas afirmações que são difíceis de conciliar. Mas, será que admitir que existe a possibilidade, de que existam “erros”, quanto aos detalhes históricos é a melhor solução? A Bíblia dá grande ênfase a detalhes históricos. A argumentação de Paulo em Romanos 5:12 - 21, por exemplo, tem como pré-requisito a crença na figura histórica de Adão. As palavras de Jesus em Mateus 12:41 deixam subentendido que o livro de Jonas não é simplesmente uma parábola, mas sim que um profeta real, chamado Jonas, pregou para o povo de Nínive. Além disso, achados arqueológicos, muitas vezes, já resolveram certos problemas encontrados nos registros bíblicos. Enquanto esperamos por mais evidências que esclareçam essas dificuldades, parece melhor, portanto, afirmar que a Bíblia como um todo, é absolutamente confiável.

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C. Teoria da inspiração plenária e verbal.

Como as outras teorias, a teoria da inspiração plenária e verbal afirma que o Espírito Santo interagiu com os autores humanos a fim de produzir o texto bíblico. As palavras “verbal” e “plenária” descrevem o significado específico que essa teoria dá à inspiração.

“Plenária” significa “cheia” ou “completa”. A inspiração plenária afirma que a inspiração de Deus estende-se por todas as Escrituras, do Gênesis ao Apocalipse. Deus guiou os autores, tanto quando eles registravam detalhes históricos, como quando nas ocasiões em que discutiam questões doutrinárias.

“Verbal” refere-se às palavras usadas nas Escrituras. Inspiração verbal significa que a inspiração de Deus estende-se a cada palavra escolhida pelo autor. Mas não é o mesmo que a teoria do ditado. Os autores poderiam ter escolhido outras palavras e, com freqüência, Deus permitiu que eles expressassem sua própria personalidade enquanto escreviam. Mas o Espírito Santo guiou o processo de modo que o produto final transmitisse fielmente o significado desejado por Deus.

A inspiração plenária e verbal, portanto, afirma que Deus inspirou toda a Bíblia. Essa inspiração estendeu-se até às palavras que os autores escolheram, mas Deus também deu aos autores uma certa liberdade para que escrevesse de acordo com seu estilo e personalidade. Ao mesmo tempo, Ele orientou o processo de forma que o produto final refletisse com fidelidade a mensagem divina.

A teoria da inspiração plenária e verbal é a que parece lidar melhor com as evidências bíblicas. Ela reconhece o elemento humano nas Escrituras e admite que diferentes autores escreveram de diferentes formas. Mas ela também afirma que o Espírito Santo é, na verdade, o autor final da Bíblia. O Espírito impulsionou os autores humanos a comunicarem a mensagem divina de amor e salvação para um mundo que precisava desesperadamente dela.

A doutrina da inspiração plenária e verbal tem importantes implicações para os cristãos dos dias de hoje. Em primeiro lugar, significa que a Bíblia é digna de confiança. Podemos confiar nas suas informações. Ela oferece muitas idéias sobre a história do povo de Deus e também descreve o plano de Deus, tanto para o mundo, como para nossas vidas. Ela revela o significado mais elevado da vida e, nos mostra como nos tornarmos tudo o que Deus quer que sejamos. Podemos confiar em tudo o que ela afirma.

Em segundo lugar, a inspiração plenária e verbal significa que a Bíblia tem autoridade. Por ser a Palavra de Deus, ela fala com a autoridade de Deus. Ela nos chama a lê-la, compreender suas implicações e sujeitarmo-nos a elas. E ela continua sendo a verdade de Deus, quer escolhamos obedecê-la ou não. A Bíblia coloca diante de nós duas opções: obedecer a Deus ou nos opormos a Ele. Moisés, o servo de Deus, disse que a palavra de Deus é a própria vida: “Porque esta palavra não é para vós outros coisa vã; antes, é a vossa vida; e, por esta mesma palavra, prolongareis os dias na terra à qual, passando o Jordão, ides para a possuir - Deuteronômio 32:47”. O Senhor Jesus também disse a mesma coisa: “O espírito é o que vivifica; a carne para nada aproveita; as

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 7

palavras que eu vos tenho dito são espírito e são vida João 6:63”. Do que você vai chamá-la?

III. Implicações da Doutrina Bíblica da Inspiração

– ver “Apêndice B” - “Livros Fontes Mencionados nas Escrituras”.

Há certos fatos que, embora não formalmente apresentados na doutrina da inspiração, acham-se implícitos. Vamos tratar aqui de três deles: a igualdade entre o Antigo e o Novo Testamento, a variedade da expressão literária e a inerrância do texto.

A. A inspiração diz respeito igualmente ao Antigo e ao Novo Testamento. A maioria

das passagens citadas acima, a respeito da natureza plena da inspiração, refere-se diretamente ao Antigo Testamento. Com barefere-se em que, então, podem aplicar-se - por extensão - ao Novo Testamento? A resposta a essa pergunta é que o Novo Testamento, à semelhança do Antigo, reivindica a virtude de ser Escritura Sagrada, de escrito profético, e toda a Escritura e todos os escritos proféticos devem ser considerados inspirados por Deus.

De acordo com II Timóteo 3:16, toda a Escritura é inspirada. Ainda que a referência explícita, aqui, refira-se ao Antigo Testamento, é verdade que o Novo Testamento também deve ser considerado Escritura Sagrada. Pedro, por exemplo, classifica as cartas de Paulo como parte das “outras Escrituras” do Antigo Testamento – ver II Pedro 3:16. Em I Timóteo 5:17 - 18, Paulo faz referência a uma informação contida no evangelho de Lucas – ver Lucas 10:7, referindo-se a ele como “Escritura”. Tal fato é mais significativo ainda quando consideramos que nem Lucas, nem Paulo fizeram parte do grupo dos doze apóstolos. Visto que as cartas de Paulo e os escritos de Lucas - ver Lucas 1:1-4 e Atos 1:1 - foram classificados como Escritura Sagrada, por implicação direta, o resto do Novo Testamento, escrito pelos apóstolos, também pode e deve ser considerado Escritura Sagrada. Em suma: se “toda Escritura é divinamente inspirada” e o Novo Testamento é considerado Escritura, decorre disto claramente, que o Novo Testamento é encarado com a mesma autoridade do Antigo. Na verdade, é exatamente assim que os cristãos, desde o tempo dos apóstolos, têm considerado o Novo Testamento. Eles o consideravam com a mesma autoridade do Antigo Testamento.

