Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.177.636 - RJ (2010/0017190-9)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
R.P/ACÓRDÃO : MINISTRO SIDNEI BENETI
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RECORRIDO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
ADVOGADO : FABRÍCIO EL JAICK RAPOZO - DEFENSOR PÚBLICO
INTERES. : B D DE S C F
INTERES. : V A DA S F
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL. DEFENSORIA PÚBLICA. ATUAÇÃO COMO CURADOR ESPECIAL. HIPÓTESES EM QUE INCAPAZ NÃO É PARTE. INTERVENÇÃO OBRIGATÓRIA NÃO CONFIGURADA. SOBREPOSIÇÃO DAS FUNÇÕES DO PARQUET E DO CURADOR. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1.- Não há obrigatoriedade de intervenção geral da Defensoria Pública em prol de incapazes nos processos em estes que não sejam partes, ainda que haja alegação de ameaça ou violação de algum direito da criança ou do adolescente.
2.- Já atuando o Ministério Público no processo como "custos legis" não ocorre necessidade da intervenção obrigatória do Defensor Público para a mesma função.
3.- O art. 9º, I, do CPC, dirige-se especificamente à capacidade processual das partes e dos procuradores. Dessa forma, a nomeação de Curador Especial ao incapaz só ocorre, de forma obrigatória, quando este figurar como parte, não na generalidade de casos que lidem com crianças ou adolescentes, sem ser na posição processual de partes, ainda que se aleguem fatos graves relativamente a eles.
4.- Recurso Especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sidnei Beneti, divergindo da Sra. Ministra Relatora, no que foi acompanhado pelos Srs. Ministros Massami Uyeda, Paulo de Tarso Sanseverino e Villas Bôas Cueva, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, dar provimento ao Recurso Especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Sidnei Beneti.Votaram com o Sr. Ministro Sidnei Beneti os
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Srs. Ministros Massami Uyeda, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva. Lavrará o acórdão o Sr. Ministro Sidnei Beneti.
Brasília, 18 de outubro de 2011(Data do Julgamento)
Ministro SIDNEI BENETI Relator p/ Acórdão
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CERTIDÃO DE JULGAMENTOTERCEIRA TURMA
Número Registro: 2010/0017190-9 REsp 1.177.636 / RJ
Números Origem: 200800239180 20082020238451 200913509889 391802008
PAUTA: 13/09/2011 JULGADO: 13/09/2011
SEGREDO DE JUSTIÇA Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MASSAMI UYEDA Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOÃO PEDRO DE SABOIA BANDEIRA DE MELLO FILHO Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA AUTUAÇÃO
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RECORRIDO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ADVOGADO : FABRÍCIO EL JAICK RAPOZO - DEFENSOR PÚBLICO INTERES. : B D DE S C F
INTERES. : V A DA S F
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Família - Tutela e Curatela
SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr(a). CHRISTINA AIRES CORRÊA LIMA(procuradora do Estado - representação ex legis) , pela parte RECORRIDA: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, adiou o julgamento deste processo para sessão do dia 15.9.2011, por indicação do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a).
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.177.636 - RJ (2010/0017190-9)
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RECORRIDO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
ADVOGADO : FABRÍCIO EL JAICK RAPOZO - DEFENSOR PÚBLICO
INTERES. : B D DE S C F
INTERES. : V A DA S F
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):
Cuida-se de recurso especial interposto pelo MINISTÉRIO
PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, com base no art. 105, III, “a”,
da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do
Estado do Rio de Janeiro (TJ/RJ).
Ação: de apuração de infração administrativa às normas de proteção
à criança, ajuizada pelo Conselho Tutelar de Jacarepaguá/RJ, em desfavor de B.
D. de S. C. F. e V. A. da S. F., por suspeita de abuso sexual perpetrado contra
seus filhos, J. G. D. de S. C. F. E J. V. de S. C. O Ministério Público atua no
processo na qualidade de custos legis . No curso do processo, a DEFENSORIA
PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO requereu sua nomeação para
atuar no processo na condição de curador especial dos menores.
