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IDEIAS PARA A SAÚDE EM PORTUGAL NO SÉCULO XXI

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Academic year: 2022

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IDEIAS PARA A SAÚDE EM PORTUGAL

NO SÉCULO XXI

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O Health Policies Theme Tank no Portugal XXI: Executive Summary A abordagem conceptual

Quem somos

Principais orientações

Uma receita diferente para um desafio diferente Contexto

Que desafios enfrentamos? O que fazer?

Reorganização e modernização dos cuidados Aproximação aos cidadãos

Integração entre redes de cuidados Transição digital na saúde

Priorização de áreas clínicas Recursos humanos em saúde Planeamento de recursos humanos Regimes de trabalho e carreiras Equipas e reorganização de tarefas Inovação

Governança do sistema Saúde em todas as políticas Educação para a Saúde

Saúde como estratégia de Portugal Cooperação e diplomacia

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HEALTH POLICIES THEME TANK 3 |

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variado de determinantes sociais e individuais que como tal, devem ser ponderados e incluídos no desenho das políticas de saúde, assim como nas demais políticas públicas: sociais, de educação, ambientais, económicas e outras. Em resumo, a visão do princípio health in all policies preconizado pela OMS e União Europeia (e também Portugal).

Na perspetiva sistémica, devem considerar-se as disponibilidades e resposta de todos os atores potenciais na geração de valor em saúde, sejam públicos, privados, ou do sector social, numa lógica de otimização de recursos ao serviço da promoção do acesso aos cuidados de saúde. O elemento global exige que se pense a saúde tendo em conta o contexto em que Portugal pensa e decide, considerando a influência de tendências globais, como as alterações climáticas, o livre comércio, a demografia ou as redes de investigação e desenvolvimento. A perspetiva evidence based representa a solidez técnica e científica nas propostas a formular. A orientação aos resultados significa a ponderação adequada do valor em saúde gerado em cada política adotada versus os recursos despendidos. As propostas a formular devem enquadrar-se nos princípios da promoção do acesso universal aos cuidados de saúde, sem descurar a sustentabilidade do sistema de saúde.

A ABORDAGEM CONCEPTUAL

A abordagem conceptual a adotar está ancorada nos princípios matriciais do Portugal XXI:

informar a formulação de políticas que, pelo consenso do processo de construção, detenham vocação para a estabilidade e duração para além duma legislatura; ou que, uma vez fundadas em opções ideológicas, possuam uma robustez que responda à crítica das potenciais alternativas.

QUEM SOMOS

Os participantes no Theme Tank serão elementos PXXI e convidados.

Elementos do PXXI: Ponciano Oliveira (coordenador); Jorge Félix Cardoso (secretário); Helena Painhas; David Braga Malta; Marta Bento

Convidados: Serão convidadas personalidades a refletirem, exporem e escreverem sobre as temáticas a abordar no Theme Tank, numa lógica complementar às competências dos elementos do PXXI.

PRINCIPAIS ORIENTAÇÕES

No enquadramento vindo de referir, apresenta-se no documento que se segue um conjunto de temas que visam, sobretudo, e uma vez identificado um amplo espectro dos principais desafios que se colocam aos sistemas de saúde nos dias de hoje, apontar caminhos que consideramos consensuais na resposta a dar àqueles desafios. Não se trata, pois, de propor, nesta altura, as concretas soluções para cada um desses desafios. Trata-se de reduzir a princípios consensuais a resposta a dar-lhes com o intuito de, a partir daí, e depois dum debate alargado, congregar vontades que permitam que as concretas soluções identificadas em cada ciclo de governação, não ponham em causa o rumo consensual identificado que as fundamentam e o resultado a conseguir.

No documento partimos do princípio de que o país possui um bom sistema de saúde, o qual se vê confrontado com uma alteração sócio-demográfica que altera o perfil e intensidade das necessidades em saúde.

Concomitantemente, o significado de equidade no acesso não pode dispensar o investimento sustentável na tecnologia que vai sendo disponibilizada em cada momento, para que o sistema preserve um bom posicionamento comparado. Exige-se, por isso, uma reorganização do mesmo em torno desta realidade que se instala, assim como um planeamento dos recursos a

disponibilizar para nele investir, assumindo-se que os mesmos devem acompanhar as suas necessidades reais não só em resultado da valorização que fazemos da saúde enquanto sociedade, mas também como via para a preservação do direito à saúde tal como constitucionalmente consagrada.

Para o efeito, são passados em revista alguns dos mais relevantes indicadores sobre o sistema de saúde português, bem como alguns dos mais relevantes temas, designadamente: a necessidade de reorganização e modernização dos cuidados, envolvendo a aproximação aos cidadãos, a integração entre redes de cuidados e a transição digital na saúde; a necessidade de

estabelecimento de prioridades, exemplificando-se algumas e os critérios que devem prevalecer na sua escolha; os recursos humanos em saúde, seu planeamento, regimes de trabalho e carreiras, o trabalho em equipa e reorganização de tarefas; a inovação enquanto fator de propulsão e sustentabilidade do sistema; a governança do sistema seja quanto à previsibilidade do financiamento e modelos de gestão; a saúde em todas as políticas, enfocando a educação para a Saúde; e, por fim, encarando a saúde como estratégia de Portugal no domínio da cooperação e diplomacia.

