• Nenhum resultado encontrado

A alienação fiduciária em contratos de adesão e a sua sujeição ao art. 53, caput, Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2018

Share "A alienação fiduciária em contratos de adesão e a sua sujeição ao art. 53, caput, Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990"

Copied!
91
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ FACULDADE DE DIREITO

JOSÉ RODRIGO MIRANDA DE SOUSA

A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM CONTRATOS DE ADESÃO E A SUA SUJEIÇÃO AO ART. 53, CAPUT, LEI Nº 8.078 DE 11 DE SETEMBRO DE 1990

(2)

JOSÉ RODRIGO MIRANDA DE SOUSA

A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM CONTRATOS DE ADESÃO E A SUA SUJEIÇÃO AO ART. 53, CAPUT, LEI Nº 8.078 DE 11 DE SETEMBRO DE 1990

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito, da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Matias Joaquim Coelho Neto

(3)

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação Universidade Federal do Ceará

Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

S725a Sousa, José Rodrigo Miranda de.

A alienação fiduciária em contratos de adesão e a sua sujeição ao art. 53, caput, Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990 / José Rodrigo Miranda de Sousa. — 2015.

86 f. ; 30 cm.

Monografia (graduação) — Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2015.

Área de Concentração: Direito Empresarial.

Orientação: Prof. Me. Matias Joaquim Coelho Neto.

1. Alienação fiduciária - Brasil. 2. Contrato bancário. 3. Falência - Brasil. I. Coelho Neto, Matias Joaquim (orient.). II. Universidade Federal do Ceará — Graduação em Direito. III. Título.

(4)

JOSÉ RODRIGO MIRANDA DE SOUSA

A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM CONTRATOS DE ADESÃO E A SUA SUJEIÇÃO AO ART. 53, CAPUT, LEI Nº 8.078 DE 11 DE SETEMBRO DE 1990

Monografia submetida à Coordenação do Curso de Graduação em Direito, da Universidade Federal do Ceará, como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Avaliação: __/___/___

BANCA EXAMINADORA

__________________________________________ Prof. Dr. Matias Joaquim Coelho Neto (Orientador)

Universidade Federal do Ceará — UFC

__________________________________________ Prof. M.Sc. William Paiva Marques Júnior

Universidade Federal do Ceará — UFC

___________________________________________ Prof. M.Sc. Álisson José Maia Melo

(5)
(6)

AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Dr. Matias Joaquim Prof. Dr. Matias Joaquim Coelho Neto, pela orientação.

Ao Prof. M.Sc. William Paiva Marques Junior, pelas excelentes recomendações bibliográficas e por ter feito parte da Banca Examinadora.

Ao Prof. M.Sc. Álisson José Maia Melo, por ter feito parte da Banca Examinadora e pelas contribuições e sugestões.

(7)

RESUMO

Esta monografia tem como objetivo discorrer sobre a característica de contrato de adesão dos negócios garantidos por alienação fiduciária, da sujeição destes às regras dispostas no Código de Defesa do Consumidor (CDC), e, em especial, a sobre a possibilidade de aplicação do art. 53, caput, do CDC nas relações entre financeira/fiduciária e devedor/fiduciante. A escolha desse tema se dá pela essencialidade desse negócio jurídico nas atuais relações comerciais e na expansão do crédito que possibilitou a recrudescimento do mercado de consumo de bens de alto valor aquisitivo, possibilitando acesso a esses bens por um número maior de pessoas. Também tem em vista a modificações na aplicação desse instituto antes as reformas empreendidas pela doutrina, jurisprudência e pelos legisladores constitucionais e infraconstitucionais, que modificaram substancialmente a forma como ele vem sendo aplicado, devido à garantia de novos direitos fundamentais. A análise se fará pela pesquisa documental das principais decisões envolvendo o instituto em analise e pela pesquisa bibliográfica das principais obras, artigos e pareceres que forem pertinentes ao tema.

(8)

ABSTRACT

This paper aims to discuss the membership contract characteristic of guaranteed business by liens, the subjection of these rules laid out in the Consumer Defense Code (CPC), and, in particular, about the possibility of application of art. 53, caput, of the CDC in the relationship between financial/fiduciary and debtor/trustor. The choice of this topic is given by the essentiality of this legal business in the current business relations and the expansion of credit that enabled the rise in consumption of high net value goods market, enabling access to these goods by a greater number of people. It also has a view to changes in the application of this instrument before the reforms undertaken by the doctrine, jurisprudence and the constitutional and infra legislators, which substantially modified the way it has been applied due to secure new fundamental rights. The analysis will be done by desk research of major decisions involving the institute for analysis and the literature of the major works, articles and opinions that are relevant to the topic.

(9)

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABECIP Associação Brasileira de Crédito Imobiliário e Poupança AgREsp Agravo no Recurso Especial

AI Ato Institucional

AR Aviso de Recebimento

Art. Artigo

BNH Banco Nacional de Habitação BC Banco Central

CC/1916 Código de Civil de 1916 CC/2002 Novo Código Civil de 2002 CDC Código de Defesa do Consumidor CRI Certificados e Recebíveis Imobiliários

CF/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CMN Conselho Monetário Nacional

CNT Código Nacional de Trânsito CPC/73 Código de Processo Civil CPC/2015 Novo Código de Processo Civil CTB Código de Trânsito Brasileiro CTN Código Tributário Nacional DJe Diário de Justiça Eletrônico

EC Emenda Constitucional

FCVS Fundo de Compensação de Variação Salarial FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço

HC Habeas Corpus

IPC Índice de Preços ao Consumidor

IPTU Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana ITBI Imposto sobre Transmissão de Bens Inter Vivos LINDB Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro

RE Recurso Extraordinário

Renavam Registro Nacional de Veículos Automotores

REsp Recurso Especial

(10)

SFI Sistema Financeiro Imobiliário STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça

(11)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 10

2 A ALIENÇÃO FIDUCIÁRIA NO DIREITO BRASILEIRO ... 12

2.1 Histórico do Instituto no Brasil ... 12

2.2 Conceito ... 16

2.3 A Natureza da Alienação Fiduciária ... 17

2.3.1 A Natureza Jurídica do Negócio ... 19

2.4 Características Gerais ... 20

2.4.1 A Característica da Resolubilidade e da Restrição da Propriedade ... 21

2.5 Os Elementos do Negócio Fiduciário ... 22

2.5.1 Os Sujeitos ... 23

2.5.1.1 O Fiduciante ... 23

2.5.1.2 O Fiduciário ... 24

2.5.2 Objeto ... 26

2.5.2.1 Objeto da Alienação Fiduciária de Bens Móveis ... 27

2.5.2.2 Objeto Da Alienação Fiduciária de Bens Imóveis ... 30

2.5.3 A Forma ... 33

3 O PAGAMENTO E O INADIMPLEMENTO ... 39

3.1 O Pagamento e Seus Efeitos ... 39

3.2 O Inadimplemento e Seus Efeitos... 44

3.2.1 Disposições Gerais ... 44

3.2.2 Os Efeitos do Inadimplemento na Alienação Fiduciária de Bens Móveis ... 49

3.2.2.1 Vencimento, Constituição em Mora e Processo Executivo ... 49

3.2.2.2 Ação de Busca e Apreensão ... 52

3.2.2.3 Ação de Depósito ... 57

3.2.2.3.1 A Prisão Civil do Depositário Infiel ... 58

3.2.2.4 Ação Possessória ... 61

3.2.2.5 Ação Executória ... 61

3.3 Os Efeitos do Inadimplemento na Alienação de Bens Imóveis ... 62

3.3.1 Os Efeitos do Vencimento e a Constituição em Mora ... 62

3.3.2 Consolidação da Propriedade nas Mãos do Fiduciante Leilão Extrajudicial ... 64

3.3.2.1 Certidão de Decurso de Prazo ... 64

3.3.2.2 Leilão ... 65

(12)

4 A ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM CONTRATOS DE ADESÃO E A SUA

SUJEIÇÃO AO ART. 53, CAPUT, LEI Nº 8.078 DE 11 DE SETEMBRO DE 1990 ... 74

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 84

REFERÊNCIAS ... 85

- Bibliográficas ... 85

(13)

1 INTRODUÇÃO

Esta monografia tem como objetivo discorrer sobre o instituto da alienação fiduciária em contratos de adesão e da sujeição destes às regras dispostas no Código de Defesa do Consumidor (CDC), e, em especial, a sobre a possibilidade de aplicação do art. 53, caput, do CDC nas relações entre financeira/fiduciária e devedor/fiduciante.

