• Nenhum resultado encontrado

18 de dezembro de 2012

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "18 de dezembro de 2012"

Copied!
17
0
0

Texto

(1)

Processo 3306/09.0TBSTS.L1-1 Data do documento 18 de dezembro de 2012 Relator Graça Araújo

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA | CÍVEL

Acórdão

DESCRITORES

Nulidade do contrato > Elementos essenciais do negócio > Desiquilibrio das prestações > Boa-fé

SUMÁRIO

Para que o contrato submetido à adesão do outro contraente, possa ser declarado nulo, é indispensável que as cláusulas do contrato que não foram excluídas por força do artigo 8º do DL 446/85, conjugadas com as normas supletivamente aplicáveis ao negócio em questão e recorrendo às regras de integração dos negócios jurídicos, conduzam a um resultado em que de todo se não conseguem determinar aspectos essenciais do contrato ou em que ocorre um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé (artigo 9º nº 1 e 2 do citado diploma).

TEXTO INTEGRAL Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa:

JMRG propôs contra P… e aluguer de Veículos, S.A. acção declarativa de condenação, sob forma comum e processo sumário.

(2)

Alegou, em síntese, que: em 12.9.02, autor e ré celebraram um contrato de aluguer de longa duração de um dado veículo automóvel; no momento da celebração, o autor estava convencido de que, findos os pagamentos das prestações acordadas, adquiriria a propriedade do veículo, objectivo que a ré bem conhecia; em Abril de 2004, o autor não pagou pontualmente a prestação devida; para liquidação dessa prestação, o autor acordou com a ré ir entregando, juntamente com as prestações vincendas, as quantias de que pudesse dispor; em cumprimento do contrato, o autor entregou a quantia total de 19.562,26€, sendo que a soma das prestações é de 18.643,86€; em 28.9.06, dois funcionários da ré exigiram que o autor lhes entregasse o veículo, sob a alegação de se encontrarem em falta as prestações relativas a Julho (apenas em parte), Agosto e Setembro de 2006; por ter sido privado do gozo da viatura, o autor deixou de pagar as prestações; o autor recebeu a carta da ré datada de 7.11.06, resolvendo o contrato e reclamando o pagamento de 1.826,70€ a título de rendas vencidas e de 3.387,12€ a título de indemnização, já descontado o produto da venda do veículo a que a ré procedeu. Considerando que o autor incorreu em erro na celebração do negócio, que a resolução empreendida pela ré é inválida e que, tendo vendido o veículo, a ré se colocou numa situação de incumprimento, devendo ressarcir o autor dos prejuízos que lhe causou, o autor concluiu, pedindo que: i) seja declarada a nulidade do contrato celebrado e, em consequência, seja a ré condenada a devolver ao autor a quantia total de 19.562,26€ deste recebida, acrescida de juros moratórios á taxa legal de 4%; ii) seja declarada a ilicitude da resolução do contrato operada pela ré; iii) seja a ré condenada a pagar uma quantia nunca inferior a 7,00€ diários pela privação do uso do veículo.

A ré contestou, excepcionando a incompetência territorial do tribunal. Deduziu defesa por impugnação e invocou, em síntese, que: aceitou que o autor procedesse ao pagamento de rendas atrasadas em duas ou três vezes e por meio de cheque ou vale de correio, mas não prescindiu de receber as rendas

(3)

vincendas na data dos vencimentos e por débito em conta; o que não se verificou em Outubro de 2002, Fevereiro, Maio Junho e Agosto de 2003 e daí em diante; a ré foi recebendo as quantias que o autor enviava por vale de correio, imputando-as às prestações em atraso, juros de mora e despesas geradas pelo incumprimento; em 19.9.06, o autor foi contactado pessoalmente no sentido de regularizar a sua situação de incumprimento, tendo acabado por reconhecer não dispor de recursos financeiros e pretender entregar a viatura para minimizar a sua dívida; na data da entrega, o autor autorizou a ré a proceder à venda do veículo e a ré procedeu á resolução do contrato. Refutou o alegado erro do autor, a ilicitude da resolução e os pedidos formulados, concluindo pela sua absolvição do pedido.

O autor respondeu á contestação.