DECLARAÇÃO DE INTERESSES

Ponciano Oliveira é dirigente da administração pública na área da saúde; Jorge Félix Cardoso é investigador na área das tecnologias de saúde e assistente convidado num estabelecimento de ensino superior e faz consultoria de comunicação para um eurodeputado; Helena Painhas é empresaria e CEO nas áreas da energia, telecomunicações e ambiente; David Braga Malta é investidor e gestor de empresas que desenvolvem novos medicamentos, dispositivos médicos ou soluções de saúde digital para doenças sem solução terapêutica disponível; e Marta Bento é responsável pelo Planeamento Estratégico de um grupo privado de saúde.

CONTEXTO

O sistema de saúde português, e em particular o Serviço Nacional de Saúde1, tem garantido aos portugueses cuidados de saúde ao nível dos 20 melhores prestados no mundo2. Esta conclusão retira-se, quer dos indicadores de saúde, quer de eficiência. Retira-se ainda do posicionamento global do país no contexto internacional, quando comparado com os países do seu

enquadramento sócio e geopolítico.

A mortalidade infantil situa-se nos 2,7 ‰ óbitos por crianças nascidas, enquanto a média da União Europeia (28 países) se situa nos 3.63. Entre 1977 e 2017, o país passou de 77,5 ‰ para 2,7 ‰, uma trajetória ímpar.

A esperança de vida à nascença em 2017 situava-se nos 81,2 anos (média de ambos os sexos), o que corresponde à 19ª posição dos países da OCDE4 e 13ª entre os países da União Europeia5. Existem ainda outros dados que dão mostras de grande capacidade de resposta e acesso do sistema, como sejam os relativos ao número de residentes com médico de família que eram no final de 2016, 92.1%, mais 2.4% que no ano anterior6, e que chegou aos 93% em 2018, pesa embora persistam desigualdades a nível regional. É necessário por isso continuar a progressão do indicador até aos 100%, que correspondem à cobertura universal e à correção das assimetrias no país.

Já quanto à eficiência do sistema podemos ver que a despesa total em saúde em Portugal representa cerca de 9% do PIB (2015)7 e a despesa total per capita é de 2,734.0 USD, enquanto a média da OCDE é de 4,003.0 USD8.

Recentemente no Euro Health Consumer Index 2018 9, publicado pela Health Consumer Powerhouse, Portugal ocupou a 13ª posição num conjunto de 35 países, à frente do Reino Unido, da Espanha e da Itália, num ranking que mede 46 indicadores de desempenho dos sistemas de saúde, designadamente, no que respeita aos direitos dos doentes e informação, acesso aos cuidados de saúde, ganhos em saúde, amplitude dos serviços prestados, prevenção e acesso a fármacos.

Sem prejuízo destas virtudes, o sistema de saúde português é confrontado com relevantes dificuldades, que amiúde originam mais ou menos soundbytes, e na verdade representam a emersão para o debate do quotidiano das suas insuficiências estruturais para vencer os desafios que enfrenta, assim como enfrentam os sistemas de saúde dos países ocidentalizados.

Evidência dessas dificuldades são as crises anuais na resposta à afluência às urgências no auge do inverno; a ainda insuficiente cobertura de médicos de família; a percentagem de consultas e cirurgias realizadas fora dos tempos máximos de resposta garantidos; a infraestrutura envelhecida e que requer manutenção e atualização; as insuficiências no desempenho dos sistemas de informação; e, com grande relevância, a dívida do SNS que, consistente e ciclicamente, é solvida num ano para se reconstituir nos seguintes, até nova solvência extraordinária.

Este é o nosso ponto de situação. Temos um bom serviço de saúde que apresenta bons resultados de saúde e de eficiência. Consegue-os, contudo, num quadro de exigência desproporcionada. A somar a isso, aproximam-se realidades sociodemográficas que determinarão maiores e mais diferenciadas necessidades em saúde. Acresce que o acesso a terapêuticas inovadoras solicitará maiores investimentos que se somarão às lacunas já descritas.

Os recursos que são disponibilizados ao SNS e a sua insuficiência estrutural e assistencial para fazer face aos desafios dos tempos que correm demonstram que o bem que tem sido feito não chega. É necessária uma receita diferente para um desafio globalmente diferente. Essa receita obriga-nos a refletir de forma profunda como organizamos as nossas respostas em saúde.

Hoje, em Portugal, na Europa e no “mundo ocidental” em geral, assistimos ao envelhecimento das populações. Esse envelhecimento é reflexo, em parte, do desenvolvimento que o país conheceu no seu todo, criando melhores condições de vida para os cidadãos, designadamente, quanto ao seu rendimento, educação e políticas sanitárias e respetivas infraestruturas. Entre as variáveis com maior poder explicativo para o estado de saúde das populações encontra-se o seu grau de literacia e rendimento, bem como fatores higiénico-sanitários que, resultando doutras

políticas públicas do tipo ambiental e obras públicas, têm um forte impacto nos perfis epidemiológicos das populações (o saneamento básico é o exemplo elementar).