Este tema é bastante polêmico na doutrina e na jurisprudência, visto ser a alienação fiduciária uma garantia tão muito usada nos dias atuais para garantir negócios de venda de bens móveis ou imóveis por longos prazos de vigência.

A criação dessa garantia no ordenamento nacional se deu pela necessidade de se fomentar o crescimento industrial no país. Esse só seria possível com a solidificação do setor financeiro, criando-se um eficaz meio de financiamento e de dissolução de crédito no país.

Isso ficava inviabilizado devido à dificuldade de recuperação desses créditos por meio dos tradicionais meios de garantia previstos no Código Civil de 1916 e no Código Civil de 2002, como o penhor, a hipoteca e a anticrese. A dificuldade jurídica e os custos com o resgate desse crédito desmotivavam os investidores.

Esse tipo de negócio tem tido grande destaque pela grande facilidade para se recuperar o crédito, em comparação com as garantias tradicionais. Diferente dos métodos tradicionais de recuperação que se utilizam das vias judiciais, a alienação fiduciária utiliza-se de meios próprios de execução extrajudicial, os quais são muito mais céleres.

As garantias tradicionais fracassaram ante a grande dificuldade na recuperar de créditos, podendo isso ser explicado pela grande dilação processual e pela mora tradicional no judiciário, fatos estes que tiravam a liquidez desses créditos, desestimulando mais investidores de investirem no setor imobiliário e fazia com que o crédito ficasse cada vez mais caro no mercado.

A morosidade do processo de recuperação era um empecilho que dificultava a viabilidade dos negócios de financiamento. Mesmo eles sendo feitos pela hipoteca de um bem, não havia a garantia de que se teria o crédito de volta, pois o mesmo bem, após a insolvência do devedor, poderia ser dado em garantia de outras dívidas, como as de natureza trabalhista, alimentícia, ou fiscal.

(14)

do seu art. 53, caput, o qual dispõe que é vedada a previsão de cláusulas contratuais que previamente disponham sobre a perda total das parcelas pagas após a retomada do bem.

Os dispositivos que regulam a alienação fiduciária são a Lei nº 4.728 de 1965, a qual trata da aplicação desse instituto junto ao mercado financeiro de capitais; o Decreto-Lei nº 911 de 1969, que alterou a parte processual referente ao processo executivo para a retomada do bem dado em garantia; e a Lei nº 9.514 de 1997, a qual regula o instituto aplicável às alienações em garantia de bens imóveis, e sobre a instituição do Sistema Financeiro Imobiliário (SFI).

As normas dispostas nos dispositivos reguladores da alienação fiduciária são bastante tendenciosas em favor da parte credora, causando um desequilíbrio contratual em benefício deste, sem uma efetiva contrapartida em favor do devedor.

A aplicação do CDC diminuiria esse desequilíbrio, prevendo no art. 53 a impossibilidade de perda total das parcelas pagas nesses contratos, quando da retomada e alienação desses bens.

Portanto, nós pretendemos resolver essa questão por meio da exposição de argumentos, de enunciados jurisprudenciais e de pesquisas doutrinárias que buscaram resolver essa questão, servindo essas fontes como base para conclusão final desse trabalho.

A escolha desse tema se dá pela essencialidade desse negócio jurídico nas relações comerciais atuais e na expansão do crédito financeiro, possibilitando o recrudescimento do mercado de consumo de bens de alto valor aquisitivo e o acesso a estes por um número bem maior de pessoas, tendo em vista as modificações na sua aplicação, as reformas lhe foram empreendidas pela doutrina, pela jurisprudência e pelos legisladores constitucionais e infraconstitucionais, que modificaram substancialmente a forma como ele vinha sendo aplicado, devido às garantias e aos direitos fundamentais trazidos pela Constituição Federal de 1988 (CF/88).

(15)

2 A ALIENÇÃO FIDUCIÁRIA NO DIREITO BRASILEIRO

Esse instituto é regulado no Brasil pela Lei nº 4.728 de 1965, a qual trata d alienação fiduciária junto ao mercado financeiro de capitais; pelo Decreto-Lei nº 911 de 1969, o qual alterou as regras processuais da Lei 4.728 de 1965, simplificando o processo de execução extrajudicial; pela Lei nº 9.514 de 1997, a qual regula a alienação de bens imóveis, criando disposições próprias, a parte do regramento anteriormente existente para garantia com bens móveis; e Código Civil de 2002, o qual regula a alienação fiduciária de bens móveis infungíveis, regulando também novos institutos de direito material.

Nos tópicos abaixo, será visto a forma como esse instituto nasceu, sua natureza e suas principais características.

2.1 Histórico do Instituto no Brasil

A alienação fiduciária teve sua origem no Direito Brasileiro por meio da Lei nº 4.728 de 1965, que regulou a alienação fiduciária de bens móveis junto ao mercado financeiro de capitais. Logo depois, foi criada a Lei nº 9.514/97, que disciplinou a aplicação desse instituto na garantia de financiamentos imobiliários.

Vindo do latim fiducia, a alienação fiduciária tem como pressuposto a confiança. Sua origem vem do Direito Romano, da figura do negócio fiduciário, tendo, à época, finalidade mais restrita. Existiam duas modalidades desse negócio jurídico, as quais eram a fidúcia cum creditore, a qual funcionava como um meio de garantia, transferindo temporariamente os bens gravados ao credor, a título de venda, para que ele os explore como seus, sob a condição do resgate do débito e, a certo prazo, os revenda ao devedor, tendo ficado proscrita pelo direito por conta das vantagens excessivas com que ficava o credor nessa relação, o qual poderia auferir um bem de valor bem maior do que o seu crédito, não ficando obrigado a restituir a diferença1. A segunda modalidade era a fiducia cum amico, na qual se operava também a transferência de bens a uma pessoa, mas com o objetivo de resguardá-los dos azares da fortuna adversa que ameace o proprietário, assumindo, o fiduciário, o compromisso de efetuar a sua emancipação2. Era uma relação de depósito entre um interessado e um terceiro depositário de confiança. Para resguardar esses bens contra

1 RIBEIRO, Monica Alves Costa Ribeiro. A Prisão Civil na Alienação Fiduciária. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 22.

(16)

eventuais infortúnios, ele os entregava a esse terceiro de confiança para guardá-los e cuidá-los. Segundo Valério de Oliveira Mazzuoli3,

[...] podemos identificar a sua origem histórica das fidúcias remonta à Lei das XII tábuas VI o seguinte texto: qum nexum faciet mandioiunque, uti lingua nuncupassit, ita jus esto. Por esta passagem e por outras do Digesto, afirma-se a existência da fidúcia (Grifo nosso).

Para alguns escritores, a alienação fiduciária também derivaria do trust receipt, instituído criado para financiamento dos revendedores de bens duráveis, que vendem pelo sistema de floor planning4.

No direito brasileiro, a alienação fiduciária foi instituída, inicialmente, por meio da Lei nº 4.728 de 1965, o qual a instituiu junto ao mercado de capitais.

Logo após, uma junta militar formado por Oficiais da Marinha e da Aeronáutica, usando das atribuições que lhe foram conferidas pelo art. 1º do Ato Institucional (AI) nº 12, de 31 de agosto de 1969, combinado com o § 1º do art. 2º do AI nº 5, de 13 de dezembro de 1968, outorgou o Decreto-Lei nº 911/69, por meio do qual foi revogada a parte processual do instituto da alienação fiduciária, tornando a execução extrajudicial da garantia afetada mais simplificada.

Tendo em vista o êxito desse meio de garantia para resgate de investimento no mercado de capitais, o legislador resolveu aplica-lo aos negócios imobiliários, como forma de garantir os créditos deles decorrentes. Além disso, havia, também, o fato de o Sistema Financeiro da Habitação (SFH), ter se mostrado um fiasco completo, tendo gerado aos cofres públicos um grande rombo.

Uma breve análise do que foi o SFH nos dá uma melhor noção do cenário econômico que motivou o legislador brasileiro a possibilitar a aplicação do instituto da alienação fiduciária no âmbito do sistema imobiliário.