Além disso, de acordo com II Pedro 1:20-21, todas as mensagens escritas de natureza profética, foram dadas ou inspiradas por Deus. E, visto que o Novo Testamento reivindica a natureza de mensagem profética, segue-se que ele também reclama autoridade igual à dos escritos proféticos do Antigo Testamento. O apóstolo João, por exemplo, refere-se ao livro do Apocalipse da seguinte forma: “palavras da profecia deste livro” – ver Apocalipse.22:18. Paulo afirmou que a igreja estava edificada sobre o alicerce dos apóstolos e profetas - do Antigo e do Novo Testamento – ver Efésios 2:20 e 3:5. Visto que o Novo Testamento, à semelhança do Antigo, é um texto dos profetas de Deus, ele possui por essa razão, a mesma autoridade dos textos inspirados do Antigo Testamento.

B. A inspiração abarca uma variedade de fontes e de gêneros literários. O fato de a

inspiração ser verbal, ou escrita, não exclui o uso de documentos literários e de gêneros literários diferentes entre si. As Escrituras Sagradas não foram ditadas

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palavra por palavra, no sentido comum que se atribui ao verbo ditar. Na verdade, há certos trechos menores da Bíblia, como, por exemplo, os Dez Mandamentos, que Deus outorgou diretamente ao homem – ver Deuteronômio 4:10, mas em parte alguma está escrito ou fica implícito que a Bíblia é resultante de um ditado palavra por palavra. Os autores das Sagradas Escrituras eram escritores e compositores, não meros secretários, amanuenses ou estenógrafos.

Há vários fatores que contribuíram para a formação das Escrituras Sagradas e que dão forte apoio a essa afirmativa.

1. Em primeiro lugar, existe uma diferença marcante de vocabulário e de estilo de um escritor para outro. Comparem-se as poderosas expressões literárias de Isaías com os tons lamurientos de Jeremias. Compare-se a construção literária de grande complexidade encontrada em Hebreus, com o estilo simples e direto de João. Distinguimos facilmente a linguagem técnica de Lucas, o médico amado, da linguagem de Tiago, formada de imagens pastorais.

2. Em segundo lugar, a Bíblia faz uso de documentos não-bíblicos, como o livro dos Justos – ver Josué 10:13 e II Samuel 1:18; o livro de Enoque – ver Judas 14 e até do poeta grego Epimênedes – ver Atos 17:28. Somos informados de que, muitos dos provérbios de Salomão, haviam sido editados pelos homens de Ezequias – ver Provérbios 25:1. Lucas reconhece o uso de muitas fontes escritas sobre a vida de Jesus, na composição de seu próprio evangelho – ver Lucas 1:1 - 4.

3. Em terceiro lugar, os autores bíblicos empregavam uma grande variedade de gêneros literários; tal fato, não caracteriza um ditado monótono em que as palavras são pronunciadas uma após a outra, segundo o mesmo padrão. Grande parte das Escrituras é formada de poesia, como por exemplo, os livros de Jó, Salmos, Provérbios e Cantares, assim como extensas porções dos profetas. Os evangelhos contêm muitas parábolas. Jesus empregou inúmeras figuras de linguagem. Paulo usava alegorias – ver Gálatas 4 e hipérboles – ver Colossenses 1:23 - ao passo que Tiago gostava de usar metáforas e símiles.

4. Por fim, a Bíblia usa a linguagem simples, do senso comum, do dia-a-dia, que salienta a ocorrência de um acontecimento, e não a linguagem de fundamento científico. Isso não significa que os autores usassem linguagem anticientífica ou negadora da ciência, e sim linguagem popular, para descrever fenômenos científicos. Não é anticientífico afirmar que o sol permaneceu parado – ver Josué 10:12 – da mesma maneira que não é anticientífico dizer que o sol nasceu ou subiu – ver Josué 1:15. Este tipo de linguagem reflete, apenas, o uso de expressões coloquiais para se referir a estes acontecimentos. Dizer que a rainha de Sabá veio “dos confins da terra”, ou que as pessoas no Pentecostes, vieram “de todas as nações debaixo do céu”, não é dizer coisas com exatidão científica, e sim de modo coloquial. Os autores usaram formas gramaticais comuns de expressar seu pensamento sobre os assuntos.

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 9

Por isso, o que quer que fique implícito na doutrina dos escritos inspirados, os dados das Escrituras mostram, com clareza, que elas incluem o emprego de grande variedade de fontes literárias e de estilos de expressão. Nem todas as mensagens vieram diretamente de Deus, mediante ditado. Tampouco foram expressas de modo uniforme e literal. É preciso que se entenda a inspiração da perspectiva histórica e gramatical. A inspiração não pode ser entendida como um ditado uniforme, ainda que divino, que exclua os recursos, a personalidade e as variadas formas humanas de expressão.

C. Inspiração pressupõem inerrância. A Bíblia não é só inspirada; é também, por

causa de sua inspiração, inerrante, i.e., não contém erros. Tudo quanto Deus declara é verdade isenta de erro. Com efeito, as Escrituras afirmam ser a declaração - aliás, as próprias palavras - de Deus. Nada do que a Bíblia ensina contém erro, visto que a inerrância é conseqüência lógica da inspiração divina. Deus não pode mentir – ver Hebreus 6:18; sua Palavra é a verdade – ver João 17:17. Por isso, seja qual for o assunto sobre o qual a Bíblia diga alguma coisa, ela só dirá a verdade. Não existem erros históricos nem científicos nos ensinos das Escrituras. Tudo quanto a Bíblia ensina vem de Deus.

Não é possível fugir às implicações da inerrância factual com a declaração de que a Bíblia nada tem para dizer a respeito de assuntos factuais ou históricos. Grande parte da Bíblia apresenta-se como história. Bastam as tediosas genealogias para atestar essa realidade. Alguns dos maiores ensinos da Bíblia, como a criação, o nascimento virginal de Cristo, a crucificação e a ressurreição corpórea, claramente pressupõem matérias factuais. Não existem meios de “espiritualizar” a natureza factual e histórica dessas verdades bíblicas, sem praticar violência terrível contra a análise honesta do texto, da perspectiva cultural e gramatical.

A Bíblia não é um compêndio de ciências, mas, quando trata de assuntos científicos em seu ensino, o faz sem cometer erro. A Bíblia não é um compêndio de história, mas, sempre que a história secular se cruza com a história sagrada em suas páginas, a Bíblia faz referência a ela sem cometer erro. Se a Bíblia não fosse inerrante e não estivesse certa nas questões factuais, empíricas, comprováveis, de que maneira seria possível confiar nela em questões espirituais, não sujeitas a testes? Como disse Jesus a Nicodemos: “Se tratando de cousas terrenas, não me credes, como crereis, se vos falar das celestiais?” – ver João 3:12.

IV. Transmissão Textual: Como a Bíblia chegou até nós?

Graças ao trabalho de inúmeros undivíduos fiéis, ao longo de muitos séculos, nós podemos ler a Bíblia hoje. Estes indivíduos são tecnicamente chamados de escribas. Estes homens copiaram, à mão a Palavra de Deus, tomando grande cuidado para manter a exatidão daquilo que copiavam.