Decisão monocrática: o juiz indeferiu o pedido da DEFENSORIA
PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, sob o argumento de que “as
crianças não são réus da relação processual”, e de que “haveria colidência nas
funções do parquet e do Curador” (e- STJ, fls. 14/15). Foi interposto agravo de
instrumento contra essa decisão.
Acórdão: deu provimento ao agravo de instrumento interposto
pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, conforme
a seguinte ementa (e-STJ, fls. 78/82)
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ESPECIAL – NECESSIDADE – ART. 9º, I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
- A hipótese é de Agravo de Instrumento ofertado contra a decisão de fls. 12/13, que indeferiu a nomeação de Curador Especial, sob o fundamento de que os menores não seriam Réus da relação processual e o Ministério Público estaria atuando não só como custos legis, mas também em prol dos interesses dos menores.
- O cerne da questão seria a necessidade da nomeação de Curador Especial para atuar no feito relativo à representação administrativa ajuizada pelo Conselho Tutelar de Jacarepaguá em face da genitora dos menores e de seu marido, tendo em vista a suspeita de abuso sexual por parte deste último.
- Compete à Defensoria Pública o múnus da Curadoria Especial, nos termos do art. 148, parágrafo único, “f”, da Lei 8.069/90 e do art. 22, X, da Lei Complementar nº 06/77.
- A intervenção do Ministério Público não supre a falta de Curador. - Agravo provido.
Recurso especial: interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO
ESTADO DO RIO DE JANEIRO, com base na alínea “a” do permissivo
constitucional (fls. 106/125), sustenta violação dos arts. 9º, I, do CPC e 148,
parágrafo único, “f”, do ECA, sob o fundamento de que o ECA não estabeleceu a
obrigatoriedade de atuação da Defensoria Pública em todos os processos em que
se discutam interesses de menores, mas apenas quando esses forem parte e a
Defensoria for provocada a atuar em defesa dos interesses do necessitado.
Retenção do recurso especial: o especial foi retido pelo TJ/RJ, com
fulcro no art. 542, § 3º, do CPC, tendo sido deferida liminar para
destrancamento, em sede da MC 15.919 de minha relatoria.
Exame de admissibilidade: o recurso foi admitido na origem pelo
TJ/RJ (e-STJ fls. 165).
Parecer do Ministério Público Federal: i. Subprocurador-Geral da
República Dr. Antônio Carlos Pessoa Lins opinou pelo não conhecimento e
improvimento do recurso especial, para manter o acórdão recorrido.
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.177.636 - RJ (2010/0017190-9)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
RECORRIDO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
ADVOGADO : FABRÍCIO EL JAICK RAPOZO - DEFENSOR PÚBLICO
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VOTO VENCIDO
A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):
Cinge-se a controvérsia a verificar a necessidade de nomeação de
defensor público como curador especial de incapaz em processo envolvendo
suspeita de abuso sexual de menor, no qual o Ministério Público já atua como
fiscal da lei.
Os dispositvos legais apontados pelo recorrente como violados foram
objeto de decisão pelo Tribunal de origem, ficando, portanto, cumprida a
exigência do prequestionamento.
I – Da tutela dos interesses dos incapazes (art. 9°, I, do CPC e
art. 148, parágrafo único, “f”, da Lei 8.069/90).
Em sede da MC 15.919, após um juízo perfunctório do mérito do
recurso especial, foi consignado que a curadoria especial se destina à
representação processual do incapaz, e não à sua representação material, de
modo que, não sendo os menores em questão parte da ação ajuizada pelo
Conselho Tutelar, a participação da Defensoria Pública se mostra dispensável, até
porque o Ministério Público já atua no processo, não apenas como custos legis ,
mas também no interesse das crianças, nos termos do art. 202, do ECA.
Entretanto, analisando a questão com maior profundidade, verifica-se
que o art. 9°, I, do CPC determina a nomeação de curador especial ao incapaz
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que não tiver representante legal ou se os seus interesses colidirem com os do seu
representante. Da mesma maneira, o faz o art. 142, parágrafo único, do ECA.
