Problemas de valores de contorno envolvendo o
operador biharmônico
Problemas de valores de contorno envolvendo o
operador biharmônico
Vanderley Alves Ferreira Junior
Orientador: Prof. Dr. Ederson Moreira dos Santos
Dissertação apresentada ao Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação - ICMC-USP, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências - Matemática . VERSÃO REVISADA
USP – São Carlos
Março de 2013
SERVIÇO DE PÓS-GRADUAÇÃO DO ICMC-USP
Data de Depósito: / /
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Prof. Achille Bassi e Seção Técnica de Informática, ICMC/USP,
com os dados fornecidos pelo(a) autor(a)
F383p
Ferreira Junior, Vanderley Alves
Problemas de valores de contorno envolvendo o operador biharmônico / Vanderley Alves Ferreira Junior; orientador Ederson Moreira dos Santos. --São Carlos, 2013.
92 p.
Dissertação (Mestrado - Programa de Pós-Graduação em Matemática) -- Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação, Universidade de São Paulo, 2013.
1. Operador biharmônico. 2. Condições de contorno de Dirichlet, Navier e Steklov. 3. Função de Green. 4. Preservação de positividade. 5. Problemas
Agradecimentos
Agradeço a Deus por ter me sustentado e guiado durante a realização deste trabalho e pelas pessoas incríveis que Ele pôs em meu caminho.
A minha querida esposa Marine, sem você eu nunca teria terminado. Obrigado por acreditar em mim e por lutar ao meu lado todos os dias.
Aos meus pais Vanderley e Luci e aos meu sogros Valdir e Elenice, que apesar da distância sempre se fizeram presentes com seu apoio, carinho e orações.
Ao meu orientador, professor Ederson, por ter me ajudado sempre que precisei ao longo destes dois anos.
Aos demais professores com quem tanto tenho aprendido, em especial ao professor Fredy Suárez.
À CAPES pelo apoio financeiro.
Com
abelhas
ou
sem
abe-lhas,
os problemas
interes-santes da Matemática têm,
para o pesquisador, a doçura do
mel.
Resumo
Estudamos o problema de valores de contorno
∆2u = f em Ω,
Bu = 0 em ∂Ω,
em um aberto limitado Ω ⊂ RN, sob diferentes condições de contorno. As questões de
existência e positividade de soluções para este problema são abordadas com condições de contorno de Dirichlet, Navier e Steklov. Deduzimos condições de contorno naturais através do estudo de um modelo para uma placa com carga estática.
Estudamos ainda propriedades do primeiro autovalor de ∆2 e o problema semilinear
∆2u = F(u) em Ω,
u = ∂u
∂ν = 0 em ∂Ω,
para não-linearidades do tipo F(t) =|t|p−1t, p6= 1, p >0. Para tal problema estudamos
Abstract
We study the boundary value problem
∆2u = f inΩ,
Bu = 0 in∂Ω,
in a bounded open Ω ⊂ RN under different boundary conditions. The questions of
existence and positivity of solutions for this problem are addressed with Dirichlet, Navier and Steklov boundary conditions. We deduce natural boundary conditions through the study of a model for a plate with static load.
We also study properties of the first eigenvalue of ∆2 and the semi-linear problem
∆2u = F(u) inΩ,
u = ∂u
∂ν = 0 in∂Ω,
for non-linearities likeF(t) =|t|p−1t, p 6= 1, p >0. For such problem we study existence
and non-existence of solutions and its positivity.
Sumário
Introdução 1
Notações 3
1 Modelos de ordem quatro 5
1.1 Caso unidimensional . . . 5
1.2 O Laplaciano de uma função sobre uma curva de nível . . . 7
1.3 Caso bidimensional . . . 12
2 Problemas lineares 15 2.1 A condição de Dirichlet . . . 19
2.2 A função de Green . . . 21
2.2.1 A função de Green da bola unitária B . . . 22
2.2.2 A função de Green dos limaçons de Pascal . . . 23
2.3 A condição de Navier . . . 26
2.4 A condição de Steklov . . . 28
2.5 Problemas de autovalor . . . 36
3 Uma classe de problemas semilineares 47 3.1 Problema subcrítico . . . 48
3.1.1 O caso sublinear . . . 49
3.1.2 O caso superlinear . . . 51
3.1.3 Solução de energia mínima . . . 55
3.2 Resultados de não-existência . . . 61
A Espaços de funções 69 B Cálculo em espaços de Banach 75 B.1 Funcionais diferenciáveis . . . 75
B.2 Exemplos . . . 79
C Pontos críticos de um funcional 87
Introdução
O operador biharmônico é definido por∆2 = ∆(∆), onde∆denota o operador
Lapla-ciano.
A equação ∆2u = f, conhecida como equação da placa, precisa ser complementada
com condições de contorno apropriadas para que se obtenha problemas matematicamente bem postos e com significado físico. Nesta dissertação estão apresentados resultados sobre a existência e positividade de soluções de problemas de valores de contorno do tipo
∆2u = f em Ω,
Bu = 0 em ∂Ω,
além de problemas semilineares como
∆2u = F(u) em Ω,
Bu = 0 em ∂Ω,
para algumas classes de não-linearidadesF e para diferentes condições de contornoB. Muitas técnicas para problemas envolvendo operadores elípticos de ordem dois não podem ser aplicadas a problemas de ordem superior devido à falta de um princípio do máximo, e porque para u ∈ H2(Ω), em geral |u| 6∈H2(Ω). Estudamos situações em que
o biharmônico possui a propriedade de preservação de positividade e quais propriedades de problemas de ordem dois são mantidas.
Por se tratar de uma equação de ordem 4, há diversas escolhas possíveis de conjuntos de condições de contorno apropriadas do ponto de vista matemático. Para mais detalhes veja [3].
Em analogia ao caso do operador ∆ em que as condições mais estudadas são as de Dirichlet, Neumann e Robin, que possuem significado físico, para o operador biharmônico estudamos as condições de Dirichlet, Navier e Steklov. Cada uma possui particularidades
2 Introdução
que serão comparadas nos Capítulos 2 e 3.
No Capítulo 1 estudamos dois modelos da teoria da elasticidade para derivar condições de contorno naturais para os problemas de contorno envolvendo o biharmônico.
O segundo capítulo trata do problema linear sob as condições de contorno de Dirichlet, Navier e Steklov, abordando existência de soluções e preservação de positividade. Veremos por exemplo que a equação permite, sob condições de Navier e Steklov, uma decomposição em um sistema de equações de ordem dois. Sob estas condições o biharmônico preserva positividade. Por outro lado, sob condição de Dirichlet esta propriedade é perdida em alguns domínios. Estudamos ainda as propriedades do primeiro autovalor do biharmônico sob cada condição de contorno e sua relação com a preservação de positividade.
No Capítulo 3 estudamos existência e não-existência de soluções para uma classe de problemas semilineares, com não-linearidade do tipo
F(u) = |u|p−1u,
Notações
1. N dimensão do espaço.
2. C, c constantes positivas.
3. Ω denota um aberto não-vazio contido em RN.
4. ∂Ωdenota a fronteira de Ω,∂Ω = Ω\Ω.
5. A é o fecho do conjunto A⊂X na topologia de X.
6. B ⊂RN é a bola unitária aberta centrada em 0, isto é, B =B1(0).
7. Br(x)⊂RN é a bola aberta de raior >0e centrox;Br(x) ={y∈RN;kx−yk< r}. 8. Br(x) é a bola fechada de raio r >0e centro x.
9. SN
r é o conjunto de todos os y∈RN tais que kyk=r. 10. ν denota o vetor normal exterior à fronteira de Ω.
11. ui =
∂u ∂xi
denota a derivada parcial de u em relação à i-ésima coordenada.
12. Du denota o gradiente de u.
13. ∆u=
N
X
i=1
uii é o Laplaciano de u.
14. ∆2u= ∆(∆u) =−∆(−∆u) =
N
X
i=1
N
X
j=1
uiijj é o biharmônico de u.
15. ∂u
∂ν é a derivada de una direção do vetor normal à fronteira ν.
16.
Z
Ω
F dx denota a integral de Lebesgue da função F no conjunto Ω.
4 Notações
17.
Z
∂Ω
F dS denota a integral de Lebesgue de F : Ω −→ R na medida (N − 1)
dimensional de ∂Ω.
18. C0(Ω) é o espaço das funções contínuas em Ω.
19. Ck(Ω), para k
∈ N é o espaço das funções u : Ω −→ R com derivadas de ordem k
contínuas emΩ.