A. O cuidado dos escribas com os textos do Antigo Testamento.

1. Os escribas no mundo antigo.

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Os escribas tiveram um papel essencial no mundo antigo. A transmissão fiel de informações precisas, era um dos aspectos mais importante das sociedades da Antigüidade. Os reis contavam com os escribas para registrar os editos reais. Oficiais administrativos precisavam dos escribas para registrar transações importantes. Os erros podiam ter implicações políticas, econômicas ou de outra natureza de grande seriedade.

Os escribas da antiguidade, que copiavam os textos bíblicos criam, que estavam copiando as palavras do próprio Deus. Consequentemente, tomavam grande cuidado de forma a preservar as cópias que haviam recebido. Um dos mais importantes grupos de escribas foi o dos Massoretas.

2. Os Massoretas.

Os Massoretas - 500-1000 d.C - trabalharam para preservar os textos do Antigo Testamento que haviam recebido. Eles queriam assegurar um entendimento correto dos textos, bem como sua transmissão com fidelidade, para as gerações futuras. Eles foram chamados de Massoretas por causa da -

massora

– tradição textual, desenvolvida por

estes homens, e que era um complexo sistema de símbolos que eles haviam desenvolvido para ajudá-los a alcançar seus objetivos.

Os Massoretas seguiram três passos para garantir a precisão textual.

a. Primeiro desenvolveram um sistema para escrever as vogais, já que as línguas hebraica e aramaica são línguas consonantais i.e. não possuem vogais e todas as letras de seus alfabetos são consoantes. Mesmo sendo línguas consonantais, no entanto, tanto o hebraico como o aramaico possuíam certas consoantes que soavam como vogais. O que os Massoretas fizeram foi desenvolver um sistema complexo de vogais - a, e, i, o, u e vogais com sons mais abertos ou mais fechados - visando preservar, na escrita, as tradições orais que haviam recebido das gerações anteriores.

b. Em segundo lugar, os Massoretas desenvolveram um sistema de acentuação para o texto hebraico. Estes acentos ajudavam o leitor a pronunciar o texto corretamente, mas, além disso, mostravam a relação entre várias palavras e frases de uma mesma sentença. Desta maneira eles ajudaram a esclarecer diversas passagens difíceis.

c. Em terceiro lugar, os Massoretas desenvolveram um sistema de anotações detalhadas do texto. Estas anotações ofereciam um meio pelo qual era possível verificar a precisão do texto copiado. Nos dias de hoje podemos produzir cópias de manuscritos idênticas usando em computador ou uma máquina copiadora. Os Massoretas tinham que fazer tudo à mão.

A palavra hebraica usada para “escriba” significa literalmente “contador”, e isto, porque os escribas contavam absolutamente tudo no texto. Eles sabiam, por exemplo, que a – T

orah

– instrução ou os primeiros cinco livros do Antigo Testamento - continha 400.945 palavras! Eles também nos informam, que o versículo de Levítico 8:8 representa o exato meio da T

orah

- instrução. Eles sabiam que a palavra que ficava exatamente no

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 11

meio da T

orah

– instrução, era a palavra “buscou” em Levítico 10:16. Sabiam também que a letra que ficava exatamente no meio da T

orah

– instrução, era uma das letras da palavra traduzida por “ventre” em Levítico 11:42. Estas informações podem parecer apenas curiosas, mas para os Massoretas, estas eram informações vitais para a preservação cuidadosa da Palavra de Deus. Devemos ser gratos a Deus pela dedicação destes homens, que através dos séculos se empenharam para preservar incorrupta a Palavra de Deus.

B. A transmissão nas línguas Originais - Hebraico e Aramaico.

A maior parte do texto do Antigo Testamento foi escrita originalmente em hebraico. Pequenas porções que podem ser encontradas em Gênesis 31:47b; Esdras 4:8 – 6:18; 7:12 – 16; Jeremias 10:11b e Daniel 2:4b – 7:28, foram escritas em aramaico. Tanto o hebraico quanto o aramaico são línguas semíticas que pertencem à mesma família do acádio, que era a língua falada pelos Assírios e pelos Babilônios, do amorita, do fenício, do

ugarítico,do amonita, do moabita e do árabe.

Várias cópias em Hebraico, do Antigo Testamento, chegaram até nossos dias. Três destas cópias são de maior importância para os nossos estudos. Estes são: O Texto Massorético, o Pentateuco Samaritano, e os Manuscritos do Mar Morto.

1. O texto Massorético.

A expressão “Texto Massorético” – TM - refere-se a um grupo de manuscritos hebraicos do Antigo Testamento, datados desde os primeiros séculos da Idade Média, e que são todos concordes entre si. Estes manuscritos possuem um padrão elevado de uniformidade textual, devido ao trabalho coerente e meticuloso dos escribas judeus do período medieval, conhecidos como Massoretas, que adotaram um rígido sistema para preservar, o texto da Bíblia Hebraica, sem corrupções e sem alterações significativas. Hoje em dia, todas as edições impressas da Bíblia Hebraica, bem como todas as traduções modernas - incluindo-se ai a nossa versão de Almeida Revista e Atualizada – ARA - são baseadas no TM. A estrutura consonantal do TM remonta ao período do Segundo Templo - c. 450 a.C. a 70 d.C. Após a destruição do Templo e da cidade de Jerusalém, os judeus se reuniram na cidade de Jâmnia para resolver a situação canônica de certos livros do Antigo Testamento que ainda tinham sua autoridade disputada. Deste concílio surgiu um texto que foi recebido pelos judeus como autoritativo. Este concílio, em Jâmnia, aconteceu perto do final do primeiro século e, desde 100 d.C., todas as comunidade judaicas adotaram-no como a forma textual definitiva e oficial das Escrituras Sagradas. O texto bíblico do Antigo Testamento, tanto de judeus quanto de cristãos, baseia-se no TM estabelecido há muitos séculos pelos escribas na época antiga e, mais tarde, pelos Massoretas, durante o período medieval. O texto atual da Bíblia Hebraica passou por um processo de definição textual desde os primeiros séculos do período medieval, quando os Massoretas procuravam padronizar, uniformizar e transmitir, para as futuras gerações de escribas, um texto que fosse correto e livre de corrupções textuais. Os manuscritos do TM conhecidos hoje em dia apresentam um número reduzido de variantes e que são, em sua totalidade, insignificantes. O texto bíblico preparado pela atividade massorética e que é a base de

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todas as edições modernas da Bíblia, é exatamente o mesmo há mais de 1000 anos, desde que os primeiros Massoretas que surgiram por volta do século VII.

