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CONDUÇÃO SEM HABILITAÇÃO LEGAL ACIDENTE DE VIAÇÃO SEGURADORA DIREITO DE REGRESSO NEXO DE CAUSALIDADE

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Supremo Tribunal de Justiça

Processo nº 21/09.8TBMCN.P1.S1 Relator: GARCIA CALEJO

Sessão: 21 Janeiro 2014 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA

CONDUÇÃO SEM HABILITAÇÃO LEGAL ACIDENTE DE VIAÇÃO

SEGURADORA DIREITO DE REGRESSO NEXO DE CAUSALIDADE

PRINCÍPIO DA IGUALDADE

Sumário

I - Para exercer o direito de regresso a que alude o art. 19.º al. c) do DL n.º 522/85 de 31-12, não incumbe à seguradora a prova do nexo de causalidade adequada entre a falta de habilitação legal de condução e o acidente.

II - Não se verifica a violação do princípio constitucional da igualdade invocado, pois as situações em análise não são absolutamente análogas. Os comportamentos ou acções considerados são diversos.

Texto Integral

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I- Relatório:

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1-1- AA - Companhia De Seguros, S.A. (hoje BB – Companhia de Seguros S.A.) com sede na Avenida José Malhoa, nº...,

Lisboa, instaurou a presente acção declarativa, com processo comum na forma ordinária, contra CC, residente no ..., pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 345.122,17 euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Fundamenta este pedido, em síntese, dizendo que no exercício da sua actividade seguradora celebrou com DD um contrato de seguro,

titulado pela apólice nº AU4320184, para cobertura da responsabilidade civil emergente da circulação do veículo ligeiro de passageiros de matrícula ...-FZ.

No dia 17/08/2003, pelas 00h20m, ocorreu um acidente, na E.N. 210, ao Km.

71.4, em Vila Boa do Bispo, em que foram intervenientes aquele veículo, que na altura era conduzido pelo R., sem estar legalmente habilitado a fazê-lo com a respectiva carta de condução, e o motociclo de matrícula ...-PD, propriedade de EE, conduzido por FF e onde era transportado, como passageiro, GG. Do acidente resultaram para o condutor do motociclo – FF – danos morais e patrimoniais para cujo ressarcimento a A., por via do contrato de seguro, despendeu € 267.239,00. Do acidente resultaram para o passageiro Alcino danos morais e patrimoniais para cujo ressarcimento a A., por via do contrato de seguro, despendeu € 22.532,17. A A., por via do acidente, pagou

assistência hospitalar e indemnizou o dono do motociclo em 8.000,00 por ter ficado totalmente destruído. Ao todo a A. despendeu € 345.122,71. o R. foi o único culpado pela produção do acidente, por via de conduzir o FZ sem estar legalmente habilitado a tal, o que foi causal do mesmo. Tem, assim, o direito de exigir o reembolso da quantia paga ao R. atentas as disposições dos artigos 27º d) do Dec-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto (actual redacção dada ao artigo 19º, al. c) do Dec-Lei nº 522/85, de 31 de Dezembro) e artigo 25º das Condições Gerais da Apólice. Interpelou o R. para pagar, mas em vão.

O R., citado, contestou, defendendo-se por excepção (prescrição) e impugnação. Concluiu pela improcedência da acção.

Respondeu a R. à defesa por excepção.

O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo- se proferido o despacho saneador em que não se conheceu da excepção

peremptória da prescrição por falta de alegação dos necessários factos, após o que se fixaram os factos assentes e se organizou a base instrutória, se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu à base instrutória e se proferiu a sentença.

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Nesta julgou-se a acção procedente por provada e, em

consequência condenou-se o R., CC, a pagar à A., AA - Companhia de Seguros, S.A. a quantia de 345.122,71 (trezentos e quarenta e cinco mil cento e vinte e dois euros e setenta e um cêntimos) euros, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a partir de 24/09/2009 até integral e efectivo pagamento.

1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreu o R.

de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, tendo-se aí, por acórdão de 22-4-2013, julgado improcedente o recurso, confirmando-se a sentença

recorrida.

1-3- Irresignado com este acórdão, dele recorreu o R. para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido pela Formação de Juízes a que alude o art. 712º A nº 3 do C.P.Civil, como revista excepcional.

O recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões:

1ª- É nosso entendimento que os Dec-Leis 522/85 e 291/2007 não contêm qualquer norma a afastar o regime geral da responsabilidade, motivo porque sempre caberá à seguradora fazer a prova do facto donde emerge o direito de regresso.

2ª- Para facilitar a prova de nexo de causalidade, no dizer de alguns, diabólico, permite-se ao julgador o recurso a presunções judiciais, apoiadas em factos e não de per si. A este propósito, cita-se o Ex.mo Sr.

Conselheiro João Bernardo, na parte em que, doutamente, refere que "a fixação de tal relação causal não assenta em prova diabólica, porque julgar a matéria de facto não é, por natureza, apenas um acto consistente em espelhar nos factos provados o que passou pela frente do juiz. A ideia de "julgamento"

tem ínsito precisamente o acrescentar da consciência ponderada de quem julga ao que por ali passou".

3ª- Na situação dos autos, o R.te só deveria ter sido condenado se a R.da tivesse feito, pelo menos, prova indiciária de que foi essa falta de habilitação que deu causa ao sinistro.

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4ª- A Rda não só não fez tal prova, como foi até o Rte que demonstrou o seguinte:

- "Apesar do referido em M), o Réu estava habituado a conduzir veículos ligeiros, incluindo o FZ, nomeadamente no logradouro da oficina, como ajudante de mecânico" facto assente em N);

- "E transitava com frequência na via em que ocorreu o embate em C) e noutros com bicicleta a pedal" (Facto assente em O)

- "O Réu esteve emigrado na Suíça e quando frequentava a escola nesse país teve aulas de código" (Facto assente em P).

5ª- Por assim ser, mesmo que se entenda que tal concreto nexo pode ser estabelecido automaticamente, há que reconhecer que foi feita, pelo Rte prova no sentido contrário, devendo, aquele, considerar-se, por isso,

"destruído".