Essa é exatamente a hipótese dos autos, em que os interesses dos
menores estão em franca colidência com os interesses dos seus representantes
legais, sob os quais recai suspeita de abuso sexual. Assim, fica evidenciado que os
menores não poderão ter seus interesses resguardados e defendidos por
intermédio de seus representantes legais, fazendo-se necessária a atuação de um
curador especial, nos termos do art. 9º, I, do CPC.
Observe-se que, embora os menores não façam parte da
representação administrativa instaurada pelo Conselho Tutelar, eles são os
verdadeiros interessados no resultado do processo, o qual lhes afetará direta e
indubitavelmente. Por isso que esses interesses deverão ser tutelados por quem a
lei confere essa incumbência.
Embora o art. 202 do ECA disponha que o Ministério Público deverá
atuar na defesa dos direitos e interesses dos menores, essa atuação, quando não
for na qualidade de parte, propondo ações que visem à tutela da criança e do
adolescente, será na qualidade de fiscal da lei, cujo papel vincula-se à defesa da
sociedade como um todo, à defesa do ordenamento e à garantia de cumprimento
da lei. Nesse sentido, ISHIDA, Válter Kenji, Estatuto da Criança e do
Adolescente, doutrina e jurisprudência , 11?ed., São Paulo? Atlas, 2010, p. 419
e GRECO FILHO, Vicente, Direito Processual Civil Brasileiro , São Paulo?
Saraiva, 2003, p. 155).
Assim também:
(...) O parágrafo único do art. 9º do Código de Processo Civil não impõe ao Ministério Público o dever de atuar como representante judicial dos incapazes. Sua atuação, em processos em que figurarem como parte pessoas desprovidas de capacidade civil, decorre do art. 82, II da mesma norma. Sua participação nessa hipótese, todavia, dá-se não como curador especial, mas como fiscal da lei (Resp 67278/SP - Rel. Ministro EDUARDO RIBEIRO - DJ 17/12/1999) (sem
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destaques no original)Não obstante, essa atuação não supre, nem exclui a atuação do
defensor público, na defesa dos interesses dos menores, na especial situação
fática analisada - de suspeita de abuso sexual dos menores pelos pais -, na qual há
evidente colidência do interesse dos menores com o de seus representantes legais.
Pelo contrário, o art. 148, parágrafo único, “f”, também do ECA,
trata exatamente da necessidade de designação de curador especial para a criança
ou adolescente nas hipóteses de apresentação de queixa ou representação ou
outros procedimento judiciais e extrajudiciais em que seus interesses estejam
envolvidos.
Diante da gravidade dos fatos que estão sendo objeto de apuração, a
atuação da Defensoria Pública, nessa situação, constitui garantia a mais no
resguardo dos interesses dos menores e, conforme já mencionado, essa atuação
independe da qualificação jurídica dos menores como parte no processo,
bastando que seus interesses estejam envolvidos, como se verifica na hipótese.
Também não há que se falar em necessidade de provocação da
Defensoria Pública pela parte ou necessidade de mandato para sua atuação.
Consoante as lições de LUIZ GUILHERME MARINONI, trazidas pelo Min.
HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO, ao proferir decisão em sede da
MC 16228 (Dje 13.11.1009), “a sua autorização vai implícita no próprio ato de
nomeação", mesmo porque a criança não dispõe de capacidade para outorgar os
poderes de representação.
Em suma, de acordo com o art. 4º da LC nº 80/94, alterada pela LC
nº 132/09, trata-se de “função institucional da Defensoria Pública o exercício da
defesa da criança e do adolescente, devendo esse órgão intervir nos
procedimentos quando houver necessidade” (ROSSATO, Luciano Alves,
LÉPORE, Paulo Eduardo, CUNHA, Rogério Sanches, Estatuto da Criança e do
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Adolescente Comentado, 2ªed, São Paulo: RT, 2011, p. 482). E, na hipótese,
vislumbro essa necessidade de atuação do defensor, como curador especial, em
prol dos interesses dos menores, sem que isso implique colidência ou supressão
da atuação do Ministério Público, como fiscal da lei.
