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OS DOIS CIRCUITOS DA ECONOMIA URBANA EM JOÃO CÂMARA/RN

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Matheus Augusto Avelino Tavares Mestre em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) Professor de Geografia Humana do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Norte (IFRN) – Campus João Câmara. Email: matheusgeografo@yahoo.com.br

matheus.tavares@cefetrn.br

OS DOIS CIRCUITOS DA ECONOMIA URBANA EM JOÃO CÂMARA/RN

1 INTRODUÇÃO

O pleno entendimento da dinâmica e funcionamento das cidades passa pela compreensão de suas principais atividades econômicas, ou como diria Souza (2008), pelas suas atividades geoeconômicas. Em João Câmara, cidade localizada nas proximidades da Região Metropolitana de Natal/RN, essas atividades dizem respeito, sobretudo ao comércio e a prestação de serviços, que vem exercendo acentuada importância para a sua economia, principalmente nos últimos anos quando a economia urbana torna-se determinante para o município como um todo a partir da decadência das economias ditas tradicionais (FELIPE, 1986).

Essas atividades que vem se expandindo na cidade de João Câmara fazem parte do que Santos (1979, 2007) denominou de Circuitos da Economia Urbana. Esse sistema teórico busca interpretar a economia urbana a partir da existência de dois circuitos, um circuito superior – composto pelos bancos, comércio, indústria de exportação, indústria moderna, serviços modernos, atacadistas e transportadores; e um circuito inferior – que se constitui pelas formas de fabricação de uso não intensivo de capital, pelos pequenos comércios e pelos serviços não modernos, voltados, sobretudo, para o consumo dos mais pobres.

Os circuitos da economia urbana podem ser vistos, como subsistemas da economia urbana, no qual todas as formas de trabalho estão integradas (SANTOS, 1979). Eles têm a mesma origem, ainda que resultem direta e indiretamente de vários processos de modernização que atingem seletivamente e descontinuamente as porções do território. Nesse processo, é preciso destacar que o circuito inferior, em muitos casos, se torna dependente do circuito superior, sobretudo por causa dos serviços prestados por atacadistas, transportadores, fornecedores de crédito e dos produtos comercializados que em diversos

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aspectos procuram copiar aqueles do circuito superior; por isso, o circuito inferior não pode ser analisado de maneira isolada, pois ele mantêm intensas relações com o superior.

Nesse sentido, o objetivo desse trabalho consiste em analisar a expansão dos dois circuitos da economia urbana na cidade de João Câmara/RN, dando ênfase a sua atual configuração espacial, bem como para os fatores que influenciam essa expansão e para as consequências desse processo. Para tanto, realizamos levantamento de dados a partir de fontes e procedimentos (CORRÊA, 2003). Na etapa que diz respeito às fontes, realizamos uma pesquisa bibliográfica e documental sobre temas relacionados à problemática em questão em bibliotecas, instituições públicas e privadas. Já no que diz respeito aos procedimentos, ou à produção de informações, realizamos entrevistas e aplicação de questionários com os principais agentes sociais envolvidos com os dois circuitos da economia urbana na cidade de João Câmara.

Faz-se mister destacar que não pretendemos somente realizar uma análise da economia urbana do município de João Câmara, mas intentamos contribuir na construção de uma metodologia para o estudo das cidades a partir da teoria dos circuitos da economia urbana desenvolvida por Santos (1979) e reelaborada por Silveira (2004, 2007a, 2007b), sobretudo, no que consiste ao estudo das cidades que não estão inseridas nas regiões metropolitanas e que se constituem na maioria dos municípios da formação socioespacial brasileira, que vêm sendo estudadas e adjetivadas de cidades média e cidades pequenas, o que do nosso ponto de vista se constitui num equívoco dado que entendemos que é preciso elaborar teorias para entendermos as cidades independentes de seus tamanho, pois o que é uma cidade média para São Paulo, com certeza não o é para o Rio Grande do Norte e vice versa.