Por outro lado, este envelhecimento é também, em grande medida, fruto do sucesso que tem sido o Serviço Nacional de Saúde e o acesso que representa a cuidados de saúde, tecnologias e terapêuticas que o conhecimento científico nos proporcionou e que permitem tratar doenças e prolongar a vida. Duma forma particularmente relevante, tem prolongado a vida em doenças que, consideradas há uns anos incuráveis, são hoje catalogadas como crónicas ou tendendo para cronicidade. O envelhecimento é ainda fruto das menores taxas de natalidade e fecundidade a que culturalmente se assistem em Portugal e no mundo ocidental. Esta combinação de fatores orienta a sua pirâmide etária no sentido de a inverter.

As pessoas mais idosas são mais dependentes e carecem de mais cuidados de saúde, pois tendem a desenvolver várias comorbilidades, ou seja, uma vida mais longa e com mais necessidades. Se as novas tecnologias disponibilizam novos tratamentos, representam também uma importante fatia das necessidades de investimento em saúde. Esta longevidade, associada a comorbilidades e sua correção terapêutica, é mais onerosa, mas também de menor qualidade para os cidadãos, relativamente à que resulte de estilos de vida saudáveis que promovem a saúde e previnem a doença. Em Portugal, estamos além da média da OCDE na esperança de vida após os 65 anos. Tendo um número de 19,9 anos de esperança de vida após os 65 anos, situamo-nos ligeiramente acima da média da OCDE de 19,5 anos, contudo, com um elevado recurso às terapêuticas disponíveis10. Aqui chegados, deparamo-nos com os dois principais desafios dos sistemas de saúde hoje em dia:

1) respostas assistenciais desadequadas a uma população mais envelhecida que necessita de mais e mais diferenciados cuidados de saúde e que sofre de comorbilidades;

2) necessidade de recursos para organizar o sistema nesses moldes.

Estas variáveis conduzem-nos a uma projeção da necessidade de crescimento da despesa em saúde numa relação muito mais do que proporcional ao crescimento das economias mundiais. A resposta a este desafio tem de refletir uma ordem de grandeza semelhante, exigindo uma ação contundente sobre o planeamento do aumento da despesa e da otimização dos recursos a afetar. Não é uma resposta única, nem desconhecida.

É multidimensional e passa, desde logo, por um assertivo planeamento em saúde, baseado na evidência, assente em estratégias que alinhem objetivos com as estruturas existentes e os recursos disponíveis. As estratégias devem empregar esses recursos e estruturas com base em novos paradigmas de resposta que confiram mais aptidão e eficiência ao sistema, assim como qualidade e segurança dos cuidados prestados. Por recursos, devem entender-se aqueles que diretamente estejam afetos à saúde, mas também aqueles que, estando afetos a outros setores, podem sê-lo com maior

convergência com as políticas de saúde, e ainda aqueles que podem ser alavancados no seio da sociedade despoletando multiplicados “outcomes” em saúde.

Para o efeito, é essencial uma gestão tão qualificada quanto possível, com um espaço de ação que potencie a emergência de novas e melhores práticas, sem que isso signifique a perda da visão de conjunto que permite a captação de ganhos de escala ao nível da

qualidade da prestação e das condições em que são garantidos os fatores de produção.

Será também importante olhar para o sistema na sua totalidade, não excluindo à partida nenhuma das suas partes. Desde o seu início, o Serviço Nacional de Saúde tem sido apoiado pelos setores privado e social, e essa é uma relação que tem dado resultados positivos quando há uma concertação adequada dos diversos contributos.

Por fim, é necessário assumir e consolidar escolhas quanto ao financiamento da saúde e ao modelo de resposta em saúde, num contexto parlamentar alargado e consolidante.

Este consenso é essencial para um planeamento de longo prazo, para o estabelecimento de soluções estáveis e para uma gestão criteriosa dos recursos disponíveis.

A par da adaptação do sistema às necessidades epidemiológicas, urge alterar o paradigma da saúde em Portugal, apostando em longevidade que tenha por base estilos de vida saudáveis e um sistema de saúde que a promove e previne o aparecimento da doença.

Tudo isto requer um alinhamento político de longo prazo para efetivar uma mudança estrutural no sistema nos próximos 10 anos. Sem um acordo que junte as principais vozes na sociedade portuguesa e que seja imune à conjuntura socioeconómica e política, não será possível capacitar o sistema de saúde português para responder aos desafios que enfrenta.

APROXIMAÇÃO AOS CIDADÃOS

A organização das respostas de cuidados de saúde primários tem de acompanhar o perfil epidemiológico da população. Sendo cuidados de proximidade por definição, devem ampliar o leque de cuidados que hoje prestam, de modo a incorporar na rotina dos seus dias os cuidados que são “regulares” na população idosa, que constitui uma fatia significativa da população que mais necessidades em saúde carece. São por isso necessárias competências e valências nesta rede de cuidados (com efetiva capacidade de resposta) como sejam psicólogos, nutricionistas, técnicos de serviço social, auxiliares de ação médica e fisioterapeutas. Também os meios complementares de diagnóstico e terapêuticos a que esta população recorre de forma regular devem fazer parte da carteira de serviços destes cuidados. Um dos principais volantes desta rede deve ser, acima de tudo, a sua vocação para capacitar os cidadãos para o autocuidado e para o cuidado informal, mobilizando-se a comunidade em geral. A presença de novas competências e meios tecnológicos nos cuidados primários é também essencial para agir na prevenção e para acompanhar com maior custo-efetividade as populações idosas. A propósito da mobilização da comunidade diga-se que, para mobilizar os recursos comunitários, é essencial um quadro normativo coerente que considere o custo-benefício global para o estado social de estímulos ao autocuidado, ao cuidado informal e à responsabilidade social do sector privado.

