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A imunidade tributária dos livros digitais à luz da jurisprudência dos Tribunais Superiores

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ

FACULDADE DE DIREITO

CURSO DE DIREITO

LUÍS FEITOSA DE MACEDO E SILVA

A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DOS LIVROS DIGITAIS À LUZ DA

JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES

FORTALEZA-CE

(2)

1

LUÍS FEITOSA DE MACEDO E SILVA

A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DOS LIVROS DIGITAIS À LUZ DA

JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Francisco Araújo Macedo Filho

FORTALEZA

(3)

2 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação

Universidade Federal do Ceará Biblioteca Setorial da Faculdade de Direito

S586i Silva, Luís Feitosa de Macedo e.

A imunidade tributária dos livros digitais à luz da jurisprudência dos Tribunais Superiores / Luís Feitosa de Macedo e Silva. – 2014.

147 f. : enc. ; 30 cm.

Monografia (graduação) – Universidade Federal do Ceará, Faculdade de Direito, Curso de Direito, Fortaleza, 2014.

Área de Concentração: Direito Tributário.

Orientação: Prof. Me. Francisco de Araújo Macedo Filho.

1. Imunidade tributária. 2. Livros digitais - Brasil. 3. Direito tributário - Brasil. 4. Princípios e garantias constitucionais. I. Macedo Filho, Francisco de Araújo (orient.). II. Universidade Federal do Ceará – Graduação em Direito. III. Título.

(4)

3 LUÍS FEITOSA DE MACEDO E SILVA

A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DOS LIVROS DIGITAIS À LUZ DA

JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES

Monografia apresentada ao Curso de Direito da

Faculdade de Direito da Universidade Federal do

Ceará, como requisito parcial à obtenção do

título de Bacharel em Direito.

Aprovada em: _____/_____/_______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________ Prof. Francisco Araújo Macedo Filho (Orientador)

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Prof. Fernando Bastos Ferraz

Universidade Federal do Ceará (UFC)

_________________________________________ Profª. Juliana Cristine Diniz Campos

(5)

4

Aos meus pais, pelo exemplo de integridade e

(6)

5

AGRADECIMENTOS

À Deus, por me fazer perseverante na conquista dos meus anseios.

Aos meus pais, Paulo e Cristina, pela imensa dedicação, pelas constantes

demonstrações de amor e afeto e pelas lições de ética, senso de justiça e retidão que busco

internalizar constantemente.

À minha avó Maria Luzia Cavalcante Feitosa pelo legado de ternura e solidariedade

que construiu de forma incólume ao longo da vida, que deve servir de inspiração para todos nós

em prol de uma existência mais saudável e harmoniosa.

Aos meus demais familiares que sempre acreditaram no meu potencial e apoiaram as

minhas conquistas, garantindo em muitas ocasiões um suporte necessário ante a distância

momentânea dos meus pais.

Ao Curso Pré-vestibular Paulo Freire, pela experiência única de horizontalidade na

relação ensino-aprendizagem, pelas lições apreendidas e pela indescritível oportunidade de

colaborar para que outras pessoas pudessem realizar um sonho que um dia também foi meu.

Aos membros do projeto Fazendo Acontecer e do Centro Acadêmico Clóvis

Beviláqua, gestão Compromisso & Atitude, pelas importantes vivências e oportunidades no

período em que atuamos juntos.

Aos professores Carlos Cesar Sousa Cintra e Juraci Mourão Lopes Filho pelos

ensinamentos fundamentais na seara do Direito Tributário e por permitirem a concretização do

Núcleo de Estudos Tributários (NETRI), no qual obtive fundamentais conhecimentos, bem como

aos demais membros discentes do referido projeto de extensão pelo aprendizado em nossos

debates e empreitadas.

Aos demais colegas da Salamanca alencarina, pelas amizades iniciadas, pelas alegrias

compartilhadas e pelos momentos felizes que sinceramente espero que se prosperem com muitos

mesmo após a graduação acadêmica.

Ao professor Francisco Araújo Macedo Filho pela orientação na realização deste

projeto monográfico, pelo contato inicial junto à Ciência Tributária e pelas lições de humildade e

dedicação; bem como aos demais membros da banca, pela disponibilidade e pela prestatividade.

Aos professores que contribuíram na minha formação e aos prestativos funcionários

das instituições de ensino nas quais estive, cujo indispensável e providencial apoio não pode ser

olvidado.

Por fim, à Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, pela

recompensadora satisfação de ter permitido o desenvolvimento de minhas aptidões pessoais e

(7)

6 “O destino é traçado pelos seus próprios

pensamentos, e não apenas por uma força externa. O seu pensamento é a planta concebida por um arquiteto para construir um edifício denominado prosperidade. Quanto mais elevado, mais belo e mais próspero tornar

seu pensamento, melhor você será”. (Martin

(8)

7

RESUMO

A presente obra tem como objeto de estudo a imunidade tributária dos livros,

jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão e o alcance da norma imunitória a

referidas publicações em formato digital. As imunidades tributárias revelam-se como uma

delimitação negativa das competências tributárias dos entes federativos – União, Estados, Distrito Federal e Municípios –, que se encontram impossibilitados de tributar os livros e congêneres, por determinação expressa do texto constitucional. A disposição constitucional

do artigo 150, inciso VI, alínea “d”, que trata da aplicação do preceito imunizante aos

veículos de informação em mídia escrita, não pode ser interpretada restritivamente,

detendo-se à mera literalidade do texto e obliterando-detendo-se a evolução do contexto social em que ela detendo-se

insere, caso contrário, implicará em uma inequívoca negativa da teleologia da norma.

Portanto, deve ser realizada uma exegese que busque aferir a real finalidade do conteúdo

normativo, de modo a conferir a sua máxima efetividade, privilegiando os valores que almeja

consagrar, como a liberdade de manifestação do pensamento; a expressão da atividade

intelectual, artística e científica; o acesso à educação e a difusão da cultura, sendo esse o

entendimento que se espera alinhavado à jurisprudência dos Tribunais Superiores sobre a

temática.

Palavras-chave: Imunidade tributária; livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua

impressão; livro digital; correntes doutrinárias restritivas à imunidade do livro; correntes

(9)

8

ABSTRACT

The present work has as its object of study the tax immunity of books,

newspapers, periodicals and paper for their printing and scope of the immunity provision

referred publications in digital format. The tax immunities are a negative delimitation of the

taxing power of the federal entities - Union, States, Federal District and Municipalities - who

are unable to tax this publications. The constitutional provision of Article 150, section VI,

"d", which deals with the application of the provision immunizing the vehicle information in

writing media, not be interpreted restrictively, restricted to the mere literal text and forgetting

the changing social context in which it is inserted, otherwise imply an unambiguous negative

teleology of the norm. Thus, an interpretation that seeks to gauge the real purpose of the

normative content shall be realized, with this understanding that is expected by the

jurisprudence of the Superior Courts on the subject.