20. C∞(Ω) = \
k≥1
Ck
(Ω).
21. Cc∞(Ω) é o espaço das funções u∈ C
∞
(Ω) com suporte compacto contido em Ω.
22. C0
0(Ω) é o espaço das funções u∈ C0(Ω) que se anulam na fronteira de Ω.
23. H1(Ω) é o espaço de Sobolev de funções u ∈ L2(Ω) que possuem derivadas fracas
em L2(Ω); ver Apêndice A.
24. H2(Ω) é o espaço de Sobolev de funções u ∈ H1(Ω) que possuem derivadas fracas
em H1(Ω).
25. H0j(Ω), j ∈ {1,2} é o fecho deC∞
c (Ω) em Hj; ver Apêndice A.
26. T(u) é o traço de u∈H1(Ω); ver Teorema A.7.
27. X denota um espaço de Banach,H denota um espaço de Hilbert.
28. X∗ é o espaço dual do espaço de Banach X.
29. |t|= max{t,−t} é o módulo det ∈R.
30. t+ = max{t,0}, t− = max{−t,0}, t∈R.
31. δij é o operador δ de Dirac, δij = 1 se i=j eδij = 0 se i6=j.
32. k k denota a norma no espaço de BanachX.
(a) kxk=
N
X
i=1
x2i !1
2
, se x= (xi)∈RN.
(b) kuk= Z
Ω
(∆u)2dx 1
2
, se u∈H02(Ω) ouu∈H2(Ω)∩H01(Ω).
(c) kukp =
Z
Ω|
u|p
dx 1
p
, seu∈Lp(Ω),1≤p <∞.
Capítulo
1
Modelos de ordem quatro
Neste capítulo estudamos dois modelos que levam a problemas de valores de contorno de ordem quatro, um para uma viga e o análogo para uma placa bidimensional. A partir da análise dos funcionais de energia chegamos às condições de contorno naturais para o operador biharmônico.
1.1 Caso unidimensional
Considere uma viga ideal unidimensional de comprimentoL, inicialmente posicionada horizontalmente, sobre a qual é posta uma certa carga de peso atuando na vertical. Esta viga pode ser representada pelo gráfico de uma funçãou: [0, L]−→R, de modo queu(t)
representa a variação da posição do ponto correspondente da viga em relação ao equilíbrio.
A energia elástica acumulada na viga deve-se à resistência ao aumento de comprimento e à resistência à flexão, isto é, envergar-se. Um modelo para a energia elástica desta viga é
JE(u) =
Z L
0
p
1 +u′(x)2−1 + u ′′(x)2
(1 +u′(x)2)3
p
1 +u′(x)2
dx, (1.1)
onde o primeiro termo representa a variação de comprimento de arco e o segundo repre-senta a curvatura.
Se os extremos da viga puderem se mover livremente na direção horizontal, então não ocorre aumento de comprimento e o primeiro termo pode ser ignorado. Neste caso,
6 Modelos de ordem quatro
denotando p: [0, L]−→R a carga sobre a viga, a energia mecânica da viga seria
J(u) = Z L
0
u′′(x)2
(1 +u′(x)2)3
p
1 +u′(x)2−p(x)u(x)
dx. (1.2)
Uma função u ∈ H2([0, L])∩H1
0([0, L]) minimizando J seria uma aproximação para a
posição de equilíbrio da viga, sob estas hipóteses. Observe que se a curva é parametrizada por γ(x) = (x, u(x)), então u′′(x)2
(1 +u′(x)2)3 é a curvatura no ponto γ(x). Para deformações
pequenas, isto é, assumindo u′ ≈0, podemos aproximar a energia da viga por
J(u) = Z L
0
1 2u
′′(x)2
−p(x)u(x)
dx. (1.3)
Suponha que u∈ C4([0, L]). Então para toda funçãov ∈ C2([0, L]),
J′(u)v = Z L
0
(u′′(x)v′′(x)−p(x)v(x))dx
= u′′(x)v′(x)L
0 −
Z L
0
(u′′′(x)v′(x) +p(x)v(x))dx
= u′′(x)v′(x)L
0 −u ′′′
(x)v(x)L
0 +
Z L
0
u(4)(x)−p(x)v(x) dx. (1.4)
Assim, com certas condições de fronteira impostas, os termos de fronteira se anulam e obtemos a equação de Euler-Lagrange para este funcional,
u(4) =p(x).
Assim, as condições de fronteira apropriadas são:
u(0) = u(L) = 0,
u′(0) = u′(L) = 0, (1.5)
u(0) = u(L) = 0,
u′′(0) = u′′(L) = 0,
(1.6)
u′(0) = u′(L) = 0,
u′′′(0) = u′′′(L) = 0, (1.7)
u′′(0) = u′′(L) = 0,
u′′′(0) = u′′′(L) = 0.
1.2 O Laplaciano de uma função sobre uma curva de nível 7
A condição de contorno correspondente à viga engastada é (1.5), conhecida como condição de Dirichlet. Para a viga articulada, temos a condição de Navier (1.6). A condição (1.8) representa uma viga livre para se mover verticalmente nas extremidades, e a condição (1.7) um mecanismo que permite movimento vertical, mas impede que ela incline-se nas extremidades. Para mais detalhes veja [12, p. 3].
As condições podem aparecer combinadas. Por exemplo, um modelo para uma viga que está engastada em uma extremidade e livre na outra seria
u(4) = p(x) em (0, L),
u(0) = u′(0) = 0,
u′′(L) = u′′′(L) = 0.
(1.9)
Esta viga é conhecida como viga em balanço ou cantilever.
1.2 O Laplaciano de uma função sobre uma curva de
nível
Sejam Ω ⊂ R2 um aberto, u ∈ C2(Ω). Suponha que p = (x0, y0) ∈ u−1(0) e que
Du(p)6= 0. Nesta seção mostramos que
∆u(p) = ∂
2u
∂ν2(p) +k(p)
∂u ∂ν(p),
ondek é a curvatura da curva de nível u−1(0) e ν é o vetor normal a esta.
A condiçãoDu(p)6= 0nos garante que em uma vizinhança de p, u−1(0) é de fato uma
curva.
Proposição 1.1. Se Ω ⊂ R2 é um aberto, p ∈ Ω, u é uma função de classe C1(Ω),
u(p) = 0 e Du(p) 6= 0, então existem um aberto A ⊂ Ω, um intervalo I ⊂ R e uma
aplicação γ :I −→Ω de classe C1, tal que γ(I) =A∩u−1(0).
Demonstração. Esta proposição é um caso particular do teorema função implícita, veja
por exemplo [16, p. 295].
Teorema 1.2. Se Ω ⊂ R2 é um aberto, u ∈ C2(Ω), p = (x0, y0) ∈ u−1(0) e Du(p) 6= 0,
então
∆u(p) = ∂
2u
∂ν2(p) +k(p)
∂u
8 Modelos de ordem quatro
Demonstração. Pela Proposição 1.1 acima, existem I ⊂ R aberto e γ : I −→ Ω, de
classe C1, uma parametrização de u−1(0) em uma vizinhança de p. Considere a função
ψ :J −→Ω, onde J ⊂I,0∈J, com coordenadas ψ = (f, g), as quais são as soluções de
f′(t) = −u
y(f(t), g(t)), com f(0) =x0,
g′(t) = u
x(f(t), g(t)), com g(0) =y0.
Tal solução existe e é de classe C1; veja [11, Teorema 1.9].
Agora, definindo m=u◦ψ e tomando s∈J, podemos calcular
m′(s) = ux(ψ(s))f′(s) +uy(ψ(s))g′(s)
= ux(ψ(s))(−uy(ψ(s))) +uy(ψ(s))ux(ψ(s))
= 0.
Logom é constante, ou seja,ué constante sobre a imagem deψ. Comou(ψ(0)) =u(p) = 0, segue queu−1(0)⊃ψ(J). Concluímos então que ψ é uma parametrização para a curva
u−1(0) em uma vizinhança de p.
Usando a parametrização ψ, podemos calcular a curvatura em função de u e de suas derivadas, usando a expressão da curvatura de [8, p. 25]:
k(s) = det(ψ
′(s), ψ′′(s))
kψ′(s)k3
= f
′(s)g′′(s)−f′′(s)g′(s)
(f′2(s) +g′2(s))32
= −uy(ψ(s)) (uxx(ψ(s)) (−uy(ψ(s))) + (uxy(ψ(s))) (ux(ψ(s))) (u2
x(ψ(s)) + (−uy)2(ψ(s)))
3 2
+
−ux(ψ(s)) (−uyy(ψ(s))ux(ψ(s)) +uy(ψ(s))uxy(ψ(s)))
(u2
x(ψ(s)) + (−uy)2(ψ(s)))
3 2
= u
2
y(ψ(s))uxx(ψ(s))−2ux(ψ(s))uy(ψ(s))uxy(ψ(s)) +u2x(ψ(s))uyy(ψ(s))
kDu(ψ(s))k3 .