6ª- Aliás, é o próprio Tribunal "a quo" a, nas respostas à matéria de facto (pág. 18, §2) a dizer o seguinte:

"A resposta a essas questões é, a nosso ver, apenas uma: o Réu, ao contrário do que pretende a testemunha HH, não encetou (não podia ter encetado) aquelas manobras que por ele são descritas, de contrário, teria forçosamente, visto o motociclo, e por razões que se desconhece (imperícia, distracção?) (negrito nosso), ao abeirar-se do cruzamento, encetou a manobra de mudança de direcção à sua esquerda, cortando, com essa sua manobra, a linha de trânsito ao condutor do motociclo, quando este se encontrava em aproximação ao cruzamento, circulando dentro da sua mão de trânsito, muito próximo daquele cruzamento, a uma distância do ponto da colisão nunca superior a 50 metros, de modo que apenas lhe deu tempo para imprimir, como imprimiu, uma travagem brusca ao motociclo, deixando um rasto de travagem de escassos 9,10 metros até colidir no FZ." ; sendo, ainda a este respeito, evidente que a hipotética "distração", sinalizada pelo M.mo Juiz, não estabelece o nexo causal entre a falta de habilitação legal e o acidente.

7ª- Há, por outro lado, que salientar que a existência de habilitação válida nem sempre é sinónimo de boa prática de condução, do mesmo modo que a falta de habilitação também nem sempre significará inabilidade;

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8ª- Também não se percebendo o porquê da diferença entre a condução sem habilitação legal, a condução sob efeito do álcool e o abandono do sinistrado, sendo caso para questionar o fundamento da justificação de tratamento tão diferenciado.

9ª- Como é sabido, mesmo após a alteração legislativa, a

jurisprudência continua a entender que na situação de condução sob efeito do álcool é necessário que a seguradora alegue e prove o nexo de causalidade - vejam-se, a este propósito, o Acórdão STJ, de 06/07/2011, proc.

129/08.7TBPTL.G1.S1 e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 19/01/2012, proc. 774110.0TBESP.Pl, em que é Relator o Desembargador Teles de Menezes, que se passa a citar:

"Para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob a influência do álcool, exige-se a alegação e prova pela seguradora do nexo de causalidade adequada entre o estado de etilizado e o acidente de que resultaram os danos do terceiro por ela indemnizados, segundo a melhor interpretação do art. o 27º nº 1, al. c) do DL nº 291/2007, de 21/8. "

No que diz respeito ao abandono do sinistrado, é pacífico que o direito de regresso da seguradora apenas abrange os danos derivados do abandono da vítima ou agravamento decorrente desse abandono, e não a totalidade dos danos originados pelo acidente - vide Ac. STJ de 01/2/2011, em que é Relator o Conselheiro Paulo Sá.

9ª- Na nossa opinião não há fundamento lógico para que o atropelamento mortal de um peão tenha efeitos tão díspares conforme o condutor que o cause esteja etilizado, não possua licença de condução válida ou abandone a vítima, quando todas as mencionadas situações constam da mesma previsão legal.

10ª- Na situação da condução sem habilitação legal são

possíveis ocorrências práticas em que a aplicação da, passe a expressão, ideia jurídica subjacente à decisão dos autos, configurará, a todos os níveis,

completo desacerto. Imagine-se, como supra se alegou, a situação de um qualquer piloto automóvel a quem a carta foi cassada ou a de qualquer ilustre cidadão que, com muitas centenas de milhares de quilómetros de condução, deixou, devido à idade e natural desconhecimento legal caducar a carta.

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11ª- É por tudo isso que nas situações de direito de regresso se deve analisar e ponderar, caso a caso, e perceber se a falta de habilitação teve alguma relação com o sinistro. Estamos no campo da responsabilidade civil e não no campo da responsabilidade penal ou contraordenacional. Não podemos ver esta condenação (civil) de quem circulava sem carta como uma pena.

12ª- É necessário provar os pressupostos da responsabilidade civil e, no caso do direito de regresso por falta de habilitação, demonstrar que o acidente se deu por imperícia decorrente dessa concreta a falta e que esta deu causa ao sinistro.

13ª- Na situação que nos ocupa, há que ter na devida conta que a Rda. não fez prova alguma do necessário nexo e que até foi o R.te que

provou o contrário.

14ª- Compreendíamos e até aceitávamos que o nexo de causalidade fosse presumido, mas já não podemos concordar que seja

indestrutível (como parece defender o acórdão em crise), uma vez que, a ser assim, tal entendimento pode conduzir a resultados completamente díspares.

A condenação ficará dependente dos danos causados a terceiros, podendo ter a "sorte" de eles serem ligeiros ou, como ocorreu no caso sub judice, ficar-se endividado para o resto da vida (€ 345.000.00!!!).

15ª- É facto notório que tal aleatoriedade não contribui, em nada, para a segurança e certeza do nosso direito e, bem assim, que não foi, seguramente, essa ideia de justiça aquela que o legislador pretendeu, ao fazer constar do art° 8° do CC que "nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito".

16ª- A interpretar-se a norma do art. 27° n° 1, aI. d), do DL 291/2007, no sentido de que - provada a culpa no acidente e a ausência de habilitação, não é possível "destruir" o nexo de causalidade adequada - pensamos que semelhante interpretação será segura e inequivocamente violadora do art. 13° e 18° da CRP, desde logo por não permitir ilidir a

presunção e por tratar de forma igual situações de uma enorme diversidade.

17ª- Tendo em conta que o R.te provou que tinha experiência de condução, que já tinha circulado outras vezes com o FZ, que era

conhecedor das regras do Código da Estrada, e que, na concreta manobra, agiu em conformidade com as regras, nomeadamente abrandando e dando o

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pisca - não faz sentido, seja a que título for que, mesmo assim, seja condenado a pagar a enormidade do valor em causa.

Por assim ser, ao sentenciar da forma supra alegada, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 668° do CPC, 566°, n° 2 e 3, art. 8°, nº 3, ambos do CC e o art. 13° e 18° da CRP - devendo o acórdão ser alterado/

revogado, nos seguintes termos:

- absolver-se o R.te pelo facto de a R.da não ter logrado provar o nexo de causalidade entre a falta de habilitação legal para conduzir e a produção do sinistro;

- ou, a defender-se o efeito automático, ainda assim, absolver-se o R.te uma vez que foi demonstrada a ausência de nexo entre a aludida falta de habilitação legal e o evento sub judice, com o que se fará sábia e oportuna Justiça.