Assim, acreditamos que o sistema teórico totalizante dos dois circuitos da economia urbana nos dar margem para o estudo das cidades independente de seu tamanho e/ou dimensões, pois busca compreender a totalidade das existências sociais, ou seja, intenta o entendimento do espaço banal através da relação dialética entre o circuito superior e o inferior, considerando que “a riqueza produzida pelo circuito superior não pode ser compreendida sem a pobreza própria do circuito inferior, que este também perpetua” (SILVEIRA, 2007a, p. 3)

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2 OS CIRCUITOS DA ECONOMIA E SUA CONFIGURAÇÃO ESPACIAL NO MUNICÍPIO DE JOÃO CÂMARA

Podemos dizer que ao mesmo tempo em que presenciamos a intensificação do processo de urbanização da sociedade (SANTOS, 2005), temos uma expansão acentuada do circuito inferior da economia, sobretudo porque o atual processo de urbanização é, cada vez mais, guiado pelas lógicas de reprodução desigual e combinada do capital que proporciona que as atividades mais modernas, típicas do circuito superior, se concentram nas regiões metropolitanas e nas cidades mais dinâmicas do território nacional, ficando as demais cidades, na maioria das vezes, excluídas desse processo. Todavia, isso não quer dizer que essas cidades não tenham atividades do circuito superior, o fato é que estas se apresentam, via de regra, de maneira pontual, de modo que na economia urbana dessas cidades prevalecem as formas de trabalho típicas do circuito inferior.

Em João Câmara, como na maioria das cidades do território potiguar, esta realidade se faz presente, pois é cada vez mais intensa a presença do circuito inferior nesse município com destaque para os pequenos comércios e estabelecimentos de prestação de serviços que estão presentes em diversos subespaços da cidade, mas, principalmente em seu centro que se apresenta como o lócus mais dinâmico da expansão desse circuito. Nesse subespaço da cidade é possível encontrar diversas formas de trabalho que tanto adaptam o meio construído as suas necessidades, como é o caso de inúmeras residências que se tornaram pequenos comércios, quanto se adaptam a esse meio construído, comprovando o peso da materialidade espacial nas relações sociais.

Diversas atividades são encontradas nessa porção da cidade, tais como, lojas de roupas, pequenos comércios de produtos importados e de CDs/DVDs. Quanto as primeiras (lojas de roupas e mercearias de produtos diversos) é importante destacar as colocações de Silveira (2004, 2007a), quando esta argumenta que um dos pilares do funcionamento do circuito inferior é a imitação de produtos típicos do circuito superior. Desse modo, grande parte dos produtos comercializados nesses estabelecimentos são na realidade uma reprodução daqueles produzidos pelas grandes marcas internacionais (Nike, Puma, Adidas, Yves Saint Laurent, Colcci etc.), que apresentam considerável influencia no consumo da

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Os pequenos estabelecimentos de produtos importados e de CDs e DVDs são uma constante no espaço urbano de João Câmara, sobretudo, aqueles destinados a comercialização de CDs e DVDs, que não são procurados somente pelos grupos sociais que não tem condições de adquirir produtos originais, mas também por pessoas que apresentam amplas condições de consumo. Aliás, é cada vez mais constante o consumo de produtos do circuito inferior pela classe média da sociedade, o que comprova a tese de Santos (2007), segundo a qual todas as classes sociais podem consumir fora do circuito ao qual estão mais ligadas, mesmo que esse consumo seja apenas ocasional ou esporádico.

A expansão do circuito inferior em João Câmara também se dar por meio da comercialização de produtos típicos do circuito superior como é o caso dos aparelhos de celular, que a cada dia se fazem mais presentes no seio da sociedade. De acordo com Silveira (2004), se são as grandes corporações que dominam a produção e a venda desses objetos, o restante da circulação é realizada por outros agentes, sendo que são aqueles pertencentes ao circuito inferior que fazem com que esses produtos cheguem as mãos das camadas mais pobres da sociedade. É preciso destacar que difusão maciça desse novo objeto, próprio do período histórico atual, não só vem proporcionando a criação de pequenos estabelecimentos destinados a sua comercialização, mas também de estabelecimentos que são destinados ao concerto e manutenção dos aparelhos, bem como engendra o aparecimento de um amplo mercado voltado para venda de acessórios, tais como: capas, baterias, bolsinhas, adesivos etc.