O investimento nestes recursos humanos e tecnológicos numa rede com a capilaridade dos cuidados primários configurará naturalmente um montante significativo, mas seguramente

compensador, pois a abordagem assistencial preventiva trará significativas poupanças em cuidados agudos, de reabilitação e em custos com prestações sociais decorrentes das incapacidades evitadas (segurança social) e perdas de receita com a manutenção no ativo das pessoas que as evitam (impostos).

INTEGRAÇÃO ENTRE REDES DE CUIDADOS

É necessário dar um avanço decisivo na integração de cuidados entre redes. Esta integração significa uma articulação entre as redes de cuidados primários, agudos e continuados dum modo em que as transições do utente entre elas ocorram de forma continuada e sem disrupções. Para o cidadão isso significará que, quando se dirige ao sistema, em qualquer tipo de unidade, pode aceder à informação sobre o seu histórico, beneficiando do conhecimento acumulado pelo sistema e dum protocolo assistencial coordenado, como se de um único prestador se tratasse (e, na verdade, se trata). Para o sistema significa uma oportunidade de partilha e aproveitamento de meios e conhecimento que lhe permite planear melhor os recursos e ser mais efetivo nos cuidados prestados. É esta abordagem que garantirá que o sistema responde melhor ao perfil epidemiológico de hoje, em que pessoas mais idosas têm mais episódios clínicos, cada vez mais severos (como é o caso conhecido do inverno ou verão, em que afluem massivamente às urgências).

TRANSIÇÃO DIGITAL NA SAÚDE

O recurso às tecnologias de informação e comunicação e à transformação digital deve ser um dos pilares do sistema. O aumento do contacto do cidadão com o sistema pelos meios digitais abre a porta a grandes oportunidades de melhoria no acesso e qualidade dos cuidados prestados, na vida e comodidade do cidadão, e uma maior eficiência do sistema. Bons exemplos disso mesmo são os casos da telessaúde, da disponibilização partilhada de dados no sistema, das funcionalidades disponibilizadas no Portal do Serviço Nacional de Saúde e na

disponibilização de informação de saúde aos cidadãos. Aprofundar a sua utilização é por isso determinante para a sustentabilidade do sistema. Para esse aprofundamento, merece atenção particular a interoperabilidade e disponibilidade dos sistemas, ainda hoje limitada em Portugal.

É também essencial adotar modelos de utilização dos sistemas que, garantindo a sua interoperabilidade, disponibilidade e segurança, fomentem a inovação das soluções, designadamente criando contextos favoráveis à iniciativa das instituições públicas e privadas.

Adicionalmente, será necessário enfrentar as recentes restrições ao tratamento de dados relacionados com a saúde, classificados como informação sensível, de acordo com o Regulamento Geral de Proteção de Dados.

A inteligência artificial (IA) tem sido vista recentemente como fator de enorme transformação na prestação de cuidados de saúde, e Portugal deve preparar-se para aproveitar a chegada de novas ferramentas. Entre as vantagens apontadas estão a melhoria da qualidade da prestação de cuidados, a redução de erros médicos (sobretudo se associados ao cansaço de longas horas de trabalho ou da repetição de algumas tarefas), ou deteção mais precoce de patologias, para apontar apenas alguns exemplos. Para já, os resultados do uso de IA publicados são conseguidos

em ambientes controlados, com os dados que alimentam os algoritmos já tratados e “limpos”

do ruído que normalmente os acompanha. Isso significa que a IA ainda não é mais que uma promessa, mas também que é possível que o SNS integre o pelotão da frente na sua adoção.

Para que isto aconteça, é preciso eliminar duas grandes barreiras. Uma delas é a natureza das rotinas de trabalho dos profissionais de saúde, integradas num sistema de incentivos que não é potenciador da introdução de novas ferramentas. A IA é alimentada por dados que precisam de ser de elevada qualidade e extremamente completos. Se a recolha dos mesmos estiver a cargo de profissionais sem tempo adequado ao preenchimento dos registos de forma cuidadosa, está condenada ao fracasso. A outra barreira prende-se com as lacunas da infraestrutura para colheita e tratamento de dados, que impossibilitam a partilha ágil de informação entre diferentes detentores dos dados, e que também já referimos acima.

A crescente digitalização do SNS deve ser feita tendo em conta dois perigos. A equidade do acesso e da prestação de cuidados não sai necessariamente beneficiada com a introdução de tecnologia, pelo que será necessário avaliar o impacto nessa dimensão das ferramentas utilizadas. Há ainda uma dimensão de segurança que não deve ser negligenciada. O cibercrime dirigido a sistemas de saúde tem sido notícia por diversas vezes nos últimos anos. A criação de sistemas integrados e a centralização de informação, embora tragam vantagens operacionais na implementação de, por exemplo, soluções de inteligência artificial, significa também que os alvos se tornam mais apetecíveis e, como tal, deve redobrar-se a atenção nesta área.