Com efeito, ressalto que, na hipótese, a gravidade dos fatos –
suspeita de abuso sexual dos menores – justifica a atuação do defensor público, já
que, exercendo a função de custus legis , o Ministério Público atua principalmente
na verificação da aplicação da própria norma (ECA) e não na defesa dos
interesses dos menores envolvidos.
Não vislumbro, assim, qualquer violação dos dispositivos legais
apontador pelo recorrente. Ao contrário, eles foram corretamente aplicados pelo
Tribunal de origem.
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RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
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VOTO-VISTA (VENCEDOR)
O EXMO. SR. MINISTRO SIDNEI BENETI:
1.- Trata-se de definir se, em processo ajuizado pelo Conselho Tutelar contra genitores de menores sob a alegação de abuso sexual, deve atuar, além do Ministério Público, na qualidade de “custos legis”, também a Defensoria Pública, obrigatoriamente, com fundamento no art. 9º, I, do Cód. de Proc. Civil, e art. 148, § ún., letra “f”, do Estatuto da Criança e do Adolescente.
2.- Peço licença para divergir do entendimento da E. Relatora, pese, embora, o imenso respeito que ora reitero, e reafirmada a maior consideração pela importantíssima instituição da Defensoria Pública.
3.- Nenhum dos artigos de lei invocados estabelece a obrigatoriedade de intervenção geral da Defensoria nos processos em que incapazes, não sejam partes, ainda que haja alegações de fatos graves contra seus genitores, reservada, evidentemente, a possibilidade da tomada de medidas processuais pela Defensoria.
4.- Estão envolvidos na questão os artigos de lei que dispõem da forma seguinte:
CPC, Art. 9º, I:
“Art. 9º. O juiz dará curador especial:
“I – ao incapaz, se não tiver representante legal, ou se os interesses deste colidirem com os daquele”.
ECA, Art. 148, § ún, letra “f”, do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069, de 13.7.1990), por sua vez, dispõe que
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“Art. 148. A Justiça da Infância e da Juventude é competente para:
(...)
“Parágrafo único. Quando se tratar de criança ou adolescente nas hipóteses do art. 98, é também competente a Justiça da Infância e da Juventude para o fim de:
(...)
“f) designar curador especial em casos de apresentação de queixa ou representação, ou de outros procedimentos judiciais ou extrajudiciais em que haja interesse de criança ou adolescente” ECA, art. 98, referido no artigo anterior:
“Art. 98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta lei forem ameaçados ou violados:
“I – por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; “II – por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; “III – em razão de sua conduta”.
4.- A intervenção obrigatória da Defensoria não resulta de nenhum dos citados dispositivos legais (art. 9º, I, do Cód. de Proc. Civil, e art. 148, § ún., letra “f”, do Estatuto da Criança e do Adolescente).
a) Art. 9º, I, do Cód. de Proc. Civil.- Esse dispositivo insere-se no Capítulo I do Título II do Cód. de Proc. Civil, isto é, dirige-se especificamente à capacidade processual das partes e dos procuradores, de modo que forçosa a conclusão de que só se dará, obrigatoriamente, Curador Especial, ao incapaz que detiver a condição de parte, não a todo e qualquer menor que se encontre envolvido no processo sem ser parte, ainda que se aleguem fatos graves a colocá-lo em risco.
A Curadoria Especial exerce-se apenas em prol da parte, visando a suprir-lhe a incapacidade na manifestação de vontade em Juízo. Não é exercida para a proteção de quem se coloque na posição de destinatário da decisão judicial.
Para essa proteção do destinatário da decisão judicial atua, em primeiro lugar, a própria função jurisdicional, por intermédio do Juiz e, em segundo, no caso, o
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Ministério Público, como representante da sociedade, à qual interessa que crianças e incapazes sejam o mais possível preservados contra as ações lesivas das partes, alertando o Juízo e requerendo e promovendo diligências que os resguardem, não se podendo presumir que sobre essas figuras institucionais paire, superior, a relevante função da Defensoria, como se sem ela o órgão julgador e o representante do Ministério Público fossem incapazes de zelar por crianças e adolescentes.