Keywords: tax immunity; books, newspapers, periodicals and paper for their printing; digital

book; doctrinal trends restrictive immunity of the book; doctrinal trends extend to immunity

(10)

9

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...10

2 AS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS...11

2.1 O Poder de Tributar e a Competência Tributária...11

2.2 Conceito e Natureza Jurídica da Norma Imunizatória...16

2.3 Histórico acerca das Imunidades Tributárias...19

2.3.1 Independência dos Estados Unidos...22

2.3.2 Revolução Francesa...22

2.3.3 Evolução constitucional das imunidades tributárias no Direito brasileiro...24

2.4 Finalidade...27

2.5 Características das Imunidades Tributárias...28

2.6 Classificação Doutrinária...36

2.6.1 Classificação a partir do objeto imunizado...37

2.6.2 Classificação a partir dos tributos e das pessoas políticas alcançadas...38

2.6.3 Classificação segundo a vinculação a princípio ou direito fundamental...38

2.6.4 Classificação segundo a explicitude da norma de imunidade...39

2.6.5 Classificação em razão da eficácia da norma imunizatória...40

2.7 Distinção entre Imunidade, Isenção, Não Incidência e Alíquota Zero...40

2.7.1 Isenção...40

2.7.2 Não incidência...42

2.7.3 Alíquota zero...43

2.8 Imunidades em Espécie...45

2.8.1 Imunidade Recíproca...45

2.8.2 Imunidade dos templos de qualquer culto...48

2.8.3 Imunidade do patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações; das entidades sindicais dos trabalhadores e das instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos...51

2.8.4 Imunidade dos livros, jornais, periódicos e papel destinado à sua impressão...55

2.8.5 Imunidade Musical...57

2.8.6 Outras Imunidades Tributárias...61

2.8.7 A aplicação das imunidades tributárias às taxas e às contribuições...62

3 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DOS LIVROS, JORNAIS, PERÍODICOS E O PAPEL DESTINADO A SUA IMPRESSÃO...64

(11)

10 3.2 Histórico da imunidade tributária dos livros, jornais, periódicos e o papel destinado a

sua impressão no Brasil...67

3.2.1 A Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946...67

3.2.2 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1967 e a Emenda Constitucional n° 1 de 1969...68

3.2.3 A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988...70

3.3 Conteúdo e Finalidade da Norma Jurídica...71

3.4 Interpretação Constitucional-Tributária da Imunidade dos livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão...76

3.4.1 Notas gerais sobre a interpretação da norma de imunidade tributária...76

3.4.2 Interpretação histórica da imunidade do livro...78

3.4.3 Interpretação restritiva da Imunidade do livro...79

3.4.3 Interpretação extensiva da imunidade do livro...83

3.4.5 Interpretação teleológica da imunidade do livro...84

3.5 Alcance e Extensão da Norma Imunizante do Artigo 150, VI, "d" da Constituição Federal de 1988...86

3.5.1 Revistas pornográficas...87

3.5.2 Álbuns de figurinhas e livros contendo ilustrações...88

3.5.3 Listas telefônicas...90

3.5.4 Anúncios, publicidade e propaganda...92

3.5.5 Encartes de propaganda...93

3.5.6 Apostilas...94

4 A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA DOS LIVROS DIGITAIS À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS SUPERIORES...96

4.1 A Evolução da Escrita e as Novas Tecnologias...96

4.2 As Correntes Doutrinárias acerca da Imunidade Tributária dos Livros Digitais...110

4.2.1 Correntes doutrinárias contrárias à imunidade tributária do livro digital...110

4.2.2 Correntes doutrinárias favoráveis à imunidade tributária do livro digital...115

4.3 A Jurisprudência dos Tribunais Superiores acerca da Imunidade Tributária do Livro Digital...126

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...138

(12)

11

1 INTRODUÇÃO

O artigo 150, inciso VI, da Constituição Federal da República Federativa do

Brasil de 1988 estabelece as imunidades tributárias genéricas, preceituando vedações aos

entes políticos federados – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – e à instituição de todos os impostos que incidam sobre os objetos, o patrimônio, a renda ou os serviços das

entidades determinadas.

Existem também outras normas imunizantes, denominadas específicas, previstas

ao longo do texto constitucional, estabelecendo a incompetência tributária das entidades

federativas para instituir tributos nas situações caracterizadas.

A imunidade tributária dos livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua

impressão encontra-se albergada na alínea “d”, do artigo 150, inciso VI, da Carta Magna brasileira. Remonta à Constituição Federal de 1946, em que era prevista apenas a imunidade

do papel exclusivamente destinado à impressão de livros, jornais e periódicos. A Constituição

Federal de 1967 foi o marco introdutório da imunidade dessas publicações, para além

meramente do papel destinado à impressão, sendo posteriormente o conteúdo normativo

incorporado ao texto constitucional vigente.

Atualmente, permanece uma divergência doutrinária e jurisprudencial em relação

ao alcance da regra imunizante aos livros, jornais e periódicos no formato digital. A corrente

restritiva atém-se à literalidade da norma, concebendo que a imunidade inclui apenas o que

puder ser depreendido da expressão ‘papel destinado a sua impressão’, caso contrário, estar -se-ia desvirtuando a vontade expressa do constituinte originário. A corrente extensiva, por sua

vez, defende uma exegese sistemática e teleológica da disposição constitucional, de modo a

garantir a sua máxima efetividade e a resguardar princípios como a livre manifestação do

pensamento, a expressão da atividade intelectual, artística, científica ou de comunicação, o

acesso à informação, o desenvolvimento da educação e a difusão da cultura.

A análise das vertentes doutrinarias incluirá ainda a jurisprudência dos Tribunais

Superiores, sobretudo tendo em vista o reconhecimento da repercussão geral pelo Supremo

Tribunal Federal sobre a matéria, sem olvidar a relevância e o interesse social sobre a

(13)

12

2 AS IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS

2.1 O Poder de Tributar e a Competência Tributária

O poder de tributar é compreendido como decorrente do poder estatal, em razão

de sua soberania. Dessa forma, para sua manutenção político-financeira, o Estado utiliza-se

dos tributos como fonte de se auferir o capital indispensável à despesa pública, recolhendo

compulsoriamente parcela de riqueza dos particulares.

Na maioria dos Estados, inclusive o Brasil, a tributação é realizada a partir de um

modelo que determina os tributos a serem pagos pelas pessoas, físicas e jurídicas, os direitos e

deveres das mesmas e os limites para a atuação estatal, em termos tributários.

Sobre a evolução do Estado financeiro, Ricardo Lobo Torres tece importantes

comentários sobre o seu patamar evolutivo atual, o qual denomina Estado Democrático e

Social Fiscal.

Vive precipuamente dos ingressos tributários, reduzindo, pela privatização de suas empresas e pela desregulamentação do social, o aporte das receitas patrimoniais e parafiscais. Procura, na via da despesa pública, diminuir as desigualdades sociais e garantir as condições necessárias à entrega de prestações públicas nas áreas da saúde e da educação, abandonando a utopia da inesgotabilidade dos recursos públicos. Nele se equilibram a justiça e a segurança jurídica, a legalidade, a capacidade contributiva, a liberdade e a responsabilidade1.

O Estado Democrático e Social Fiscal deve ser compreendido como aquele que

recebe, por delegação do povo, o poder de tributar, produto de uma Constituição que lhe

conferirá essa prerrogativa de formação de receitas ao mesmo tempo em que lhe imporá

limitações para o exercício da tributação.

Nesse ínterim, importante a lição de Sacha Navarro Calmon Coelho, que assevera:

O poder de tributar, modernamente, é campo predileto do labor constituinte. A uma, porque o exercício da tributação é fundamental aos interesses do Estado, tanto para auferir as receitas necessárias à realização de seus fins, sempre crescentes, quanto para utilizar do tributo como instrumento extrafiscal, técnica em que o Estado intervencionista é pródigo. A duas, porque tamanho poder há de ser disciplinado e contido em prol da segurança dos cidadãos2.