A excepção de incompetência territorial foi julgada procedente e o processo remetido para os Juízos Cíveis de Lisboa.

Foi proferido despacho saneador e dispensada a condensação do processo. Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi prolatada sentença que declarou a nulidade do contrato e condenou a ré a pagar ao autor a quantia de 9.566,85€, absolvendo-a do mais que peticionado foi.

A ré interpôs recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões:

a) O presente recurso vem interposto da decisão proferida pelo Meritíssimo Juiz de Direito do 10º Juízo Cível, 2ª secção do Tribunal Judicial da Comarca de …, processo n.º …, que julgou parcialmente procedente a acção declarativa de condenação com processo sumário que lhe move J… e condena a recorrente no pagamento da quantia de € 9.566,85;

b) Com efeito, o tribunal a quo declarou a nulidade do contrato por falta de comunicação das respectivas cláusulas e por recurso à equidade condena a recorrente a devolver ao recorrido metade das rendas pagas;

(4)

considera, com todo o respeito, que se fez uma errada apreciação da prova produzida e da aplicação do direito aos factos apurados, violando os artigos 7º e 9º do Dec-Lei 446/85, de 25 de Outubro;

d) No caso de proceder a nulidade do contrato, considera, ainda, a recorrente que a douta sentença é nula nos termos do disposto no artº 668º, nº 1 al. d), por não ter apreciado as excepções de abuso de direito e do valor das rendas acordadas nas condições particulares do contrato como correspondente do uso do veículo;

e) E que é nula nos termos da al. b) do nº 1 do artº 668º, uma vez que não fundamenta os termos em que considera que há indeterminação dos aspectos essenciais do contrato e em que julga excessivo o valor das rendas como correspondente do uso do veículo;

f) A douta sentença viola frontalmente o disposto no artº 566º, nº 3 do C.C., o qual não tem aplicação aos autos atenta a determinação do artº 289º do C.C. e artº 4º al. a) do C.C.;

g) Quanto à errada apreciação da prova produzida e da aplicação do direito aos factos apurados, considera a recorrente que a prova produzida e alguns dos factos dados como provados, impõem considerar que a recorrente comunicou ao recorrido as condições constantes do contrato;

h) Ora, o contrato celebrado nasceu após a recepção de uma proposta para o efeito, a qual foi elaborada na sequência da situação concreta apresentada pelo recorrido, reflectindo-se tais circunstâncias nas condições particulares do contrato;

i) Já as condições gerais fazem parte do clausulado que a recorrente usa nos contratos que celebra e foi apresentado ao recorrido para que no âmbito da sua liberdade contratual as aceitasse ou não;

j) Ficou provado que o recorrido ficou na posse do contrato, com as condições particulares e gerais, por tempo indeterminado, mas o suficiente para o assinar e levar a sua casa para a … o assinar, conforme 5. dos factos assentes;

(5)

k) Ora, sendo o dever de comunicação uma obrigação de meios e atento que o aderente também deve ser suficientemente diligente, deve-se concluir que foi cumprido o dever de comunicação por parte da recorrente, já que foi disponibilizado o contrato ao recorrido pelo tempo suficiente para que este o lesse e assinasse, o que ocorreu sem que pelo mesmo fosse levantada qualquer dúvida ou pedido qualquer esclarecimento;

l) Quanto à aplicação do regime legal: a lei não comina com a nulidade as cláusulas não comunicadas, diz que tais cláusulas se consideram excluídas dos contratos, artº 8º do DL 446/85;

m) Só nos casos de uma indeterminação insuprível de aspectos essenciais os contratos serão nulos, conforme dispõe o nº do artº 9º do DL 446/85;

n) Resulta da matéria de facto dada como provada, nomeadamente dos factos 1., 2. e 3., que as condições particulares do contrato foram negociadas com o recorrido e resultam da concretização da sua situação em concreto, resultam do valor do veículo que escolheu e da sua capacidade financeira para pagamento mensal. O recorrido alega que não pretendia celebrar um contrato de aluguer, mas um leasing, contudo em termos práticos a diferença entre esses contratos não existe, pois ambos se destinam a financiar a aquisição de um bem em prestações;

o) Assim, quanto às condições particulares do contrato não podem as mesmas ser consideradas nulas dada a negociação das mesmas com o recorrido, conforme resulta da matéria de facto provada, pelo que teria o contrato de subsistir, ainda que, caso se entenda pela falta de comunicação, sem as condições gerais, únicas a que se aplica o disposto no Dec-Lei 446/85, de 25 de Outubro;

p) Isto é, o contrato subsiste e não lhe será aplicado o que consta das condições gerais do documento, mas as normas supletivas. Pois, não há qualquer indeterminação dos aspectos essenciais do contrato celebrado e da vontade das partes: o recorrido pretendia adquirir uma viatura automóvel, dirigiu-se a