PRIORIZAÇÃO DE ÁREAS CLÍNICAS

Sendo os recursos escassos, para operar uma transição é essencial que a programação de cada medida inclua a sua avaliação económica de modo a aferir do custo-benefício globalmente obtido, a comparar a custo-efetividade entre as soluções possíveis e a minimização de custos. Esta avaliação é crucial para o estabelecimento de prioridades que devem, por um lado, responder a problemas de saúde cimeiros e, por outro, permitam libertar recursos para esta transição de modelo. As prioridades devem ser poucas. Doutro modo, não o são. Às prioridades deve ser dada mais atenção, meios e agilidade na sua operação até à consecução dos objetivos estabelecidos.

Exemplos de prioridades em saúde com aqueles predicados para o nosso sistema são os casos da saúde mental, da prevenção e controlo de infeção, e da diabetes. Nestes três temas, Portugal possui indicadores aquém do desejável e constituem importantes problemas de saúde pública.

Melhores resultados nestes indicadores representariam elevadas poupanças quer em anos de vida potencial perdidos, quer em recursos despendidos. Representariam uma enorme poupança com menos dias de incapacidade, com menos internamentos e mais efetividade nos tratamentos e evitariam penosas comorbilidades para os doentes.

“Os distúrbios mentais são responsáveis por mais de 12% da carga global de doença em todo o mundo e 23% nos países desenvolvidos”. Por sua vez, o envelhecimento das populações faz aumentar o número de pessoas com demências, condição frequente das idades avançadas e para as quais é necessário dar resposta, designadamente no que respeita à diminuição da sua autonomia e dos cuidados especiais de que carecem. “A depressão é a principal causa de incapacidades e a segunda causa de perda de anos de vida saudáveis entre as 107 doenças e problemas de saúde mais relevantes. Os custos pessoais e sociais da doença são muito elevados. Uma

em cada quatro pessoas em todo o mundo sofre, sofreu ou vai sofrer de depressão”. A resposta aos problemas de saúde mental em Portugal é ainda incipiente nos cuidados primários e continuados, carecendo de consolidação nos cuidados agudos. Temos um longo caminho a percorrer. É, pois, essencial criar uma resposta preventiva nos cuidados primários, e de humanização e reabilitação nos cuidados continuados, evitando a agudização de episódios no primeiro caso e garantindo condições para a promoção de autonomia e de convivência com a doença no segundo. Tais respostas contribuem para minorar os impactos sociais, económicos e de saúde no doente e nos seus familiares e para reduzir os custos com a doença. “A depressão e as perturbações da ansiedade são geridas com a melhor relação custo-benefício nos cuidados primários, e os modelos de tratamento para a esquizofrenia e perturbação bipolar baseados na comunidade são apreciavelmente mais baratos que o tratamento baseado em hospitais”.11

Já no caso da infeção associada aos cuidados de saúde, a melhoria das taxas de prevenção e controlo de infeção tem um enorme retorno ao nível da qualidade e segurança dos cuidados prestados e das poupanças para o sistema, com a redução de dias de internamento e com a maior efetividade dos cuidados. No documento da Fundação Calouste Gulbenkian que sumariza o desafio “Stop Infeção Hospitalar – Um Desafio Gulbenkian”, estima-se que Portugal tem uma taxa de prevalência de 10,5% de infeções associadas aos cuidados de saúde, sendo a média dos países europeus de 5,7%. Em 2013, ocorreram 4606 óbitos associados a infeção por dispositivos invasivos e 637 óbitos devido a acidentes de viação, de acordo com o mesmo documento. O óbito é a consequência mais dramática, mas os reinternamentos e o prolongamento da demora média em internamento são consequências comuns que, podendo evitar-se, oneram os cuidados prestados.

Urge, por isso, agir com maior contundência sobre este determinante da qualidade em saúde.

O caso da diabetes é outro exemplo duma patologia em que o país tem também uma enorme margem de progressão. Portugal situa-se nas últimas posições dos países europeus com maior taxa de diabetes e, de acordo com o documento da “Não à Diabetes – Um Desafio Gulbenkian”, estima-se que Portugal tem uma taxa de prevalência da diabetes de cerca de 13% e ainda 2 milhões de pessoas em risco de a desenvolver. O tratamento da doença e suas complicações representa cerca de 10% da despesa em saúde e 1% do PIB português. A taxa média europeia é de cerca de 8%. Esta doença, quando diagnosticada precocemente, pode evitar por exemplo amputações ou a cegueira. Exige-se aqui um trabalho de maior coordenação entre níveis de cuidados e maior consequência a retirar dessa coordenação.

Daqui decorre que assertivas políticas preventivas para fazer baixar as taxas de prevalência para níveis da média dos países comparáveis a Portugal, resultariam em importantes ganhos em saúde para os Portugueses e a libertação de recursos que podem ser reafectados a outras medidas similares e ao investimento na transição para um modelo com cuidados primários mais amplos e efetivos.

RECURSOS HUMANOS EM SAÚDE

A transição para um modelo mais preventivo, como acima se disse, não anula a necessidade de investimento em recursos humanos e tecnologias de saúde. As pessoas continuarão a adoecer e aqueles fatores são condições essenciais à prestação de cuidados de saúde. Representam também o maior investimento.