O Sistema Financeiro de Habitação (SFH) foi instituído pela Lei nº 4.830, de 1964, com a finalidade de viabilizar o acesso da população de baixa renda à casa própria5 por meio de um programa de financiamento hipotecário. O SFH foi criado no âmbito de uma reformulação geral do Sistema Financeiro Nacional. Segundo artigo publicado em site da Associação Brasileira de Crédito Imobiliário e Poupança (ABECIP)6, “A mesma lei instituiu a

3 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Prisão Civil por Dívida no Pacto de São José da Costa Rica. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 7.

4 Orlando Gomes, Op. Cit. p. 18.

5 TÚLIO, Marcos. O Sistema Financeiro de Habitação. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/cursos/curso.asp?id_curso=765>. Acesso em 27 de março de 2015.

(17)

correção monetária, com objetivo de abrir o mercado para a colocação de títulos do governo e

viabilizar o financiamentos de longo prazo”.

A fonte dos recursos para os empréstimos era oriunda do antigo Banco Nacional de Habitação (BNH), sendo decorrentes de saldos de cadernetas de poupanças e do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

A primeira fase do programa, que foi até metade da década de 70, foi o período áureo do SFH. Nessa fase, houve um crescimento dos depósitos em poupança. Os recursos do FGTS também expandiram. Apareceram as Sociedades de Crédito Imobiliário e as Associações de Poupança e Empréstimo, formando o que se chamou de Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), sendo integrado por instituições financeiras especializadas na concessão de financiamentos habitacionais, tendo como fonte do repasse de seus recursos os depósitos em cadernetas de poupança e saldos de FGTS7.

A mesma Lei instituidora do SFH criou um mecanismo para dar maior tranquilidade aos tomadores de empréstimo, o qual era o Fundo de Compensação de Variação Salarial (FCVS), que tinha como objetivo assumir eventuais saldos devedores dos contratos após o vencimento do prazo de vigência dos mesmos, sendo este era atualizado por meio do Índice de Preços ao Consumidor (IPC).

A crise do SFH teve início por conta das crises financeiras ocorridas na década de 80, as quais foram a Segunda Crise do Petróleo, em seguida, a Crise da Divida Externa8, as quais causaram grande desemprego no país e aumento da inflação, fazendo com que o número de inadimplentes aos contratos de financiamentos imobiliários aumentasse vertiginosamente, sobrecarregando o FGVS. As prestações, à época, eram reajustadas de forma anual, enquanto que os saldos devedores eram atualizados de forma trimestral, gerando com isso um déficit. Os planos implementados pelo Governo para diminuir a inflação só fizeram agravar a situação econômica. Entre as medidas aplicadas, incluem-se o congelamento dos preços e a aplicação das tablitas às prestações (no Plano Cruzado Novo).

No início da Década de 90, o Governo visando diminuir a inflação, reteve boa parte dos recursos da caderneta de poupança, afetando seriamente o setor da construção civil. Por conta disso, o SFH tornou-se um fisco enquanto meio de disseminação de crédito e de fomento da construção civil, gerando para os cofres públicos um grande rombo, sendo este incluído na dívida interna do país. A crise desse sistema fez com que fossem

7 Idem.

(18)

elaborados projetos para a criação de outro sistema de investimento imobiliário, corrigindo-se as falhas que causaram o colapso.

Os financiamentos feitos na sistemática do SFH tinham o problema de serem feitos por meio de hipoteca. Os imóveis financiados por esse meio são beneficiados com a declaração de bem de família, não podendo eles ser penhorados para a garantia do pagamento de dívidas, o que era um entrave para a recuperação desses investimentos, causando a perda da liquidez dos seus títulos representativos.

Foi nesse momento que foi instituído, por meio da Lei nº 9.514 de 20 de novembro de 1997, o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI). O SFI funciona da seguinte maneira: a instituição financeira que concede o financiamento o imóvel vende o seu direito de crédito a uma companhia securitizadora que o divide em vários títulos, os quais são chamados de Certificados e Recebíveis Imobiliários (CRI), sendo eles comercializados no mercado secundário de capitais. Esta venda é uma forma de canalizar investimentos para o setor financeiro, fazendo com que haja uma maior rotatividade de investimentos, possibilitando que o investidor possa emprestar a mesma quantidade de dinheiro a um número bem maior de pessoas. Estes créditos possuem lastro e garantia no imóvel que deu origem a emissão do crédito9.

O legislador escolheu a alienação fiduciária como meio de garantia dos financiamentos imobiliários realizados dentro do SFI, diferente com o que aconteceu com o SFH, que usava a hipoteca, não então afetada pela declaração de bens de família ou pela falência das partes.

O credor do contrato principal garantido por esse instituto se beneficia do meio de execução extrajudicial autônomo instituído pelo instituto, o que a torna mais célere que os meios tradicionais de garantia.

Ao longo do seu desenvolvimento, a alienação fiduciária foi passando por muitas transformações. As mais importantes aconteceram pela superveniência da Constituição Federal de 1988 (CF/88), que instituiu novos direitos fundamentais, entre eles incluindo o direito fundamental à moradia (art. 6º, caput, da CF/88) e a proteção ao consumidor (art. 170, V, CF/88), considerado como parte hipossuficiente da relação. Os princípios fundamentais passaram a ter força normativa, impondo-se não apenas à Administração pública, mas também

(19)

aos particulares (eficácia horizontal dos direitos fundamentais), decorrendo isso do princípio da supremacia da Constituição e a constitucionalização do direito privado10.

Outra grande transformação ocorrida no instituto ocorreu devido à Emenda Constitucional (EC) nº 45 de 2004. Por meio desta, os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais (art. 5º, §3º, da CF/88). Segundo entendimento jurisprudencial, por conta da EC/45, foi abolida do ordenamento jurídico a possibilidade de prisão civil do depositário infiel, a qual era um importante meio de proteção da garantia.

2.2 Conceito

A doutrina define a alienação fiduciária como um negócio de garantia pelo qual o devedor, fiduciante, aliena fiduciariamente um bem ao credor, em garantia de um contrato principal.

Segundo Silvio Rodrigues11:

A alienação fiduciária em garantia é o negócio jurídico mediante o qual o adquirente de um bem transfere o domínio do mesmo ao credor que emprestou dinheiro para pagar-lhe o preço, continuando, entretanto, o alienante a possuí-lo pelo constituto possessório , resolvendo-se o domínio do credor quando for pago de seu crédito. Para Orlando Gomes12,

Em sentido lato, a alienação em garantia é o negócio jurídico pelo qual uma das partes adquire, em confiança, a propriedade de bem, obrigando-se a devolvê-la quando se verifique o acontecimento a que se tenha subordinado tal obrigação, ou lhe seja perdida a restituição.

Segundo a definição legal, contida no art. 22, caput, Lei nº 9.514/1997, a alienação fiduciária consiste no negócio jurídico pelo qual o devedor transfere a propriedade resolúvel de bem móvel ou imóvel, com o escopo de garantia pelo crédito contratado.

Também na forma do art. 66, da Lei nº 4.728/65, alterado pelo Decreto-Lei nº 911, de 1969, a alienação fiduciária em garantia transfere ao credor o domínio resolúvel e a posse indireta da coisa móvel alienada, independentemente da tradição efetiva do bem, tornando-se o alienante ou devedor em possuidor direto e depositário com todas as responsabilidades e encargos que lhe incumbem de acordo com a lei civil e penal.

10 RIBEIRO, Wesllay Carlos. Aplicação dos Direitos Fundamentais entre Particulares. 2009. Disponível em: < http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7733>. Acesso em 14/05/2015.

11 RODRIGUES, Sílvio. Direito Civil. v. 5. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 241.

(20)

Por este negócio, o devedor transfere o domínio resolúvel de um bem de seu patrimônio ao credor, em garantia do pagamento de um crédito, sendo que esta se resolverá pelo pagamento, devendo ele ser entregue de volta ao alienante.

É um típico negócio resolúvel, cuja condição resolutiva da garantia é o pagamento do crédito constituído, seja por mútuo, por contrato de compra e venda ou por instrumento atípico que estabeleça obrigações recíprocas de pagamento, resolvendo-se a propriedade do fiduciário pelo pagamento integral do débito.

2.3 A Natureza da Alienação Fiduciária

A alienação fiduciária possui uma natureza mista entre um negócio contratual e real de garantia, no qual há a cessão do domínio resolúvel de um bem ao fiduciário para garantir o cumprimento de uma obrigação, sendo o pagamento sua condição resolutiva.