b) Art. 148, § ún., letra “f”, do Estatuto da Criança e do Adolescente.- Esse dispositivo legal, combinado com o art. 4º, XVI, da Lei Complementar 80, de 12.1.1994, que prescreve normas para a organização das Defensorias Públicas nos Estados e em boa hora garante à Defensoria Pública a legitimidade para atuar como “curador especial em casos de apresentação de queixa ou representação, ou de outros procedimentos judiciais ou extrajudiciais em que haja interesse de criança ou adolescente”, não leva à necessidade de intervenção obrigatória da Defensoria nos processos em que crianças ou adolescentes não sejam partes, mas pessoas destinatárias da proteção legal.
Essa proteção, relembre-se, dá-se, em primeiro lugar, por intermédio da atuação dos genitores ou representantes legais, dos Conselhos Tutelares, que possuem legitimidade para promover medidas administrativas ou judiciais em prol de crianças e adolescentes e, ainda, por intermédio da vigilância de “custos legis” do Ministério Público na aplicação da Lei.
Suficiente a rede protetiva dos interesses da criança e do adolescente em Juízo, não há razão para que se acrescente a obrigatória atuação da Defensoria Pública, atuação que, por mais elevados que notoriamente sejam os propósitos da Instituição, viria apenas a complexizar o desenvolvimento do processo, com o acréscimo de mais uma intervenção, e, ainda, de titular de vários privilégios processuais – como já se frisou, quanto a intimações pessoais, por forma ainda não estabilizada em cada unidade, prazos privilegiados e desoneração em diligências, tudo a somar-se a esses mesmos privilégios processuais assegurados ao Ministério Público.
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notícia, por qualquer forma, inclusive comunicação do Juízo, do Ministério Público, do Conselho Tutelar ou, ainda, de conhecimento direto de ocorrência de situação que envolva a criança ou adolescente), vir a usar dos instrumentos processuais disponíveis para atuação, podendo promover ações e, mesmo, intervir como assistente de algumas das partes em casos específicos em que se legitime concretamente a atuação.
O que a Lei não autoriza é a proclamação de regra de intervenção obrigatória, sob a invocação do disposto nos arts. 9º, I, do Cód. de Proc. Civil, e 148, § ún, letra “f”, do Estatuto da Criança e do Adolescente, como foi julgado no caso.
6.- A matéria, pelo potencial catastrófico ao andamento de várias espécies de processos em que se envolvam crianças e adolescentes, é extremamente relevante, pois, se proclamada a tese de obrigatoriedade de intervenção da Defensoria toda vez em que haja alegação de ameaça ou violação de algum direito de criança ou adolescente, haverá necessidade de aludida intervenção, pena de nulidade, em qualquer espécie de processo.
Daí se segue que se imporá a obrigatória atuação da Defensoria não só em caso em que ambos os genitores são acusados de abuso, mas também em processos como os atinentes a guarda, responsabilidade, adoção, visitas, alienação parental, separação, divórcio, inventários e partilhas, ações indenizatórias, enfim, todas as ações em que se entreveja alguma consequência de moléstia, direta ou indireta que seja, a alguma criança ou adolescente.
As consequências para o andamento desses processos certamente virão contra os interesses das próprias crianças ou adolescentes, pois, como já antes se disse, gozando a Defensoria de privilégios processuais específicos da função, como o direito à intimação pessoal, prazo privilegiado, gratuidade de custeio de providências requeridas e outros, certamente daí resultarão ônus suplementares à atividade dos demais participantes do processo – as partes, o Ministério Público, o Juízo, testemunhas e auxiliares da Justiça.
Relembre-se, mais uma vez, que já atuando o Ministério Público, com prerrogativas idênticas, certamente se somarão tempos enormes, os necessários à atuação da Defensoria, à caminhada processual, decorrentes da aparentemente singela inserção, neles, da atuação obrigatória da Defensoria Pública.
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Ademais, proclamada a obrigatoriedade de integração, certamente emergirão alegações de nulidades de casos passados, alegações essas hibernadas por longo tempo, que serão vitalizadas diante do esgotamento de outros argumentos, daí se antevendo a imposição de duração de processos apenas limitada ao atingimento da maioridade de crianças e adolescentes envolvidos.