PLANEAMENTO DE RECURSOS HUMANOS

Crescendo a necessidade de cuidados, crescem as carências de recursos humanos. A saúde é um dos sectores cuja produtividade depende intensamente do trabalho. Importa, por isso, planear esse crescimento, encontrando oportunidades de eficiência que o compensem e atenuem, estruturando-o. Dos objetivos dessa estruturação deve constar, como parte fundamental, a motivação dos profissionais enquanto fator de maximização da produtividade e de

compromisso com o serviço. Esse compromisso é fundamental no setor da saúde em que existe uma margem de discricionariedade no exercício profissional apenas escrutável pelos pares e pela consciência. Neste cenário, é imperioso garantir uma perspetiva de carreira aos mesmos.

A saúde no século XXI requer ainda profissionais com competências diferentes, capazes de usufruir de todas as potencialidades trazidas pela tecnologia, com conhecimentos sistémicos e de gestão e políticas de saúde, mas sem perder de vista a componente humana da prestação de cuidados, incontornável ao exercício de uma profissão no ramo da saúde. Ainda no que respeita à formação de profissionais, há necessidade de articulação entre os ministérios da Saúde e do Ensino Superior, transitando para um paradigma de decisão partilhada. Por fim, será preciso avançar definitivamente para uma continuada atualização dos conhecimentos teóricos, técnicos e práticos dos profissionais de saúde.

REGIMES DE TRABALHO E CARREIRAS

No Serviço Nacional de Saúde coexistem dois regimes de trabalho - o do código do trabalho previsto para as entidades públicas empresariais que constituem a maioria dos hospitais (com tendência crescente pela aposentação de trabalhadores e recrutamento doutros ao abrigo deste regime), e dos trabalhadores em funções públicas, previsto na lei geral de trabalho em funções públicas. Na sua coexistência, é necessário preencher espaços lacunares que harmonizem a justiça nessa convivência e permitam simultaneamente planear o crescimento da despesa com pessoal, criando alguma capacidade gestionária.

O recurso a instrumentos de regulamentação coletiva do trabalho pode ter esse mérito, se for negociado no sentido de oferecer essa perspetiva de carreira aos trabalhadores com contrato individual de trabalho, como permitir um melhor planeamento da despesa, associada a alguma capacidade gestionária, assente na previsão de alguma margem de negociação das

administrações, dentro de escalões de progressão, na definição da massa salarial.

Já no domínio interprofissional do sistema, apresenta-se como fundamental um ajustamento das carreiras em função da sua complexidade funcional, aferida por critérios objetivos, como sejam, por exemplo, a complexidade na formação e o grau académico essencial, ou também do grau de responsabilidade das tarefas incluídas no conteúdo funcional. A negociação das carreiras profissionais de modo integrado tenderá a harmonizar a justiça laboral entre as diversas corporações e a contribuir para o consenso à volta do tema entre as várias profissões.

Harmonizadas as carreiras profissionais na sua base, outros elementos de majoração estatutária (como sejam suplementos remuneratórios) devem ser apenas objetivamente estabelecidos

(designadamente, em função da exigência do contexto do posto de trabalho) para todas as carreiras e indexados à sua base, em vez de o serem em função de elementos subjetivos da profissão, os quais já haviam sido diferenciados na remuneração base. Um tal sistema poderia permitir uma maior justiça retributiva e uma maior previsibilidade na despesa.

EQUIPAS E REORGANIZAÇÃO DE TAREFAS

Obtida a estabilidade no domínio das profissões, importará otimizar a força de trabalho total do sistema. Existe evidência de algum efeito substituição entre profissões – sendo que umas são mais dispendiosas que outras e umas mais escassas que outras. Sucede que também existem conhecidos litígios de defesa de fronteiras profissionais. Face ao exposto, modelos de atribuição de compromissos assistenciais partilhados por profissionais agrupados em equipas

multidisciplinares, podem fomentar a combinação ótima de competências, resultando também numa otimização da força de trabalho disponível. Neste contexto, e mediante um quadro legal ou de regulamentação previamente estabelecidos, pode incentivar-se a negociação coletiva nas entidades do Serviço Nacional de Saúde de modo a enquadrar estes modelos de trabalho. Por sua vez, a estruturação dos serviços das unidades deve também organizar-se em função dos resultados a obter e não das competências detidas. São as competências que estão ao serviço dos resultados que se pretendem. Os incentivos que o sistema proporcionar à produtividade devem ser fixados em função dos resultados em saúde.

Ainda no capítulo da otimização da força de trabalho total, a revisão de processos de trabalho merece uma palavra. Os profissionais de saúde são em média profissionais mais diferenciados e mais dispendiosos. É, pois, essencial que concentremos a sua força de trabalho na prestação de cuidados. Devem rever-se os processos de trabalho de modo a evitar a sua sobrecarga com registos clínicos, procedimentos administrativos ou repetição de tarefas. O seu tempo é demasiado caro para esse efeito. E também por isso uma maior integração de cuidados é fundamental.

INOVAÇÃO

O outro grande fator de produção do sistema - as tecnologias de saúde -, com os seus custos de investigação associados e o elevado ritmo de inovação que as tem caracterizado, gera terapias às quais é essencial garantir o acesso a custos comportáveis e correspondentes ao valor gerado.

A investigação & desenvolvimento representam um papel basilar para a sustentabilidade do sistema. Contudo, o processo da sua produção procura naturalmente transferir os custos da investigação (produção) para o comprador – o sistema de saúde. Importa, por isso, privilegiar na sua aquisição modelos de partilha de risco, com uma remuneração em função do resultado.