Pelo fato da alienação fiduciária ser um negócio de natureza real de garantia, este negócio tem uma eficácia erga omnes, o que diz respeito à transmissão da titularidade do direito, ou seja, em relação ao seu título outorgativo de titularidade fiduciária13. Disso decorre que o bem alienado em garantia constitui um patrimônio apartado, ou “patrimônio de afetação”, sendo, pois, que o direito alienado ao credor ou a posse direta do devedor não constituirá ativo financeiro para nenhuma das partes para fins de falência ou penhora14.

Na perspectiva da limitação dos poderes do adquirente da propriedade, este negócio é explicado por meio de três teorias.

Segundo Orlando Gomes15:

Serve a primeira de um pacto obrigacional agregado à transferência da propriedade, que se destina a neutralizar o efeito real da transmissão, condicionando-o ao fim especial para o qual ela se realiza. As raízes dessa explicação encontram-se no direito romano.

A segunda teoria, de inspiração alemã, recorre à construção resolutiva para justificar a limitação, no tempo e no conteúdo, do direito real do fiduciário. Sustentam seus adeptos que ele adquire uma propriedade temporária, para fim determinado. A terceira teoria dissocia o direito do fiduciário, assinalando que, nas relações externas, é de propriedade, e, nas relações internas, de crédito, figurando ele, em certos casos, como um mandatário (fiducie cum creditore e cum amico), e, em outros, como accipiens.

13 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: plano de existência. 12. ed. São Paulo-SP: Editora Saraiva, 2003. p. 204.

14 CHALHUBI, Melhim Namem. Alienação Fiduciária em Segundo Grau? 2009. Disponível em: <http://www.extradigital.com.br/alienacao-fiduciaria-de-bens-imoveis-em-segundo-grau-por-melhim-namem-chalhub-e-afranio-carlos-cama/>. Acesso em 30/04/2015

(21)

A primeira teoria, a de origem romana, é chamada de “teoria do efeito duplo”,

pela qual este negócio produz dois efeitos distintos, porque, para ela, confluem dois contratos independentes, o de transmissão de domínio, e o que gera a obrigação de restituí-lo16,

O primeiro contrato opera, para o credor, a transferência da propriedade, atribuindo-a plenatribuindo-a e definitivatribuindo-amente. O segundo contratribuindo-ato obrigatribuindo-a o atribuindo-adquirente atribuindo-a se comportatribuindo-ar por forma a não impedir o resgate pelo transmitente, comprometendo-se a restituir a coisa recebida e, no caso negativo, a pagar o equivalente em dinheiro. Esse dois negócios jurídicos produzem efeitos distintos quanto à natureza e extensão. A eficácia do segundo contrato é puramente obrigacional e só atinge os contratantes, mas repercute na relação jurídica constituída no primeiro contrato, por ter a função de limitar o comportamento jurídico do adquirente no sentido de adequá-lo ao fim para o qual ele adquiriu o bem.

A segunda teoria, de origem alemã, é a da “propriedade sob condição resolutiva”, pela qual se permite o restabelecimento da condição anterior, de forma automática e imediata, pelo implemento da condição resolutiva ou pela extinção do débito.

A terceira teoria é a do “direito real limitado”, segundo a qual o fiduciante

transmite ao fiduciário um direito sui generis de conteúdo limitado. Esta teoria dissocia o direito do fiduciário, assinalando que, nas relações externas, é de garantia, enquanto que nas relações internas, é de crédito, figurando o credor, em certos casos, como um mandatário17.

Há, também, uma quarta teoria, a qual foi desenvolvida por Heymann, a “teoria da autorização”, segundo a qual a autorização constitutiva importa transmissão de um poder jurídico, atribuindo ao “autorizado” o poder de agir em nome próprio. Trata-se, basicamente, de uma legitimação de agir, segundo o consentimento prévio do titular do direito. O ato que pratica tem não só eficácia interna, mas também externa. Aplica-se a teoria ao negócio fiduciário, verifica-se que o fiduciante autoriza o fiduciário a dispor do bem, em nome próprio, isto é, como se lhe pertencesse, na confiança de que continuará a reconhecê-lo como titular do direito. Esta teoria se mostra inadequada para a sua aplicação à alienação fiduciária em garantia18.

A escolha de uma teoria ou de outra importa em definir a essência do poder jurídico do fiduciário. Do ponto de vista prático, importa na escolha das soluções porque atribuem limites diferentes a esse poder jurídico19.

16 GOMES, Orlando. Op. Cit. p. 43. 17 GOMES, Orlando. Op. cit. p. 44. 18 Ibdem. p. 48.

(22)

2.3.1 A Natureza Jurídica do Negócio

A dicotomia entre direito real e obrigacional resume esse instituto jurídico. A alienação fiduciária é um ato negocial quando se fala de alienar a coisa em garantia e tê-la de volta após o adimplemento da condição resolutiva, pelo fato dos sujeitos estarem reciprocamente obrigados; é um direito real, pois, o bem alienado é objeto de um direito real de garantia, com efeitos erga omnes (contra todos), mas de caráter transitório, pois a razão do seu título se justifica até o adimplemento da condição, ou seja, o pagamento.

Podemos dizer também que o bem é objeto de uma sequela, pelo fato de os bens gravados dessa forma ser executados em garantia do cumprimento de uma obrigação contratual, podendo ser exigidas contra qualquer pessoa que a detenha.

Para Silvio de Salvo Venosa20, ela, em seu ato de alienar, é um negócio contratual. É um negócio jurídico que visa à garantia fiduciária, esta, sim, um direito real.

Para Arnold Wald, é uma “[...] operação não tributada, na qual o devedor (alienante fiduciário) adquire o bem, que é revendido fiduciariamente ao financiador, ou seja, à instituição financeira (adquirente fiduciário)” (Grifo nosso)21.

Orlando Gomes22 também considera que a alienação fiduciária é uma espécie do gênero negócio fiduciário.

Para Miguel Saad, a alienação fiduciária não é espécie de negócio fiduciário, e sim direito real de garantia de categoria autônoma e que se identifica por ser acessório a um negócio resolúvel da propriedade. Para este autor, não se vislumbra, para a constituição desse negócio, a imprescindibilidade do elemento confiança23.

Podemos dizer, também, que a alienação fiduciária é um negócio acessório, pois o que se visa garantir é eficácia de contrato principal contra uma eventual inadimplência por parte do devedor. O que se almeja não é a transferência do domínio resolúvel, mas sim o cumprimento de obrigações estabelecidas. Podemos ter como exemplo o mútuo, o qual é o tipo mais comum a ser garantido por esse tipo de constrição, devido ao fato de ele ser um empréstimo de grandes somas em dinheiro, por um prazo bem dilatado, sendo, pois, necessário um efetivo meio de garantia para que possa fazer cumprirem-se as obrigações de forma contínua, durante toda a vigência do contrato.

20 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. 3. ed. São Paulo-SP: Editora Atlas S/A, v. 5. 2003. p. 550. 21 WALD, Arnold. Direito Civil: contrato em espécie. 19. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 40. 22 GOMES, Orlando. Op. Cit. p. 19, 31 e 40.

(23)

O bem fica gravado pelo gravame fiduciário, sendo que o seu alienante tem apenas a sua posse direta, não podendo aliená-lo a outra pessoa. O credor ficará com a posse indireta do bem gravado, podendo tomá-lo por meio de busca e apreensão, no caso de bem móvel, e as partes cumprirem as condições estabelecidas no Decreto-Lei nº 911/69, ou por meio de reintegração de posse, no caso de imóveis, ou meio executivo ordinário, na forma do CPC/73 ou do CPC/2015 (quando o seu prazo de vation legis acabar).

Segundo Dantzger, a alienação fiduciária é por excelência um contrato de garantia, pois já nasce para garantir um débito gerado por outro negócio, tido como principal24.

Quanto ao dever de restituição, este é de natureza pessoal, cabendo ao fiduciante, ou a quem o suceda na relação, exigir o seu cumprimento por parte da parte fiduciária, de quem o represente ou de quem lhe suceda25, após o cumprimento da condição resolutiva de pagamento do débito.

Portanto, a natureza do contrato de alienação fiduciária é de natureza real para o devedor fiduciante, por estar na posse de um bem do qual não detém a titularidade, e de natureza obrigacional para o credor, que tem obrigação pessoal de fornecer quitação para cancelamento do registro do gravame após o advento da condição resolutiva, sob pena de ser obrigado por meio de obrigação de fazer.