O tipo textual do TM possui testemunhos antigos que atestam sua antiguidade e seu uso pelos judeus e pelos primeiros cristãos. Estes testemunhos incluem: os Targumin - comentários acerca de passagens bíblicas; a Peshita - tradução das Escrituras para o Siríaco; as traduções gregas de Áquila, de Símaco e de Teodocião; as recensões1 da LXX

feitas por Luciano e por Orígenes; a Vulgata Latina e os vários manuscritos encontrados no deserto da Judéia, e que são conhecidos como Manuscritos do Mar Morto, descobertos a partir de 1947 em Khirbet ou ruínas de Qumran, Wadi Murabba’at, Nahal Hever e Massada. A tudo isto, somem-se as milhares de citações rabínicas antigas e medievais, que também refletem o texto do TM.

A partir de 1450 a.D. com o surgimento da imprensa inventada por Johannes Gutenberg2, o TM vem sendo impresso de forma contínua, tanto por editores cristãos

como por judeus. Todas as primeiras edições críticas da Bíblia Hebraica - edições que discutem leituras variantes em um mesmo texto - surgidas desde o século XVIII, assim como as edições de Benjamin Kennicott (1776 - 1780) de Giovanni Bernardo Rossi (1784 - 1788), e a de Christian David Ginsburg (1908 - 1926), baseiam-se na forma textual estabelecida e transmitida pelos escribas e Massoretas.

Além das edições mencionadas acima, atualmente, existem outras cinco versões, que seguem determinados manuscritos Massoréticos pertencentes ao período do auge da atividade Massorética. Entre estas podemos citar:

 Bíblia Hebraica Kittel – símbolo = BHK.

 Bíblia Hebraica Stuttgartensia – símbolo = BHS.  Bíblia Hebraica Leningradensia – símbolo = BHL.

 Bíblia Hebraica Quinta – símbolo BHQ. Esta versão está sendo editada atualmente pelas Sociedades Bíblicas Unidas e está prevista, para ser publicada, em 2010. Esta versão deverá suceder a Bíblia Hebraica Stuttgartensia – BHS.

 Bíblia Hebraica do Hebrew University Bible Project – símbolo = HUBP3.

1 Recensões: 1) Recenseamento e, 2) Cotejamento do texto de uma edição com o respectivo

manuscrito.

2 Johann Gensfleisch Zum Laden Zum Gutemberg artesão alemão nascido no século XIV em Mainz na

Alemanha veio a falecer provavelmente, em 3 de Fevereiro 1468 também em Mainz. Gutemberg foi o responsável pela invenção da imprensa moderna, mediante a utilização de tipos móveis, esculpidos em madeira e revestidos de metal e tinta à base de óleo. Sua invenção foi única, e sua técnica não era conhecida, nem na China nem na Coréia do século XV. Até nos dias de hoje, podemos ver pequenas gráficas, usando a tecnologia inventada por Gutenberg.

3 Este projeto publicou, até o ano de 2003, somente os livros do profeta Isaías (entre 1975 e 1995) e do

profeta Jeremias (1997). Nestas edições, em seus aparatos críticos, são citadas várias fontes judaicas antigas e medievais, bem como a LXX, os manuscritos do Mar Morto, outros manuscritos Massoréticos, a literatura Talmúdica e a literatura rabínica medieval.

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 13

As três primeiras Bíblias Hebraicas mencionadas acima, estão todas baseadas no Códice4 de Leningrado, chamado: B 19a (L). E a última, da lista acima, está baseada no

Códice de Aleppo chamado de “Codice A”.

O Códice de Leningrado B 19ª - designado pela letra L - foi produzido em 1008 a.D. Estudiosos acreditam que o mesmo tenha sido copiado de um manuscrito produzido por Aaron ben Moseh ben Asher. Este manuscrito contém todo o Antigo Testamento.

O Códice de Aleppo - designado pela letra A - foi produzido por volta do ano 940 a.D. Foi originalmente encontrado em Jerusalém e de lá, levado para a cidade do Cairo no Egito. Do Cairo foi levado para Aleppo, no norte da Síria. É desta cidade que o manuscrito toma emprestado seu nome. Maimônides5 costumava referir-se a este

código, como o mais fidedigno - digno de fé; merecedor de crédito - de todos os que ele conhecia. Originalmente, o Codice A, continha o Antigo Testamento inteiro em 380 fólios – folhas escritas na frente e no verso - mas uma turba invadiu a sinagoga sefardita6

em 1498, e no processo, mais ou menos um terço do manuscrito foi destruído, restando somente 294 fólios atualmente. Depois da destruição, o manuscrito começa com a última palavra de Deuteronômio 28:17 – (

vu)misheadeteka

– tua amassadeira. Este manuscrito encontra-se, atualmente, na Universidade de Jerusalém sob os cuidados do Instituto Ben Zvi.

2. O Texto Protomassorético.

O texto consonantal do TM, anterior à época dos Massoretas, é chamado de texto Protomassorético, não contendo ainda a vocalização, a acentuação e o aparato Massorético, que foram desenvolvidos somente durante a Idade Média. O texto Protomassorético é um dos tipos textuais da Bíblia Hebraica utilizados pelos judeus, durante o período do Segundo Templo - c. 450 a.C. a 70 d.C., ao lado de outras formas textuais transmitidas naquela mesma época.

O texto Protomassorético, preservado e transmitido pelos escribas judeus na época do Segundo Templo, foi a base e a origem do TM desenvolvido pelos Massoretas, na época medieval. Este texto foi provavelmente o preferido pelos fariseus e pelos círculos dos escribas do Templo em Jerusalém, que o copiaram constantemente através dos séculos. Alguns estudiosos acreditam que esta forma textual foi a que teve a melhor transmissão e preservação, pelo foto de ter sido copiada meticulosamente seguindo regras estabelecidas pelos próprios escribas.

Os outros tipos textuais hebraicos existentes, ao lado do Protomassorético, eram o tipo que deu origem ao Pentateuco Samaritano e o tipo que deu origem à Septuaginta -

4 Chamam-se de “Códice” os manuscritos antigos montados em forma de “livros” modernos utilizando

“cadernos” de oito, dez ou doze folhas. A forma alternativa aos códices eram os rolos de papiro ou mesmo de pergaminho (couro de ovelhas, cabras, veados etc) ou vellum (couro de bois).

5 Moses Maimônides rabino judeu nascido em 30 de Março de 1135 a.D. em Córdoba na Espanha e

falecido em 13 de Dezembro de 1204 no Egito.

6 Do hebraico tardio “sepharadh”, naturais de Sepharadh, provável região da Ásia Menor que

posteriormente os emigrantes asiáticos identificaram com a Península Ibérica. Chamam-se de sefarditas os judeus descendentes dos primeiros israelitas de Portugal e da Espanha, expulsos, respectivamente, em 1496 e 1492. São também chamados de sefaraditas.

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designada pela sigla LXX7 - os quais discordam, em vários detalhes relativos ao texto, à

ortografia e à morfologia, do texto Protomassorético. Os eruditos costumam argumentar que estes outros tipos textuais são, na verdade, textos vulgarizados, transmitidos sem muitos critérios e sem obedecer a regras estabelecidas e, por isso, eles possuíam alterações como se vê no Pentateuco Samaritano e em certos manuscritos de Qumran. Mas apesar disto, todos eles eram de uso comum entre os judeus e nenhum deles tinha mais autoridade do que o outro no período pré-cristão.