O vetor normal à curva ν(s)é ortogonal ao tangente ψ′(s). Por outro lado,
(ψ′(s), Du(ψ(s))) =−uy(ψ(s))ux(ψ(s)) +uy(ψ(s))ux(ψ(s)) = 0,
1.2 O Laplaciano de uma função sobre uma curva de nível 9
λν(s), onde|λ|=kDu(ψ(s))k. Escolhendoν de modo queλ =kDu(ψ(s))k, temos
∂u
∂ν(ψ(s)) = (Du(ψ(s)), ν(s)) =λ(ν(s), ν(s)) =λ=kDu(ψ(s))k.
Calculando ∂
2u
∂ν2(ψ(s)), obtemos
∂2u
∂ν2(ψ(s)) = D
2u(ψ(s))(ν, ν)
= u
2
x(ψ(s))uxx(ψ(s)) + 2ux(ψ(s))uy(ψ(s))uxy(ψ(s)) +u2y(ψ(s))uyy(ψ(s))
kDu(ψ(s))k2 .
Por fim obtemos nosso resultado
∂2u
∂ν2(ψ(s)) + k
∂u
∂ν(ψ(s)) =
= u
2
y(ψ(s))uxx(ψ(s))−2ux(ψ(s))uy(ψ(s))uxy(ψ(s))
kDu(ψ(s))k
kDu(ψ(s))k3 +
+(u
2
x(ψ(s))uyy(ψ(s)))kDu(ψ(s))k kDu(ψ(s))k3 +
u2
x(ψ(s))uxx(ψ(s)) kDu(ψ(s))k2 +
2ux(ψ(s))uy(ψ(s))uxy(ψ(s)) +u2y(ψ(s))uyy(ψ(s)) kDu(ψ(s))k2
= u
2
y(ψ(s))uxx(ψ(s))−2ux(ψ(s))uy(ψ(s))uxy(ψ(s)) +u2x(ψ(s))uyy(ψ(s))
kDu(ψ(s))k2 +
+u
2
x(ψ(s))uxx(ψ(s)) + 2ux(ψ(s))uy(ψ(s))uxy(ψ(s)) +u2y(ψ(s))uyy(ψ(s)) kDu(ψ(s))k2
= u
2
y(ψ(s))uxx(ψ(s)) +u2x(ψ(s))uyy(ψ(s)) +u2x(ψ(s))uxx(ψ(s))
kDu(ψ(s))k2 +
+u
2
y(ψ(s))uyy(ψ(s)) kDu(ψ(s))k2
= u
2
x(ψ(s)) +u2y(ψ(s))
(uxx(ψ(s))) + u2x(ψ(s)) +u2y(ψ(s))
(uyy(ψ(s))) kDu(ψ(s))k2
= kDu(ψ(s))k
2
kDu(ψ(s))k2 (uxx(ψ(s)) +uyy(ψ(s))) = ∆u(ψ(s)).
Observação 1.3. Sejam Ω um aberto radialmente simétrico em relação a zero e u uma função radial tal queu(x) = U(kxk). O teorema acima nos dá a conhecida fórmula
∆u(x) =U′′(kxk) + N −1
kxk U
′
10 Modelos de ordem quatro
De fato, sejam u: Ω ⊂ R2 −→R, x∈ Ω,kxk =r > 0, tais que u(y) = U(kyk), U de
classe C2. Localmente, a curva de nívelU(r) é uma parte da esfera
Sr ={y∈R2;kyk=r}, quandoDu(x)6= 0. A curvatura deSré constante e vale
1
r, e o vetor normal éν(y) = y
kyk.
Calculando a derivada normal de u em x, temos
∂u
∂ν(x) = limt→0
u(x+tν)−u(x) t
= lim
t→0
U(kx+tνk)−U(kxk) t
= lim
t→0
U(kxk+t)−U(kxk) t
= U′(kxk).
Por definição ∂2u
∂ν2(x) =D
2u(ν, ν) =
N
X
i,j=1
uij(x)
xixj
kxk2, como u é radial podemos
calcu-lar as derivadas parciais
ui(x) =U′(x)
xi
kxk, uij(x) = U
′′(x)xixj kxk2 +U
′(x)δijkxk2−xixj kxk3 .
Agora vamos calcular a segunda derivada normal
D2u(ν, ν) =
N
X
i,j=1
U′′(x)x
2
ix2j kxk4 +U
′ (x) N X i,j=1 δij
xixj kxk3 −
N
X
i,j=1
x2
ix2j kxk5
!
=U′′(x) +U′(x)
1
kxk−
1
kxk
=U′′(x). (1.12)
Deste modo ∂2u
∂ν2(x) = U ′′(
kxk), e (1.10) se torna (1.11).
Para uma função radial u : Ω ⊂ RN −→ R, N ≥ 3, considere x ∈ Ω, r = kxk > 0,
com Du(x)6= 0 e
SN
r ={y∈R N;
kyk=r},
como antes, u−1(kxk)∩B
R=SrN ∩BR,onde BR=BR(x), R >0.
Considere uma base ortonormal deRN da seguinte forma{ν(x), v2(x), ..., vN(x)}, onde
os vetores vi(x),1< i≤N são tangentes a SR em x, e ν(x) =
x
kxk é o vetor normal.
1.2 O Laplaciano de uma função sobre uma curva de nível 11
1< i≤N, ui =u
πi∩Ω
, isto é,
ui(a, b) =u(aν(x) +bvi(x)).
As funções ui cumprem
∆ui(a, b) =
∂2u
∂ν2(aν(x) +bvi(x)) +
∂2u
∂v2
i
(aν(x) +bvi(x)), (1.13)
e em particular
∆ui(r,0) =
∂2u
∂ν2(x) +
∂2u
∂v2
i
(x).
Note agora que SN
r ∩πi =Sr, assim podemos aplicar a identidade (1.10) em ui,
∆ui =
∂2u
∂ν2 +k
∂u ∂ν.
De fato,
k(a, b)k2 =a2+b2 =kaν(x)k2+kbvi(x)k2 =kaν(x) +bvi(x)k2,
por ortogonalidade. Assim,(a, b)∈Sr se, e somente se,aν(x) +bvi(x)∈SrN, e além disso
ui(a, b) = u(aν(x) +bvi(x)) =U(kaν(x) +bvi(x)k) = Uk(a, b)k,
e portantoui é radial.
Comparando (1.13) e (1.11) vemos que
∂2u
∂v2
i
(x) = k∂u ∂ν =
1 rU
′(r), (1.14)
com igualdade para cada i∈ {2, ..., N}. Aplicando (1.14) podemos calcular
∆u(x) = ∂
2u
∂ν2(x) +
N
X
i=1
∂2u
∂v2
i
(x)
= U′′(r) + (N −1)1 rU
′(r)
= U′′(r) + N −1
r U
′(r), (1.15)
12 Modelos de ordem quatro
1.3 Caso bidimensional
Em dimensão dois podemos considerar um modelo análogo para uma placa fina e plana, à qual é aplicada uma carga de forças verticais. Permitindo que os pontos na ex-tremidade da placa se movam horizontalmente, não haverá aumento da área da superfície da placa. Desprezando então a energia elástica devida à dilatação da placa, um modelo aproximado para a energia mecânica da placa é
J(u) = Z
Ω
1 2(∆u)
2+ (1
−σ)(u212−u11u22)−f u
dx, (1.16)
onde Ω ⊂ R2 é um aberto que representa a placa no estado sem a ação da carga, f :
Ω−→Ré a força aplicada, u: Ω−→R é a variação vertical em relação ao equilíbrio e σ
é uma contante relacionada ao material constituinte da placa, chamada razão de Poisson. Para metais o valor de σ é aproximadamente 0.3 e usualmenteσ ∈(0,0.5), mas em geral temos −1< σ <1; veja [12, p. 5].
O gráfico deué uma superfície. No lugar do termo representando a curvatura da viga em (1.2), temos
1 2(∆u)
2+ (1
−σ)(u212−u11u22)≈
1
2(k1+k2)
2+ (1
−σ)k1k2,
onde k1 e k2 são as curvaturas principais do gráfico de u,
k1+k2
2 é a curvatura média e k1k2 é a curvatura Gaussiana; para mais detalhes veja [8, Definition 6, p. 146]. Para a
aproximação acima assumimos que kDuk é pequeno, isto é,kDuk ≈0.