7.- Pelo exposto, rogando, mais uma vez, a maxima venia à E. Ministra Relatora, bem como reafirmando o maior respeito pela relevante atuação institucional da Defensoria Pública, pelo meu voto dá-se provimento ao Recurso Especial, anulando-se a decisão que determinou a intervenção da Defensoria Pública, com a observação de que, entendendo necessário, o Juízo, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, determinará a extração de peças e envio à Defensoria Pública, para, na modalidade de atuação processual que entender apropriada, tomar as providências, cíveis ou criminais, que veja adequadas à proteção dos menores.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2010/0017190-9 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.177.636 / RJ
Números Origem: 200800239180 20082020238451 200913509889 391802008
PAUTA: 13/09/2011 JULGADO: 15/09/2011
SEGREDO DE JUSTIÇA Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MASSAMI UYEDA Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOÃO PEDRO DE SABOIA BANDEIRA DE MELLO FILHO Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA AUTUAÇÃO
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RECORRIDO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ADVOGADO : FABRÍCIO EL JAICK RAPOZO - DEFENSOR PÚBLICO INTERES. : B D DE S C F
INTERES. : V A DA S F
ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Família - Tutela e Curatela
SUSTENTAÇÃO ORAL
Dr(a). CHRISTINA AIRES CORRÊA LIMA, pela parte RECORRIDA: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Após o voto da Sra. Relatora, negando provimento ao recurso especial, pediu vista, antecipadamente, o Sr. Ministro Sidnei Beneti. Aguardam os Srs. Ministros Massami Uyeda, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva.
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.177.636 - RJ (2010/0017190-9)
RELATORA
: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO
RECORRIDO
: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE
JANEIRO
ADVOGADO
: FABRÍCIO
EL
JAICK
RAPOZO
-
DEFENSOR
PÚBLICO
INTERES.
: B D DE S C F
INTERES.
: V A DA S F
VOTO
O
EXMO.
SR.
MINISTRO
PAULO
DE
TARSO
SANSEVERINO (Relator):
Sr. Presidente, pedindo vênia à eminente Relatora, acompanho a divergência, no sentido de dar provimento ao recurso especial.
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RECURSO ESPECIAL Nº 1.177.636 - RJ (2010/0017190-9)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RECORRIDO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ADVOGADO : FABRÍCIO EL JAICK RAPOZO - DEFENSOR PÚBLICO INTERES. : B D DE S C F
INTERES. : V A DA S F
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO MASSAMI UYEDA(Presidente):
Srs. Ministros, tive a oportunidade de tomar conhecimento do voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi e estava aguardando a manifestação de Sua Excelência nesse voto-vista, que me foi antecipadamente encaminhado.
Rogando imensas vênias à eminente Relatora, acompanho o voto da divergência, no sentido de dar provimento ao recurso especial, com observação.
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CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2010/0017190-9 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.177.636 / RJ
Números Origem: 200800239180 20082020238451 200913509889 391802008
PAUTA: 13/09/2011 JULGADO: 18/10/2011
SEGREDO DE JUSTIÇA Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI Relator para Acórdão
Exmo. Sr. Ministro SIDNEI BENETI Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MASSAMI UYEDA Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO VIEIRA BRACKS Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA AUTUAÇÃO
RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO RECORRIDO : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO ADVOGADO : FABRÍCIO EL JAICK RAPOZO - DEFENSOR PÚBLICO INTERES. : B D DE S C F
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ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Família - Tutela e Curatela CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Sidnei Beneti, divergindo da Sra. Ministra Relatora, no que foi acompanhado pelos Srs. Ministros Massami Uyeda, Paulo de Tarso Sanseverino e Villas Bôas Cueva, a Turma, por maioria, deu provimento ao recurso especial, com observação. Vencida a Sr. Ministra Relatora que negava provimento. Votaram com com o Sr. Ministro Sidnei Beneti os Srs. Ministros Massami Uyeda, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva. Lavrará o acórdão o Sr. Ministro Sidnei Beneti.