(6)

um Stand de automóveis, escolheu uma viatura automóvel que não tinha recursos financeiros para pagar ao respectivo vendedor, foi apresentada uma proposta para financiamento dessa aquisição à recorrente, foi assinado o documento que consta a fls. 11 dos autos, a recorrente pagou a viatura em causa ao vendedor e o recorrido usou essa viatura durante 4 anos;

q) Não há indeterminação dos aspectos essenciais do contrato e há regime supletivo a aplicar: "O contrato de aluguer de veículos automóveis sem condutor é de natureza especial, rege-se pelo disposto no Dec.-Lei nº 354/36, de 23-10, alterado pelos Dec.-Leis nºs 373/90, de 27/11, e 44/92, de 31-3, pelo respectivo clausulado e, na sua falta, pelas normas supletivas relativas ao contrato de aluguer constantes no Código Civil." - cfr. Ac. RL de 28/10/1999, in BMJ, 490º, 314;

r) Para o caso de se entender que procede a nulidade do contrato, verifica-se que não foram apreciadas na douta sentença todas as questões que foram colocadas: o Juiz deve conhecer de todas as questões suscitadas pelas partes, pois o pedido é toda a questão submetida à apreciação do tribunal. E, no caso presente, a recorrente alegou a excepção peremptória de conhecimento oficioso: abuso de direito, a qual não teve qualquer pronúncia por parte do tribunal;

s) Aliás, nem o recorrido lhe respondeu na réplica que apresentou, pelo que deveria a mesma ter sido logo dada como verificada, atento o previsto no artº 490º do CPC;

t) O caso dos autos é um exemplo em que, caso se admita que o contrato é nulo, o direito de invocar essa nulidade deve ser impedido pelo abuso de direito na vertente de venire contra factum propriu;

u) Chama-se à colação o teor dos pontos 13. e 14. dos factos assentes: "13. Entre 12.09.2002 e 19.06.2006, o Autor pagou à Ré a quantia de € 19.133,71, sendo que a partir de 06.08.2003 foi apenas por vale postal - o que fazia após interpelação por parte da Ré, no seguimento de esta constatar que a conta dos

(7)

Autores não tinha provisão.

14. O Autor usou a viatura durante quatro anos.";

v) Ora, o contrato cuja nulidade o recorrido invoca vigorou por quatro anos, período durante o qual foi executado por ambas as partes: a recorrente concedeu o uso da viatura e o recorrido pagou as rendas mensais acordadas; w) Assim, podemos concluir, perante esta factualidade, que a invocação da referida nulidade, no caso vertente, choca frontalmente com o comportamento anterior do recorrido, que, para além de não ter invocado qualquer dúvida no tempo próprio, quis a sua execução, designadamente, pagando as prestações acordadas e usando a viatura e criou na recorrente a confiança de validade do contrato;

x) Pelo que, por efeito da verificação do abuso do direito, na modalidade de venire contra factum proprium, plasmado no art. 334.º do CC, não pode deixar de se reiterar a ilegitimidade da invocação da nulidade do contrato feita pelo recorrido, o que foi em tempo invocado pela recorrente, não replicado pelo recorrido e não apreciado pelo tribunal a quo;

y) Quanto às consequências da nulidade do contrato, atento o disposto no artº 289º do C.C., há obrigação das partes em restituir tudo o que foi prestado;

z) O recorrido, numa posição bastante conveniente, veio pedir a devolução das rendas que pagou à recorrente durante o período de efectiva execução do contrato;

aa) Tendo a recorrente invocado que o recorrido não podia devolver o que lhe foi prestado: o uso do veículo. Pelo que o valor de prestações pagas correspondia ao pagamento do gozo e fruição do veículo que efectivamente teve;

bb) Trata-se, mais uma vez, de defesa por excepção, à qual o recorrido deveria ter respondido na réplica que apresentou. Sucede que o recorrido não se pronunciou sobre os factos excepcionados pela recorrente, daí que os mesmos tenham de ser considerados admitidos nos termos do disposto no arte 490º do