1 TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 9. 2 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário. 6ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.

(14)

13

O ônus tributário, portanto, não se constitui apenas em um poder estatal ou um

dispendioso dever do contribuinte, mas em um contrapeso necessário para a conservação da

sociedade e do próprio Estado. A tributação é imposta pelo Estado objetivando o bem comum,

posto que o seu fim é a conquista do ideal social, e a espécie e a gradação dos tributos sofrem

a influem do contexto político-econômico ao qual está submetido a nação.

A competência tributária fixada na Constituição da República Federativa do Brasil

de 1988 é decorrente do poder de tributar conferido aos entes políticos da Federação (União,

Estados, Distrito Federal e Municípios), por meio da qual essas pessoas jurídicas de Direito

Público interno se encontram autorizadas a instituir tributos, por meio de lei, nos limites

fixados pelo legislador.

Organizado juridicamente o Estado, com a elaboração de sua Constituição, o Poder Tributário, como Poder Político em geral, fica delimitado. No Brasil, o poder tributário é partilhado entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Ao poder tributário juridicamente delimitado e, sendo o caso, dividido dá-se o nome de competência tributária3.

Segundo Humberto Ávila, as regras de competência tributária, fixadas de forma

rígida pela Constituição Federal, tanto em relação às hipóteses de incidência dos tributos

quanto à predeterminação do conteúdo material para o seu exercício, excluem a livre

ponderação principiológica e exigem a demonstração de que o ente estatal se manteve, no

exercício de sua competência, no âmbito material4.

Os tributos passíveis de instituição pelas pessoas políticas, conforme consignados

no texto constitucional e reafirmados pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF),

se classificam em impostos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições especiais e

empréstimos compulsórios.

O exercício da competência tributária deve estar coadunado às regras, aos

princípios, aos pressupostos e aos limites estabelecidos na Constituição Federal, bem como à

observância dos direitos e garantias fundamentais individuais e coletivos.

Por fim, havendo controvérsias entre a pretensão estatal e a dos indivíduos, o sistema oferece a possibilidade facultativa de discutir as questões controvertidas através de um processo administrativo, com os meios e recursos próprios previstos em lei. Coloca, ainda, o Poder Judiciário como órgão estatal competente para dirimir controvérsias em concreto, no pressuposto de haver ameaça ou lesão de direito

3

MACHADO, Hugo de Brito.Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 37.

4

(15)

14 (princípio da inafastabilidade da jurisdição). As decisões judiciais devem ser cumpridas, sob pena de desobediência, ou caracterizar crime de responsabilidade5.

Antônio Roque Carrazza apresenta seis características para a competência

tributária: privatividade, indelegabilidade, incaducabilidade, inalterabilidade,

irrenunciabilidade e faculdade de exercício6; das quais, Paulo de Barros Carvalho reconhece

apenas a indelegabilidade, a irrenunciabilidade e a incaducabilidade.

A privatividade significa que a competência tributária é conferida em caráter de

exclusividade a cada um dos entes tributantes, ou seja, a competência conferida acerca de

determinado tipo de tributo, exclui, por conseguinte, a competência de todos os demais entes

federativos para instituí-lo. Paulo de Barros Carvalho7 sustenta que a única competência

tributária privativa é a da União, fundamentando sua afirmativa no artigo 154, inciso II, da

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Art. 154. A União poderá instituir: [...]

II - na iminência ou no caso de guerra externa, impostos extraordinários, compreendidos ou não em sua competência tributária, os quais serão suprimidos, gradativamente, cessadas as causas de sua criação.

Percebe-se pela leitura do dispositivo constitucional, que há circunstâncias – iminência ou caso de guerra externa – nas quais a União está constitucionalmente autorizada a invadir a esfera de competência dos Estados e dos Municípios. Confirmando o exposto,

Cristiane Mendonça8 acrescenta os casos previstos no art. 147 da Constituição Federal.

Art. 147. Competem à União, em Território Federal, os impostos estaduais e, se o Território não for dividido em Municípios, cumulativamente, os impostos municipais; ao Distrito Federal cabem os impostos municipais.

A indelegabilidade determina que o titular da competência, seja qual for, não a

pode transferir, no todo ou em parte, ainda que por meio de lei. Igualmente, o legislativo não

pode delegar ao Executivo ou a terceiros, quaisquer das atribuições para criar tributos.

Paulo de Barros Carvalho aponta a indelegabilidade como característica da

competência tributária, expondo:

5 ICHIHARA, Yoshiaki. Imunidades tributárias. São Paulo: Atlas, 2000, p. 89. 6

CARRAZZA, Roque Antônio.Curso de Direito Constitucional Tributário. 25ª edição. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 298-379.

7 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 248 e 241. 8

(16)

15 A faculdade legislativa de instituir tributos e sobre eles dispor, inaugurando a ordem jurídica, não pode ser delegada, devendo permanecer no corpo das prerrogativas constitucionais que a recolher do Texto Superior. Essa regra vedatória não encontra registro expresso na Constituição. Ora, ao definir a incidência do imposto, já terá o legislador esgotado sua competência, pelo que poderá passar adiante tão somente a capacidade de ser sujeito ativo, o que perfeitamente admissível. Transferir capacidade ativa não é transferir competência tributária, e assim o problema se resolve9.

A competência tributária é indelegável, salvo atribuição de funções de arrecadar

ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em

matéria tributária conferida por uma pessoa jurídica de Direito Público a outra, conforme

preceitua o artigo 7º e seu § 3º, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, o Código

Tributário Nacional.

Art. 7º A competência tributária é indelegável, salvo atribuição das funções de arrecadar ou fiscalizar tributos, ou de executar leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária, conferida por uma pessoa jurídica de direito público a outra, nos termos do§ 3º do artigo 18 da Constituição.

§ 3º Não constitui delegação de competência o cometimento, a pessoas de direito privado, do encargo ou da função de arrecadar tributos.

José Eduardo Soares de Melo conclui que sequer por emenda constitucional

poderiam ser as competências tributárias transferidas de um ente para outro10, com base em

vedação imposta pelo inciso I do § 4º do artigo 60 da Constituição Federal de 1988.

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: [...]

§ 4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I - a forma federativa de Estado;

A incaducabilidade da competência tributária significa que o seu não exercício,

ainda que por prolongado tempo, não tem o condão de impedir que a pessoa política,

querendo, venha a criar, por meio de lei, os tributos que lhe forem constitucionalmente

deferidos.

A Constituição subsiste para perdurar no tempo. Caso as atribuições estabelecidas

fossem perecíveis, o próprio texto constitucional ficaria comprometido. Dessa forma, a

permanência das competências impõe-se ante as circunstâncias vigentes. Além disso, Roque

9

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 220.

10 MELO, José Eduardo Soares de. A importação no direito tributário: impostos, taxas, contribuições. São

(17)

16

Antônio Carrazza afirma que o Poder Legislativo não pode ser impelido de legislar por ter

deixado de fazê-lo durante certo lapso temporal; justifica sua colocação afirmando que a

Constituição quando atribuiu ao Poder Legislativo a faculdade de legislar não estabeleceu um

prazo limite para que o fizesse, sob pena de sua extinção; e legislar pressupõe inovar, nos

limites impostos pela Constituição, a ordem jurídica.