A busca de pontos críticos deste funcional nos leva a investigar a equação
J′(u)v = 0, ∀ v ∈ H,
onde H é um espaço de Hilbert apropriado onde J está bem definido e que também depende das condições de contorno. Além disso, verifica-se que
J′(u)v = Z
Ω
(∆u ∆v+ (1−σ)(2u12v12−u11v22−u22v11)−f v) dx.
1.3 Caso bidimensional 13
mesmo espaço de funções. Temos então
Z
Ω
(∆u∆v) dx = Z ∂Ω ∆u∂v ∂ν dS− Z Ω (D(∆u)Dv) dx = Z ∂Ω ∆u∂v ∂ν dS− Z ∂Ω ∂
∂ν(∆u)v
dS+ Z
Ω
(∆2u v)dx
= Z ∂Ω ∆u∂v ∂ν dS+ Z Ω
(∆2u v) dx. (1.17)
Por outro lado, empregando o Teorema 1.2, obtemos
Z
Ω
(2u12v12−u11v22−u22v11) dx =
Z
∂Ω
(u12v1ν2+u12v2ν1−u11v2ν2−u22v1ν1)dS
−
Z
Ω
(u122v1+u112v2−u112v2−u122v1) dx
= Z
∂Ω
(u12v1ν2+u12v2ν1−u11v2ν2−u22v1ν1)dS
= Z
∂Ω
(u12ν1ν2+u12ν1ν2−u11ν22−u22ν12)kDvk
dS = Z ∂Ω
(2u12ν1ν2−u11ν22−u22ν12)
∂v ∂ν dS = − Z ∂Ω
(u11(ν12+ν22) +u22(ν12+ν22)−u11ν12+
−u22ν22−2u12ν1ν2)
∂v ∂ν dS = − Z Ω
∆u− ∂
2u ∂ν2 ∂v ∂ν dS = − Z Ω k ∂u ∂ν ∂v ∂ν dS. (1.18)
Para u=v = 0 em ∂Ω, temos então ∂v
∂ν =kDvk e
J′(u)v = Z
Ω
(∆2u−f)v dx+ Z
∂Ω
∆u−(1−σ)k ∂u ∂ν
∂v
∂ν dS. (1.19)
Para a placa engastada, assumimos também que ∂u
∂ν se anula sobre ∂Ω, e podemos
supor o mesmo para ∂v
∂ν. Com isso a integral sobre a fronteira deΩem (1.19) se anula, e
chegamos a Z
Ω
(∆2u−f)v dx= 0, ∀ v ∈ H,
com v = ∂v
14 Modelos de ordem quatro
Isso nos permite concluir que se um ponto crítico de J for de classe C4(Ω), será uma
solução do problema com condições de contorno de Dirichlet
∆2u = f(x) em Ω,
u = ∂u
∂ν = 0 em ∂Ω.
(1.20)
Se por outro lado a placa estiver articulada, não temos a condição sobre ∂v
∂ν, e o termo
de fronteira nos fornece a última condição de contorno que é
∆u−(1−σ)k∂u
∂ν = 0 em ∂Ω.
Assim, um ponto crítico de classe C4(Ω) é uma solução do seguinte problema de Steklov
∆2u = f(x) em Ω,
u = ∆u−(1−σ)k∂u
∂ν = 0 em ∂Ω.
(1.21)
Para mais detalhes sobre a interpretação da condição de contorno de Steklov, veja [14, p. 412].
Se assumirmos que a curvatura da fronteira do aberto Ωnão contribui para a energia ou que σ = 1, obtemos a condição de contorno ∆u = 0 em ∂Ω, que nos dá o problema com condição de Navier
∆2u = f(x) em Ω,
Capítulo
2
Problemas lineares
Neste capítulo estudamos a equação
∆2u=f(x), (2.1)
onde a função f é conhecida e u é a incógnita, complementada por uma condição de contorno homogênea. Na Seção 2.5 estudamos os autovalores do operador biharmônico sob cada condição de contorno.
Considere inicialmente o problema linear com condição de Dirichlet
∆2u = f(x) em Ω,
u = ∂u
∂ν = 0 em ∂Ω,
(2.2)
no aberto Ω⊂RN limitado, onde ν é o vetor normal exterior à fronteira deΩ e a função
f : Ω−→Ré dada.
Outras condições de contorno consideradas serão
∆2u = f(x) em Ω,
u = ∆u= 0 em ∂Ω,
(2.3)
chamado problema com condição de Navier, e
∆2u = f(x) em Ω,
u = ∆u−a∂u
∂ν = 0 em ∂Ω,
(2.4)
16 Problemas lineares
a condição de Steklov, onde a:∂Ω−→R.
Uma solução clássica para o problema (2.2), ou (2.3) ou (2.4) é uma função u ∈
C4(Ω) satisfazendo a equação diferencial pontualmente em Ω e as respectivas condições
de contorno em cada ponto de∂Ω.
Vamos definir a noção de solução fraca para estes problemas. Para isso, suponha que
u∈ C4(Ω) satisfaz
∆2u = f(x) em Ω,
u = 0 em ∂Ω.
Multiplicando a primeira equação por uma função v ∈ C2(Ω) que se anula em ∂Ω, isto é,
v ∈ C2(Ω)∩ C0
0(Ω) e integrando em Ω, obtemos
Z
Ω
(∆2u−f)v dx= 0.
Como u também se anula na fronteira de Ω, duas integrações por partes na equação nos levam a
0 = Z
Ω
(∆2uv−f v) dx
= Z
Ω
(−(D(∆u), Dv)−f v)dx
= Z
∂Ω−
∆u∂v ∂ν dS+
Z
Ω
(∆u∆v−f v)dx. (2.5)
Se u é uma solução clássica de (2.2), então assumimos também que a função teste v
satisfaz ∂v
∂ν = 0 em ∂Ω, e o termo de fronteira em (2.5) se anula. Além disso, a integral
sobre Ω é bem definida para
u, v ∈H02(Ω), f ∈L2(Ω).
Definição 2.1. Seja f ∈ L2(Ω). Uma solução fraca de (2.2) é uma função u ∈ H2 0(Ω)
tal que
Z
Ω
(∆u ∆v−f v) dx= 0, ∀ v ∈H02(Ω). (2.6)
Para uma solução clássica de (2.3), temos ∆u = 0 em ∂Ω, logo o termo de bordo de (2.5) também se anula. Observando novamente que a integral é bem definida para
u, v ∈H2(Ω) e f ∈L2(Ω) chegamos à seguinte definição de solução fraca.
Definição 2.2. Uma solução fraca de(2.3) é uma u∈H2(Ω)∩H1
17
v ∈H2(Ω)∩H1 0(Ω),
Z
Ω
(∆u ∆v−f v) dx = 0. (2.7)
Para o problema de Steklov (2.4), usando a última condição de contorno obtemos
Z
Ω
(∆u ∆v−f v)dx−
Z
∂Ω
a∂u ∂ν
∂v
∂ν dS = 0.
Suponha que ∂Ω tem classe C2, de modo que o vetor normal ν é contínuo e
dife-renciável. Para v ∈ H2(Ω), 1 ≤ i ≤ N, temos ∂v
∂xi ∈
H1(Ω). Logo é bem definido
T
∂v ∂xi
∈L2(∂Ω) e definimos
∂v ∂ν =
N
X
i=1
νi T
∂v ∂xi
,
ondeT é o operador traço do Teorema A.7 e νi é a i-ésima coordenada deν.
Definição 2.3. Uma solução fraca do problema (2.4) é uma u∈H2(Ω)∩H1
0(Ω), tal que
Z
Ω
(∆u ∆v−f v) dx− Z
∂Ω
a∂u ∂ν
∂v
∂ν dS = 0, (2.8)
para toda funçãov ∈H2(Ω)∩H1 0(Ω).
Teorema 2.4. Seja Ω⊂RN um aberto limitado.
• Se existe uma solução fraca de (2.2), então ela é única.
• Se ∂Ω é de classe C2 e existe uma solução fraca de (2.3) , então ela é única.