A recorrida contra-alegou, pronunciando-se pela confirmação do acórdão recorrido.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir:

II- Fundamentação:

2-1- Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelo recorrente, apreciaremos apenas as

questões que ali foram enunciadas (arts. 684º nº 3 e 685º A nº 1 do C.P.Civil).

Nesta conformidade, serão as seguintes as questões a apreciar e decidir:

- Se para exercitar o direito de regresso a que alude o art. 19º al. c) do Dec-Lei 522/85 de 31/12, incumbe, ou não, à Seguradora a prova do nexo de causalidade adequada entre a falta de habilitação legal de condução e o acidente. - Se a decisão recorrida violou o princípio constitucional da igualdade.

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2-2- Vem fixada das instâncias e com vista à decisão, a seguinte matéria de facto:

A- A Autora exerce a actividade seguradora.

B- No exercício da sua actividade, a Autora celebrou com DD um contrato de seguro titulado pela apólice nº AU43201843, para cobertura da responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária do veículo ligeiro de passageiros de marca "Volkswagen" e com o número de matrícula ...-FZ.

C- No dia 17 de Agosto de 2003, pelas 00h20m, deu-se um embate na E.N. 210, ao Km. 71,4, em Vila Boa do Bispo, concelho de Marco de Canaveses.

D- Foram interveniente no acidente:

- O veículo motociclo, da marca "Honda" e de matrícula ...-PD, propriedade de EE e conduzido, na altura, por FF;

- e o já citado veículo ...-FZ, conduzido pelo Réu.

E- À data do embate, além do referido condutor, seguia como passageiro do motociclo ...-PD GG.

F- O local onde veio a ocorrer o embate configura uma recta de boa visibilidade, com cruzamento devidamente sinalizado.

G- Cruzamento esse formado pela dita E.N. 210 e a via que liga o Lugar do Pinheiro a Lages.

H- No local o limite de velocidade é de 50 Kms./hora.

I- O piso encontrava-se seco e em bom estado de conservação.

J- No mencionado dia e hora o veículo PD circulava na dita E.N.

nº 210, no sentido de marcha Marco de Canaveses/Alpendurada, pela respectiva metade direita da faixa de rodagem.

L- Enquanto o veículo FZ conduzido pelo Réu circulava em sentido oposto, ou seja, no sentido de marcha Alpendurada/ Marco de Canaveses.

M- No momento do embate identificado em C), o Réu conduzia o FZ sem estar legalmente habilitado com a respectiva carta de condução.

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N- Apesar do referido em M), o Réu estava habituado a conduzir veículos ligeiros, incluindo o FZ, nomeadamente no logradouro da oficina, como ajudante de mecânico.

O- E transitava com frequência na via em que ocorreu o embate identificado em C) e noutros com bicicleta a pedal.

P- O Réu esteve emigrado na Suíça e quando frequentava a escola nesse país teve aulas de código.

Q- Após circular na E.N. 210 no sentido Alpendurada/Marco de Canaveses, ao chegar à intersecção do cruzamento identificado em G), o Réu iniciou uma manobra de mudança de direcção à sua esquerda, com destino ao Lugar do Pinheiro - resposta aos pontos 3°,4° e 5° da base instrutória.

R- Invadindo a hemi-faixa de rodagem contrária, no preciso momento em que o motociclo aí circulava a uma distância daquele cruzamento não concretamente apurada, mas nunca superior a 50 metros - resposta ao ponto 6° da base instrutória.

S- Cortando e obstruindo, assim, a linha de trânsito do referido motociclo - resposta ao ponto 7° da base instrutória.

T - E provocando o embate entre os dois veículos - resposta ao ponto 8° da base instrutória.

U- Embate que ocorreu entre a parte lateral direita do FZ e a frente do motociclo resposta ao ponto 9° da base instrutória.

V- E se deu na hemi-faixa de rodagem esquerda, atento o sentido de marcha do Réu -resposta ao ponto 10° da base instrutória.

W - O condutor do motociclo não conseguiu evitar o embate - resposta ao ponto 11 ° da base instrutória.

Y - Por força da violência do embate, o condutor e passageiro do motociclo foram projectados contra o solo - resposta ao ponto 12° da base instrutória.

X- Em consequência do embate, o condutor do motociclo FF sofreu traumatismo crâneo-encefálico, com múltiplas pequenas contusões hemorrágicas, traumatismo de hemiface direita e da região cervical direita, com fractura do malar direito, fractura da mandíbula e ferida inciso-contusa

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sub-mandibular e cervical, traumatismo do ombro direito, traumatismo do tórax, com pneumotorax à esquerda e contusão pulmonar - resposta ao ponto 13 ° da base instrutória.

Z- Em consequência do embate, também o passageiro do motociclo, GG sofreu traumatismo crâneo-encefálico - resposta ao ponto 14°

da base instrutória.

AA- …

AL- Por força do contrato identificado em B), lesões e sequelas acima identificadas, a Autora entregou a FF a quantia de 267.239,00 euros, a título de indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu com o embate identificado em C) - resposta ao ponto 23° - C da base instrutória.

AM - ... Sendo que a quantia de 17.239,00 euros lhe foi sendo adiantada pela Autora por conta da indemnização final - resposta ao ponto 23°

- D da base instrutória.

AN- A Autora pagou toda a assistência médica, hospitalar e transportes prestados a FF, no que despendeu a quantia de 37.660,30 euros - resposta ao ponto 23° - E da base instrutória.

AO…

AY- Por força do contrato identificado em B), lesões e sequelas acima identificadas a Autora entregou a GG a quantia de 22.532,17 euros a título de indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu com o embate identificado em C) resposta ao ponto 30° - C da base instrutória.

AX- ... Sendo que a quantia de 2.532,17 euros lhe foi sendo adiantada pela Ré por conta da indemnização final - resposta ao ponto 30° - D da base instrutória.

AZ- A Autora pagou toda a assistência médica e hospitalar prestada a GG, no que gastou a quantia total de 9.691,24 euros - resposta ao ponto 30° - da base instrutória.