Por outro lado, devem ser utilizadas de forma parcimoniosa, em função de casuísticas recomendáveis, no quadro de redes de referenciação coerentes, construídas sem descurar o acesso, mas tendo presente a sua avaliação económica e a equidade.

Começando pelo elementar, a investigação & desenvolvimento são uma área de investimento incontornável, na medida em que é delas que se alimenta o saber de cada profissão e, por essa via, são

originadas novas terapias e tecnologias de saúde para atuais e novos problemas de saúde. São a ciência e a essência do sistema. Nesta medida, importa desmistificar a relação dos profissionais, indústria e sistema. Essa desmistificação deve comportar regras claras, vertidas globalmente num plano de investigação que correlacione todos os interesses, e potenciais conflitos deles resultantes, e os consolide num quadro normativo preferencialmente único, analisando todas as perspetivas em presença e prevendo a sua articulação. A investigação & desenvolvimento são ainda essenciais para desenvolver novas terapias para doenças raras que atingem pequenas franjas da população. Neste capítulo, a concentração de casuística em centros de referência, como tem vindo a ser feito na Europa, é essencial. Importa fomentar o seu desenvolvimento. Por outro lado, a investigação & desenvolvimento são inevitáveis, já que no atual quadro de mobilidade europeia de doentes, qualquer doente pode obter noutro país da União os cuidados de saúde que necessitar, sendo reembolsado na medida em que teria direito no seu país. Essa motivação de procura de cuidados além-fronteira será maior se o sistema de saúde for menos atual nos cuidados que presta, ou seja, mesmo que Portugal não adote a inovação, terá de pagar por ela num país terceiro. Um movimento massivo de recurso a cuidados de saúde transfronteiriços poderia no limite pôr em causa a sustentabilidade do sistema que teria de despender recursos para manter um serviço de saúde para toda a sua população, e além disso, para ressarcir aqueles que optem por obter cuidados no estrangeiro. Acresce que, no âmbito da mobilidade de doentes, para Portugal, a reputação do sistema de saúde é também relevante para a indústria turística. Não tanto para o conceito de turismo de saúde que tem sido desenvolvido de há uns anos a esta parte, mas antes como infraestrutura que garante bons cuidados de saúde aos visitantes, que cada vez mais se preocupam com o tema.

Governança do sistema

Toda a linha de ação supra descrita e que se apresenta como desejável no movimento internacional das políticas de saúde, será tanto mais bem-sucedida quanto adequadas e estáveis forem as soluções de governação do sistema. Desde logo, no que ao modelo concetual do sistema e seu financiamento diz respeito. A saúde carece dum planeamento de longo prazo. A equidade e sustentabilidade dos cuidados prestados carecem de estabilidade e previsibilidade nos recursos a afetar. É por isso inadiável um debate tendente a um consenso parlamentar alargado sobre este tema. Nesse debate, é necessário considerar não só a despesa realizada na Saúde, mas também a despesa evitada noutros setores pelas políticas de saúde, e ainda a despesa em saúde que se pode evitar, através de políticas públicas intersectoriais convergentes. Assimilar o princípio de inclusão da saúde em todas as políticas é essencial para um financiamento assertivo do sistema de saúde.

De igual modo, o modelo conceptual deve ser objeto do mesmo consenso. O sistema de saúde português é garantido pela prestação de cuidados de agentes de natureza pública, privada em sentido estrito, e privado social. O papel que cada um ocupa é muito relevante, não só para a prestação de cuidados, mas também para a inovação e a modernização. É por isso necessário consolidá-lo de forma consensual, de modo a que as soluções de prestação e financiamento de cuidados sejam harmonizadas entre todos os agentes do sistema, beneficiando assim do melhor que cada um desses agentes contribui para o mesmo.

Esta estabilidade e previsibilidade verá os seus efeitos potenciados por uma gestão tão qualificada quanto possível. Uma gestão qualificada tende a ter maior capacidade para capturar as oportunidades

de eficiência e de gerar mais outcomes em saúde. No entanto, tal só é possível com mais autonomia na gestão. Essa autonomia não pode perigar os objetivos do perímetro orçamental, mas é

contraproducente se impedir ou limitar as virtudes da autonomia de gestão. Uma forma adequada de garantir essa combinação de interesses seria o de estabelecer planos estratégicos plurianuais (que se tornariam possíveis com um financiamento previsível), no limite dos quais as instituições poderiam recrutar, investir e produzir a sua atividade, desde que em convergência com o perfil assistencial que lhes fosse determinado, numa lógica sistémica coerente a ser estabelecida na negociação e aprovação de cada plano estratégico e ajustada anualmente em cada contrato-programa. Esta é, aliás, uma ideia que tem timidamente avançado, porém, muito limitada nos seus efeitos se o próprio Ministério da Saúde não obtiver um modelo de financiamento global previsível.

Numa implementação moderada para este modelo, pode mitigar-se o risco associado à autonomia, fazendo a mesma depender de resultados operacionais equilibrados durante um conjunto de anos consecutivos (três anos, por exemplo), o que resulta também na valorização da gestão e num incentivo aos gestores para obtenção de melhores resultados.

