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'O novo imposto não vê as transformações de forma profunda'

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Academic year: 2021

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04nov18

'O novo imposto não vê as

transformações de forma profunda'

Para a especialista, como a economia está mais digital, seria mais eficaz

repensar o sistema tributário como um todo

Andrei Netto

PARIS — Especialista em impostos, a portuguesa Rita de la Feria, professora de Legislação Fiscal da Escola de Direito da Universidade de Leeds, no Reino Unido, vê no novo imposto que será adotado pelo Reino Unido e está em estudos na União Europeia uma solução parcial, que não revolve o problema fiscal da nova economia. Segundo ela, a criação de uma taxa é um erro, pois toda a política fiscal deveria ser revista à luz da revolução digital. Leia os principais trechos da entrevista:

A sra. acredita que essa taxa vai entrar em vigor?

A situação política no Reino Unido é bastante instável devido ao Brexit. É possível que as eleições sejam antecipadas para o próximo ano. Se não houver eleições, e se este governo continuar no poder, é possível que o imposto venha a ser introduzido no próximo ano.

Esse imposto é similar ao imposto que vem sendo debatido na UE e na OCDE? A lógica é idêntica. Essas empresas, devido a seus modelos econômicos e suas estruturas corporativas, pagam muito menos impostos do que as empresas mais tradicionais.

Há empresas que instalam suas sedes na Irlanda, apesar de sua atuação estar mais concentrada em outras nações.

Isso preocupa os países maiores, como França e a Alemanha. São países que têm um mercado consumidor de produtos digitais grande e sentem que estão perdendo uma parte muito grande da receita.

É uma espécie de adaptação fiscal à revolução digital?

O problema é que o sistema fiscal mundial é pensado para um mundo territorial e físico. Mas a economia mudou muito nos últimos 20 anos. E todos, inclusive o Brasil,

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2 sintomático. Estamos tentando arranjar situações para adaptar à realidade digital. E essa solução me parece a errada.

Qual é o erro?

Ser uma solução setorial e provisória. Deveríamos fazer as coisas ao longo prazo. O conjunto da economia está se digitalizando, mas estamos criando um imposto que tem como alvo apenas algumas empresas digitais. Mesmo as multinacionais tradicionais já estão se digitalizando. A solução é temporária e vai criar problemas para tentar

distinguir o que é um serviço digital e o que não é. Qual seria a melhor opção?

Temos de pensar no sistema todo. As alterações são de tal escala que é impossível manter o status quo. O novo imposto é uma oportunidade perdida para pensar as coisas de forma mais profunda. Quando pensamos nesse novo imposto, estamos pensando em tributar os lucros das empresas nos países em que estão os consumidores. Por que não repensar o sistema todo e tributar os lucros das empresas - e não apenas as digitais - onde estão os consumidores? Há propostas que mostram que tributar onde os consumidores estão seria muito mais eficiente.

Europa reage a 'dribles' tributários de

gigantes da tecnologia no continente

Apertando o cerco. Reino Unido será o primeiro país a criar o imposto 'Gafam', que deve atingir Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft; hoje, empresas pagam tributos em seus países-sede, e a ideia é cobrar também nos mercados consumidores de seus serviços

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3 Andrei Netto

Depois de colocar em vigor a nova Regulamentação Geral sobre a Proteção de Dados, texto que vem enquadrando a questão da privacidade online, a União Europeia se prepara para uma nova ofensiva sobre as gigantes da web. Desta vez, os preparativos são para a criação de um imposto sobre a receita de companhias como Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft (ou "Gafam", sigla que usa as primeiras letras dessas marcas).

O texto foi proposto pela França a Bruxelas, mas, na semana passada, o Reino Unido se antecipou. O governo de Theresa May anunciou o início da taxa para 2020.

A ideia original francesa é taxar em 3% a receita das empresas de web que superarem ¤ 750 milhões de receita mundial ou ¤ 50 milhões de faturamento na web. Essa nova fonte de recursos seria usada para reinvestir em setores da economia abalados pela digitalização ou no treinamento de desempregados para os desafios da era digital. A pedido da UE, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) também considera um imposto global, mas ainda sem uma proposta concreta - até pela resistência dos Estados Unidos.

