INFLUÊNCIA DO FENÔMENO ÍNDICE DE OSCILAÇÃO SUL (EL NIÑO E LA NIÑA) NA TEMPERATURA DE SUPERFÍCIE DO BIOMA CERRADO
Dra. Nicali Bleyer Ferreira dos Santos ¹ ; M.e Diego Tarley Ferreira Nascimento ²; Dra. Juliana Ramalho Barros ¹.
¹ Universidade Federal de Goiás - Instituto de Estudos Socioambientais. ² Universidade Federal de Goiás - Escola de Agronomia e Engenharia de Alimentos.
RESUMO: O fenômeno IOS influencia várias regiões do Brasil, contudo, quase nada se sabe sobre suas conseqüências na região Centro-Oeste. Nesse sentido, o presente trabalho teve por objetivo analisar a influência dos fenômenos El Niño e La Niña sobre a variação espacial e temporal da temperatura de superfície no bioma Cerrado, haja vista as poucas análises referentes a essa temática para a região Centro–Oeste do Brasil. Para isso, utilizou-se dados do MODIS, Produto MOD11, mod11A2 Coleção 5, com resolução espacial de 1km, dos anos de 2003 e 2007. Apesar das análises terem sido para apenas dois anos, foi possível perceber variações com relação à presença de nuvens e à variabilidade termal de superfície em termos de valores máximos e distribuição espacial entre os anos de ocorrência dos fenômenos La Niña e El Niño.
ABSTRACT: The IOS phenomenon affects different regions of Brazil, however, almost nothing is known about the consequences in the Midwest. In this sense, this study aimed to analyze the influence of El Niño and La Niña on the spatial and temporal variation of surface temperature in the Cerrado biome, given few tests regarding this issue on Brazil’s Midwest. For this, was used data from MODIS, Product MOD11, mod11A2 Product Collection 5,with spatial resolution of 1km, years 2003 and 2007. Although the analysis were only for two years, it was possible see variations related to the presence of clouds and surface thermal variability in terms of maximum and spatial distribution between the years of occurrence of the phenomenon El Niño and La Niña.
1. INTRODUÇÃO
O Índice de Oscilação Sul (ENOS) é um fenômeno climático de interação atmosfera-oceano associado a alterações dos padrões da Temperatura Superficial do Mar e dos ventos alísios do Pacífico Equatorial, possuindo duas fases: uma quente e outra fria (BERLATO; FONTANA, 2003).
O fenômeno El Niño consiste no aumento anormal das temperaturas das águas superficiais e sub-superficiais do Oceano Pacífico, enquanto que o fenômeno La Niña compreende sua diminuição. Segundo Oliveira (1999), os dois fenômenos acarretam um gama de modificações no sistema de circulação atmosférica mundial, repercutindo num cenário atípico das trocas de energia entre a atmosfera e a superfície que, por sua vez, repercutem alterações nos elementos climáticos como a temperatura, a precipitação e a umidade e produzindo um comportamento anômalo do clima em diversas áreas do globo terrestre.
O fenômeno ENOS influencia, no caso do Brasil, principalmente o setor norte da Região Nordeste, leste da Região Amazônica (na faixa tropical) e a Região Sul, resultando,
respectivamente, em secas severas com aumento das temperaturas médias, diminuição da precipitação com risco de secas e precipitações mais abundantes. Porém, no caso da Região Centro-Oeste não há nenhuma tendência observada devido à baixa previsibilidade para esta região (BORSATO; SOUZA FILHO, 2006; BERLATO, FONTANA, 2003).
Nesse sentido, entendendo a importância de estudos que forneçam subsídios para a compreensão desses fenômenos na região Centro-Oeste do Brasil, em particular, para o bioma Cerrado, reconhecido mundialmente por sua rica endemia (MYERS, 2000), é que se desenvolveu este trabalho.
Além disso, considerando a inexistência de uma rede de estações meteorológicas que possa fornecer dados de áreas relativamente extensas, associada à grande dificuldade de acesso aos dados de temperatura de superfície, optou-se pela utilização de dados provenientes de sensores orbitais.
2. OBJETIVOS
Nesse sentido, o presente trabalho teve por objetivo fazer uma análise da influência do fenômeno ENOS (El Niño e La Niña) na variação espacial e temporal da temperatura de superfície no bioma Cerrado, haja vista as poucas análises referentes a essa temática para a região Centro-Oeste do Brasil.