(8)

CPC, ou seja, tem de se considerar admitido por acordo que o valor pago pelo recorrido corresponde à contrapartida da prestação da recorrente que o mesmo usufruiu;

cc) E de matéria sobre a qual a douta sentença, mais uma vez, nem se pronunciou, em clara violação do disposto no arte 668º, nº 1 al. d);

dd) Efectivamente, o gozo obtido através do contrato, ainda que o mesmo seja considerado nulo, deve dar lugar ao pagamento de uma soma correspondente ao seu valor, não como contrapartida devida nos termos do contrato, mas como sucedâneo daquele uso e fruição que ocorreu. Tendo a recorrente defendido que esse valor correspondia ao valor das rendas acordadas no contrato celebrado, sem qualquer oposição por parte do recorrido e a par do que tem sido decido em casos similares no caso da locação de imóveis;

ee) Na douta sentença recorrida, considera-se tal valor como excessivo, sem contudo se fundamentar em factos provados ou outros elementos concretos, o que corresponde à violação do disposto no nº 1 al. b) do artigo 668º do CPC. Com efeito, não são especificados os factos concretos do processo que permitem concluir como excessivo que a recorrente receba o valor das rendas acordadas, quando o recorrido teve o usou efectivo do veículo durante aquele período de tempo, veiculo que foi adquirido em estado novo pela recorrente; ff) E vem o Tribunal a quo recorrer à equidade para determinar esse montante. Contudo, mais uma vez erra a douta sentença, pois a fixação do montante dos danos segundo a equidade apenas se mostra possível quando não puder ser apurado o montante exacto dos danos, isto é, na situação prevista pelo artigo 566º, nº 3 do CPC;

gg) No caso sub judice, o tribunal a quo só poderia ter feito apelo à equidade, tendo em atenção o preceituado no artigo 4º, alínea a) do C.C., se houvesse uma disposição legal que o permitisse desde logo;

hh) O que não é o caso, pois resulta do artigo 566º, nº 3 do C.C. que o recurso à equidade para a fixação do quantum indemnizatório só é legalmente possível

(9)

quando se mostram esgotados os meios de averiguação do montante exacto daquele: "Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.";

ii) O uso de um veículo automóvel constitui uma vantagem susceptível de avaliação pecuniária, pelo que não há fundamento para recurso à equidade que apenas deve funcionar em casos excepcionais ou quando não for possível ao tribunal fixar a indemnização em termos rigorosamente equivalentes aos danos; jj) Face ao exposto, a douta sentença deve ser alterada por outra que considere o contrato válido;

kk) Ou, no caso de assim não se entender, considerar procedentes as excepções invocadas com os efeitos supra referidos, sempre com a consequência de considerar totalmente improcedente a acção.

O autor apresentou contra-alegações, defendendo a confirmação da sentença.

*

São os seguintes os factos que a 1ª instância considerou provados:

1. Em Setembro de 2002, o Autor deslocou-se a um stand de automóveis sito na Trofa, com vista à aquisição de uma viatura ligeira.

2. No local, foi atendido por um vendedor que lhe propôs a compra de um automóvel da marca …, modelo …7, pelo preço de € 19.086,00, a pagar em 60 prestações, iguais, mensais e sucessivas.

3. Em face das suas condições financeiras, o Autor escolheu a viatura em causa, pelo preço e condições referidas, tendo preenchido diversos documentos.

4. A Ré recebeu do stand o documento de fls. 94, não assinado pelo Autor, após o que enviou o documento de fls. 11, por si pré-elaborado, para que o Autor o assinasse.

5. Em ocasião não concretamente apurada, o vendedor do stand entregou o documento de fls. 11 ao Autor, que o assinou e levou a …, para que a mesma o

(10)

assinasse, o que fez.