2.4 Características Gerais

A alienação fiduciária pode ser caracterizada como um negócio jurídico de garantia26, o qual tem por fim garantir uma obrigação; acessório, pois é um contrato que visa garantir o cumprimento de uma obrigação principal; comutativo, pois existe uma equivalência de obrigações; bilateral, pois existe um rol de prestações e de contraprestações recíprocas entre as partes, sendo, cada uma, credor e devedor de forma recíproca; típico, pois existe a previsão de sua forma e de suas principais cláusulas em dispositivos legais específicos; e formal, pois, para que tenha validade, exige-se que cumpra fielmente a forma prescrita em lei, ou seja, em conformidade ao disposto na Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, modificado pelo Decreto-Lei nº 911, de 1º de outubro de 1969, e na Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997.

24 DANTZGER, Afrânio Carlos Camargo. Alienação Fiduciária em Garantia. São Paulo- SP: Editora Método, 2007. p. 39.

(24)

É, indubitavelmente, um contrato acessório, isto porque o que realmente é almejado não é a transferência definitiva do domínio da coisa alienada ao credor, mas a realização de um contrato principal, sendo que a alienação é apenas uma forma de garantia contra uma possível inadimplência por parte do alienante em relação a sua obrigação de pagar o crédito que lhe foi concedido. Geralmente, os principais contratos garantidos são o de empréstimo a mútuo ou o de compra e venda.

É um contrato formal, pois, dependendo do tipo do objeto, se móvel ou imóvel, exige-se uma forma pré-estabelecida em lei para que tenha efeitos. Para Orlando Gomes27, “o

contrato de alienação fiduciária não está sujeito para a sua validade e eficácia a forma

determinada”. Embora a posição do autor, esse negócio somente se prova por escrito, podendo o seu instrumento ser público ou particular, sendo que, quando registrado, deverá ser obrigatoriamente arquivado, por cópia ou micro filme, no Cartório de Títulos e Documentos do domicílio do credor, sob pena de não valer contra terceiros, quando se tratar de bens móveis fungíveis ou infungíveis (art. 66, § 1º, Lei nº 4.728 de 14 de outubro de 1965, alterado pelo Decreto-Lei nº 911, de 1º de outubro de 1969); para a alienação fiduciária de bens imóveis, além do formalismo do ato, há ainda a ainda a exigência do formalismo registral, pois deve o instrumento de contrato ser levado ao registro público, não só para que tenha validade contra terceiros, mas também para que tenha que se possa gozar do processo executório extrajudicial para resgate da garantia. Os atos e contratos que visem à constituição, à transferência, à modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública (art. 38, Lei nº 9.514/ 1965).

Segundo Pedro Celestino28, a natureza do contrato seria de um contrato assessório, de garantia, sendo também um contrato típico, formal, oneroso, unilateral, e comutativo.

2.4.1 A Característica da Resolubilidade e da Restrição da Propriedade

A alienação fiduciária em garantia apresenta duas características marcantes: a resolubilidade e a restrição da propriedade29.

27 GOMES, Orlando. Op.Cit. p. 57.

28 CELESTINO, Pedro. Alienação Fiduciária de Imóveis. Disponível em <pedrocelestino.jusbrasil.com.br/artigo/113705745/a-alienação-fiduciaria-de-imoveis>. Acesso em: 08 de abril de 2015.

(25)

A propriedade transferida é resolúvel, ficando esta limitada pelo tempo. Ela se resolve com o adimplemento da condição, sendo que, ocorrida esta, o fiduciante recobra automaticamente a propriedade da coisa após cumprimento da obrigação, em razão dessa resolubilidade, assumindo o título de proprietário pleno da coisa. Os efeitos do implemento da condição pelo fiduciante, em relação à aquisição da propriedade, são ex tunc 30.

Quanto à restrição da propriedade, o credor, adquirente, ou fiduciário, não tem a coisa com o animus de tê-la pra si de forma plena e inescusável, mas a tem assumindo o compromisso de restituí-la ao fiduciante, ou devedor, logo após este cumprir a sua parte no contrato, pagando o crédito constituído, sendo que os efeitos do adimplemento da obrigação são ex tunc e erga omnes, e o fiduciário nunca terá tido a faculdade de usar e perceber os frutos da propriedade que foi lhe transmitida a título de garantia31.

Por isso que no art. 25 da Lei nº 9.514/1997, é disposto que, “com o pagamento da dívida e seus encargos, resolve-se, nos termos deste artigo, a propriedade fiduciária do

imóvel”. Com o pagamento da dívida, o título que anteriormente constituía a propriedade

fiduciária nas mãos do fiduciário deve ser cancelado, devendo o fiduciário fornecer o respectivo termo de quitação ao fiduciante, no prazo de 30 dias, a contar da data da liquidação da dívida, sob pena de multa em favor deste, equivalente à meio por cento ao mês, ou fração, sobre o valor do contrato.

Na alienação fiduciária de bem móveis, não há previsão legal de punição ao fiduciário, nos casos em que este se negue a fornecer o título de quitação para cancelamento do gravame no Cartório de Títulos e Documentos do domicílio do fiduciário ou no Registro de Veículos, mas ele poderá ser coagido, por meio de obrigação de fazer com pedido de astreintes, ou seja, multa rotativa.

2.5 Os Elementos do Negócio Fiduciário

Os elementos do negócio fiduciário de bens móveis ou imóveis são: os sujeitos da relação (fiduciante e fiduciário), o objeto (bem móvel, este o qual é geralmente um veículo automotor, ou bem imóvel, podendo ser propriedade, direito real de uso, superfície, entre outros) e a forma, os quais têm as suas qualificações básicas dispostas nas suas leis específicas.

(26)

2.5.1 Os Sujeitos

Os sujeitos da relação são o devedor da relação principal, chamado de alienante ou fiduciante na relação fiduciária, pelo fato de ser aquele que aliena o bem em garantia; e o credor da relação principal, chamado de fiduciário, por ficar com o titularidade do bem alienado.

Os sujeitos devem ser capazes de realizar atos da vida civil, ou seja, devem ser capazes juridicamente para realizar os atos necessários para a vida civil, sendo uma capacidade necessária para a constituição do negócio fiduciário.

2.5.1.1 O Fiduciante

O alienante, além de ser capaz, deve também ter capacidade de disposição do bem dado em garantia. Deve, pois, ter capacidade de alienar a coisa fiduciariamente.

Poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica. Segundo a Lei nº 4.728/65, e no Decreto-Lei nº 911/69, poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica. Na alienação de bem imóveis, o negócio poderá ser contratado por pessoa física ou jurídica, não sendo privativo das entidades que atuam no Sistema Financeiro Imobiliário (SFI) (art. 22, § 1º, Lei 9.514/1997).

Para Orlando Gomes, o alienante deve ser proprietário do bem, sobre o qual tenha o poder de disposição, devendo, pois, ter a capacidade de agir32. A incapacidade relativa de uma das partes não pode ser invocada pela outra em benefício próprio, nem aos cointeressados capazes, salvo se, neste caso, foi indispensável o objeto do direito ou da obrigação comum (Art. 105, Código Civil de 2002). Um relativamente incapaz pode alienar um bem fiduciariamente, móvel ou imóvel, contanto que esteja assistido por seu representante legal.

O legislador, ao criar a Lei 9.514/97, dispôs que o alienante não precisa ter a propriedade da coisa no momento da constituição do negócio fiduciário. Também o art. 66, § 2º da Lei nº 4.728/65, dispõe que, se na data da assinatura do instrumento de alienação fiduciária o devedor ainda não for o proprietário da coisa móvel, o domínio fiduciário desta se transferirá ao credor no momento da aquisição da propriedade pelo fiduciário, independente de qualquer formalidade posterior. No Código Civil de 2002, o fiduciante poderá também ser pessoa física ou jurídica.

(27)

Na forma do que dispõe a Súmula nº 28 do STJ: “O contrato de alienação fiduciária em garantia pode ter por objeto bem que já integrava o patrimônio do devedor”.

A lei que cuida da alienação fiduciária de bens imóveis (Lei nº 9.514/1997) não cuida dessa possibilidade. Mas, pelos princípios contratuais, pelo fato de não haver na lei qualquer impedimento, essa disposição também poderá ser aplicado aos negócios fiduciários de bens imóveis, havendo a possibilidade de alienação de um objeto por parte do alienante que ainda não é de sua propriedade, contanto que o seja em breve.