A proposta francesa parecia fadada ao fracasso, mas ganhou novo impulso com a decisão de Londres. Ao apresentar a proposta de orçamento para 2019, o ministro britânico de Finanças, Philip Hammond, anunciou a intenção de criar no próximo ano um imposto que atinja as gigantes da web - e poupe as startups. Essas companhias seriam taxadas em 2% da receita que obtêm com a venda de produtos e serviços a consumidores britânicos.

A expectativa do governo é arrecadar até 450 milhões de euros por ano. "Claramente não é sustentável nem justo que plataformas digitais possam gerar lucros substanciais no Reino Unido sem pagar impostos aqui", disse Hammond.

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4 A iniciativa britânica é sintoma da perda de paciência dos governos dos maiores países da Europa com as estratégias contábeis de companhias como Google, Facebook, Apple e Amazon.

Para comercializar produtos e serviços em solo europeu, essas empresas fincaram bandeira em países que têm as mais baixas alíquotas de tributação.

Um dos destinos preferidos dessas gigantes é a Irlanda, que tem um imposto sobre empresas de 12,5%, bem inferior à média de 20% a 25% nos demais países da UE (leia box acima).

Manobra. Ao optar por estabelecer sede em território irlandês, por exemplo, as gigantes de web ganham uma residência fiscal, responsável por faturar o imposto de todo o continente.

Em vez de pagar 19% na Alemanha ou 20% na França ou Reino Unido, essas companhias maximizam lucros pagando menos impostos. Um relatório da UE

demonstrou que o nível de impostos médio pago por empresas tradicionais é de 23%, taxa que cai a 9% quando se trata de companhias digitais.

O esquema é conhecido e levou a União Europeia a pressionar a Apple a "reembolsar" o governo da Irlanda em 13 bilhões de euros por "vantagens fiscais indevidas" no início do ano.

Agora, em lugar de investigar a evasão fiscal, Reino Unido e UE pretendem evitar que a prática seja realizada - ou ao menos reduzir sua amplitude. No fim da semana, Bruno Le Maire, ministro francês da Economia, informou que há um acordo entre França e

Alemanha para que uma taxa semelhante à britânica seja criada nos dois países. A decisão acontecerá em dezembro e deve resultar em uma taxa de 3%, o que deve se refletir em 5 bilhões de euros novas receitas para toda a Europa - sendo 500 milhões de euros na França. "Nós chegamos a um acordo e haverá uma decisão até o fim de 2018", garantiu Le Maire, que reconheceu a existência de "parceiros europeus reticentes". Cerco. A resistência, no entanto, parece ter sido vencida com um acordo para que a legislação europeia seja extinta assim que a OCDE - grupo de 36 países que não inclui o Brasil - chegar a um entendimento em âmbito global. Projetos de lei semelhantes estão nesse momento sendo analisados por governos de países como Coreia do Sul, Malásia, Chile e México.

Resta, porém, a oposição frontal de gigantes europeias da web, como Spotify, Booking e Zalando, que publicaram um comunicado rejeitando a taxa porque "causaria um prejuízo material ao crescimento e à inovação, ao investimento e ao emprego em toda a Europa".

Irlanda está na ponta da resistência contra legislação

País que durante muito tempo foi o principal destino de gigantes da web que se instalavam na Europa, a Irlanda está na linha de frente da resistência à taxa sobre as

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5 multinacionais digitais na União Europeia. Ao lado de Luxemburgo, Malta e Chipre, o governo irlandês tira proveito de suas baixas alíquotas tributárias - 12,5% de impostos sobre empresas - e faz lobby em Bruxelas para que a medida não seja adotada em âmbito continental. O argumento é que o problema é global e deveria ser tratado pelos 36 países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) - grupo que não inclui o Brasil. Trata-se de uma manobra para ganhar tempo e levar o problema a uma organização em que os Estados Unidos, maiores interessados em que a taxa não exista na Europa, têm grande peso e um eventual poder de veto. / A.N.

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