A inalterabilidade é a característica de que as pessoas titulares de competência

tributária não podem alterar o campo tributável que lhes foi conferido, sendo que somente

pode ocorrer tal alteração por modificação da própria Carta Magna, através de emenda

constitucional.

Paulo de Barros Carvalho não considera a inalterabilidade como uma das

características da competência tributária, tendo em vista que o Poder Reformador poderá

realizar alterações no quadro discriminativo das competências tributárias11. Contudo, Roque

Antônio Carrazza e Cristiane Mendonça alertam que eventual reforma constitucional com

pretensão de alterar as competências tributárias deve respeitar o conteúdo do artigo 60, § 4º,

da Constituição Federal12.

A competência tributária é uma prerrogativa indisponível, razão pela qual ela

pode deixar de ser exercida, mas nunca renunciada. Paulo de Barros Carvalho aduz que não

haver sentido o Poder Originário Constituinte pormenorizadamente discriminar as

competências tributárias e os entes políticos delegá-las ou delas abdica-las em definitivo, em

outras palavras, delas dispor13.

Roque Antônio Carrazza afirma que a renúncia, entendida como abdicação

unilateral da competência tributária outorgada, pela pessoa política, é juridicamente ineficaz14,

no que é acompanhado por Tácio Lacerda Gama, que menciona: “renunciar à competência é forma pela qual a modifica e, em não sendo possível sua modificação, não será igualmente

possível a sua renúncia15”.

A facultatividade estabelece que a instituição do tributo em relação ao qual

determinada pessoa política seja competente fica no âmbito de sua decisão política,

11 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 241.

12

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 646; MENDONÇA, Cristiane. Competência tributária. São Paulo: Quartier Latin do Brasil, 2004, p. 287.

13

CARVALHO, op. cit., p. 240.

14

CARRAZZA, op. cit., p. 648.

15

(18)

17

dependendo da conveniência do ente tributante. Os entes políticos, embora não possam

delegar suas competências tributárias, são livres para delas de utilizarem ou não.

Roque Antônio Carrazza, apoiado nas lições de Norberto Bobbio sobre as diversas

regras de estrutura, concluiu que não há, na Constituição Federal, no que concerne ao

exercício da competência tributária, norma que obrigue o seu exercício, e sim apenas as que o

permitem. Os entes políticos, portanto, são livres para dela se utilizar ou não16. O autor aponta

como única exceção à facultatividade da competência tributária aquele que se refere à

instituição do ICMS, sobre o tema leciona Paulo de Barros Carvalho:

Todavia, a exceção vem aí para solapar o caráter de universalidade da proposição: refiro-me ao ICMS. Por sua índole eminentemente nacional, não é dado a qualquer Estado-membro ou ao Distrito Federal operar por omissão, deixando de legislar sobre esse gravame. Caso houvesse uma só unidade da federação que empreendesse tal procedimento e o sistema do ICMS perderia consistência, abrindo-se ao acaso das manipulações episódicas, tentadas com tanta frequência naquele clima que conhecemos por guerra fiscal17.

2.2 Conceito e Natureza Jurídica da Norma Imunizatória

Etimologicamente, o termo imunidade provém do latim immunitas, immunitate.

Trata-se de expressão que indica negação, estabelecida pelo prefixo in, de munus (cargo,

função ou encargo), significando, portanto, sem encargos ou livre de encargos18.

Munus é empregado também, no latim, como sinônimo de imposto, bem como

dádiva ou favor, o que remonta, inclusive, ao histórico do instituto da imunidade tributária.

Além disso, alguns doutrinadores sugerem que o vocábulo tem o sentido de algo protegido

por uma barreira19.

A doutrina diverge na elaboração do conceito e na atribuição da natureza jurídica

da imunidade tributária, o que enseja uma análise acurada das diversas perspectivas abordadas

para, ao final, atribuirmos o nosso posicionamento.

José Souto Maior Borges e Amílcar de Araújo Falcão adotam a tese de que a

imunidade tributária constituir-se-ia como uma hipótese de não incidência

constitucionalmente qualificada, no que aquele assevera:

16

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 648-653.

17

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 19ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 220.

18

MORAES, Bernardo Ribeiro de. Imunidades tributárias. São Paulo: Revista dos Tribunais, Pesquisas Tributárias, Nova Série - 4, 2001, p. 105.

19 FARIA, Maria Cristina Neubern de. A interpretação das normas de imunidade tributária: conteúdo e

(19)

18 A regra imunizante configura, desta sorte, hipótese de não-incidência constitucionalmente qualificada. Quando se destaca no ordenamento jurídico um setor normativo autônomo – as regras tributárias – a análise constata a existência de duas modalidades distintas pelas quais se manifestam o fenômeno denominado não-incidência: I) a não-incidência genérica ou pura e simples, e II) a não-incidência juridicamente qualificada ou especial. A imunidade tributária inclui-se, pois, nesta segunda alternativa. A não-incidência pura e simples ocorre quando inexistentes os pressupostos de fato idôneos para desencadear a incidência, automática e infalível, da norma sobre a sua hipótese de incidência realizada concretamente (fato gerador). A não-incidência por imunidade constitucional decorre da exclusão de competência impositiva do poder tributário20.

Paulo de Barros Carvalho, corroborado por José Wilson Sobrinho, afirma que a

classificação da imunidade tributária como não-incidência constitucionalmente qualificada

leva a crer que a norma constitucional possa não incidir, o que é inconcebível. Além disso, é

por incidir que a norma qualifica pessoas, coisas e estados de coisas no sistema21.

Alguns teóricos defendem que as imunidades constituem hipóteses de exclusão ou

supressão de parte do poder tributário concedido aos entes políticos. Segundo José Eduardo

Soares de Melo:

A imunidade consiste na exclusão de competência da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para instituir tributos relativamente a determinados atos, fatos e pessoas, expressamente previstas na Constituição Federal22.

Contudo, tanto as normas que disciplinam a competência quanto às que

contemplam as hipóteses de imunidades propagam seus efeitos no mesmo instante,

dimensionando o campo tributável, quando configuradas na Constituição, não existindo um

sucedâneo cronológico entre estas. Dessa forma, referida concepção não representa

adequadamente o fenômeno das imunidades.

Rubens Gomes de Souza define as imunidades como proibições contidas no texto

constitucional e que representam limitações à competência tributária23, enquanto Aliomar

Baleeiro defende a tese de que as imunidades são limitações ao poder de tributar, da qual

também é adepto Luciano Amaral.

A face mais visível das limitações do poder de tributar desdobra-se nos princípios constitucionais tributários e nas imunidades tributárias (técnica por meio da qual, na

20 BORGES, José Souto Maior. Teoria Geral das Isenções tributárias. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p.

181.

21 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 173-174

22

SOARES DE MELO, José Eduardo. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1997, p. 89.

23

(20)

19 definição do campo sobre que a Constituição autoriza a criação de tributos, se excepcionam determinadas situações, que ficam, portanto, fora do referido campo de competência tributária). Essa matéria é objeto de seção específica da Constituição (arts. 150 a 152), justamente com o título de Limitações do Poder de Tributar, no capítulo relativo ao Sistema Tributário Nacional24.