BA- Em consequência do embate, também o motociclo PD sofreu danos avultados em toda a parte frontal e traseira, centro, tecto,

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chassis, tendo a respectiva estimativa de reparação sido orçada em 13.083,00 euros - resposta ao ponto 31 ° da base instrutória.

BB- A estimativa do custo da referida reparação orçou em valor superior ao valor venal daquele veículo à data do embate, pelo que foi

considerado perda total - resposta ao ponto 32° da base instrutória.

BC- Entregou a EE, proprietário do PD, a quantia de 8.000,00 euros correspondente à indemnização pela perda total daquele veículo, tendo o respectivo salvado ficado em poder daquele - resposta ao ponto 32° - A da base instrutória.

BD- O Réu nada pagou à Autora a título de pagamentos das quantias por esta despendidas com a regularização do sinistro - resposta ao ponto 33° da base instrutória.

BE- O Réu iniciou a circulação com o ...-FZ da posição de parado - resposta ao ponto 34° da base instrutória.

BF- O Réu arrancou do parque da Casa do Povo de Vila Boa do Bispo - resposta ao ponto 35° da base instrutória.

BG- O Réu percorreu a E.N. no sentido Alpendurada/Marco de Canaveses e pretendeu virar à esquerda no cruzamento identificado em G - resposta ao ponto 36° da base instrutória.

BH- Quando já se encontrava com a frente do FZ fora da hemi- faixa da E. Nacional 210, foi violentamente embatido na parte lateral daquele - resposta ao ponto 39° da base

instrutória.---

2-3- No douto acórdão recorrido, sobre o tema em discussão acima referenciado, referiu-se:

“De acordo com o art. 19.º, al. c) do Dec-Lei nº 522/85 de 31/12, “ satisfeita a indemnização, a seguradora apenas tem direito de regresso contra o condutor, se este não estiver legalmente habilitado”…(ou tiver agido sob a influência do álcool, estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos, ou quando haja abandonado o sinistrado). O Dec-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto, que revogou aquele diploma, dispõe no seu artigo 27º, 1: satisfeita a indemnização, a empresa de seguros apenas tem direito de regresso: c)- contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, ou

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acusar consumo de estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos; d)- contra o condutor, se não estiver legalmente habilitado, ou quando haja abandonado o sinistrado. Sobre a questão de exigir ou não na acção de regresso nexo de causalidade entre a falta de habilitação para conduzir e a produção do acidente, na vigência do Dec-Lei nº 522/85 foram defendidas na jurisprudência duas posições. A 1ª - o direito de regresso existe sempre que se verifique objectivamente a falta de habilitação legal na condução e

independentemente do acidente ter tido ou não como causa essa falta. A 2ª - à seguradora cumpre provar o nexo de causalidade adequada entre a

inabilitação legal para conduzir e o acidente para poder exercer com sucesso o direito de regresso contra o condutor. Foi então proferido o Acórdão

uniformizador de jurisprudência nº 6/2002, in “Diário da República”, I série – 18.7.2002, que se reporta a situações de condução sob a influência do álcool e que fixou a seguinte jurisprudência: «a alínea c) do art. 19 do Dec-Lei nº

522/85, de 31.12, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob a influência do álcool o ónus da prova pela

seguradora do nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente». Na sequência de tal acórdão ainda houve arestos a

manter a segunda posição apontada, para as acções em que estava em causa a falta de habilitação para conduzir do condutor. Porém, depressa e

definitivamente passou a ser pacífico na nossa jurisprudência …que não há paralelismo entre a situação dos autos e a condução sob o efeito do álcool, vigorando aquele Ac.UJ para os casos de condução sob o efeito do álcool e não para a situação dos autos… Acontece que situação bastante diversa é aquela que agora nos ocupa. Estamos nestes autos perante um acidente causado por pessoa que à data dos factos não possuía habilitação legal para conduzir veículos automóveis, caso em que não poderemos adoptar argumentação semelhante à que foi seguida para as anteriores hipóteses de condução sob a influência do álcool e de abandono de sinistrado. O excesso de álcool pode ser causa adequada do acidente. O abandono de sinistrado pode ser causa

adequada dos danos ou do seu agravamento. Daí que, como já vimos, se exija à seguradora, nestas hipóteses, a prova do respectivo nexo de causalidade.

Porém, a falta de licença de condução nunca pode ser vista, só por si, como causa concreta do acidente. Um acidente de viação é uma realidade dinâmica e nessa dinâmica surge um evento que origina o acidente: um excesso de velocidade, uma ultrapassagem indevidamente efectuada, um desrespeito por uma regra de prioridade, um excesso de álcool, etc. Tudo isto são situações concretas e a falta de licença de condução não se enquadra neste tipo de eventos. Ou seja, só por si não pode ser uma causa concreta do acidente. A partir da hermenêutica operada no Ac.UJ referido, passou, no âmbito da

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vigência do Dec-Lei nº 522/85, a defender-se aquela 1ª posição e a considerar- se que a seguradora, para fazer valer o direito de regresso no caso de

condução sem habilitação legal, tem de alegar e provar os pressupostos da responsabilidade civil e a condução sem habilitação legal, mas não tem de provar o nexo de causalidade adequada entre a falta de carta e a verificação do acidente… Com a publicação do Dec-Lei nº 291/2007, de 21 de Agosto o elemento literal aponta para que o mesmo entendimento continue a valer para os casos de falta de habilitação. Os casos de condução sob a influência do álcool permitem agora novo entendimento … Posto isto, a Autora alegou e provou os pressupostos da responsabilidade civil por factos ilícitos

relativamente ao Réu. Alegou e provou que indemnizou os sinistrados. Alegou e provou a culpa do Réu na produção do acidente. Alerta o Ac. STJ de

25-10-2012 que mesmo assim, neste particular, a jurisprudência tem-se

dividido tornando extensiva a doutrina do acórdão uniformizador aos casos de condução sem habilitação, o que, com o respeito devido, não nos parece

curial. Vale a pena seguir no caso dos autos o argumentário seguido naquele douto aresto. Assim, no caso dos autos foi, contudo, feita prova, como decorre da factualidade assente, que o acidente se ficou também a dever a culpa do R.