Portanto, para que haja a alienação fiduciária de patrimônio, não é necessário que o alienante, no momento da constituição do ato, tenha sua propriedade.

2.5.1.2 O Fiduciário

O papel do fiduciário não é o de adquirir a propriedade definitiva e plena da coisa alienada, mas apenas torna-se titular de uma propriedade sob condição resolutiva, visto que, ao adquiri-la, contrai a obrigação de restituí-la se o alienante paga a dívida que ela garante33. O adquirente tem a coisa, mas não com intenção de tê-la para si, mas apenas como uma garantia para o cumprimento da contrapartida do devedor, ou alienante, no contrato, que no geral é o de mútuo.

Quanto à legitimidade para figurar como fiduciário nessa relação jurídica, diferente do fiduciante, que poderá ser tanto pessoa física ou jurídica, as leis que regulam o instituto dispõem de requisitos sobre a pessoa do fiduciário, havendo regras de capacidade para se figurar como fiduciário nesse negócio. Discute-se se essa possibilidade é exclusiva das instituições financeiras. Esse tema é bastante controverso na doutrina e o que se tem disposto na jurisprudência ainda é muito pouco. Há autores que sustentam que poderiam figurar como fiduciários qualquer pessoa física ou jurídica, enquanto que outros acham que somente financeiras teriam legitimidade ou estariam legitimadas para figurar como tal.

Para Orlando Gomes34, nesses negócios translativos, a posição de financeira é reservada às sociedades de credito e financiamento autorizadas a funcionar pelas autoridades monetárias do país. Esse monopólio traduz-se juridicamente no pressuposto de legitimação. Deve haver, em outras palavras, uma relação necessária entre os sujeitos do negócio e o interesse em jogo, de sorte que ao se afirmar que somente as financeiras podem adquirir fiduciariamente bens em garantia, não se declara que somente elas têm capacidade para

(28)

realizar essa aquisição, mas se adianta que são as pessoas unicamente legitimadas a efetuá-lo. A outras pessoas físicas ou jurídicas, falta, em suma, legitimidade.

Os que entendem ser possível que outras pessoas jurídicas, além das instituições financeiras, e, até mesmo, pessoas físicas, figurem como parte fiduciária nessa relação fundamentam essa possibilidade pelo fato dos dispositivos legais não preveem restrição alguma quanto a isso, sobretudo, pelo fato de que outros dispositivos vieram a autorizar a utilização da alienação fiduciária a outras situações, caso a caso, na forma como dispõe Melhim Namem Chalhub35,

A controversa questão ainda não tem orientação segura da jurisprudência, muito embora se registre firme tendência no sentido da aplicação restritiva do instituto, sobretudo considerando-se que outros diplomas legais vieram autorizar a utilização da alienação fiduciária a outras situações, caso a caso, reforçando a tese de que só podem ser garantidas por propriedade fiduciária as operações que a Lei define, de maneira especifica.

Para resolver essa polêmica, a Lei nº 9.514 de 1997, a qual rege a alienação fiduciária de bens imóveis, dispõe, em seu art. 22, § 1º, que a alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoas físicas ou jurídicas não sendo privativa das entidades que operam no Sistema Financeiro Imobiliário.

Com isso, resolve-se a questão em relação à alienação fiduciária de bens imóveis, mas, ao mesmo tempo, reforça-se a tese que qualquer pessoa pode contratar, também, no Decreto-Lei nº 911, não sendo privativo apenas das Instituições Financeiras.

Para que o art. 22, § 1º, da Lei nº 9.514 de 1997 tivesse esse entendimento, teve que passar por uma série de alterações em seu texto, as quais foram feitas, inicialmente, em seu parágrafo primeiro, pela Medida Provisória nº 2.223 de 2001, e, novamente, pela Lei nº 11.076/2004. O texto final desse dispositivo foi dado pela Lei nº 11.481 de 2007, o qual transformou o antigo parágrafo único do artigo em parágrafo primeiro, incluindo a possibilidade de alienação fiduciária de outros direitos reais.

O que o STJ tem entendido que o procedimento de busca e apreensão disposto no Decreto-Lei nº 911 de 1969 aplica-se exclusivamente às hipóteses da Seção XIV da Lei nº 4.728, de 14 de julho de 1965, ou quando o ônus da propriedade fiduciária tiver sido constituído para fins de garantia de débito fiscal ou previdenciário (art. 8-A, Decreto-Lei nº 911/69, alterado pela Lei nº 10.931, de 2004), dispondo que os procedimentos previstos no Diploma Civil (art. 1.361 a 1.368-B) e no Decreto-Lei são regimes jurídicos dúplices, não se confundindo. A medida de busca e apreensão, previsto na Lei reguladora do Mercado de

(29)

Capitais, consubstancia procedimento autônomo, de caráter satisfativo e de cognição sumária, que ostenta rito célere e específico com vistas à concessão de maiores garantias aos credores legitimados nesse dispositivo legal específico. O art. 8º-A do referido Decreto, incluído pela Lei nº 10.931/2004, determina que esse procedimento judicial especial se aplica exclusivamente às hipóteses de operações no mercado financeiro e de capitais, e às operações de garantia de débitos fiscais ou previdenciários. Com isso, é vedada a utilização do rito processual da busca e apreensão, tal qual disciplinado pelo Decreto-Lei nº 911/1969, ao credor fiduciário que não revista a condição de instituição financeira, lato sensu, ou de pessoa jurídica de direito público titular de créditos fiscais e previdenciários36. Portanto, no caso de fiduciário pessoa física ou pessoa jurídica que não seja instituição financeira autorizada a operar no mercado de capitais, estas deverão ajuizar um processo executivo ordinário para recuperar os seus créditos, sendo regulado pelo CPC/73 e pelo CPC/2015 (após o prazo de vacatio legis).

2.5.2 Objeto

Os requisitos de natureza objetiva dizem respeito aos tipos de coisas que podem ser objeto dos negócios fiduciários, de bens móveis e imóveis.

Em relação ao objeto da alienação fiduciária de bens móveis, como o próprio título dispõe, o objeto deve ser móvel, mas precisa ter determinadas características para que tenha utilidade jurídica necessária para que possa desempenhar a função de garantia de um negócio.

(30)

2.5.2.1 Objeto da Alienação Fiduciária de Bens Móveis

A alienação de bens móveis pode se dar segundo a forma disposta no Código Civil, nos arts. 1.361 a 1.369, para bens infungíveis, ou segundo a Lei nº 4.728/64 c/c Decreto-Lei nº 911/65, para alienações de bens móveis fungíveis, quando o credor for instituição financeira (sociedade de crédito e financiamento e investimento, com funcionamento autorizado e fiscalizado pelo Banco Central do Brasil), ou para garantia de débitos fiscais ou previdenciários, em favor de pessoa jurídica de direito público titular desses créditos (art. 66-B, da Lei nº 4.7228/64).

Para Orlando Gomes, o objeto da alienação fiduciária de bens móveis fungíveis precisa ser durável para que tenha condições de figurar como tal37,

Uma vez que, nesse contrato, alienante e adquirente são, respectivamente, um consumidor e uma financeira, a coisa alienada deve ter certas qualidades necessárias a que sua alienação possa desempenhar a função de garantia. Diz-se que precisa ser bem durável. Significa, com esta expressão, que a coisa alienada não pode ser das que se acabam com o primeiro uso. Por outras palavras, os bens consumíveis não podem ser objeto, no contrato de alienação fiduciária, da prestação que incumbe ao alienante. Bem é de ver, entretanto, que os bens duráveis estão sujeitos a perecimento progressivo, incluindo-se, assim, na categoria dos bens deterioráveis, mas, como ensinava Teixeira de Freitas, a coisa suscetível de se deteriorar, num lapso de tempo mais ou menos longo, não é consumível38.

A exigibilidade dessa regra é compreensível, pelo fato do título constitutivo da propriedade fiduciária só ser concedido para que figure como garantia de um crédito. Portanto, a obrigação será garantida enquanto a coisa alienada existir para garantir seu cumprimento, sendo uma forma de compensação no caso de eventual inadimplemento. Não haveria sentido em se alienar em garantia uma coisa que se deteriore ao seu primeiro uso, pois ficaria comprometida a eficácia e a segurança do cumprimento do negócio por parte do devedor.