Demonstração. Sejam u, w ∈ H soluções fracas de (2.2) ou (2.3), onde H = H2
0(Ω) ou
H=H2(Ω)∩H1
0(Ω), respectivamente. Em ambos os casos, veja os teoremas A.11 e A.13,
temos
Z
Ω
(∆(u−w))2dx=ku−wk2. (2.9)
Agora aplicando a definição de solução fraca a v =u−w, temos
Z
Ω
∆u∆(u−w) dx= Z
Ω
f(u−w) dx= Z
Ω
18 Problemas lineares
que nos dá Z
Ω
(∆(u−w))2 dx= 0.
Por (2.9), segue que ku−wk= 0 e assim u=w em H.
Para a condição de Steklov o argumento é o mesmo, porém precisamos de hipóteses sobre a; veja a Seção 2.4.
Observação 2.5. Se existir solução clássica para qualquer dos problemas considerados,
então necessariamente f deve ser contínua emΩ. Por outro lado, para estudar a
existên-cia de soluções fracas podemos considerar uma classe bem maior de funções f, conforme
observado acima.
Observe que as soluções clássicas também são soluções fracas. Considere o problema (2.2) com u∈ C4(Ω) e tomev ∈ C∞
c (Ω). Multiplicando a equação por v e integrando por partes em Ω, obtemos
Z
Ω
(∆u ∆v−f v) dx= 0, ∀ v ∈ Cc∞(Ω).
Agora como u∈ C4(Ω) e u=Du = 0em ∂Ω, então u∈H2
0(Ω), pois Ω é limitado. Além
disso, definindo ϕ:H2
0(Ω) −→R, por ϕ(v) =
Z
Ω
(∆u ∆v−f v)dx obtemos um funcional
linear limitado em H2
0(Ω). De fato, como H02(Ω) está imerso em L2(Ω) continuamente,
|ϕ v| ≤ kukkvk+kfk2kvk2 ≤Ckvk.
Como ϕ zera no subespaço denso Cc∞(Ω), segue ϕ ≡ 0 em H02(Ω). Mas então u é uma
solução fraca.
Reciprocamente, provada a existência de solução fraca para f ∈ L2(Ω), o passo
seguinte é verificar se a solução fraca obtida é também uma solução clássica quando
f é regular. Este é um problema usualmente chamado de resultado de regularidade. Por hora suponha que u ∈ H2
0(Ω) seja uma solução fraca de (2.2) com f ∈ C0,α(Ω), para
algum 0< α <1e que u∈ C4(Ω). Temos pelo Teorema A.7 que a continuidade de u nos
dá u= ∂u
∂ν = 0 em ∂Ω. Por contradição, suponha que exista x∈Ω com ∆
2u(x)> f(x).
Como u∈ C4(Ω), temos que ∆2u∈ C0(Ω) e comof é contínua, vai existir A⊂Ω aberto
com ∆2u−f >0 emA. Tomeϕ ∈ C∞
c (Ω), com supp ϕ ⊂A,ϕ ≥0em A, ϕ= 1 em uma bola Br(x)de centro x e raior >0. Integrando, temos
Z
Ω
(∆u∆ϕ−f ϕ) dx= Z
Ω
(∆2u−f)ϕ dx = Z
A
(∆2u−f)ϕ dx≥ Z
Br(x)
2.1 A condição de Dirichlet 19
Como C∞
c (Ω) está imerso em H02(Ω), u não é uma solução fraca de (2.2), o que é uma
contradição.
Analogamente, podemos mostrar que não existex∈Ωtal que∆2u(x)< f(x). Assim,
∆2u(x) = f(x)para todox∈Ωeu= ∂u
∂ν = 0sobre∂Ω. Portantoué uma solução clássica
de (2.2).
Para definir o que entendemos por preservação de positividade, considere o problema de valor de contorno linear
∆2u = f, em Ω,
Bu = 0, em ∂Ω, (2.10)
ondeBu é uma das condições de contorno consideradas neste capítulo.
Definição 2.6. Dizemos que (2.10) tem a propriedade de preservação de positividade se para qualquerf ≥0 a solução u de (2.10) satisfaz u≥0.
2.1 A condição de Dirichlet
Sejaf ∈L2(Ω). Como introduzido na Definição 2.1, uma solução fraca de (2.2) é um
ponto crítico do funcional
J(u) = Z
Ω
1 2(∆u)
2−f u
dx, u∈H02(Ω).
Podemos escreverJ =K −L, onde
K(u) = 1 2
Z
Ω
(∆u)2 dx, L(u) = Z
Ω
f u dx.
Pelo Teorema A.15, L é um funcional linear contínuo em H2
0(Ω). Pelo Exemplo B.16, L
é de classe C2.
Por outro lado, pelo Teorema A.11,
K(u) = 1 2kuk
2, u
∈H02(Ω).
Logo, pelo Exemplo B.18,Ké de classeC2. Pela Proposição B.15,J é de classeC2. Vamos
provar que J possui um único ponto crítico.
Teorema 2.7. SeΩ⊂RN é aberto, limitado ef ∈L2(Ω), então existe uma única solução
20 Problemas lineares
Demonstração. Queremos aplicar o Teorema C.4 ao funcional J. Seja f ∈ L2(Ω), temos
então
Z
Ω
f u dx ≤ kfk2kuk2 ≤Ckfk2kuk,
pelo Teorema A.15. Temos portanto
J(u)≥ 1
2kuk
2−Ckfk
2kuk=kuk
1
2kuk −Ckfk2
, (2.11)
e desta desigualdade obtemos a coercividade de J. De fato, dado M ∈ N tome R0 =
2Ckfk2+ 1 >0. ParaR ≥R0, temos
R
2 −Ckfk2 > R0
2 −Ckfk2 = 1 2.
Assim se R= max{2M, R0}, então kuk> R implica em (2.11)J(u)≥M.
Vamos agora verificar a semicontinuidade inferior por sequências de J na topologia fraca. Tome (uk) ∈ H02(Ω) e suponha que uk ⇀ u ∈ H02(Ω). Então, em particular,
L(uk)−→L(u).Pela Proposição B.4, K(u)≤lim inf
k→∞ K(uk),e por fim
J(u) = K(u)−L(u)≤lim inf
k→∞ K(uk)−klim→∞L(uk) = lim infk→∞ J(uk).
Pelo Teorema C.4, existe u ∈ H2
0(Ω) mínimo global de J. Este ponto mínimo é um
ponto crítico pela Proposição C.1, e assim é uma solução fraca de (2.2). A unicidade decorre do Teorema 2.4.
O problema (2.2) não pode ser reescrito como um sistema de equações de ordem dois, e portanto não podemos empregar diretamente muitas das técnicas desenvolvidas para equações de ordem dois para este tipo de problema. Para estudar a questão da preservação de positividade podemos analisar a função de Green, porém precisamos nos restringir a domínios onde ela é conhecida explicitamente.
A questão da propriedade de preservação de positividade está relacionada ao sinal da função de Green, se ela existir. De fato, suponha que existe uma função de Green GΩ
associada ao problema (2.10), conforme a Definição 2.9 abaixo e∂Ωé de classeC4,γ, para algum γ ∈(0,1]. Assim, dada f ∈L2(Ω), a soluçãou de (2.10) é
u(x) = Z
Ω
2.2 A função de Green 21
Se a função GΩ é positiva em Ω×Ω\ {(x, x);x ∈ Ω}, então dada qualquer f
não-negativa, teremos
u(x) = Z
Ω
GΩ(x, y)f(y)dy ≥0, ∀x∈Ω,
o que prova a propriedade de preservação de positividade. Além disso, se f 6= 0, então
f >0em um conjunto de medida positiva. Se parax∈Ω, tivermos para todoy ∈Ω\{x}, a desigualdade GΩ(x, y)>0, teremos u(x)>0 para todox∈Ω, pois
u(x) = Z
Ω
GΩ(x, y)f(y) dy >0.
Por outro lado, suponha que a função de Green assuma algum valor negativo, isto é, existem x0, y0 ∈ Ω, x0 6= y0, tais que GΩ(x0, y0) < 0. Neste caso (2.10) não tem
a propriedade de preservação de positividade. De fato, como GΩ é contínua em uma
vizinhança de (x0, y0), existe r > 0 tal que para todo z ∈ Br(y0), GΩ(x0, z) < 0, com
r > 0 escolhido de modo que |x0 −y0| > r. Tomando uma função ϕ ∈ Cc∞(Ω) tal que
ϕ≥0 e suppϕ =Br(y0), obtemos um par(u, ϕ)satisfazendo (2.10), com ϕ ≥0e
u(x0) =
Z
Ω
GΩ(x0, z)ϕ(z) dz =
Z
Br(y)
GΩ(x0, z)ϕ(z) dz <0.