Na verdade, embora este tivesse accionado o sinal luminoso indicativo de que pretendia mudar de direcção para a esquerda, operou a manobra sem se certificar de que a poderia fazer sem perigo para os demais utentes da via, nomeadamente para os sinistrados. Por isso, não se pode concluir, como faz o Apelante, pela total ausência de culpa do Réu. Ainda que o condutor do

motociclo sinistrado, tenha contribuído com a sua quota parte para o sinistro, o que não resulta a toda a evidência dos factos provados, tal não afasta a culpa do Réu. Mesmo para quem defenda que o direito de regresso da

seguradora, em caso de condução sem habilitação, deve ter por base um nexo de causalidade, não se exige a exclusividade da culpa. No caso vertente não está provada a culpa do sinistrado condutor do PD e muito menos a culpa exclusiva deste, pelo que, em face de todo o exposto, à seguradora assiste o direito de regresso de que se arroga”. Em consequência, o douto aresto

decidiu julgar improcedente a apelação do R. e manter a sentença recorrida.

Por sua vez o R. sustenta, em síntese, que nas situações de direito de regresso (como é o caso) se deve analisar e ponderar, caso a caso, e perceber se a falta de habilitação teve alguma relação com o sinistro. É

necessário provar, para além dos pressupostos da responsabilidade civil no caso do direito de regresso por falta de habilitação, que o acidente se deu por imperícia decorrente dessa concreta falta e que esta deu causa ao sinistro. Ou seja, para exercitar o direito de regresso a que alude o Dec-Lei 291/2007 cabe

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à Seguradora a prova do nexo de causalidade adequada entre a falta de habilitação legal de condução e o acidente.

Vejamos:

Movemo-nos no âmbito do seguro automóvel obrigatório, que foi institucionalizado pelo Dec-Lei 408/79 de 25/9. Neste diploma, logo no seu art. 1º nº 1, estabeleceu-se que os veículos automóveis só poderiam circular na via pública desde que fosse efectuado seguro de responsabilidade civil que pudesse resultar da sua circulação. Com a obrigatoriedade do seguro

obrigatória pretendeu-se que fosse “na maioria dos casos um instrumento válido para remediar as carência e as gritantes injustiças que a não

obrigatoriedade do seguro automóvel de responsabilidade civil determinava, sendo um factor importante na protecção dos legítimos direitos e interesses dos cidadãos” (in relatório do diploma). Dai que se tenha determinado que “ dentro das quantias por que é obrigatório o seguro, a seguradora não pode opor aos lesados quaisquer excepções, nulidades, anulabilidades ou cláusulas limitativas da sua responsabilidade que não sejam estabelecidas no diploma”

(art. 15º nº 1) e, neste contexto, tornar obrigatória, nas acções destinadas à efectivação da responsabilidade civil por acidente de viação abrangido pelo seguro obrigatória, a intervenção da seguradora do demandado (art. 22º nº 1 ambos do dito diploma). A institucionalização do seguro obrigatório, como se refere no acórdão deste STJ de 20-5-2003 (www.dgsi.pt/jstj.nsf) “era há muito sentida como medida de alcance social inquestionável para dar resposta aos legítimos interesses dos lesados em acidente de viação” ou, como se afirma no preâmbulo do Dec-Lei 522/85 de 31/12 (de que falaremos mais à frente) “a institucionalização do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel revelou-se uma medida de alcance social inquestionável, que, com o decurso do tempo, apenas impõe reforçar e aperfeiçoar, procurando dar uma resposta cabal aos legítimos interesses, dos lesados em acidente de viação”.

Por força daquele art. 15º nº 1 e nos termos da lei do seguro obrigatório, é a seguradora quem, desde logo, deve pagar aos lesados em acidente de viação as indemnizações decorrentes da responsabilidade civil do segurado. Este, em regra, fica dispensado do pagamento de qualquer

importância reclamada nesse âmbito (e desde que se situe dentro dos limites do seguro). Porém, o legislador entendeu, por evidentes razões de equidade e de justo equilíbrio das prestações entre o segurado e a seguradora,

estabelecer casos em que, após a satisfazer a indemnização, a seguradora fica com o direito de regresso e ou reembolso contra (para além de outras

hipóteses sem interesse para aqui) “o condutor, se este não estiver legal

(15)

habilitado ou tiver agido sob a influência do álcool ou outras drogas ou

produtos tóxicos, ou quando haja abandonado o sinistrado” (art. 19º al. c) do referido Dec-Lei 408/79).

Este diploma veio a ser revogado pelo Dec-Lei 522/85 de 31/12 [1], normativo que mais não visou do que reforçar e aperfeiçoar o seguro de responsabilidade civil automóvel, criando “as condições indispensáveis a um enquadramento normativo na linha da justiça social que caracteriza” tal seguro.

De idêntico modo se determinou a obrigatoriedade do seguro obrigatório (art. 1º nº 1), garantindo o seguro “a obrigação de indemnizar estabelecida na lei civil até ao montante do capital obrigatoriamente seguro por sinistro e por veículo causador e relativamente aos danos emergentes de acidente não excepcionados no presente diploma” (art. 5º) e fazendo intervir, obrigatoriamente, nas acções destinadas à efectivação da responsabilidade civil decorrente de acidente de viação, as seguradoras, nos termos do art. 29º do diploma.

Em paralelo com o Dec-Lei 408/79 de 25/9, também o

legislador do Dec-Lei 522/85 de 31/12 entendeu estabelecer casos em que a seguradora, depois de satisfazer a indemnização, fica com o direito de

regresso e ou reembolso contra o condutor do veículo gerador da obrigação de indemnizar. A este propósito diremos que o art. 19º al. c) estabelece, com idêntica formulação do art. 19º do Dec-Lei 408/79, que “satisfeita a

indemnização, a seguradora apenas tem direito de regresso contra o condutor, se este não estiver legal habilitado ou tiver agido sob a influência do álcool ou outras drogas ou produtos tóxicos, ou quando haja abandonado o sinistrado”.

Perante esta norma fica claro que a seguradora poderá exigir do condutor a indemnização que pagou, se este não estiver habilitado com a respectiva carta de condução, tiver agido sob a influência do álcool ou outras drogas ou produtos tóxicos, ou quando tenha abandonado o sinistrado.