3. O Pentateuco Samaritano.

O Pentateuco Samaritano, como o próprio nome revela, contém somente os cinco primeiros livros do Antigo Testamento - Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio - e tem sua origem relacionada aos judeus samaritanos. Estes judeus surgiram de casamentos mistos entre judeus e estrangeiros trazidos pelo imperador da Assíria, após destruir o reino do norte - reino de Israel em 722 a.C. Era prática, era comum dos imperadores Assírios, que desterravam parte da população dos territórios ocupados, transportando-as para outras regiões, igualmente ocupadas. Assim, parte da população do reino de Israel, foi desterrada para outras terras, enquanto povos de outras regiões, foram trazidos para Israel. Desta miscigenação entre judeus e estrangeiros surgiu esta raça mista conhecida como samaritanos.

As cópias manuscritas mais antigas do Pentateuco Samaritano são aproximadamente do ano 1100 a.D. Os estudiosos acreditam que estes manuscritos refletem, de maneira apropriada, texto antigos, produzidos originalmente entre 200 e 100 a.C.

Os judeus de Jerusalém viam os samaritanos como mestiços, raça não pura, e que faziam inúmeras concessões culturais, entre as quais, a mais grave, era a de se casarem com estrangeiros. Os samaritanos, por sua vez, consideravam que preservavam uma forma mais antiga e mais pura da fé do que os judeus que haviam retornado da Babilônia. Aqui, cabe lembrar, as palavras da mulher samaritana a Jesus quando disse: “Nossos pais adoravam neste monte; vós, entretanto, dizeis que em Jerusalém é o lugar onde se deve adorar – João 4:20”. Em suas palavras podermos notar que havia diferenças teológicas entre judeus e samaritanos. O Pentateuco Samaritano possui características que refletem estas diferenças. O texto do Pentateuco Samaritano oferece um testemunho, muito antigo, de como os samaritanos interpretavam o Pentateuco. Os samaritanos como que ajustaram o texto do Pentateuco para refletir suas próprias conveniências e isto, torna este manuscrito uma testemunha mais fraca.

O Pentateuco Samaritano era desconhecido pelo mundo ocidental até 1616, quando foi descoberto por Pietro della Valle, em Damasco, na Síria. Após a descoberta do texto, o Pentateuco Samaritano foi incluído na Poliglota8 Parisiense produzida entre 1629 e

1645, bem como na Poliglota Londrina produzida entre 1654 e 1657.

7 A Septuaginta, comummente identificada pelo símbolo LXX, é a tradução das escrituras hebraicas para

o grego realizada no Egito sob o patrocínio do Ptolomeu II Filadelfo (285–246 a.C.

8 Chama-se de “Poliglota” a publicação de textos, sejam do Antigo Testamento sejam do Novo

Testamento em colunas paralelas como a Poliglota publicada no Brasil pela Sociedade Bíblica do Brasil e Edições Vida Nova contendo o texto do Antigo Testamento em Hebraico (TM conforme editado na Bíblia Hebraica Stuttgartensia), Grego (Septuaginta, texto editado por Alfred Ralphs), Português (versão de Almeida Revista e Atualizada – ARA) e Inglês (texto da The New International Version).

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 15

Em 1815, Wilhelm Gesenius considerou o texto impróprio para a crítica textual do Pentateuco, por conter alterações deliberadas feitas pelos Samaritanos. Outros estudiosos, entre os quais podemos citar Abraham Geiger e Paul E. Kahle, vieram a considerar o Pentateuco Samaritano como um testemunho de grande valor para a crítica bíblica. Começando no final do século XIX e, estendendo-se por todo século XX, os estudos acerca do Pentateuco Samaritano, esclareceram sua natureza, o seu tipo textual e a sua relação com o TM - Texto Massorético. Estes estudos constataram cerca de 6.000 variantes com relação ao texto do TM e cerca de 1900 leituras concordantes com a LXX - Septuaginta. A maioria das variantes é de ordem ortográfica - grafia correta e pontuação, lingüística - língua e gramática, fonológica - sistemas sonoros da língua - e de vocabulário - conjunto de palavras. As diferenças que mais chamaram a atenção dos estudiosos, todavia, foram as de cunho ideológico, que foram inseridas no texto em defesa de pontos de vista dos próprios Samaritanos. Entre estas diferenças podemos citar:

 Diferenças relacionadas às cronologias do período patriarcal, no livro de Gênesis, e da importância de Siquém, quanto ao estatus religioso quando comparada com Jerusalém,9 – ver Gênesis 12:6 e 33:18 a 34:2. Os samaritanos achavam que a

cidade de Siquém já existia nos dias de Abrão (circa 2100 a.C) conforme Gênesis 12:6. Isto era importante para eles porque a cidade de Siquém ficava bem no centro da terra de Canaã onde estava localizado o centro do reino de Israel (após a divisão entre os reinos de Judá e Israel), com sua capital em Samaria. Mas na realidade esta cidade de Siquém foi assim chamada por causa do filho de um príncipe Heveu homônimo que existiu nos dias de Jacó (pelo menos 200 anos depois de Abrão ter passado por lá). Então o que aconteceu? Nós precisamos entender que quem escreveu o livro de Gênesis foi Moisés por volta do ano 1440-1400 a. C. Portanto, quando Moisés escreveu o livro de Gênesis aquela localidade chamava-se Siquém. Assim sendo quando Moisés a chama de Siquém nos dias de Abrão o faz em sentido de antecipação e não querendo indicar que aquela localidade já era conhecida por Siquém nos dias de Abrão.

 Diferenças com relação a mandamentos adicionais ordenando a construção de um templo no monte Gerizim como, por exemplo, em Deuteronômio 11:29. Na grafia Samaritana a expressão monte Gerizim aparece como uma palavra –

hargerizim

– montegerizim, enquanto que em hebraico a grafia é – har gerezim – monte gerezim.

De acordo com os estudos paleográficos, textuais, históricos e, principalmente, dos Manuscritos de Qumram, o tipo textual do Pentateuco Samaritano pertence ao período do Segundo Templo e não é anterior ao século II a.C. Este dado, coloca o surgimento do Pentateuco Samaritano, solidamente, no período da história de Israel, conhecido como época dos Hasmoneus10.

9 Jerusalém – Origem do nome é desconhecida. Certamente está relacionada a Salém (Paz) e estudiosos

especulam entre “fundada em paz” ou “cidade da paz”. A primeira parte do nome “Jeru” é obscura e não possui origem hebraica – ver mais detalhes em “Jerusalém” na Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia escrita e editada por R. N. Champlin, publicada pela Editora Hagnos, São Paulo, SP.