Nas relações de consumo, o STJ tem entendido que a financeira não terá responsabilidade nos caso de vício do produto dado em garantia, ou seja, não haverá um dever de restituição por parte dela para com o devedor/consumidor. Pelo fato de os contratos de financiamento e o de compra e venda assinado com uma fornecedora não se confundirem, não deve haver responsabilidade subsidiária entre o fornecedor e instituição financeira, pois são feitos por sujeitos diferentes e por contratos diferentes. Esta não faz parte da relação de consumo como responsável subsidiário, pois o contrato de financiamento é distinto do contrato de aquisição do bem. O adquirente realiza o contrato de aquisição do bem, realizando

(31)

com a financeira apenas o contrato de mútuo para aquisição do valor para aquisição do bem, não havendo responsabilidade do banco pela durabilidade ou pela qualidade do bem, sendo o contrato de empréstimo autônomo em relação ao contrato de aquisição do veículo, ou bem móvel fungível ou infungível (REsp 1.014.547-DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 25/8/2009)39.

A situação muda de figura quando a financeira pertence ao mesmo grupo econômico da fornecedora, situação essa na qual o banco faz parte da relação e da cadeia de consumo, respondendo subsidiariamente pelos defeitos do bem alienado (REsp 1.379.839-SP, Rel. Originária Min. Nancy Andrighi, Rel. Para Acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/11/2014, DJe 15/12/2014)40.

O objeto precisa respeitar as exigências e os preceitos da teoria geral dos negócios jurídicos, que prescrevem que ele deverá ser lícito, possível, determinado ou determinável, devendo ser identificado por sinais característicos. A coisa precisa ser certa

39

REsp 1.014.547-DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 25/8/2009: Trata-se de ação de rescisão contratual cumulada com indenização por danos materiais e morais em desfavor de banco e da sociedade empresarial revendedora de veículo. A recorrida (autora) adquiriu veículo automotor usado que apresentou vícios redibitórios, tornando-o imprestável ao uso, fato incontroverso nos autos. No REsp, o banco suscita violação dos arts. 14 e 18 do CDC, inconformado por ter sido condenado no Tribunal a quo solidariamente com a empresa vendedora do veículo. Note-se que são dois contratos distintos, um de compra e venda do veículo e outro de mútuo garantido com alienação fiduciária. Isso posto, ao prosseguir o julgamento, a Turma, por maioria, conheceu do recurso e lhe deu provimento. Considerou-se que, na espécie, a instituição financeira não poderia ser reconhecida como fornecedora do veículo nem solidariamente responsável por eventuais defeitos ocultos que impedissem seu uso. O banco, no caso, é fornecedor, mas do serviço de crédito e de tudo que se relaciona a ele. Observou-se, todavia, que o pleito indenizatório, como o próprio interesse de agir da autora, legitima-se pelo defeito oculto no produto de exclusiva responsabilidade, no caso dos autos, de quem vendeu e lhe deu garantias. Assim, o causador dos danos materiais e morais (revendedora do veículo) deve responder perante a consumidora e essa responsabilidade deve abranger todas as características do negócio jurídico realizado.

40 REsp 1.379.839-SP, Rel. Originária Min. Nancy Andrighi, Rel. Para Acórdão Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/11/2014, DJe 15/12/2014: DIREITO DO CONSUMIDOR. RESCISÃO DE CONTRATO DE ARRENDAMENTO MERCANTIL VINCULADO A CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE AUTOMÓVEL. Na hipótese de rescisão de contrato de compra e venda de automóvel firmado entre consumidor e concessionária em razão de vício de qualidade do produto, deverá ser também rescindido o contrato de arrendamento mercantil do veículo defeituoso firmado com instituição financeira pertencente ao mesmo grupo econômico da montadora do veículo (banco de montadora). Inicialmente, esclareça-se que o microssistema normativo do CDC conferiu ao consumidor o direito de demandar contra quaisquer dos integrantes da cadeia produtiva com o objetivo de alcançar a plena reparação de prejuízos sofridos no curso da relação de consumo. Ademais, a regra do art. 18 do CDC, ao regular a responsabilidade por vício do produto, deixa expressa a responsabilidade solidária entre todos os fornecedores integrantes da cadeia de consumo. Nesse sentido, observe-se que as regras do art. 7º, § único, e do art. 25, § 1º, do CDC, estatuem claramente que,

“havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão pela reparação prevista nesta e nas Seções anteriores.” Amplia-se, assim, o nexo de imputação para abranger pessoas que, no sistema tradicional do Código Civil, não seriam atingidas, como é o caso da instituição financeira integrante do mesmo grupo econômico da montadora. Na hipótese ora em análise, não se trata de instituição financeira que atua como

“banco de varejo” — apenas concedendo financiamento ao consumidor para aquisição de um veículo novo ou usado sem vinculação direta com o fabricante —, mas sim de instituição financeira que atua como “banco de montadora”, isto é, que integra o mesmo grupo econômico da montadora que se beneficia com a venda de seus

(32)

corpara, ou seja, precisa ser individualizada pelo número e série de fabricação, pela marca da fabrica, por qualquer sinal indicativo41. Como indica o § 3º do art. 66, da Lei nº 4.728/65, alterada pelo Decreto-Lei nº 911/69, “Se a coisa alienada em garantia não se identifica por números, marcas e sinais indicados no instrumento de alienação fiduciária, cabe ao proprietário fiduciário o ônus da prova, contra terceiros, da identidade dos bens do seu domínio que se encontram em poder do devedor”. Esse parágrafo também nos mostra que é

possível a alienação de bens móveis sem que haja a identificação, mas cabendo ao fiduciário o ônus da prova do domínio contra terceiros.

Como explica Orlando Gomes42:

[...] nenhuma dúvida se pode ter de que são suscetíveis de alienação fiduciária bens cuja identidade não se possa estabelecer por esses sinais característicos. A autorização implícita não se justifica, entretanto, diante estrutura e da finalidade desse negócio jurídico. Trata-se de uma aberração, que, ademais, expõe terceiros ao risco de perda do bem adquirido se o fiduciário prova que é seu proprietário.

A evidência, o ônus da prova se transfere ao fiduciário somente quando se precisa argüir, contra terceiros, a sua condição de proprietário do bem. Para reclamá-lo do fiduciante, não arca com esse ônus, como pareceu, sem razão, a um escritor (Grifo nosso).

Há uma transferência do ônus da prova para o fiduciário, devendo, pois, provar contra terceiros o seu domínio.

Quanto à alienação fiduciária de bens móveis infungíveis, regulada pelo Código Civil de 2002, o art. 1.361dispõe que está se constitui com o registro do instrumento de contrato que lhe serve de garantia em Cartório de Títulos e Documentos.

A infungibilidade é característica que torna o bem peculiar, específico ou especial, não podendo ser simplesmente trocado ou substituído por outro. A singularidade invoca e sustenta a impossibilidade de substituição, quer no sentido qualitativo, quer em acepção quantitativa43.

Na forma do que dispõe Ilgo Alam Castro44,

Na prática, infungível será o bem objeto da alienação fiduciária, o qual não pode ser substituído por outro, mesmo que de igual qualidade, porque o bem específico alienado fiduciariamente é que é objeto da propriedade resolúvel. Em tese, o credor quererá o bem objeto de garantia e de domínio resolúvel, independentemente se o bem se desgastou, deteriorou (sem culpa ou dolo do devedor), porque assim fora acordado. Já o devedor, em caso de não cumprimento de inadimplemento de suas obrigações não é obrigado a substituir o bem por outro, mesmo que este tenha se deteriorado ou desgastado e sim o de entregar o próprio bem objeto da garantia.

41 GOMES, Orlando. Op.Cit. 42 GOMES, Orlando. Op. Cit. p. 51.

(33)

O bem gravado nessas situações possui características singulares, não podendo ser substituídos por outro de mesma natureza, ou espécie, seja por valor sentimental para determinado grupo de pessoas, ou por valor histórico, a um grupo social específico, havendo sobre eles a manifestação de um direito de personalidade. São exemplos deles os bens tombados como patrimônio histórico ou da humanidade, as obras de arte de artistas famosos, etc.