Há ainda uma variedade de estabelecimentos de prestação de serviços como salões de cabeleireiro, bares, lanchonetes e pontos de moto-taxi; e de comercialização de produtos diversos como lojas de peças (motocicletas e automóveis), de material de construção e de pequenas mercearias e mercadinhos, todos esses estabelecimentos se localizando nos mesmos subespaços de maneira contigua, de modo que não constatamos a existência de

áreas de especialização urbana em uma única atividade ou ramo, mas de áreas de diversificação, nas quais predominam múltiplo circuitos espaciais de produção conforme

destaca Silveira (2004). Desse modo, fica evidenciado que nessa área da cidade o processo de trabalho apresenta diversas formas de realização, dado que constitui-se num subespaço no qual coexistem técnicas de diversos períodos históricos.

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Outro subespaço importante da cidade são as margens da BR 406, que constituindo-se num importante eixo de ligação entre a Região Metropolitana de Natal e a cidade de Macau, tem em João Câmara um importante ponto de apoio para inúmeros caminhoneiros e comerciantes que circulam diariamente por essa BR, já que este trecho da cidade abriga uma significativa quantidade de pequenos restaurantes, lanchonetes e pousadas que atendem a esse público bastante diversificado.

Mas, a cidade de João Câmara também apresenta alguns espaços mais voltados para a realização de funções mais modernas da cidade contemporânea, através da existência de atividades que se orientam de acordo com a atual divisão internacional hegemônica do trabalho (SILVEIRA, 2004). Assim, constatamos que o circuito superior também se faz presente na economia de João Câmara, por meio da presença de duas grandes concessionárias de motos multinacionais, as empresas Honda e Yamaha. A existência dessas empresas mundiais na cidade de João Câmara dar-se por que no período histórico atual os espaços estão cada vez mais abertos aos investimentos do exterior (ISNARD, 1978). Entendemos que esses são espaços luminosos que aparecem sob a forma de mancha nessa cidade e que, de acordo com Santos (2002, p 139), podemos denominá-los de verticalidades, isto é, “pontos no espaço que, separados uns dos outros, asseguram o funcionamento global da sociedade e da economia”.

A existência dessas empresas no município de João Câmara vem proporcionando uma intensa expansão de motocicletas não somente na cidade em foco, que apresenta uma das maiores frotas de todo estado, só perdendo para cidades como Natal e Mossoró, mas também nos municípios que estão em seu entorno. Tal expansão encontra nexo na difusão dos sistemas de créditos que facilitam sobremaneira o consumo desses objetos técnicos, sobretudo para os aposentados e para aqueles que apresentam uma renda fixa e que tem desse modo, a oportunidade de realizar diversas formas de financiamento.

Entretanto, vale mencionar que esse circuito se faz presente apenas de maneira pontual, de modo que entendemos que o circuito inferior é quem domina as atividades em João Câmara e que, desse modo, garante a reprodução da existência das camadas mais pobres dessa cidade, embora os empregos gerados nesse setor sejam muitas vezes precários, com seus trabalhadores não tendo assegurados os seus principais direitos trabalhistas.

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Dentro desse contexto, podemos nos interrogar: Quais são os aspectos que estão contribuindo para expansão desses circuitos na cidade de João Câmara? A pesquisa em tela vem evidenciando que vários são os fatores que possibilitam a ampliação desse consumo e consequentemente a expansão dos circuitos da economia em João Câmara, dentre os quais destacamos o aumento do processo de urbanização da sociedade que tem incrementado sobremaneira o papel da economia urbana na geração de empregos e renda para o município; a expansão do consumo em todas as classes sociais, mas, sobretudo entre os mais pobres, que nos últimos anos passaram a ser beneficiados por varias políticas de assistência social (bolsa escola, família etc.), que incrementaram sobremaneira o seu poder de consumo; e a presença de uma substancial massa de salários na cidade, oriunda tanto do emprego público quanto do emprego privado. Some-se a isto o fato de que esta cidade exerce significativa importância na região na qual está inserida, aliás, da qual ela é cidade central, de modo que funciona como uma espécie de pólo de consumo para as populações das cidades da vizinhança que diariamente a frequentam para suprir as suas necessidades de consumo. Em síntese, entendemos que todos esses aspectos quando tomados em conjunto nos dão margem para apreendermos o porquê da intensa expansão do consumo e dos circuitos da economia nessa cidade.