Como ϕ ∈ C∞
c (Ω), por [12, Theorem 2.19] temos u ∈ C4,γ(Ω), em particular u é con-tínua em uma vizinhança de x0. Concluímos que u muda de sinal, logo ∆2 não preserva
positividade neste caso.
2.2 A função de Green do operador biharmônico sob a
condição de Dirichlet
Vamos definir a função de Green para o operador biharmônico em um determinado domínioΩ⊂RN sob condição de contorno de Dirichlet. Para isto, vamos definir a solução
fundamental para o biharmônico.
Definição 2.8. A solução fundamental para o operador ∆2 é
FN(x) =
CNkxk(4−N), se N 6∈ {2,4},
CNkxk(4−N)(−log(kxk), se N = 2,ou N = 4,
22 Problemas lineares
A solução fundamental cumpre ∆2F
N(x) = 0 para todo x 6= 0 em RN e é de classe C∞(RN \ {0}). Definimos a função de Green através desta solução fundamental.
Definição 2.9. A função de Green de ∆2 em Ω é uma função
GΩ : Ω×Ω\ {(x, x);x∈Ω} −→R,
tal que GΩ(x, y) = FN(kx−yk) +h(x, y) e h(x,·) é a solução do problema
∆2
yh(x, y) = 0 em Ω,
h(x, y) = −Fn(|x−y|) em ∂Ω,
∂ ∂vy
h(x, y) = − ∂ ∂vy
Fn(|x−y|) em ∂Ω.
Aqui ∂
∂νyF(x, y) =
P2N
i=N+1Fi(x, y)νi(y) denota a derivada na direção normal à fron-teira deΩda função F(x,·)no pontoy. Do mesmo modo,∆yF(x, y) = P2i=NN+1Fii(x, y). Lembramos que o espaço Ck,γ(Ω) é o conjunto das funções emCk,γ(Ω) tais que todas as suas derivadas de ordem aték são Hölder-contínuas com expoente0< γ ≤1, veja [10, p. 240].
Proposição 2.10. Se Ω⊂RN é um aberto limitado com fronteira C4,γ, então
GΩ ∈ C4,γ(Ω×Ω\ {(x, x);x∈Ω}).
Demonstração. Veja [12, Proposition 4.7].
Em geral é impossível determinar a função de Green de um domínio Ω arbitrário. Nas próximas subseções estudamos dois casos onde a função de Green é conhecida, a bola unitária de RN e os limaçons de Pascal.
2.2.1 A função de Green da bola unitária
B
O seguinte lema, devido a Boggio [5, p. 126], nos dá a fórmula para a função de Green deB, ondeB ⊂RN representa a bola unitária aberta de RN.
Lema 2.11. A função de Green para
∆2u = f em B,
u = ∂u
∂ν = 0 em ∂B,
2.2 A função de Green 23
é positiva, e é dada por
GN(x, y) =KN|x−y|4−N
Z [xy]
1
(ν2−1)ν1−N dν, (2.13)
onde a constante KN é positiva e depende somente de N e [xy] =
|x|y−
x
|x|
|x−y| .
Demonstração. Veja [12, Lemma 2.27] e também [5, p. 126].
Note que gN(t) = (t2 −1)t1−N é uma função crescente em (0,∞), com gN(1) = 0. Defina [xy] = ||x|y−
x
|x||
|x−y| . Assim, se [xy] > 1, temos a integral que define GN calculada
sobre um intervalo onde gN é positiva e portanto
GN(x, y)>0.
Por outro lado, se 0<[xy]<1, então gN é negativa, enquanto
Z [xy]
1
gN(ν)dν =−
Z 1
[xy]
gN(ν)dν >0
e portanto GN(x, y) > 0. Por fim se [xy] = 1, a integral é nula assim como GN(x, y), e concluímos que
GN(x, y)≥0, ∀ x, y ∈B, x6=y.
2.2.2 A função de Green dos limaçons de Pascal
Considere agora a família de domínios
Ωa={(ρcosθ−a, ρsinθ); 0 ≤ρ≤1 + 2acosθ}, a ∈[0,1/2]
chamados limaçons de Pascal. Quandoa= 0temos a bola unitária de R2 e quandoa= 1
2
temos o cardióide.
O limaçon Ωa é a imagem de B pela transformação conformeηa :B −→Ωa, definida por
24 Problemas lineares
ou em coordenadas cartesianas
ηa(x1, x2) = (x1+a(x12−x22), x2+ 2ax1x2).
A função de Green emΩa é definida através de ηa,
GΩa(ηa(x), ηa(y)) =Ga(x, y),
onde Ga:B×B \ {(x, x);x∈B} −→R é dada por
Ga(x, y) =
a2s2r2
16π R2
r2 −1−log
R2
r2 −
a2
1−2a2
r2
s2
R2
r2 −1
2!
, (2.14)
er=kx−yk,R= ((1−x1y1−x2y2)2+(x2y1−x1y2)2)
1
2 es= ((x
1+y1+1a)2+(x2+y2)2)
1 2. Para uma prova de queGa define a função de Green de ∆2 em Ωa, veja [9, p. 10].
Lema 2.12. Sejam p, q ∈B, tais que p6=q e 0< a < b≤ 1 2.
• Se Ga(p, q)<0, então Gb(p, q)<0.
• Se Gb(p, q)>0, então Ga(p, q)>0.
Demonstração. Observe inicialmente que r e R não dependem de a e
s2(a) =
p1+q1+
1 a
2
+ (p2+q2)2. (2.15)
Sejam p, q ∈ B, p 6= q tais que Ga(p, q) < 0. Trocando por constantes o que não depende de a nesta desigualdade, obtemos
a2s2(a)C
D− a
2
1−2a2
1 s2(a)E
<0, (2.16)
D < a
2
1−2a2
1 s2(a)E,
D E <
a2
1−2a2
1
s2(a), (2.17)
onde a2s2(a)C foi simplificado por ser positivo.
Denotando M(b) = b
2
1−2b2
1
s2(b), queremos mostrar que para b > a, M(b) >
2.2 A função de Green 25
Calculando a derivada de M, obtemos
M′(a) = 2a (1−2a2)2
1 s2(a) +
a2
1−2a2(−2s
−3(a)s′(a))
= 2a
(1−2a2)2
2 (1−2a2)s4(a)
p1 +q1+
1 a
.
Agora p, q ∈B, logo kpk<1, kqk<1 e |p1|<1, |q1|<1. Comoa ≤ 12, então 1a ≤2.
Assim
p1+q1+
1 a ≥0,
e só temos igualdade se p1 =q1 =−1. Neste caso teríamos p =q = (−1,0), mas p6= q,
logo p1 +q1+a1 ≥0.
Logo M é crescente para b∈(0,1/2]e para b > a,
M(b)> M(a)> D E.
Esta desigualdade implica Gb(p, q)<0.
Para o segundo item, se Gb(p, q)>0, procedendo como em (2.17) chegamos a
M(b)< D E.
ComoM é crescente, dado qualquer a em (0,1/2], se a < b, então
D
E > M(b)> M(a),
e concluímosGa(p, q)>0.
Teorema 2.13. Existe a0 ∈(0,1/2), tal que GΩa é positiva se, e somente se, a ≤a0.
Demonstração. Seja A = {t ∈ [0,1/2]; a função de Green é postiva emΩt}. Pela
fór-mula de Boggio 0 ∈ A, enquanto pelo Lema 2.12 A é um intervalo fechado. De fato, se
t ∈ A, então dados p, q ∈ B, p =6 q, vale Gt(p, q) >0. Se s < t, aplicando o Lema 2.16,
Gs(p, q)>0, e assim s∈A, provando queA é um intervalo.
Por outro lado, W = [0,1/2]\Aé aberto em[0,1/2]. Set∈W, então existe p, q ∈B, com p6=q tais que Gt(p, q)<0. Se s > t, então novamente pelo Lema 2.12 Gs(p, q)<0, es∈W. Como M é contínua, como na demonstração do Lema 2.12 temos
26 Problemas lineares
logo existe ε > 0, tal que em (t−ε, t+ε) ainda temos M(s)> D
E. Logo (t−ε, t+ε)∩ [0,1/2]⊂W, eW é um aberto. Consequentemente A é fechado.
Definindo
a0 = supA
temos então A= [0, a0],W = (a0,1/2].