3. MATERIAIS E MÉTODOS
O recorte espacial utilizado para esse estudo foi o Cerrado, bioma localizado na região central do Brasil, que ocupa uma área aproximadamente de 2 milhões de quilômetros quadrados, abrangendo onze estados brasileiros: São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Tocantins, Bahia, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Piauí, Ceará e Rondônia mais o Distrito Federal - 24% do território brasileiro (IBGE, 2004). A paisagem desse bioma está associada a diferentes formações geológicas, estruturas do relevo e classes de solo que, combinados com as diferentes condições climáticas, caracterizam o bioma como um mosaico de formações vegetais que variam desde campos abertos até formações densas de florestas (RIBEIRO; WALTER, 1998).
Os dados orbitais utilizados na pesquisa são provenientes do sensor MODIS, Produto MOD11, Produto MOD11 A2 Coleção 5, com resolução espacial de 1 km. O dado de Temperatura de Superfície (TS) produzido por este sensor utiliza o algoritmo LST para o cálculo de TS, incluindo o Day/night LST algorithm (WAN e LI, 1997), desenvolvido especificamente para o MODIS, que produz imagens termais diurnas e noturnas para toda a superfície da Terra, com periodicidade diária, validadas a partir de imagens MAS (MODIS Airborne Simulator) e por mensurações de campo conduzidas em 1996-1998 (WAN et al., 1998). O produto A2 é uma composição de oito dias, realizada a partir de dados diários gerados
pelo produto e a coleção 5 foi utilizada por apresentar melhorias metodológicas significativas quando comparada à coleção 4 (WAN, 2007).
O Produto MOD11 incorpora em seu algoritmo dados de emissividade, ângulo de visada (desenvolvido para corrigir os efeitos atmosféricos), informações sobre a reflectância da superfície, emissão, absorção e dispersão atmosférica, assim como informações sobre a radiação solar do dia. È tido como um dos melhores sensores em resolução radiométrica e apresenta um corpo negro interno para calibração das temperaturas (MODIS Land-Surface Temperature Algorithm Theoretical Basis Document [LST ATBD] Version 3.3, 1999).
Os dados de TS do sensor MODIS apresentam ainda um controle de qualidade automático, que acompanha cada imagem orbital e é fornecido para cada pixel, nos quais são consideradas as variações espaciais de temperatura, a classificação da cobertura do solo, o efeito da topografia e o efeito das nuvens (WAN et al, 1998; WAN, 2007).
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Conforme indicado pelo Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos, órgão vinculado ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/INPE), e representado na Figura 1, nos últimos anos os eventos do fenômeno ENOS se fizeram bastante presentes, com ocorrências de magnitude forte de El Niño nos anos de 1997-1998 e moderado nos anos de 2002-2003. Por sua vez, foram identificados eventos de magnitude forte de La Niña nos aos de 2007-2008 e moderado em 1998-2001.
Figura 1: Ocorrência de Fenômeno ENOS (El Niño – laranja – e La Niña – azul –). Fonte: CPTEC/INPE, 2011.
Em estudo temporal (de 2003 a 2008) realizado por Santos (2010), os referidos anos (2003 e 2007), apresentaram anomalias espaciais e temporais de temperatura de superfície no bioma Cerrado. Nos anos de ocorrência de Fenômeno IOS, as temperaturas de superfície sofreram variações quanto ao valor, em relação à localização de seus valores máximos e considerável ausência de dados provenientes das imagens orbitais, comprometidas pela grande presença de nuvens, como pode ser observado na Figura 2.
Figura 2: Variação espacial e temporal da temperatura de superfície no bioma Cerrado para os meses de janeiro (verão), abril (outono), julho (inverno) e outubro (primavera) dos anos de 2003 e 2007.
De acordo com os dados, é possível destacar para o ano de 2003 uma grande ocorrência de áreas sem dados de Temperatura de Superfície, sobretudo nos meses de janeiro, abril e outubro, quando comparado ao ano de 2007, no qual a ausência de dados se restringiu, essencialmente, na porção sul do Cerrado no mês de janeiro e pequenas áreas a noroeste em abril e outubro – meses com alta ocorrência de precipitação.