Rui Barbosa Nogueira também concebe a imunidade como limitação

constitucional ao poder de tributar25, bem como Sacha Calmon Navarro Coelho que conceitua

a imunidade como uma heterolimitação ao poder de tributar26.

No que tange as imunidades como limitação à competência tributária, a

proposição apresenta igualmente o equívoco de supor uma cronologia entre as normas de

competência e aquelas que contemplam hipóteses de imunidade. Quanto ao entendimento da

imunidade como limitação ao poder de tributar, não se pode admitir a existência de um poder

de tributar anterior ao texto constitucional, que precede a própria criação deste.

Alinhamo-nos ao posicionamento do professor Paulo de Barros Carvalho, que,

inclusive, fundamenta os argumentos contrários às teses anteriormente mencionadas.

Extraímos de sua doutrina o conceito e a natureza jurídica que se demonstram mais adequados

para a imunidade tributária:

classe finita e imediatamente determinável de normas jurídicas, contidas no texto da Constituição Federal, e que estabelecem, de modo expresso, a incompetência das pessoas políticas de Direito Constitucional interno para expedir regras instituidoras de tributos que alcancem situações específicas e suficientemente caracterizadas27.

O autor aborda as imunidades como normas de estrutura (normas de produção, de

formação ou de transformação de outras normas), haja vista que estabelecem o modo de criar

ou alterar regras no sistema jurídico. Além disso, enquadra os institutos imunizantes no

domínio das sobrenormas ou metaproposições prescritivas, que atuam, de forma positiva ou

negativa, para determinar a competência dos entes tributantes, estabelecendo os limites de sua

atividade.

Paulo de Barros Carvalho diferencia as normas de comportamento (conduta) e

normas de estrutura:

24 AMARO, Luciano.Direito Tributário Brasileiro. 9° ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 105-106 25

BARBOSA NOGUEIRA, Ruy.Curso de Direito Tributário. 10° ed. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 172.

26 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro.Curso de Direito Tributário. 6° ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.

157.

27

(21)

20 São normas de conduta, entre outras, as regras-matrizes de incidência dos tributos e todas aquelas atinentes ao cumprimento dos deveres instrumentais ou formais, também chamados de "obrigações acessórias". E são tipicamente regras de estrutura aquelas que outorgam competência, isenções, procedimentos administrativos e judiciais, as que prescrevem pressupostos. Entre as normas que estipulam, competência, incluamos as regras de imunidade tributária28.

As normas de conduta têm como objeto os comportamentos interpessoais,

modalizando-os deonticamente como obrigatórios, proibidos ou permitidos, e as normas de

estrutura, por outro lado, apesar de disporem também sobre condutas, regulam a produção de

novas estruturas deôntico-jurídicas, já que o Direito é um sistema autopoiético e, dessa forma,

regula sua própria produção.

Acrescenta Norberto Bobbio:

Existem normas de comportamento ao lado de normas de estrutura. As normas de estrutura podem também ser consideradas como as normas para a produção jurídica: quer dizer, como as normas que regulam os procedimentos de regulamentação jurídica. Elas não regulam o comportamento, mas o modo de regular um comportamento, ou, mais exatamente, o comportamento que elas regulam é o de produzir regras29.

Assim, realizada a distinção entre normas de comportamento e normas de

estrutura, percebe-se a pertinência do conceito apresentado por Paulo de Barros Carvalho, por

configurarem-se as imunidades como normas dirigidas ao legislador, restringindo-lhe a

possibilidade de tributar determinadas situações. Não são normas dirigidas ao âmbito material

da conduta, mas que aludem à produção, formação ou transformação de outras normas,

especificamente sobre a impossibilidade de abarcar situações discriminadas, caracterizando-se

as normas imunizantes, portanto, como metaproposições prescritivas.

2.3 Histórico acerca das Imunidades Tributárias

A análise do histórico é importante ao entendimento da tributação e,

consequentemente, das imunidades, que constituem uma desoneração tributária, pois permite

compreender como a tributação passou de uma arrecadação confiscatória para um produto

destinado ao bem comum e como os privilégios de classes cederam lugar à valores

relacionados à totalidade da sociedade.

28 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário: fundamentos jurídicos da incidência. São Paulo:

Saraiva, 1999, p. 20.

(22)

21

Aliomar Baleeiro relaciona o poder político com a tributação, em uma perspectiva

histórica:

O tributo é vestusta e fiel sombra do poder político há mais de vinte séculos. Onde se ergue um governante, ela se projeta sobre o solo de sua dominação. Inúmeros testemunhos, desde a Antiguidade até hoje, excluem qualquer dúvida30.

Os fatos históricos permitem vislumbrar os motivos extrajurídicos da tributação e

como foram ocorrendo as transformações destes segundo os valores sociais de cada período, o

que possibilita apreender como a imunidade, inicialmente concedida a classes

particularizadas, sem qualquer critério de equidade, isonomia, ou justiça fiscal, passou a

resguardar finalidades essenciais à democracia e aos direitos fundamentais.

A imunidade, anteriormente, estava relacionada à noção de benesse a uns poucos

privilegiados. A desoneração de tributos baseava-se na distinção de classes sociais, sendo

concedida como graça ou favor aos amigos e protegidos do soberano. O privilégio tributário

era decorrente do domínio político; em favor dos povos invasores e conquistadores em

relação aos conquistados, bem como em detrimento das classes tidas como superiores em

relação aos demais, desprovidos de direitos civis e políticos. Contudo, ao longo do tempo,

ocorreram profundas transformações nos critérios para concessão de privilégios fiscais,

passando a ter uma fundamentação pautada em interesses sociais mais amplos.

Na Antiguidade, as desonerações tributárias baseavam-se na distinção entre

classes. Na China, Índia, Pérsia, Babilônia e em algumas cidades da Grécia Antiga, a

aristocracia era dispensada do pagamento de tributos. Quanto mais elevada a classe, maiores

eram os favores fiscais concedidos pelos soberanos, que representavam o Estado, e em troca

recebiam apoio político. Um aspecto interessante do Código de Manu (Índia – século XIII a.C) era a concessão de isenções fiscais com base na condição física de determinados

indivíduos como cegos, paralíticos, deficientes mentais e septuagenários.

No Direito Romano, apesar da existência de uma estrutura tributária mais

sofisticada, a situação não era muito distinta das demais civilizações. Os privilégios

tributários eram concedidos como graça ou favor a certas pessoas ou situações (templos

religiosos e bens públicos).

Existiam várias espécies de impostos, bem como de isenções. A Lex Vicesima

Hereditatum et Legatorum estabelecia a cobrança de um imposto com alíquota de 5% sobre o

30 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atualização de Misabel Abreu

(23)

22

valor das heranças ou legados, recaindo, principalmente, sobre os legados a amigos e as

heranças dos celibatários. Eram isentos parentes próximos e os bens de pequeno valor. Tal

incidência estava em conformidade com a política econômica do Imperador Augusto, que se

caracterizava pela preocupação em amparar famílias numerosas, proteger os casamentos,

punir os adultérios, gravar os celibatários e os casais sem filhos.

Posteriormente, em face de problemas financeiros do Império, Antonino

aumentou a alíquota para 10% e estendeu a cidadania romana a todos os habitantes de seu

território através do edito de Caracala (212 a.C.)31. Pode-se ver que não são recentes as

determinações estatais de aumento de alíquota e do número de contribuintes.