10 Hasmoneus, nome pelo qual é conhecida a dinastia judaica que conseguiu uma relativa

independência do jugo grego das dinastias dos Selêucidas centrada na Síria e dos Ptolomeus centrada no Egito. Esta dinastia teve início (165 a.C) com a rebelião comandada por um sacerdote chamado

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4. Os Manuscritos do Mar Morto.

Um jovem pastor beduíno, da tribo de Taamireh, chamado Muhammad adh-Dhib, descobriu os primeiros manuscritos em uma caverna, na região do Mar Morto em 1947. Nesta, que foi a primeira descoberta de manuscritos naquela região, foram descobertos dois rolos do profeta Isaías - como o que é mencionado em Lucas 4:16 – 17 - um completo e outro fragmentado. Além destes foram encontrados ainda na caverna 1 de Qumran, dois importantes manuscritos grafados pela própria comunidade, conhecidos como Gênesis Apokryphon - 1 Q Gen Apo - e o Rolo da Guerra – Milhamâ - 1 Q M. Após esta descoberta, arqueólogos e historiadores11 exploraram toda aquela região, incluindo

as localidades de Hirbet Qumran, Wadi Murabba’at, Nahal Hever, Massada, Hirbet Feshkha, Hirbet Mid e Ein Guedi Estas explorações mostraram-se muito produtivas, pois através delas, foram encontrados inúmeros manuscritos grafados em papiros. Estes manuscritos, estavam grafados em hebraico, aramaico e também em grego. Todos estes documentos, grafados em papiros, foram produzidos entre os anos 200 a 100 a.C., e nos mesmos, nós podemos encontrar manuscritos de todos os livros do Antigo Testamento, com exceção, do livro de Ester. Os manuscritos oferecem também, muitas informações acerca da comunidade de Qumran e discutem as práticas religiosas e as atividades diárias. Todos estes manuscritos revelam vários tipos textuais da Bíblia Hebraica existentes no período do Segundo Templo. Neles estão representados o texto hebraico que deu origem à LXX, o tipo textual hebraico do Pentateuco Samaritano, assim como o tipo textual do Texto Massorético. Segundo a estimativa de alguns estudiosos, o total de manuscritos encontrados gira em torno de 823, enquanto outros fornecem o número de 668 manuscritos. O total de textos bíblicos achados em Qumran é de aproximadamente 190.

Além dos textos bíblicos, foram encontrados livros apócrifos/deuterocanônicos12 - tais

como os livros do Eclesiástico e Tobias, pseudoepígrafos13 - tais como o Livro dos Jubileus

e o Testamento dos XII Patriarcas - targumim14 do livro de Jó e de Levítico e um grande

número de escritos produzidos pela própria comunidade de Qumran, tais como: o Apócrifo do Gênesis, a Regra da Comunidade, o Rolo do Templo, a Regra da Guerra, o Documento de Damasco, Cânticos de Louvor ou Hodayot, os Pesher15 de Habacuque e

de Naum e o Rolo de Cobre, entre outros. Além dos livros, alguns objetos sagrados judaicos como tefilim ou filactérios e alguns mezuzot ou objetos fixados nos batentes das portas, também se encontravam no local das descobertas; estes mezuzot, que são

Matatias, seu filho Judas, chamado Macabeus e seus irmãos João, Simão, Eleazar e Jonatan. O fim veio com a invasão dos Romanos comandados por Pompeu em 64 a.C.

11 Entre estes podemos citar: Eleazar L. Sukenik, Harold H. Rowley, William F. Albright, Roland de Vaux, A.

Supont-Sommer, Yigael Yadin, Nahman Avigad, Josef T. Milik e Geza Vermes.

12 Chama-se de livros apócrifos/deuterocanônicos à coleção de livros que foram acrescentados ao cânon

da Bíblia Católica Romana a partir no Concílio de Trento que visava combater a Reforma Protestante.

13 Chama-se de livros pseudoepigráficos à coleção de livros produzidos por diversos autores que, visando

aumentar a aceitação de seus escritos, atribuíam os mesmos a famosos personagens do passado.

14 Do hebraico – targum, os Targumin eram traduções dos livros do Antigo Testamento, do hebraico para

o aramaico, que iam muito além da versão original. Neles encontramos comentários, ampliações, alterações, narrativas, interpretações, explicações e tradições rabínicas.

15 Do hebraico – pesher é o termo aplicado aos textos do Mar Morto que contêm explicações ou

comentários a respeito dos textos bíblicos. Os comentários são relacionados a acontecimentos escatológicos ou referentes ao fim dos tempos.

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 17

usados pelos judeus até os nossos dias, continham pequenos trechos bíblicos – como, por exemplo, Deuteronômio 6:8 - 9. De todas as cavernas, as que forneceram materiais mais importantes, foram as de número I, IV e IX. Segundo os eruditos, somente na gruta IV, foram encontrados cerca de 580 manuscritos, vários dos quais em estado muito fragmentário. Além de textos bíblicos em hebraico, também foram achados textos em aramaico e manuscritos da LXX em grego nas grutas IV e VII.

Como mencionamos acima, o tipo de texto do TM está representado nos manuscritos de Qumran e esta representação é a mais significativa de todas, pois cerca de 60% de todo o material do Antigo Testamento, encontrado em Qumran, concorda com o TM. Assim temos que o nível de concordância textual destes manuscritos com o TM é muito grande, o que serve para comprovar a antiguidade do tipo textual ao qual pertence o texto preservado pelos escribas e mais tarde pelos massoretas durante a Idade Média. De todos os livros do Antigo Testamento, o Pentateuco apresenta uma maior homogeneidade em sua transmissão textual.

A comunidade de Qumran, ao que parece tinha mais apreço por determinados livros bíblicos, por serem provavelmente mais populares, entre os adeptos do grupo. Estes textos bíblicos são representados por muitas cópias encontradas em Hirbet Qumran como, por exemplo: Gênesis 16 e 17, Êxodo 13, Deuteronômio 25, Isaías 20 a 24 e o Salmo 34. Até hoje há divergências em torno da identidade da comunidade de Qumran. Segundo alguns, esse grupo seria identificado com os essênios, um dos vários ramos do judaísmo no período dos 200 anos que antecederam o advento de Cristo, juntamente com os fariseus, os saduceus e os zelotes. A identificação da comunidade de Qumran com os essênios continua em aberto até o presente momento.

5. Os Fragmentos da Guenizá

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do Cairo.