2.5.2.2 Objeto Da Alienação Fiduciária de Bens Imóveis

Na alienação de bens imóveis, a coisa alienada há de ser imóvel. Antes de serem realizadas as modificações trazidas pela Lei nº 11.481, de 2007, havia inúmeras discussões entorno do objeto da alienação fiduciária, tudo porque no dispositivo legal que dispunha sobre a sua definição, o art. 22, da Lei nº 9.514/1997, havia a possibilidade de

alienação de “imóvel concluído ou em conclusão”. Com as alterações que foram realizadas

pelo legislador, foram incluídos como objetos possíveis do negócio de alienação fiduciária, além da propriedade plena bens enfitêuticos, direito de uso especial para fins de moradia, o direito real de uso e a propriedade superficiária.

Com relação aos bens enfitêuticos, deverá ser exigível o pagamento do laudêmio, se houver a consolidação do domínio útil na pessoa do fiduciário, junto com o IPTU incidente sobre o imóvel. No antigo Código Civil de 1916, o art. 678 disciplinava que

“dá-se a enfiteuse, aforamento ou emprazamento, quando por ato entre vivos, ou de última vontade, o proprietário atribui a outrem o domínio útil do imóvel, pagando a pessoa, que adquire, e assim se constitui enfiteuta, ao senhorio direto uma pensão, ou foro anual, certo e

invariável”. A enfiteuse é o direito real mais extenso, o que permite a seu titular uma maior amplitude no exercícios de poderes inerente à propriedade45.

Não há mais a possibilidade da constituição de novas enfiteuses, havendo agora o direito de superfície, mas as que já foram constituídas antes da entrada em vigor do Código Civil de 2002 continuarão válidas se realizadas de acordo com o Código Civil de 1916, sendo que os seus efeitos posteriores serão regidos pelo Novo Código (art. 2.035, caput, CC/2002). Com isso, o legislador quis possibilitar que as pessoas que tem o domínio útil de algum imóvel constituído por meio de enfiteuse pudessem alienar esta fiduciariamente em garantia de algum crédito.

(34)

Com a Lei nº 11.481, de 2007, a qual modificou a Lei nº 9.636 de 1998, o direito de uso para fins de moradia e o direito real de uso podem ser objetos de dação em garantia real de dívidas e de créditos, como a hipoteca e a alienação fiduciária.

O direito de uso para fins de moradia é uma tentativa de solucionar o problema habitacional brasileiro da quantidade de casas construídas em terrenos públicos, os quais são insuscetíveis de usucapião, e de concretizar o princípio e garantia constitucional do direito à moradia e da função social da propriedade (Art. 5º, XXIII, 170, III e 182, § 2º, da CF/88), aplicando-se às propriedades da União, dos Estados e dos Municípios, inclusive às áreas de marinha, devendo ser concedida aos ocupantes que se enquadrem nos requisitos da MP nº 2.200, de 200146.

O direito real de uso foi instituído, inicialmente, pelo Decreto-Lei nº 271 de 1967, com a finalidade de regularização fundiária nas áreas urbanas e a tentativa de realizar a reforma agrária.

Rosângela A. Vilaça Bertoni dispõe47,

Como direito real, abrange única e exclusivamente imóveis públicos urbanos, destinados à moradia, excluindo-se os imóveis funcionais. Por ser alienável, possível de ser dado como garantia real, necessitando, consequentemente de seu registro, junto ao Serviço de Registros Imobiliário, de acordo com o item 37 do inciso 167 da Lei de Registros. Vale ressaltar a concessão de uso especial não há transferência domínio ao ocupante, mas apenas a posse, constituindo a favor dele um direito real, mas o bem continua a pertencer a Administração Pública.

O direito de uso constitui o direito real de usar uma coisa tirando dela o necessário para as suas necessidades e para as de sua família, nos limites descritos no ato constitutivo desse direito. Ele é se conceitua como o direito de usar e gozar de coisa alheia, sem alterar sua substância. Segundo Sílvio de Salvo Venosa48, “O usufrutuário não recebe o

ius abutendi, ou seja, o direito de alienar a coisa, a qual fica reservada ao nu-proprietário

como é rotulado o dono da propriedade nessa modalidade”.

Segundo o conceito tradicional, o direito de uso era o direito de usar a coisa sem dela se tirar os seus frutos49. No fructus sine usus, ocorria a cessão de uso a uma pessoa e o gozo dos frutos por outra. O Código Civil de 1916, no seu art. 742, estendeu os poderes do usuário, o qual tem a possibilidade de colher os frutos necessários a sua sobrevivência. Não

46 BERTONI, Rosângela A. Vilaça. Penhor Hipoteca e Anticrese. In.: MACHADO, Costa (Org.); CHINELLATO, Silmara Juny (Cood). Código Civil Interpretado. 5.ed. Barueri- SP: Manole Editora, 2012. p. 1.218.

(35)

houve mudanças no conteúdo original do artigo com a entrada do Novo Código Civil, o qual, no art. 1.412, apenas substituiu o termo fruirá por usará.

A Lei dispõe que é possível a alienação desse tipo de direito real, desde que ele seja passível de alienação, mas a característica da alienação vai contra a natureza do instituto se ela for realizada pelo usufrutuário, pois como foi dito a cima, ele não possui a faculdade de alienar a coisa, ficando isso reservado ao nu-proprietário. Então é o de se concluir que a lei, ao se referir à possibilidade de alienação do direito de uso, referiu-se ao direito do nu-proprietário, que tem o ius abutendi.

Poderá também ser objeto de alienação fiduciária de bens imóveis a propriedade superficiária. O direito de superfície foi criado em substituição ao direito de enfiteuse, permitindo ao superficiário ter a posse direta da coisa, cabendo ao proprietário a posse indireta. O artigo 1.369, caput, CC/2002, dispõe que o proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Registro de Imóveis:

Funda-se em limitação espontânea ao direito de propriedade por intermédio de Concessão por escritura pública registrada no Cartório de Registro Imobiliário, na qual o titular do direito real mais amplo concede à outra parte contratante, doravante denominado superficiário , o direito (real) de construir ou plantar em seu terreno. Salienta-se que a conjunção ou não está empregada somente para indicar a excludente entre uma das duas situações, isto é, construir ou plantar, porquanto nada obsta que os contratantes (proprietário concedente e superficiário) definam previamente que o objeto da concessão recairá sobre o direito de construir e plantar Assim, dependendo da vontade das partes contratantes, podemos interpretar a partícula ou como includente, no que tange ao objeto do contrato50.

O proprietário não pode turbar a posse do superficiário. Alguns aspectos são marcantes na propriedade superficiária, sendo este um instituto complexo51:

[…] há um direito de propriedade do solo, que é direito que necessariamente pertence ao fundeiro; há o direito de plantar ou edificar, o direito de implante; o direito de cânon, ou pagamento, se a concessão for onerosa (Grifo nosso)52.

O superficiário não pode ultrapassar o limite dos poderes que lhe foram concedidos, constituindo-se turbação a extrapolação desses.

O direito de superfície é sempre temporário, sendo vedada a constituição de superfície por tempo indeterminado. Ele não autoriza obra no subsolo, salvo se for inerente ao objeto da concessão (art. 1.369, parágrafo único, CC/2002).

50 DINIZ. Maria Helena Diniz. Código Civil Comentado. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 702. 51 Ibdem. p. 391.

Referências

Documentos relacionados

Desde então, vários autores deram o seu contributo, uns convergindo outros divergindo, contudo, apesar de mais de 20 anos de discurso académico e de gestão sobre o

b) Verifique se o manuscrito cumpre as normas aos au- tores da Acta Médica Portuguesa e que contém as informa- ções necessárias em todos os manuscritos da Acta Médica

Médias seguidas da mesma letra minúscula, em cada agrupamento de colunas, não diferem entre si pelo teste de Tukey 5% de probabilidade.. Médias mm do teste de comprimento das

Widespread cigarette smoking will exacerbate worldwide health disparities between nations, leading to an increasing burden of non-communicable diseases in

Os principais objectivos definidos foram a observação e realização dos procedimentos nas diferentes vertentes de atividade do cirurgião, aplicação correta da terminologia cirúrgica,

psicológicos, sociais e ambientais. Assim podemos observar que é de extrema importância a QV e a PS andarem juntas, pois não adianta ter uma meta de promoção de saúde se

A mesma autora (p.28) refere que: “A autonomia profissional decorre do reconhecimento por parte da sociedade de que a enfermagem enquanto disciplina e profissão coloca o utente

Este ap´ os fazer a consulta ` a base de dados e carregar toda a informa¸ c˜ ao necess´ aria para o preenchimento da tabela envia-a para o Portal de Gest˜ ao onde a interface