Na época medieval, em que prevalecia o Feudalismo, a Igreja e os nobres ficavam

afastados do poder do soberano, inclusive no âmbito fiscal, porém encarregados de exercê-lo

na área determinada de sua atuação. Posteriormente, as cidades também passaram a ter

desonerações tributárias em relação ao poder central.

A Carta Magna (1215, d.C.) foi um marco para o Direito, e, em especial, para a

cidadania e a tributação, a partir da qual surgiram garantias constitucionais de liberdade

presentes nas Constituições ocidentais, dentre elas o princípio da legalidade. Contudo, os

direitos previstos eram controlados pela nobreza, em seu próprio proveito, e não para o da

sociedade com um todo. Historicamente foi um avanço, mas ainda longe da situação atual. As

garantias configuravam-se como privilégios de classe, ao invés de garantias individuais.

Com as Revoluções Burguesas (século XVII), os privilégios, legalmente,

passaram dos nobres e da Igreja Católica para todos os cidadãos, se constituindo, então, em

verdadeiras garantias individuais. Em relação aos aspectos tributários, a imunidade passou a

significar uma garantia de que certas atividades estariam afastadas da esfera do poder de

tributar da classe dirigente32.

Em Portugal, com as Ordenações Filipinas, foi instituído que estavam dispensados

do pagamento de contribuições extraordinárias os fidalgos, cavaleiros e escudeiros de

linhagem, os doutores, licenciados, bacharéis, vereadores e procuradores, o que foi

consolidado em 1773, pela assinatura do Rei e do Marquês de Pombal, vigendo para Portugal,

colônias e Brasil, em que se percebe a herança dos favores fiscais de nossos antecedentes

lusitanos.

31

MEIRA, Sílvio. Direito tributário romano. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978, p. 23. Disponível em: http://books.google.com.br/books/about/Direito_tribut%C3%A1rio_romano.html?id=hrxAAAAAYAAJ&redir_ esc=y. Acesso em: 12 de março de 2014.

(24)

23

Posteriormente a um período marcado por privilégios fiscais em função do

sistema de classes, a partir da Independência dos Estados Unidos e da Revolução Francesa,

estabeleceram-se novas diretrizes no que se refere às relações de poder entre o Estado e a

população, que atingiram também a tributação.

2.3.1 Independência dos Estados Unidos

A independência dos Estados Unidos da América, com forte influência iluminista,

foi motivada, dentre outras razões, por medidas de arrecadação compulsória, implementadas

pela Inglaterra, com o intuito de reestabelecer a economia inglesa prejudica pela Guerra dos

Sete Anos (1756-1763) contra os franceses.

A Coroa inglesa adotou várias medidas para arrecadar um grande volume de

capital em detrimento das Treze Colônias. Em 1764, o Parlamento inglês aprovou o Sugar

Act, que taxava produtos que não viessem das Antilhas Britânicas, e o Stamp Act, em 1765,

pelo qual passaram a ser tributados os documentos públicos. Posteriormente, os Townshend

Acts, que impuseram a tributação sobre todas as mercadorias importadas, e o Tea Act, em

1773, que garantia o monopólio do chá vendido para América à Companhia Britânica das

Índias Orientais, em grave crise financeira.

O Tea Act tem um aspecto específico na Independência das Treze Colônias, posto

que foi o estopim que desencadeou o movimento revolucionário. Contra referida taxação,

colonos disfarçados de índios destruíram centenas de caixas de chá retiradas dos porões de

barcos ancorados no porto de Boston (Boston Tea Party). A partir de então a crise entre

colônia e metrópole atinge seu ápice, ensejando uma série de conflitos que resultaram na

Declaração da Independência e a promulgação da primeira Constituição dos Estados Unidos,

com regime republicado, presidencialista e a tripartição de poderes preconizada por

Montesquieu.

2.3.2 Revolução Francesa

A Revolução Francesa, assim como a Independência dos Estados Unidos, tem

motivações relacionadas à carga tributária. A sociedade francesa era dividida em estamentos,

segundo os quais eram estabelecidos privilégios a alguns em detrimentos de outros, que

arcavam com os custos do Estado. O clero compunha o primeiro estado, a nobreza o segundo

(25)

24

impostos e contribuições. Os dois primeiros estados além de não pagar tributos, viviam à

custa do dinheiro público, o que ensejou reivindicações do terceiro estado pela extinção dos

privilégios e pela igualdade.

A nobreza era uma classe decadente, que vivia de forma parasitária junto à Corte.

Possuía tribunais próprios, recebia pensões do poder real e gozavam de direitos feudais

(servidão, corveias, banalidades). Os servos, camponeses livres e arrendatários arcavam com a

maior parte dos impostos e contribuições, além de exigências de prestação de serviços gratuita

devida ao monarca e ao clero. A burguesia urbana também era elevadamente onerada. Com o

intuito de auferir grandes lucros, os arrecadadores exploravam ao máximo os contribuintes do

terceiro estado. Os custos da Corte em Versalhes representavam 10% (dez por cento) das

despesas de toda a França, que recaíam em quase sua totalidade sobre o terceiro estado

francês.

No contexto de propagação de ideais iluministas, de revolta com a indiferença

contínua e a decadência da classe dominante francesa, de crise financeira e do anseio da

ascendente burguesia por maior participação política, eclodiu a crise, e os antigos valores de

tradição e de hierarquia dos monarcas, dos aristocratas e da Igreja Católica foram destituídos

pelos novos princípios de liberté, égalité et fraternité.

Em maio de 1789, foi convocada a Assembleia dos Estados Gerais, um órgão

político de caráter consultivo e deliberativo, constituído por representantes das três ordens

sociais denominadas estados, em que cada estado tinha direito a um voto. O intuito da

convocação era tratar sobre modificações na cobrança dos impostos.

Ao longo do debate, o terceiro estado passou a exigir que a votação fosse por

pessoa, e não por estado, negando-se o clero e a nobreza a aceitar a exigência. Os

representantes do terceiro estado reagiram, declarando a formação da Assembleia Nacional

Constituinte, com o objetivo de criar uma Constituição para a França.

Em meados de julho de 1789, após notícias de que o monarca francês iria

combater a Assembleia Nacional Constituinte, a população rebelou-se: saquearam depósitos

de armas e alimentos; tomaram a Bastilha, uma prisão fortificada francesa; e no campo,

atacaram os castelos. Posteriormente, foi determinada a abolição da servidão, dos dízimos e

dos privilégios do clero e da nobreza; a nacionalização dos bens da Igreja e a sua submissão à

monarquia francesa e a aprovação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão,

(26)

25

aprovada a Constituição francesa, instituindo a Monarquia Constitucional e colocando fim ao

poder absoluto do rei.

Surge o princípio da Generalidade da Tributação, segundo o qual ninguém, por

sua condição social, pode se eximir de pagar tributos, podendo somente o interesse público

autorizar a desoneração tributária.

Assim, substituindo a antiga concepção de imunidade como um favor fiscal do

soberano, com a evolução dos governos autocráticos e absolutistas para o Estado Democrático

de Direito, o vocábulo assume sua atual representação. Desonerada (im-munus: livre de

imposto) passa a ser a situação que deve ser protegida da tributação, em torno da qual se

coloca uma barreira à exação, para a preservação de um valor maior para o Estado que a

própria arrecadação.