Para o caso vertente, interessa-nos a situação de falta de habilitação legal por parte do condutor.

Perante a formulação deste dispositivo, quanto à acção do condutor sobre a influência do álcool, a jurisprudência dos nossos tribunais dividiu-se, decidindo uns no sentido de que o direito de regresso da

seguradora deveria ser automático, bastando que se provasse que o condutor possuía, no momento do acidente, uma taxa de alcoolemia superior à legal,

(16)

outros que seria necessário demonstrar-se o nexo causal entre o álcool e o acidente e outros ainda que devia indiciar-se que situação de alcoolemia era causa do acidente, embora tal relação fosse de presumir, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º da Lei n.º 3/82. Neste sentido e esclarecendo melhor esta

situação (condução sobre a influência do álcool) referiu-se no acórdão

uniformizador 6/2002 do STJ de 28-5-2002 (publicado no D.R. Série I A 164 de 18-7-2002) que “apesar das várias correntes jurisprudenciais vêm-se

delineando três principais, que importa destacar como fundamentais: “a) O reembolso pela seguradora é sempre devido porque representa o desvalor da acção, uma vez que o risco contratualmente assumido não se compadece com condutores que agem sob o efeito do álcool e que preconiza o efeito

automático da existência do direito de regresso [v. g. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Abril de 1995, in Colectânea de Jurisprudência, (S) vol. III-1, p. 151, e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Abril de 1999, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 486, p. 307]; b) A seguradora só tem direito de regresso se provar que o sinistro foi causado pela taxa de alcoolemia de que o condutor era portador [v., v. g., Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Janeiro de 1993, in Colectânea de Jurisprudência, (S) vol. I-1, p. 104, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 7 de Dezembro de 1994, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 442, p. 155, Acórdão do

Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 1997, in Colectânea de

Jurisprudência, vol. V-1, p. 39 e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Janeiro de 1997. c) O direito de regresso só existe se a situação de

alcoolemia for causa do acidente, embora tal relação seja de presumir nos termos do n.º 2 do artigo 1.º da Lei n.º 3/82, do artigo 350.º do Código Civil e do artigo 81.º do C. E. (Acórdão da Relação de Lisboa de 13 de Julho de 1995, in Boletim do Ministério da Justiça, n.º 449, p. 429)”.

Pondo fim à polémica, este acórdão entendeu uniformizar a jurisprudência determinando que “a alínea c) do artigo 19.º do Decreto-Lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro, exige para a procedência do direito de regresso contra o condutor por ter agido sob influência do álcool o ónus da prova pela seguradora do nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente”.

Portanto, face a este acórdão e no que toca à condução sob o efeito do álcool, a seguradora tem que provar o nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente.

Porém, aqui o que está em causa é o direito de regresso da seguradora em relação ao condutor que não esteja habilitado com a respectiva

(17)

carta de condução. E segundo a formulação legal a seguradora terá “direito de regresso contra o condutor, se este não estiver legal habilitado”. Ou seja, para que o direito de regresso se efective, satisfeita a indemnização por parte da seguradora, apenas será necessário demonstrar-se que o condutor, aquando do acidente, não se encontrava legalmente habilitado para a condução.

Segundo cremos, o legislador entendeu que, nestas circunstâncias, seria de considerar que o condutor não teria os conhecimentos e a perícia necessários à condução automóvel, julgando correcto punir civilmente a conduta

inadequada do condutor, bastando-se com o facto de ele não se encontrar legalmente habilitado para a condução. Neste sentido refere-se

apropriadamente no acórdão deste STJ de 20-5-2003 (www.dgsi.pt/jstj.nsf) “ mas é precisamente a partir da redacção desta al. f) (do art. 19º do Dec-Lei 522/85) que se pode concluir que a lei quis punir, também com as armas do direito civil (sublinhado nosso) os condutores que abandonam o sinistrado, que não têm habilitação legal para conduzir ou que conduzem sob o efeito de álcool ou produtos tóxicos semelhantes, como dito na al. c)”.

Quanto ao (invocado) paralelismo entre a situação dos autos e o direito de regresso em caso do condutor apresentar uma taxa de alcoolémica superior à legal[2], sublinharemos que o dispositivo é claro em afirmar que este direito só se verifica quando ele “tiver agido sob a influência do álcool”.

Em virtude desta circunstância é que no acórdão uniformizador 6/2002 se ponderou que “… no caso em apreço exige-se que haja condução sob

influência do álcool a ditar o comportamento do condutor. Não é suficiente que o condutor estivesse sob a influência do álcool, sendo necessário que esse facto seja a causa ou uma das causas do acidente” e, por isso, se produziu a determinação jurisprudencial acima mencionada. Ora, isto não sucede no caso de condução inabilitada, pois a lei não exige a prova (e alegação) de que o acidente se verificou em razão da inabilitação legal do condutor. Face à formulação legal, será suficiente a constatação de que o condutor não se encontrava, à data do acidente, habilitado legalmente a conduzir. A

enunciação legal limitou-se a prever factos objectivos, mais concretamente o direito de regresso da seguradora contra condutor que não se encontrar legalmente habilitado para a condução. A este propósito refere-se no douto acórdão deste STJ de 20-5-2003 já acima referido, que a lei “limitou-se a prever factos, comportamentos passivos e criminalmente censurados noutras disposições legais, já antes ética e socialmente reprovados, sem curar de saber se esses comportamentos foram causais do acidente ou factores de agravamento dos danos”.

(18)

Como se sabe, a interpretação da lei deve fazer-se nos termos do art. 9º do C.Civil. É de supor que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. Nesta conformidade, somos em crer que se o legislador quisesse restringir o direito de regresso da seguradora apenas aos casos em que a falta de habilitação legal para a condução fosse a causa do acidente e dos danos, não deixaria de exprimir esse sentido.

Por outro lado, decorre do nº 2 deste art. 9º que na interpretação da lei, não deve o intérprete considerar “o pensamento

legislativo que não tenha na letra da lei o mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso” e, nesta contexto, não será possível interpretar a norma no sentido de que, para se exercer o direito de regresso, será necessário (à seguradora) provar, para além da falta de habilitação legal do condutor, que esta fosse a causa do acidente, pois este elemento está, patentemente, ausente da dispositivo. O legislador, na formulação legal, foi concreto e elucidativo, tendo-se limitado a prever um facto objectivo, sem curar de saber se esse facto causou o acidente e os danos.