Tomandop0 = (0.3,0.9), q0 = (0.3,−0.9)∈B verifica-se que
R2
r2 −1−log
R2
r2
− r
2
2s2
R2
r2 −1
2
<0,
na verdade, aproximadamente −4.74233, assim G1
2(p0, q0) < 0 e
1
2 ∈ W. Vemos então
que a0 <
1
2 e existe um intervalo onde a função de Green de Ωa muda de sinal.
Para uma prova de que a função de Green em Ωa é não-negativa para a ∈
0,√6/6
e muda de sinal em √6/6,1/2; veja [9, Theorem 3].
2.3 A condição de Navier
Para a condição de Navier consideramos o problema (2.3) com f ∈L2(Ω).
Teorema 2.14. SeΩ⊂RN é um aberto limitado com fronteira de classe C2 ef ∈L2(Ω),
então existe uma única solução fraca de (2.3).
Demonstração. As soluções fracas de (2.3) são os pontos críticos do funcionalJ :H2(Ω)∩
H1
0(Ω)−→R definido por
J(u) = Z
Ω
1 2(∆u)
2−f u
dx, u∈H2(Ω)∩H01(Ω).
Este funcional é bem definido para f ∈L2(Ω), e pelo Teorema A.13, as hipóteses em
Ω nos dão
J(u) = 1 2kuk
2
−
Z
Ω
f u dx.
Novamente temos a desigualdade
J(u)≥ 1 2kuk
2
− kfk2kuk,
2.3 A condição de Navier 27
H1
0(Ω). Pelo Teorema C.4 temos a existência de um ponto mínimo global, que é ponto
crítico de J, poisJ ∈ C1(H2(Ω)∩H1 0(Ω)).
Nesta definição de solução fraca não está inclusa a condição ∆u = 0 na fronteira de
Ω. Ela pode ser verificada reescrevendo (2.3) em forma de um sistema de equações de segunda ordem:
−∆u=w, −∆w=f em Ω,
u=w= 0 em ∂Ω. (2.18)
Se f ∈L2(Ω), então existe uma única solução fraca para o problema
−∆w = f em Ω,
w = 0 em ∂Ω,
isto é,w∈H1 0(Ω) e
Z
Ω
(Dw Dv−f v)dx= 0, ∀ v ∈H01(Ω);
veja por exemplo [4].
Agora novamente, como H1
0(Ω) está imerso em L2(Ω), w∈L2(Ω) e existe uma única
solução fracau0 ∈H01(Ω) para o segundo problema
−∆u0 = w em Ω
u0 = 0 em ∂Ω.
Assim existe uma solução(u0, w)∈H01(Ω)×H01(Ω)para o sistema (2.18), que
chamare-mos de solução de sistema para (2.3). Como ∂Ω é de classe C2, por [2, Theorem 1.1]
u0 ∈H2(Ω). Podemos calcular
Z
Ω
f v dx = Z
Ω
Dw Dv dx=
N
X
i=1
Z
Ω
wivi dx
= − Z
Ω
wXvii dx=
Z
Ω
28 Problemas lineares
onde foi usada a definição de derivada fraca. Novamente
Z
Ω
w(−∆v) dx = Z
Ω
D(u0) D(−∆v)dx=
N
X
i=1
Z
Ω
(uo)i(−∆v)i dx
= − N
X
i=1
Z
Ω
(u0)ii(−∆v)dx =
Z
Ω
∆u0 ∆v dx, (2.20)
com as igualdades (2.19) e (2.20) valendo para todo v ∈ C∞
c (Ω). Mas então u0 é uma
solução fraca, e pela unicidade do Teorema 2.4, u0 =u.
Mas−∆u0 =w∈H01(Ω), logo no sentido do traço u0 cumpre −∆u0 = 0 em ∂Ω.
A decomposição em sistema também é interessante para mostrar que o problema (2.3) preserva positividade. De fato, sejam f ∈ L2(Ω), f ≥ 0 e (u0, w) ∈ (H2(Ω)∩H01(Ω))×
(H2(Ω)∩H1
0(Ω)) a solução de sistema de (2.3), aplicando o Corolário A.19,w ≥0 em Ω,
outra aplicação do Corolário A.19 dá u≥0 em Ω.
2.4 A condição de Steklov
Nesta seção consideramos o seguinte problema com condição de contorno homogênea no aberto Ω⊂RN
∆2u = f em Ω,
u = ∆u−a∂u
∂ν = 0 em ∂Ω,
(2.21)
onde f : Ω−→R ea :∂Ω−→R são funções conhecidas.
O teorema a seguir, [12, Theorem 5.22], é o principal resultado desta seção.
Teorema 2.15. Sejam Ω⊂RN um aberto limitado com fronteira C2, N ≥2e b :∂Ω−→ R contínua e não-negativa. Então existem δ1,b ∈R, δc,b ∈R∪ {−∞}, com δc,b <0< δ1,b,
tais que para toda a :∂Ω−→R contínua:
1. Se a ≥ δ1,bb, f ≥ 0, f 6= 0 em L2(Ω), então não existe solução fraca não-negativa de (2.21).
2. Se a=δ1,bb, então (2.21) com f = 0 admite uma solução fraca u1,b positiva em Ω, tal
que −∆u1,b >0 em Ω e
∂u1,b
∂ν <0 em ∂Ω. A menos de múltiplos, u1,b é única.
3. Se a≤δ1,bb, mas a=6 δ1,bb, então para toda f ∈L2(Ω) existe uma única solução fraca
de (2.21). Além disso:
2.4 A condição de Steklov 29
(b) Se a > δc,bb e f ≥ 0, f 6= 0, então existe cf > 0, tal que u(x) ≥ cfdist(x, ∂Ω).
Além disso, −∆u≥0 em Ω se, e somente se, a≥0 em ∂Ω.
(c) Se a < δc,bb, então existe f ∈ L2(Ω), f ≥ 0, f 6= 0, tal que a solução u de (2.21)
não é não-negativa.
Para provar o Teorema 2.15 precisaremos do Lema 2.16.
Lema 2.16. Dada a : ∂Ω −→ R contínua, a ≤ δ1,bb, a6= δ1,bb, existe ε >0 tal que para
toda u∈H2(Ω)∩H1 0(Ω),
Z
Ω
(∆u)2 dx−
Z ∂Ω a ∂u ∂ν 2
dS ≥ε Z
Ω
(∆u)2 dx. (2.22)
Demonstração. Observe que para todau∈H2(Ω)∩H1
0(Ω), temos
Z
Ω
(∆u)2 dx≥δ1,b
Z ∂Ω b ∂u ∂ν 2 dS, isto é, Z Ω
(∆u)2 dx− Z
∂Ω
δ1,bb
∂u ∂ν
2
dS ≥0. (2.23)
Primeiramente observe que (2.22) é trivialmente satisfeita com ε= 1 no caso em que
a≤0em ∂Ω.
No caso em que a < δ1,bb e existe x0 ∈∂Ω tal que 0< a(x0), tome
ε= min{δ1,bb(x)−a(x);x∈∂Ω} max{δ1,bb(x);x∈∂Ω}
>0.
Observe que ε < 1, pois δ1,bb(x0)−a(x0) < δ1,bb(x0). Observe também que para todo
x∈∂Ω, δ1,bb(x)−a(x)≥εδ1,bb(x), ou seja, a≤(1−ε)δ1,bb. Assim
Z
Ω
(∆u)2dx−
Z ∂Ω a ∂u ∂ν 2
dS =ε Z
Ω
(∆u)2dx+ (1−ε) Z
Ω
(∆u)2dx−
Z ∂Ω a ∂u ∂ν 2 dS ≥ε Z Ω
(∆u)2dx+ (1−ε) Z
Ω
(∆u)2dx−
Z
∂Ω
(1−ε)δ1,bb
∂u ∂ν 2 dS =ε Z Ω
(∆u)2dx+ (1−ε) Z
Ω
(∆u)2dx− Z
∂Ω
δ1,bb
∂u ∂ν 2 dS ! ≥ε Z Ω
(∆u)2dx. (2.24)
30 Problemas lineares
Definaeb = 1 2
b+ a
+
δ1,b
. Assimeb:∂Ω−→R é contínua, não-negativa,
eb= 1 2b+
1 2
a+
δ1,b ≤
1 2b+
1
2b=b em ∂Ω
e
eb(x1) =
1
2b(x1) + 1 2
a(x1)
δ1,b
< b(x1).
Aplicando a primeira parte do Lema 2.25, existemu1, u2 ∈H2(Ω)∩H01(Ω) tais que
u1 = min
u∈H2(Ω)∩H1 0
Jb(u), u2 = min
u∈H2(Ω)∩H1 0
Jeb(u).