2.3.3 Evolução constitucional das imunidades tributárias no Direito brasileiro

Na historiografia brasileira também é possível perceber, à semelhança dos Estados

Unidos e da França, movimentos de independência com motivações relacionadas às exações

tributárias.

Várias revoltas contra o domínio político de Portugal ocorreram em razão de

medidas que contrariavam os interesses econômicos dos colonos, quando um novo monopólio

ou privilégio era criado ou quando os impostos eram elevados.

O principal movimento de independência política do Brasil colônia, a

Inconfidência Mineira, no século XVIII, obteve grande repercussão por envolver amplos

setores da elite intelectual e contestar o pacto colonial. Dentre as motivações, estavam as

rígidas medidas de política econômica, como a derrama (taxação compulsória em que deveria

ser completado o que faltasse da cota imposta por lei de 100 arrobas de ouro anuais) e o

quinto (desconto de vinte por cento da quantidade de ouro e escravos). Contudo,

diferentemente do que aconteceu com as Treze Colônias da América, a Conjuração de Minas

foi violentamente sufocada pela metrópole, mantendo-se os privilégios e a exação abusiva.

Na Constituição de 1824, com o advento do Império, pouco era mencionado sobre

a matéria tributária, existindo breves noções sobre a capacidade contributiva e a imunidade

fiscal, mas esta não forma expressa.

Com a proclamação da República e a instauração do regime federativo no Brasil,

(27)

26

tributária, inclusive no tocante às limitações do poder de tributar, dentre as quais se incluem

as hipóteses de imunidade. Na primeira Constituição republicana, em 1891, é adotado, pela

primeira vez, expressamente o instituto da imunidade tributária. Rui Barbosa, autor do

anteprojeto, confessadamente se inspirou na Carta norte-americana, inclusive no tocante às

imunidades recíprocas entre os estados e para o culto religioso, embora à época tenha

desconsiderado os municípios.

Contudo, a sistematização das imunidades no modelo norte-americano é diversa

da existente no direito pátrio, sobretudo pelo processo de federalização distinto vivenciado

pelos dois países. Nos Estados Unidos, o instituto da imunidade recíproca visa proteger a

União em relação à atuação autônoma dos Estados, que tributavam atividades ligadas à

União. No Brasil, como a federação é oriunda de relevantes marcas de unitarismo, o

constituinte buscou defender a autonomia dos estados.

Aliomar Baleeiro, sobre o assunto, aponta:

Em nenhum dispositivo da Constituição dos Estados Unidos ou de suas emendas se contém expressamente o princípio da reciprocal immunity of Federal and State Instrumentalities. Ela é consequência remota e indireta da teoria dos poderes implícitos, segundo a necessidade de expansão da competência federal, em detrimento da ciumenta autonomia dos Estados33.

Nos EUA, o processo de federalização delineou-se a partir da força política de

cada estado, enquanto no Brasil, o poder unitário procurou decentralizar-se, dando ensejo à

federação. Esse fenômeno justifica a forma como as imunidades, sobretudo a recíproca, são

positivadas na Constituição Federal.

A Constituição de 1934 reitera a vedação ao embaraço de cultos, exonera a

tributação sobre a produção de combustíveis e mantém as imunidades recíprocas entre os

entes políticos, incluindo os municípios. Uma inovação interessante foi a determinação de

imunidades ao exercício profissional de jornalistas e professores e à renda cedular de imóveis.

A Carta Magna de 1937 manteve a imunidade dos cultos religiosos, mas eliminou

as imunidades recíprocas entre os entes federados, sendo positivadas novamente somente a

partir da Emenda n° 9, de 1945.

A Constituição de 1946 imunizava do imposto de consumo os produtos

considerados como de mínimo indispensável das pessoas de reduzida capacidade econômica,

mantinha as imunidades recíprocas entre as pessoas políticas e as imunidades dos cultos

33 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atualização de Misabel Abreu

(28)

27

religiosos, estabelecia imunidades para os partidos políticos, entidades educacionais e

assistenciais e ao papel destinado à impressão de livros, jornais e periódicos.

Aliomar Baleeiro salienta que a Constituição norte-americana, que foi referência à

Constituição Republicana de 1891, também inspirou a de 1946, acrescentando que:

Nenhuma Constituição excede a brasileira, a partir da redação de 1946, pelo zelo com que reduziu a disposições jurídicas aqueles princípios tributários. Nenhuma outra contém tantas limitações expressas em matéria financeira. Por isso mesmo, a interpretação e a aplicação daqueles dispositivos não podem dispensar as elaborações da Ciência das Finanças, velha fonte de onde afinal promanaram34.

A Emenda Constitucional nº 10/64 estabeleceu imunidade de impostos sobre a

transferência imobiliária das propriedades rurais em caso de desapropriação de terras para

reforma agrária. Por sua vez, a EC 18/65 reformulou o sistema tributário, passando as

imunidades serem previstas expressamente na forma da Constituição atual.

A Constituição Federal de 1967 foi o marco introdutório da imunidade dos livros,

jornais e periódicos (artigo 20, inciso III, alínea “d”), que na Constituição anterior restringia-se ao papel.

A EC 01/69 modificou profundamente o texto constitucional, contudo, manteve as

imunidades previstas; além disso, imunizou o Imposto Territorial Rural de pequenas

propriedades, Imposto sobre Direitos Reais de Garantia, Imposto sobre Transmissão de Bens

e Direitos incorporados ao patrimônio na realização de capital e incorporação ou extinção de

capital da pessoa jurídica, com algumas restrições, e Imposto sobre Circulação de

Mercadorias de produtos industrializados destinadas a exportação.

A Constituição Cidadã de 1988 aperfeiçoou o conceito de imunidade tributária e

ampliou as situações de aplicação, mencionando, no artigo 150, a ausência de finalidade

lucrativa das entidades assistenciais e de educação para efeito de imunidade e estabelecendo

imunidade recíproca às fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público.

Dessa forma, o instrumento da imunidade tributária foi se positivando no

ordenamento jurídico brasileiro, a exemplo do que ocorreu historicamente em âmbito global,

a partir da noção de que determinadas pessoas, bens e situações, conforme sua natureza

jurídica e sua importância ao interesse social, merecem tratamento tributário diferenciado.

34 BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. Atualização de Misabel Abreu

(29)

28

2.4 Finalidade

Consoante o histórico apresentado, as imunidades deixaram de ser benefícios

fiscais concedidos a classes privilegiadas, relacionadas ao poder, para se tornarem,

gradativamente, meios para consecução de valores fundamentais existentes no âmbito social e

decorrentes do próprio modelo republicado, democrático, e social do Estado.

Nesse sentido, José Eduardo Soares de Melo:

O objetivo da imunidade é a preservação de valores considerados como de superior interesse nacional, tais como a manutenção das entidades federadas, o exercício das atividades religiosas, da democracia, das instituições educacionais, assistenciais e de filantropia, e o acesso à informações35.

As motivações para instituição das imunidades pelo Constituinte encontram-se na

busca pela concretização de valores prestigiados pela sociedade. Não se trata de uma escolha

aleatória, sem critérios, mas do afastamento da tributação por uma finalidade, viabilizando a

proteção e promoção de preceitos tidos como fundamentais, conforme preceitua Luciano

Amaro:

O fundamento das imunidades é a preservação de valores que a Constituição reputa relevantes (a atuação de certas entidades, a liberdade religiosa, o acesso à informação, a liberdade de expressão), que faz com que se ignore a eventual (ou efetiva) capacidade econômica revelada pela pessoa (ou revelada na situação), proclamando-se, independentemente da existência dessa capacidade, a não-tributabilidade das pessoas ou situações imunes36.