Um grande lote de manuscritos do Antigo Testamento foi encontrado, “oficialmente”, em 1896, na guenizá da Sinagoga Ben Ezra em Fustat, na parte antiga da cidade do Cairo, no Egito. Esta sinagoga havia sido, até o ano 882 d.C. uma antiga igreja cristã, chamada de Igreja de São Miguel. Naquele ano, ela foi vendida para um grupo de Judeus, que a converteram em seu templo religioso. Em todas as sinagogas judaicas existe um espaço especialmente separado para guardar todo o material que não esteja mais em uso pela comunidade. Este material é geralmente composto de cópias dos livros do Antigo Testamento e de livros litúrgicos e outros materiais usados na liturgia. Este cuidado era necessário, pela convicção que os Judeus têm, de que todo o material que contenha o nome inefável de Deus IHVH – o eterno, precisa ser sempre guardado com a maior reverência. Era também costume, de vez em quando, retirar todo o material da guenizá e providenciar que o mesmo fosse cuidadosamente enterrado, visando impedir que o mesmo fosse profanado. No caso específico da guenizá da Sinagoga Ben Ezra no Cairo, os manuscritos que estavam lá, foram esquecidos e uma parede foi construída obstruindo o acesso à guenizá. Talvez alguém tenha pensado em retirá-la de lá antes de a parede ser completamente fechada, talvez foi deixada ali propositadamente protegida de mãos que pudessem profanar os documentos nela contidos. Nunca

16 O termo hebraico - guenizá – significa esconderijo, arquivo, tesouro, armário e depósito. Identifica, nas

sinagogas judaicas, o local onde são recolhidos os livros sagrados, os livros litúrgicos e os objetos rituais que não estão mais em uso.

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saberemos o que realmente aconteceu. O fato é que uma quantidade enorme de documentos ficou escondida atrás daquela parede.

Existem informações precisas de que, por volta de 1860, o esconderijo havia sido descoberto e os primeiros fragmentos começaram a ser retirados da guenizá e começaram a circular. Nos dias de hoje, os muitos milhares de manuscritos fragmentários da guenizá da Sinagoga Ben Ezra, estão espalhados por diversas coleções entre as cidades de Oxford, Londres, Nova York, São Petersburgo outras. A coleção mais importante, devido à quantidade de manuscritos e a importância do material que contém, é a Coleção Taylor-Schechter, pertencente à Biblioteca da Universidade de Cambridge. Os responsáveis por esta coleção foram o próprio Salomão Schechter e o Dr. Charles F. Taylor, diretor do St. John’s College, matemático e hebraísta cristão. Outra grande coleção pode ser encontrada na Biblioteca Bodleian, em Oxford.

Segundo estimativas de estudiosos, a Coleção Taylor-Schechter possui cerca de 140.000 fragmentos de manuscritos, que estão sendo catalogados até ao dia de hoje (Janeiro de 2006). O número total do material da guenizá, segundo estimativas, gira em torno de 200.000 fragmentos. O estudioso Emanuel Tov informa que dessa quantidade cerca de 10.000 são fragmentos bíblicos, muitos dos quais não foram ainda publicados. Estes manuscritos apresentam sistemas diversos de notas massoréticas, vocalização e acentuação e também apresentam uma escrita hebraica cuidadosa enquanto que outros fragmentos foram escritos de maneira descuidada.

C. A Transmissão do Texto em Outras Línguas.

1. A Septuaginta – LXX.

Um dos maiores testemunhos da transmissão do texto bíblico é a versão grega conhecida como Septuaginta - Setenta – LXX em algarismos romanos - que foi a primeira tradução completa do texto bíblico hebraico para outro idioma. A importância dessa tradução é enorme, pois além de ser um reflexo do judaísmo helenístico, também foi fonte de inspiração para os escritores do Novo Testamento e para os escritos teológicos dos chamados Pais da Igreja. Vários conceitos cristãos foram diretamente tomados da tradução que estamos chamando de Septuaginta - LXX. As comunidades cristãs espalhadas pelo Império Romano, que não falavam grego ou latim, mas que tinham sua própria língua nacional, conheceram o texto da Bíblia, através de traduções feitas da Septuaginta - LXX e isso, basta para demonstrar a sua influência e importância dentro da história do cristianismo primitivo.

O uso da Septuaginta - LXX pelos judeus, durou até o inicio do segundo século da Era cristã, quando o judaísmo sentiu a necessidade de novas traduções, feitas a partir do texto hebraico, mas refletindo os conceitos do judaísmo rabínico de então. Com o passar do tempo, a LXX tornou-se a Bíblia por excelência da Igreja Cristã e seu impacto no cristianismo, nos seus primeiros séculos, foi definitivo, pois nessa tradução bíblica, os cristãos encontraram respaldo para as suas afirmações e para suas doutrinas.

A LXX é considerada, por muitos estudiosos, uma das mais importantes versões da Bíblia Hebraica e seu texto serviu, e serve até hoje, para estudos, pesquisas e reflexões sobre a tradição textual existente nos últimos três séculos anteriores à Era cristã. Além disso, o seu

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 19

texto é uma das principais referências para os estudos de crítica textual do texto em hebraico.

2. Data e Origem da Septuaginta – LXX.

A primeira tradução completa do Antigo Testamento foi para a língua grega. Esta tradução feita por volta do século III a.C. em Alexandria, no Egito. Ela é importante para a crítica bíblica, tanto textual como literária, para a antiga exegese, para a terminologia do Novo Testamento, como também para a tradição histórica do texto bíblico. O nome dessa versão grega é Setenta -

ebdomékonta

- setenta. O nome em latim desta tradução é Septuaginta e em hebraico é

– tergum ha-siveim

- tradução dos Setenta. Esse nome, em grego, vem da carta apócrifa conhecida como Carta de Aristéias, escrita por volta de 130 a.C., e que pretende narrar a origem dessa antiga tradução. A Carta de Aristéias informa-nos que o rei do Egito, Ptolomeu II Filadelfo – 285 - 247 a.C., desejava ter um cópia da – T

orah

- instrução ou ensino - composta dos 5 primeiros livros do Antigo Testamento que é também chamada de Pentateuco - traduzida para o grego. Para essa finalidade, ele enviou uma delegação - incluindo o próprio Aristéias - para Jerusalém, requisitando a Eleazar, o sumo sacerdote naqueles dias, uma cópia da – T

orah

- instrução ou ensino, e um grupo de sábios para traduzi-la em Alexandria. O seleto grupo de sábios era composto de 72 judeus versados em hebraico e grego - seis de cada uma das tribos de Israel. Ao chegar a Alexandria, o grupo se apresentou perante o rei Ptolomeu e expôs a sua sabedoria e conhecimento e, com isso, impressionou tanto ao rei como à sua corte. Logo após esses acontecimentos, os tradutores iniciaram o trabalho na ilha de Faros, defronte a Alexandria. Cada um trabalhava em uma cela separada com uma cópia da – T

orah

- instrução ou ensino. A obra de tradução foi concluída em 72 dias e constatou-se que todas as traduções eram absolutamente idênticas.