O mês de julho, em ambos os anos apresenta dados completos de TS para o bioma. Esse fato pode ser explicado pela influência do clima seco, da região Centro-Oeste, característico nessa época do ano, com maior estabilidade atmosférica, com céu claro – devido ao predomínio da Massa Tropical Equatorial.
Em relação aos valores de TS registrados em 2003 e em 2007, é possível observar um aumento das máximas termais de temperatura no ano de 2007, bem como uma maior área de ocorrência dos mesmos, quando comparado a 2003.
A maior presença de cobertura de nuvens em 2003, indicando um ano mais chuvoso quando comparado ao ano de 2007, pode ter provocado uma “queda” nos valores de temperatura de superfície. Isso porque nuvens baixas e espessas refletem a radiação solar incidente de volta para o espaço, causando resfriamento (JENSEN, 2009). Além disso, o aumento da umidade favorece a manutenção de partículas sólidas em suspensão na atmosfera, o que por sua vez, tende a resfriar a superfície a baixo deles, porque a maioria dos aerossóis reflete a luz do Sol de volta para o espaço, reduzindo a quantidade de radiação solar que pode ser absorvida (NOVO, 2008; KAHN, 1999).
5. CONCLUSÕES
Apesar das análises terem sido restritas apenas há dois anos, foi possível perceber variações no que diz respeito à presença de nuvens e à variabilidade termal de superfície em termos de valores máximos e distribuição espacial entre os anos de ocorrência dos fenômenos La Niña e El Niño. O ano de 2003, com influência moderada de El Niño, apresentou maior quantidade de nuvens bem como valores máximos de temperaturas de superfície menores, quando comparado ao ano de 2007, que sofreu com uma forte influência do fenômeno La Niña.
Ainda que o período analisado já tenha revelado fortes indícios das influências dos IOS sobre a região Centro-Oeste, é preciso ampliar a escala temporal de análise para os anos sob influência dos fenômenos climáticos El Ninõ e La Niña no Cerrado a fim de aprimorar os conhecimentos acerca dos efeitos desses fenômenos sobre o clima do bioma em questão.
6. REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO
BERLATO, M. A.; FONTANA, D. C. El Niño e La Niña: impactos no clima, na vegetação e na agricultura do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: UFRGS, 2003.
BORSATO, V. da A.; SOUZA FILHO, E. E de. A dinâmica climática em Porto Rico, PR. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE CLIMATOLOGIA GEOGRÁFICA: os climas e a produção do espaço no Brasil, 7., 2006, Rondonópolis. Anais do VII SBCG, Rondonópolis: DGEO-UFMT, 2006. 1 CD-ROM.
IBGE (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA). Biomas do Brasil, 2004. Disponível em: http://mapas.mma.gov.br/i3geo/datadownload.htm. Acesso em: 25 de jun. 2007.
JENSEN, R.J. Sensoriamento Remoto do Ambiente. Tradução: Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE: José Carlos Neves Epiphanio (coordenador), Antônio Roberto Formaggio, Athos Ribeiro dos Santos, Bernado Friedrich Theodor Rudorff, Cláudia Maria de Almeida, Lênio, Soareas, Galvão. Editora Parêntese. Tradução da Segunda Edição. São José dos Campos 2009.
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MYERS, N.; MITTERMEYER, R.A.; MITERMEYER, C.G.; FONSECA, G.A.; KENT, J. Biodiversity hotspots for conservation priorities. Nature, vol. 403, p. 853-858, 2000.
NOVO. E. M. L. de Moraes. Sensoriamento remoto: princípios e aplicações. São Paulo: Editora Blucher, 2008.
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RIBEIRO, J. F.; WALTER, B.M.T. Fitofisionomias do bioma cerrado. In: SANO, S.M.; ALMEIDA, S.P. (eds.), Cerrado: Ambiente e Flora. Planaltina: EMBRAPA-CPAC, p. 89-166, 1998.
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WAN, Z.Y.Z.; FENG, Y.; ZHANG.; KING, M.D. Land-surface temperature and emissivity retrieval from MODIS Airborne Simulator (MAS) data. Summaries of the Seventh JPL Airborne Earth Science Workshop, January 12-16, v. 3, p.57-66, 1998.