SAÚDE EM TODAS AS POLÍTICAS

Educação para a Saúde

É essencial transitar para um paradigma de esperança de vida assente em estilos de vida saudáveis, fruto da promoção da saúde e prevenção da doença. Neste campo, Portugal tem um caminho ainda a percorrer. É necessário educar a população portuguesa para a saúde. Esta transição opera-se de forma geracional. Para o efeito, a criação duma disciplina de educação para a saúde nos primeiros ciclos escolares, poderia surtir um forte impacto a longo prazo. A verdade é que hoje existem já diversos projetos e programas no âmbito da saúde escolar. O tema da alimentação saudável ou da prevenção no âmbito das adições e dependências são bons exemplos disso, mas é importante refletir sobre a efetividade destes programas e alargá-los ou estruturá-los de modo a retirar dos mesmos todo o potencial possível. O caso da adição à internet, ao jogo, e a outros comportamentos contemporâneos são um bom exemplo disso, como poderiam ser a prevenção da depressão no caso da saúde mental, sem negligenciar as áreas clássicas de intervenção como sejam os estilos de vida saudáveis, a nutrição ou saúde sexual. Naqueles primeiros exemplos das adições, a intersectorialidade de políticas poderia até resultar em ganhos ao nível das demais políticas como sejam as da segurança interna. Pense-se na prevenção do tráfico de pessoas, o bullying ou no cibercrime através da capacitação das crianças e jovens para a utilização das tecnologias e dos recursos que dispõem nos dias de hoje. Por isso mesmo, o financiamento disponibilizado para os programas de promoção da saúde deve ser majorados em função duma estratégia concreta, consistente e continuada para a melhoria dos estilos de vida e da saúde em geral. Esta visão deve ser enquadrada no sistema macro do país e suas necessidades, alinhavando compromissos das várias áreas da governação (por exemplo da economia com a saúde, quando falamos do problema do álcool ou do jogo) e considerando os seus objetivos. Por outro lado, do lado da efetividade e das disponibilidades do sistema governativo, devem rever-se as estratégias vigentes em função dos movimentos descentralizadores em curso para as autarquias procurando otimizar recursos entre os vários stakeholders.

A SAÚDE COMO ESTRATÉGIA DE PORTUGAL

Cooperação e diplomacia

No domínio internacional, tem existido uma grande preocupação com a mobilidade dos doentes. Portugal, em particular, está integrado numa comunidade com livre circulação de pessoas e bens – a União Europeia. Acresce que, nessas comunidades existem países com regimes especiais de acesso a outros países. Portugal, por sua vez, através dos países de expressão lusófona e das relações com eles mantidas – e bem – está especialmente exposto a novos perfis epidemiológicos que se tornam, diariamente e cada vez mais, também parte integrante do nosso próprio perfil. Este panorama encerra desafios por exemplo, ao nível da vigilância epidemiológica e oportunidades, também por exemplo, ao nível da cooperação.

A cooperação em saúde é uma matéria de grande responsabilidade para Portugal nas comunidades em que se encontra inserido, seja pelas suas responsabilidades históricas, seja pelo papel de vanguarda que o nosso SNS ocupa nos sistemas de saúde mundiais. Essa cooperação, enquanto veículo de diplomacia pode ser utilizado para fortalecer os laços das economias com esses países. Tem-no sido e poderá sê-lo em maior medida.

O desenvolvimento de sistemas de saúde no globo, seja nos países sul americanos onde tem crescido a cobertura populacional de cuidados de saúde através dos projetos das últimas décadas para desenvolvimento de sistemas de saúde, ou mais recentemente nos EUA com o Obamacare, mas também com o aprofundamento do conceito do estado social em países como a China e a Índia, trazem a boa notícia de se estarem a dar passos decisivos para a cobertura universal dos cuidados de saúde. Porém, esta realidade implica o crescimento da demanda mundial de cuidados a somar ao crescimento decorrente do envelhecimento das populações e do aumento das doenças crónicas.

Somam-se assim outros desafios. Um deles e mais gritante é o da mobilidade dos profissionais de saúde. Para os países com economias mais frágeis isso pode significar uma impossibilidade de garantir o acesso universal, com volumosos gastos em formação de profissionais, sem possibilidade de estancar a sangria decorrente do êxodo para países com economias mais robustas, significando, no limite, um desincentivo ao investimento na formação de profissionais de saúde nesses países. Em 2012 a OMS procurou dar resposta ao problema com o código de recrutamento ético. Portugal está posicionado relativamente a alguns países no lado das economias frágeis e relativamente a outro, no lado das economias robustas – relembrem-se o caso profissionais que emigram e dos médicos Cubanos. Estas interdependências devem ser aproveitadas para cimentar e expandir laços de cooperação que extravasam o domínio da saúde e os seus benefícios que podem contribuir para aumentar os recursos disponíveis em saúde.

A saúde pode ainda ser vista como um trunfo na estratégia de afirmação internacional de Portugal. Países como o Brasil e a resposta ao VIH-SIDA, ou como a Alemanha e a criação da World Health Summit e liderança no Global Action Plan, são bons exemplos. A saúde tem sido cada vez mais um tema discutido ao nível de cimeiras como G8 e G20 e alvo de resoluções do Conselho de Segurança da ONU. Tendo em conta a qualidade do seu SNS, dos seus recursos humanos e de alguma da sua inovação nesta área, Portugal pode ter na saúde um trunfo na agenda internacional e nas relações com blocos regionais e/ou bilaterais.

Referências

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