Além disso, outros fatores vêm contribuindo sobremaneira para a expansão dos circuitos da economia, trata-se da banalização dos sistemas de créditos e da publicidade. Quanto ao primeiro constatamos que ele se faz presente de maneira bastante intensa na cidade por meio de diversos agentes que se estabelecem no município através de redes financeiras de grandes instituições como Panamericano e Losango. Tais instituições embora apresentem taxas de juros leoninas (SILVEIRA, 2007a) acabam disponibilizando créditos mais fáceis e rápidos do que os bancos que possuem uma burocracia maior para a realização de empréstimos. Para Silveira (2004), a existência dessas instituições de crédito em diversas partes do território dar-se porque o crédito tende a não deixar de lado quase que nenhuma parcela do território, de modo que elas se interessam direta e indiretamente pela totalidade do território.

Os sistemas de crédito se fazem presentes por meio dos cartões de crédito, que são aceitos nos mais variados estabelecimentos da cidade desde pequenas lojas a redes de supermercados, sendo que as bandeiras mais utilizadas são master-card, visanet e

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hiper-card, que sendo as bandeiras com maior capilaridade, são as mais difundidas entre as

classes populares.

Já a publicidade, por sua vez, se adapta as necessidades dos agentes do circuito inferior, dado que ela acontece por meio da utilização de banners, cartazes, cartões, folhetos, rádios locais e através de carros e motos de som que diariamente percorrem as principais vias da cidade para divulgarem os produtos dos principais estabelecimentos da cidade. Vale destacar que a produção dessas formas de publicidade é realizada pelos próprios agentes desse circuito, através do uso de computadores e em associação com pequenos estabelecimentos gráficos.

Assim, o circuito inferior em João Câmara vem, cada vez mais, se realizando a partir da apropriação de técnicas típicas do circuito superior, tais como cartões crédito e publicidade, o que nos revela as mudanças que estão em curso nas relações desse circuito com as finanças e a informação que constituem-se variáveis chaves do período técnico-científico-informacional (SILVEIRA, 2007a).

Em suma, até o presente momento a pesquisa em tela constatou a expansão dos dois circuitos da economia na cidade de João Câmara, sobretudo o circuito inferior que no período atual é o locus de reprodução de diversas formas de trabalho, bem como tornou-se o abrigo para a reprodução da existência das camadas mais pobres da sociedade. No entanto, destacamos que o projeto em tela ainda está inconcluso e que, desse modo, novos resultados virão a tona na medida em que a pesquisa vá se desenrolando.

REFERÊNCIAS

CORRÊA, Roberto Lobato. Análise crítica de textos geográficos: breves notas. Geo UERJ. Rio de Janeiro, n. 14, p. 7-18, 2. Semestre 2003.

FELIPE, José Lacerda A. Elementos de Geografia do RN. Editora Universitária, Natal, 1986.

ISNARD, H. O espaço Geográfico. In: Boletim Geográfico. Rio de Janeiro, N° 258-259. Ano: 36, 1978.

SANTOS, Milton. O espaço dividido: os dois circuitos da economia urbana nos países subdesenvolvidos. São Paulo: Livraria Francisco Alves Editora S.A, 1979.

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______. Da Totalidade ao Lugar. 7. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2002.

______. A urbanização brasileira. 5. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2005.

_____. Economia espacial: críticas e alternativas. Tradução de Maria Irene de Q. F. Szmrecsányi. 2. ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2007.

SILVEIRA, Maria Laura Da. Globalización y Circuitos de la Economía Urbana en Ciudades Brasileñas . In: Cuadernos del Cendes. A. 21. N. 57, tercera época, septiembre-diciembre 2004, p. 1-21.

______. Crises e Paradoxos da Cidade Contemporânea: os Circuitos da Economia Urbana. In: Anais do X SIMPURB, Florianópolis, 2007a.

_____. Metrópolis brasileñas: un análisis de los circuitos de la economía urbana. In: Revista

eure. Santiago de Chile, vol. XXXIII, n. 100, diciembre de 2007. 2007b, p. 149-164.

SOUZA, Maria Adélia de. A metrópole e o futuro: a dinâmica dos lugares e o período popular da História. In: SOUZA, Maria Adélia de. (Org.). A metrópole e o futuro: refletindo sobre Campinas. Campinas: Edições Territorial, 2008, p. 35-53.

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