A este propósito refere-se no dito acórdão deste STJ de 20-5-2003 que “um Legislador que é suposto consagrar as soluções mais

acertadas e exprimir em termos adequados o seu pensamento teria deixado na letra da al. c), se fosse essa a sua intenção, algum elemento no sentido de apenas punir esses condutores quando a inabilitação legal (não interessa considerar aqui as demais hipóteses ali previstas) tivesse sido causa dos danos. E não se enxerga aí rasto de tal mens legislatoris. Pelo contrário, depois de nas alíneas a), b) e d) ter usado expressões que fazem depender o direito de regresso da prova de comportamentos activos, de causas do

acidente e ou dos danos e de na al. f) ter deixado clara a repartição do ónus da prova, na al. c) limitou-se a prever factos, comportamentos passivos e

criminalmente censurados noutras disposições legais, já antes ética e

socialmente reprovados, sem curar de saber se esses comportamentos foram causais do acidente ou factores de agravamento dos danos. Este elemento literal e sistemático, a teleologia do preceito em análise, a natureza jurídica e finalidade do seguro obrigatório, a criminalização e a reprovação ético-social do comportamento em apreço permitem-nos concluir que na situação

prevenida na primeira parte da al. c) do art. 19.° do Dec-lei n.º 522/85, de 31 de Dezembro (condutor não legalmente habilitado) e para lhe ser deferido o reembolso do que pagou, a Seguradora apenas terá de provar que satisfez a

(19)

indemnização devida e que o condutor demandado se incluía na referida hipótese”.

Portanto dando resposta à questão colocada pelo recorrente poderemos concluir que para exercer o direito de regresso a que alude o art.

19º al. c) do Dec-Lei 522/85 de 31/12, não incumbe à seguradora a prova do nexo de causalidade adequada entre a falta de habilitação legal de condução e o acidente.

Neste sentido se tem orientado a jurisprudência maioritária que se conhece deste STJ, como se verifica compulsando, além do acórdão já acima referido, os Acs. 25-10-2012 e de 24-10-2006 ambos acessíveis em www.dgsi.pt/jstj.nsf.

2-5- A argumentação aduzida diz respeito ao direito de

regresso a que alude o art. 19º al. c) do Dec-Lei 522/85 de 31/12, pois era este o diploma em vigor à data do acidente dos autos[3].

Hoje o direito de regresso da seguradora está previsto no art.

27º nº 1 do Dec-Lei 291/2007 de 21/8 e, por isso, face ao que dispõe a al. c) do dispositivo, parece não ser necessário agora a empresa de seguros provar o nexo de causalidade adequada entre a condução sob o efeito do álcool e o acidente, dada a nova formulação que o legislador entendeu dar à disposição.

Na verdade, concede a norma o direito de regresso à seguradora contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduza com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, subtraindo, assim, do

dispositivo, a expressão “tiver agido (o condutor) sob o efeito do álcool”.

Entendeu, segundo cremos, o legislador de 2007 clarificar a situação,

bastando-se agora, para o exercício do direito de regresso da seguradora, com as ditas condições, ou seja, que o condutor tenha dado causa ao acidente e tenha conduzido com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida.

Face a esta (nova) formulação, a doutrina do dito acórdão uniformizador deixará de ter aplicação.

Não se nega que esta posição poderá ser polémica, mas não a desenvolveremos visto que a discussão, por não ter atinência prática com o caso dos autos, redundaria em lucubração meramente teórica e especulativa.

2-6- Diz ainda o recorrente que aceita que o nexo de

causalidade seja presumido, mas já não concorda que seja indestrutível (como

(20)

parece defender o acórdão em crise), uma vez que, a ser assim, tal entendimento pode conduzir a resultados completamente díspares.

A este respeito fazendo nossa a argumentação usada no acórdão deste STJ de 20-5-2003 já acima mencionado, diremos que “…fica livre e cabe ao demandado a prova de que, não obstante não estar legalmente habilitado a conduzir, o acidente e ou os maiores danos foram causados por terceiro, pelo lesado ou resultaram de circunstância de todo estranha a essa circunstância, ou que a Seguradora pagou mais que o devido. Só assim se evitam possíveis conluios ou fraudes entre lesado e Seguradora (conluios apenas por mor de raciocínio aqui falados) e se permite ao obrigado de

regresso amplo exercício dos seus direitos de defesa e do contraditório (art. 3.

° do CPC e 20.° da Constituição)”.

Ora no caso dos autos, o demandado, ora recorrente, não

logrou efectuar essa prova. Pelo contrário, demonstrou-se, inequivocamente, a sua culpa na produção do acidente.

2-7- Diz ainda o recorrente que é facto notório que tal

aleatoriedade não contribui, em nada, para a segurança e certeza do nosso direito e, bem assim, que não foi, seguramente, essa ideia de justiça aquela que o legislador pretendeu, ao fazer constar do art° 8° do CC que "nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito". A interpretar-se a norma do art. 27° n° 1, al. d), do DL 291/2007, no sentido de que - provada a culpa no acidente e a ausência de habilitação, não é possível "destruir" o nexo de causalidade adequada - pensamos que semelhante interpretação será segura e inequivocamente violadora do art. 13° e 18° da CRP, desde logo por não permitir ilidir a

presunção e por tratar de forma igual situações de uma enorme diversidade.

Segundo cremos, o recorrente clama aqui pela violação, pela decisão recorrida, do princípio da igualdade, já que são tratadas, no seu prisma, situações análogas de forma diversa. Os casos análogos serão a condução com taxa de alcoolemia superior à permitida e a condução sem habilitação legal.

Para além do que já dissemos em relação ao actual regime da condução com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida (com subtracção da expressão “tiver agido - o condutor - sob o efeito do álcool”),

(21)

acrescentaremos que não se nos afigura que tal princípio constitucional seja violado, mesmo atendendo-se à anterior formulação legal.