Temos ainda
δ1,b=Jb(u1)≤Jb(u2)< Jeb(u2) =δ1,eb.
Colocando ε = 1− δ1,b δ1,eb
>0, temos
a≤a+ =δ1,b(2eb−b)≤δ1,beb = (1−ε)δ1,ebeb. (2.25)
Por fim,
Z
Ω
(∆u)2dx− Z ∂Ω a ∂u ∂ν 2
dS =ε Z
Ω
(∆u)2dx+ (1−ε) Z
Ω
(∆u)2dx− Z ∂Ω a ∂u ∂ν 2 dS ≥ε Z Ω
(∆u)2dx+ (1−ε) Z
Ω
(∆u)2dx−
Z
∂Ω
δ1,ebeb
∂u ∂ν 2 dS ! ≥ε Z Ω
(∆u)2dx. (2.26)
Consideremos agora o último caso, isto é, quando a+ = δ
1,bb e a− 6= 0. Neste caso temoseb= 1
2(b+b) =b. Vamos substituirJb por
Ja− b (u) =
R
Ω(∆u)
2dx+R
∂Ωa − ∂u
∂ν
2
dS R
∂Ωb
∂u ∂ν
2
dS .
Definindo δ1a,b− para Ja
−
b como em (2.44), o mesmo argumento mostra que existe ua
− 1,b ∈
H2∩H1
0(Ω) que minimiza Ja −
b . Temos então
δa−
1,b =J a− b (u
a−
1,b)≥Jb(ua
−
1,b)≥Jb(u−1, b) =δ1,b.
Como ∂u1,b
∂ν 6= 0 em ∂Ω, se u
a−
2.4 A condição de Steklov 31
outro lado, se não existir λ∈ R\ {0} tal que ua−
1,b =λu1,b, então a segunda desigualdade é estrita, poisδ1,b é simples; veja o Lema 2.25. Em qualquer caso,δa
−
1,b > δ1,b. Tome então
ε= 1− δ1,b δa− 1,b
, (2.27)
e observe que0< ε < 1. Assim,
Z
Ω|
∆u|2dx−
Z ∂Ω a ∂u ∂ν 2 dS = Z Ω|
∆u|2dx+
Z ∂Ω a− ∂u ∂ν 2 dS− Z ∂Ω
δ1,bb
∂u ∂ν 2 dS ≥ Z Ω|
∆u|2dx+ (1−ε)
Z
Ω|
∆u|2dx+
Z ∂Ω a− ∂u ∂ν 2 dS − Z ∂Ω
δa−
1,bb
∂u ∂ν 2 dS ! ≥ε Z Ω|
∆u|2dx. (2.28)
Prova do Teorema 2.15. Seja Ω⊂RN um aberto limitado com fronteira C2,N ≥2.
Prova do item 1. Sejam a > δ1,bb, δ1,b definido em (2.44), f ∈ L2(Ω), f ≥ 0, f 6= 0, suponha que u ∈ H2(Ω)∩H1
0(Ω) é uma solução fraca de (2.21), u ≥ 0, tome v = u1,b minimizador deJb. Temos
0< Z
Ω
f u1,b dx=
Z
Ω
∆u ∆u1,b dx−
Z
∂Ω
a∂u ∂ν
∂u1,b
∂ν dS
≤
Z
Ω
∆u∆u1,b dx−
Z
∂Ω
δ1,bb
∂u ∂ν
∂u1,b
∂ν dS = 0,
contradição. Note que a primeira igualdade vem da positividade de u1,b no item 2, e a última porque u1,b é solução fraca de (2.21) comf = 0 e a=δ1,bb.
Prova do item 2. Será provado no Lema 2.25.
Prova do item3. Vamos empregar o Teorema C.4 e o Lema 2.16. De fato, comoa≤δ1,bb,
a6=δ1,bb, existe ε >0, tal que
Z
Ω
(∆u)2dx− Z ∂Ω a ∂u ∂ν 2
dS ≥ε Z
Ω
32 Problemas lineares
para todau∈H2(Ω)∩H1
0(Ω). Assim, pela Desigualdade de Hölder (Teorema A.2)
J(u) ≥ ε Z
Ω
(∆u)2dx−Ckfk2kuk2 =εkuk2−Ckfk2kuk, (2.29)
pelo Teorema A.13. A desigualdade (2.29) nos permite concluir que J é coercivo. O funcional J é de classe C1, pelos Exemplos B.16 e B.17. Para aplicar o Teorema C.4,
vamos mostrar que J é semicontínuo inferiormente por sequências na topologia fraca. Para isso precisaremos da compacidade do operador traço T.
Seja (uk) ∈H2(Ω)∩H01(Ω), tal que uk ⇀ u ∈H2(Ω)∩H01(Ω), pela Proposição B.4,
sabemos que
lim inf
k→∞ kukk
2 ≥ kuk2.
Como o operador traço é compacto [1] e (uk) é limitada em H2(Ω)∩H01(Ω), existe uma subsequência ainda denotada (uk) tal que
1≤i≤N =⇒T ∂uk ∂xi −→T ∂u ∂xi
em L2(∂Ω).
Assim, ∂uk ∂ν = N X i=1 T ∂uk ∂xi
νi −→
∂u ∂ν em L
2(∂Ω),
e como a∈ C(∂Ω),
Z ∂Ω a ∂u ∂ν 2
dS = lim
k→∞ Z ∂Ω a ∂uk ∂ν 2 dS, (2.30)
pois a limitado, implica
Z
∂Ω
a(·)dS é funcional linear contínuo em L1(∂Ω). Por fim,
lim inf
k→∞ J(uk) = lim infk→∞
Z
Ω
(∆uk)2dx−lim inf k→∞ Z ∂Ω a ∂uk ∂ν 2
dS−lim inf
k→∞
Z
Ω
f uk dx
≥ lim inf
k→∞ kukk 2 − Z Ω a ∂u ∂ν 2
dS− lim
k→∞
Z
Ω
f uk dx≥J(u). (2.31)
Pelo Teorema C.4, existe um ponto crítico de J, solução de (2.4). Para provar a unicidade, sejam u, v ∈H2(Ω)∩H1
0(Ω) duas soluções fracas de (2.4), temos
Z
Ω
(∆(u−v))2dx− Z
∂Ω
a
∂(u−v) ∂ν
2
2.4 A condição de Steklov 33
Mas w=u−v ∈H2(Ω)∩H1
0(Ω), logo usando (2.23) e a < δ1,bb, temos
Z
Ω
(∆(w))2dx− Z
∂Ω
a
∂(w) ∂ν
2
dS ≥ Z
Ω
(∆(w))2dx− Z
∂Ω
δ1,bb
∂(w)
∂ν 2
dS >0,
sew6=λu1,b, para todo λ∈R\ {0}.
Por outro lado, se w=λu1,b, λ 6= 0, então
Z
Ω
(∆(w))2dx= Z
∂Ω
δ1,bb
∂(w)
∂ν 2
dS
e Z
∂Ω
(δ1,bb−a)
∂(w)
∂ν 2
dS =λ2 Z
∂Ω
(δ1,bb−a)
∂u1,b
∂ν 2
dS >0,
poisa < δ1,bb em um conjunto aberto em ∂Ω, e pelo item 2,
∂u1,b
∂ν 6= 0 em todo o bordo.
Mas isto é uma contradição e portantow= 0, ou u=v.
Para provar o item 3.(a), sejam
A={s ∈R; ∀ f ∈L2(Ω),∀ a∈ C(∂Ω),
se a≥sb, f ≥0 e existe usolução de (2.4), então u≥0 em Ω},
e tome δc,b = infA. Note que 0 ∈ A, pois se u ∈ H2(Ω)∩H01(Ω) é solução de (2.4) e
f ≥ 0, a ≥ 0, então decompondo (2.4) como sistema, o princípio do máximo (Corolário A.19) nos dá
−∆u≥inf
∂Ω(−∆u)≥0.
Logo como u= 0 em ∂Ω, outra aplicação do princípio do máximo leva a
u≥inf
∂Ωu= 0.
Por outro lado, se s ∈ A e δ1,b > t > s, então claramente t ∈ A, pois se a ≥ tb > sb e
f ≥0, então a solução u é não-negativa e t∈A. Dessa forma,
A⊃(δc,b, δ1,b),
onde o ínfimo é tomado como sendo −∞, se A não é limitado inferiormente.
Pela definição de δc,b, a < δc,bb implica a existência de f ∈L2(Ω), f ≥0, f 6= 0, com a solução de (2.4)u6>0, o que prova o item(c).