O objetivo do relato da carta de Aristéias era elevar e legitimar, o valor da LXX, perante os judeus que viviam em Alexandria e na diáspora, e que falavam o grego como língua do cotidiano. Com o passar do tempo, outros autores, tanto judeus como cristãos, acrescentaram dados à história de sua origem. Aristóbulo, Fílon de Alexandria, Flávio Josefo, fontes rabínicas e cristãs, colaboraram para que a imagem e a autoridade da LXX fossem reconhecidas por aqueles que desejavam conhecer e usar a versão da Bíblia Hebraica em sua roupagem grega.

Dos vários autores que escreveram sobre a origem da LXX, dois forneceram duas concepções importantes que seriam seguidas principalmente pelos cristãos. Eles são:

a. Fílon de Alexandria (25 a.C. - 40 d.C) afirmou que a LXX era uma tradução inspirada.

b. Flávio Josefo (c. 37/38 – 100 d.C), por sua vez, argumentou que essa versão possuía uma fidelidade literal ao hebraico, portanto, era de boa qualidade.

Os Pais da Igreja normalmente aceitavam as opiniões tanto de Fílon como de Josefo; entre esses estavam Justino Mártir, Clemente de Alexandria, Irineu de Lião, Cirilo de Jerusalém, Ambrósio de Milão, Hipólito de Roma, Agostinho de Hipona, e outros.

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Outro dado da carta de Aristéias é que ela só se refere à tradução da – Torah - instrução ou ensino, não mencionando os outros livros bíblicos. Em sentido lato, a lenda da origem da LXX foi aplicada também aos demais escritos bíblicos, traduzidos posteriormente, e sob seu nome, estão englobados todos os livros do cânone hebraico, juntamente com os livros típicos do cânone grego. Da narrativa da Carta de Aristéias podemos tirar duas conclusões que se aproximam da verdade:

a. Por volta do século III a.C. apareceu uma tradução grega da – Toráh - instrução ou ensino.

b. Essa versão foi feita em Alexandria, no Egito.

Os estudiosos, de acordo com as suas pesquisas, acreditam que a tradução da LXX não foi um único projeto de algum grupo específico, mas sim, um trabalho realizado por diversos tradutores em épocas distintas, com estilos e métodos diferentes e, além disso, cada um possuía um conhecimento relativo da língua hebraica. A LXX demorou para ser concluída e, provavelmente, a –

Toráh

- instrução ou ensino, apareceu em 250 a.C.; com os Profetas aparecendo por volta de 75 a.C. e, por último, os Hagiógrafos, que teriam surgido somente em 90 d.C. Desse modo, a versão apresenta-se muito irregular e reflete diversas concepções e métodos distintos de tradução17.

O empenho de se traduzir as Escrituras hebraicas para o grego, foi fruto da própria comunidade judaica de Alexandria, que não falando mais o hebraico no dia-a-dia, desejava ler e compreender a Bíblia Hebraica em sua língua cotidiana, o grego. Os motivos da tradução, possivelmente, foram de ordem litúrgica, devocional e para estudos. Outro motivo foi fazer da Bíblia Hebraica uma obra conhecida pelos não judeus, para que estes pudessem lê-la e estudá-la – como em Atos 8:26 - 33.

Assim, quando havia a necessidade de se traduzir determinado livro bíblico, um grupo ou pessoa fazia a versão para a comunidade. Muitos livros foram traduzidos por mais de um tradutor, como, por exemplo, Isaías, Jeremias, e os Doze Profetas que tiveram dois tradutores; Ezequiel teve três tradutores, e assim por diante. Em relação ao Pentateuco, cada um de seus livros foi traduzido por uma única pessoa. Os estudiosos argumentam que a LXX foi, na verdade, uma coleção de traduções gregas feitas de maneira independente por várias pessoas e grupos da comunidade judaica do Egito, refletindo o espírito e as concepções do judaísmo helenístico.

Segundo os estudiosos, a qualidade da tradução da LXX é muito irregular e, além disso, os tradutores tinham diferentes níveis de conhecimento do hebraico. Os livros foram traduzidos obedecendo a métodos diversos e técnicas de tradução variadas. Pode-se analisar alguns tipos de tradução encontradas ao longo dos livros da LXX:

a. O Pentateuco e os livros Históricos são fiéis.

17 Não há consenso entre os eruditos sobre a data do término e do aparecimento de todos os livros em

grego. Alguns argumentam que todos os livros já estavam traduzidos em torno de 150 a.C., enquanto outros defendem uma data mais tardia, pelo menos para os livros do bloco do Escritos, que teriam sido finalmente traduzidos por volta de 90 d.C.

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Bíblia – Antigo e Novo Testamento – Capítulo 1 - O que é o Antigo 21 b. Profetas e Salmos são literais.

c. Cantares e Eclesiastes são servis.

d. Os livros de Jó, Provérbios, Daniel e Ester são traduções livres.

À medida que os livros vão se distanciando do Pentateuco, a qualidade vai decaindo. Em relação à fidelidade à língua grega, os livros também não são homogêneos:

a. Jó e Provérbios são bons.

b. O Pentateuco, Josué e Isaías são versões medíocres. c. Os outros livros são de qualidade mais inferior ainda.

Isto aconteceu devido ao fato de os tradutores, além de não terem um conhecimento pleno do hebraico, também não eram competentes na gramática e na composição gregas.

Em muitas passagens, a LXX, em vez de simplesmente traduzir o texto hebraico, faz uma interpretação e, assim, nem sempre é fiel à sua fonte hebraica. Várias expressões hebraicas foram adaptadas a um ambiente judaico helenizado. Alguns exemplos podem ser dados como ilustração:

Texto Massorético - TM Septuaginta - LXX

Mão do Eterno Poder do Senhor

O Eterno é a rocha de Israel O Senhor é o auxílio de Israel O manto do Eterno A glória do Senhor

O rosto do Eterno A presença do Senhor O braço do Eterno A força do Senhor

Outros termos hebraicos, também sofreram interpretação quando foram traduzidos na LXX. Entre estes encontramos:

Texto Massorético - TM Septuaginta - LXX

hessed

- bondade

éleos

- misericórdia

qahal

– reunião

ekklissia - assembléia

mashiah

– ungido - Messias

Christos

- Cristo

Toráh

- instrução ou ensino

nómos

- lei

malak

- mensageiro

angelos

- anjo

IHVH

- o Eterno

kúrios

- Senhor

A Septuaginta – LXX, ao fazer modificações e interpretações de termos hebraicos, quando os mesmos foram traduzidos para o grego, acabou por fornecer uma terminologia específica que foi posteriormente usada pelo Novo Testamento e pelos primeiros cristãos. Das 350 citações do Antigo Testamento feitas pelo Novo Testamento, 300 foram tiradas da Septuaginta – LXX! Durante os três primeiros séculos da Era cristã, a Septuaginta – LXX foi, por excelência, a Bíblia da Igreja Cristã. Além de interpretar

Referências

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