Da obra de Ives Gandra da Silva Martins, extrai-se que:

As imunidades foram criadas estribadas em considerações extrajurídicas, atendendo à orientação do Poder Constituinte em função das ideias políticas vigentes, preservando determinados valores políticos, religiosos, educacionais, sociais, culturais e econômicos, todos eles fundamentais à sociedade brasileira. Dessa forma, assegura-se, retirando das mãos do legislador infra-constitucional, a possibilidade de, por meio da exação imposta, atingi-los.

Resguarda o equilíbrio federativo, a liberdade política, religiosa, de associação, do livre pensamento, e de expressão, a expansão da cultura, o desenvolvimento econômico, e, assim não deve considerar a imunidade como um benefício, um favor fiscal, uma renúncia à competência tributária ou um privilégio, mas sim uma forma de resguardar e garantir valores da comunidade e do indivíduo37.

35

SOARES DE MELO, José Eduardo.Curso de Direito Tributário. São Paulo: Dialética, 1997, p. 89.

36 AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 149.

(30)

29

A tricotomia fato, valor e norma estabelece que o fato precede a normatização de

uma conduta. O fato jurídico guarda distinção para com os demais em razão da valoração que

o Direito lhe atribui. Neste sentido, as imunidades encontram uma alta carga axiológica e

também decorrem de princípios valorados em um determinado momento histórico.

As imunidades podem ser concebidas como decorrência de princípios do sistema

jurídico, ou como advindas de preceitos extrajurídicos, que refletem valores consagrados na

coletividade, não mais se configurando como incentivos fiscais ou privilégios. Federação,

liberdade de religião, atividade política, exercício da democracia, educação e assistência

social, livros como comunicação do pensamento e transmissão do conhecimento, são

exemplos de valores que fundamentam as imunidades.

Ao considerar hipóteses de imunidade, o legislador constituinte visou garantir a

efetividade de valores consagrados pela sociedade na forma de princípios. A valoração desses

princípios, que se irradiam na realidade em situações concretas, assume tamanha relevância, a

ponto de ir além da própria necessidade do Estado de obter receitas pela tributação. Dessa

forma, também é vedada a taxação de situações e pessoas que componham um valor, que se

buscou constitucionalmente resguardar.

As imunidades tributárias, portanto, ao contrário da antiga noção de privilégio

fiscal, são, atualmente, decorrência da forma federativa do Estado (recíproca), do direito ao

acesso à informação (imunidade de livros e periódicos e papel destinado à sua impressão), de

instituições democráticas (imunidade de partidos políticos), e de outros valores albergados

pelo ordenamento jurídico.

2.5 Características das Imunidades Tributárias

As normas de imunidade caracterizam-se por serem amplas, indivisíveis, de

eficácia plena e aplicabilidade imediata. São amplas, tendo em vista serem aplicáveis, em

tese, a todos os tributos. Na Constituição, há exemplos de regras de imunidade relativas a

impostos, taxas e contribuições sociais. Nada impediria, contudo, que o legislador constituinte

tivesse instituído imunidades em relação à contribuição de melhoria e ao empréstimo

compulsório, apesar de não tê-lo feito.

Contudo, não concordamos com o posicionamento de que, em decorrência dessa

(31)

30

Constituição estendeu às autarquias e fundações mantidas pelo Poder Público, a imunidade

prevista pelo inciso VI, alínea “a”, do mesmo dispositivo legal. Porém, tal extensão não ocorreu de forma irrestrita como generalizado por alguns. O legislador separou, de um lado,

as atividades ligadas aos objetivos primordiais daqueles entes, de outro, o exercício de

funções paralelas, marginais ou episódicas, que eventualmente as autarquias e as fundações

instituídas e mantidas pelo Poder Público venham a desempenhar.

Igualmente, há hipóteses de imunidade em que o legislador constitucional

subordina o desfrute da imunidade à observância de requisitos previstos em lei, como se

observa no artigo 150, VI, c, da CF/88.

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

VI - instituir impostos sobre: [...]

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei; [grifou-se]

Hodiernamente, podemos dizer que a doutrina é quase unânime em reconhecer

que as imunidades não atingem somente os impostos, mas os tributos como gênero, abarcando

impostos, taxas e contribuições de melhoria e, para aqueles que reconhecem mais espécies

tributárias, as demais exações.

O argumento daqueles que defendem que as imunidades somente se referem a

tributos não vinculados são o de que o texto da Constituição Federal, em seu artigo 150,

inciso VI, cita especificamente estas espécies de tributos; segundo, porque os impostos são

concebidos para as despesas gerais do Estado, enquanto que as demais espécies tributárias

pressupõem uma atividade do Estado, seja o exercício do poder de polícia, a prestação de um

serviço público ou a valorização imobiliária decorrente de obra pública, o que as tornariam

incompatíveis com as imunidades.

Os argumentos não prosperaram e a situação encontra-se pacificada na doutrina,

sendo que a posição amplamente majoritária admite as imunidades em relação a taxas e

contribuições de melhoria.

Não existe circunstância que teria aptidão de impedir que o legislador constituinte,

(32)

31

tributárias, afastasse a decretação de certas taxas ou impossibilitasse a criação de

contribuições de melhorias.

Paulo de Barros aponta o equívoco:

A proposição afirmativa de que a imunidade é instituto que só se refere aos impostos carece de consistência veritativa. Traduz exacerbada extensão de uma particularidade constitucional que pode ser facilmente enunciada mediante a ponderação de outros fatores, também extraídos da disciplina do Texto Supremo. Não sobeja repetir que, mesmo em termos literais, a Constituição brasileira abriga regras de competência da natureza daquelas que se conhecem pelo nome de imunidades tributárias, e que trazem alusão explícita às taxas e à contribuição de melhoria, o que basta para exibir a falsidade da proposição descritiva38.

Aliomar Baleeiro esposa o mesmo entendimento:

Por essa mesma razão é que as imunidades, como regra geral, contemplam impostos. Eventualmente, por razões de política econômica, a Constituição consagra a imunidade mais ampla, abrangendo qualquer espécie tributária (art. 155, § 3°), ou, por imperativo de Justiça, a Constituição consagra a imunidade daqueles reconhecidamente pobres, em relação a certas taxas e emolumentos (art. 5°, LXXIV, LXXVI). Mas as hipóteses são excepcionais39.

Além disso, não há razões para que sejam restringidas as hipóteses de imunidades

ao inciso, VI, do artigo 150 da Constituição Federal. Destaca-se o que dispõe o artigo 5°,

inciso XXIV, a e b:

XXXIV – são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de Poder;

b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;

É, portanto, uma hipótese que exibe o equívoco da proposição que afirma que as

imunidades restringem-se aos impostos. Observa-se também o exposto no artigo 195, § 7°, da

CRFB/88:

§ 7° São isentas de contribuição para seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei.

Apesar de o legislador, mediante sua linguagem técnica permeada de imprecisões

e equívocos, referir-se à isenção, o correto seria imunidade, de modo que vemos que há

38 CARVALHO, Paulo de Barros.Curso de Direito Tributário.São Paulo: Saraiva, 2007, p. 178. 39

Referências

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