Quanto ao princípio de igualdade, que tem consagração

constitucional no art. 13º da Lei Fundamental, referem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da Republica Portuguesa Anotada – Vol. I, 3ª

edição revista, 1993, págs. 126 e 127, tal princípio “tem a ver

fundamentalmente com igual posição em matéria de direitos e deveres (daí a sua colocação sistemática nesta sede nesta sede de princípios gerais dos

direitos e deveres fundamentais). Essencialmente, ele consiste em duas coisas:

proibição de privilégios ou benefícios no gozo de qualquer direito ou na

isenção de qualquer dever; proibição de prejuízo ou detrimento na privação de qualquer direito ou na imposição de qualquer dever (n°2). No fundo, o

princípio da igualdade traduz-se na regra da generalidade na atribuição de direitos e na imposição de deveres. Em princípio, os direitos e vantagens devem beneficiar a todos; e os deveres e encargos devem impender sobre todos. O conteúdo jurídico-constitucional do princípio da igualdade tem vindo progressivamente a alargar-se, de acordo com a síntese dialéctica dos

«momentos» liberais, democráticos e sociais. O seu âmbito de protecção abrange na ordem constitucional portuguesa as seguintes dimensões: (a) proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor

objectivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais; (b) proibição de discriminação, não sendo legítimas quaisquer diferenciações de tratamento entre os cidadãos baseadas em categorias meramente subjectivas ou em razão dessas categorias (cfr. n° 2, onde se faz expressa menção de categorias subjectivas que

historicamente fundamentaram discriminações); (c) obrigação de

diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que pressupõe a eliminação, pelos poderes públicos, de desigualdades fácticas de natureza social, económica e cultural (cfr., por ex., arts. 9°/d ef, 58°-3/b e 74°-1).

Como se refere no acórdão deste Supremo Tribunal de 17-2-2005 (in Col. Jur. Acs. do STJ, 2005, Tomo 1, pág. 86) o princípio da

igualdade “não exige uma paridade absoluta de tratamento das situações, mas apenas o tratamento igual de situações iguais entre si e um tratamento

desigual de situações desiguais, de modo que a disciplina jurídica prescrita seja igual quando uniformes as condições objectivas das hipóteses ou

(22)

previsões regulares quando falte tal uniformidade; que também não há violação do princípio de igualdade quando a diferenciação de tratamento de situações aparentemente iguais se baseie em razões ponderosas e não em fundamentos meramente arbitrários ou desrazoáveis, traduzindo impulsos momentâneos ou caprichosos, sem sentido e consequência”.

De um modo sintético, poder-se-á dizer que o princípio da igualdade impõe um tratamento igualitário de todas as pessoas. Não proíbe que a situações diversas seja dado um tratamento diferenciado. O que se proíbe é o arbítrio, consistente em dar tratamento diverso a situações absolutamente análogas.

Ora, as situações em análise não são, como o recorrente deve convir, absolutamente análogas. Os comportamentos ou acções considerados são diversos.

A este propósito refere-se no douto acórdão deste STJ de 20-5-2003 já mencionado que “sobre o sentido do princípio da igualdade sob as vestes de proibição do arbítrio na jurisprudência constitucional portuguesa cfr., por exemplo, Ac. TC 44/84, DR, II Série, de 22/5; Ac.TC 186/90, DR, II Série, de 12/9; Ac. 187/90, DR, II Série, de 12/9; Ac. TC 188/90, DR, II Série, de 12/9. Cfr. por último, 330/93, 38 1/93, 16/93, 335/94, 486/96, 536/96, 786/96. Afirma-se, por exemplo, no Ac. 39/88: «O princípio da igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o arbítrio; ou seja, proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável, segundo critérios de valor objectivo constitucionalmente relevantes. Proíbe também que se tratem por igual situações essencialmente desiguais. E proíbe ainda a discriminação: ou seja, as diferenciações de tratamento fundadas em

categorias meramente subjectivas como são as indicadas exemplificativamente no n.º 2 do artigo 13º (15). Não se vê onde está a discriminação, a

desigualdade, o tratamento desproporcionado quando se confere à

Seguradora que, por força da lei, adiantou a indemnização devida ao lesado, o direito de pedir o seu reembolso nos casos em que a mesma lei assim o

determina. Desigualdade haveria se o segurado condutor devidamente

habilitado tivesse que suportar, também ele, os custos dos danos provocados por quem não curou de adquirir a habilitação legal, ou se a lei que só permite a condução por indivíduos habilitados quedasse letra mora, sem qualquer sanção para quem, como o R. ora Recorrente, se sentisse desobrigado de a acatar”.

(23)

Assim, não se verifica a inconstitucionalidade invocada pelo recorrente.

Quer isto tudo dizer que o acórdão recorrido merece plena confirmação.

Nos termos dos arts. 713º nº 7 e 726º do C.P.Civil, elabora-se o seguinte sumário:

Para exercer o direito de regresso a que alude o art. 19º al. c) do Dec-Lei 522/85 de 31/12, não incumbe à seguradora a prova do nexo de causalidade adequada entre a falta de habilitação legal de condução e o acidente.

Não se verifica a violação do princípio constitucional da igualdade invocado, pois as situações em análise não são absolutamente análogas. Os comportamentos ou acções considerados são diversos.

III- Decisão:

Por tudo o exposto, nega-se a revista.

Custas pelo recorrente.

Garcia Calejo (Relator) * Helder Roque

Gregório Silva Jesus ---

[1] Diploma que deverá ser aplicável ao presente caso, dado o momento do acidente. Hoje vigora o Dec-Lei 291/2007 de 21/8 que, porém, no que toca ao direito de regresso da seguradora (no caso do condutor não habilitado

legalmente para conduzir), estabelece idêntica prorrogativa (art. 27º nº 1 al.

d))

[2] Hoje a formulação legal é, no que toca à condução com álcool algo diversa.

Com efeito o art. 27º nº 1 do Dec-Lei 291/2007 de 21/8 estabelece que “ satisfeita a indemnização, a empresa de seguros apenas tem direito de

regresso …c) contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida”,

subtraindo-se, assim, a expressão de condução “sob a influência do álcool”.

(24)

[3] Nos termos do art. 95º do Dec-Lei 291/2007 de 21/8, este diploma só entrou em vigor em 21-10-2007.

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