6. O referido documento de fls. 11 e 12, intitula-se "contrato de aluguer de longa duração", no qual o ora Autor, na qualidade de locatário, declara pagar à ora Ré, na qualidade de locadora, 60 rendas no valor de € 378,54, com início em 12.10.2002, num total de € 22.712,40, pelo aluguer do automóvel com a marca … e modelo 307 XS Premium.

7. A fls. 89 encontra-se uma factura datada de 12.09.2002, comprovando o pagamento pela ora Ré da quantia de € 19.700,00 a …, relativo à compra do referido veículo.

8. A fls. 90, encontra-se um documento sem data, assinado pelo ora Autor e …, autorizando o débito em conta das quantias devidas à ora Ré o âmbito do contrato acima referido.

9. A fls. 92, encontra-se um documento, datado de 29.09.2006, previamente elaborado e preenchido pela Ré e assinado pelo ora Autor, no qual este declara ter entregue a viatura a funcionário da ora Ré, tendo tomado consciência da resolução unilateral do contrato pela mesma, no seguimento do incumprimento contratual por falta de pagamento de rendas vencidas e não pagas, mais autorizando a venda da viatura para pagamento da indemnização.

10. A fls. 23 e 93, encontram-se cópias de documento datado de 26.09.2006, previamente elaborado e preenchido pela Ré e assinado pelo ora Autor, no qual se refere o estado geral da viatura e se declara que "Em face do incumprimento por parte do signatário, do contrato de aluguer de longa duração referenciado, concernente à viatura automóvel acima identificada, pelo presente documento irrevogavelmente se autoriza essa sociedade a proceder à venda da citada viatura nos termos e condições que melhor entenda. Declara desde já o signatário que aceita e assume o saldo em dívida que resultar após a entrega do veículo, calculado nos termos das condições gerais do contrato de aluguer celebrado entre as partes. Mais se revoga expressamente o contrato promessa de compra e venda celebrado com referência àquela mesma viatura

(11)

automóvel.".

11. A fls. 21 encontra-se cópia de carta datada de 02.11.2006, elaborada pela Ré e dirigida ao Autor, que a recebeu, na qual comunica a "resolução antecipada do contrato celebrado", por falta de pagamento de rendas, no valor de € 1.826,70, a que acresce uma indemnização no valor de € 3.387,12, num total de € 5.213,02, ficando o Autor obrigado a devolver a viatura de imediato. 12. A fls. 95, encontra-se uma cópia de uma livrança assinada pelo ora Autor e por R..., a favor da ora Ré, que a preencheu em 13.11.2006 pela quantia de € 5.213,83.

13. Entre 12.09.2002 e 19.06.2006, o Autor pagou à Ré a quantia de € 19.133,71, sendo que a partir de 06.08.2003 foi apenas por vale postal - o que fazia após interpelação por parte da Ré, no seguimento de esta constatar que a conta dos Autores não tinha provisão.

14. O Autor usou a viatura durante quatro anos.

15. Após a entrega do veículo, o Autor e a sua família utilizaram transportes públicos e táxis para se deslocarem às consultas que a mulher do Autor e o seu filho necessitavam, despendendo quantias não concretamente apuradas.

*

I - Em face da subsidiariedade imprimida pela apelante às questões submetidas à apreciação desta Relação, a primeira questão a resolver prende-se com a decisão sobre a matéria de facto.

A apelante manifesta a sua discordância relativamente à convicção da 1ª instância quando esta considera que “não se provou que a Ré comunicou ao Autor as condições constantes do contrato de fls. 11 e ss”. E baseia essa discordância nos factos constantes dos pontos 4. e 5. da matéria de facto e no depoimento das testemunhas …, …, … pretendendo que a referida

(12)

comunicação resultou provada.

Sobre aquele que pré-elabora um dado modelo contratual destinado a ser apresentado e submetido a outrem, sem possibilidade de negociação, recai, entre outros, o dever de comunicação a que se reporta o artigo 5º do DL 446/85, de 25.10.

Esse dever realiza-se através de uma comunicação integral, prévia e adequada das cláusulas contratuais gerais, de molde que, considerando a importância do contrato e a extensão e complexidade do respectivo clausulado, o aderente que use de comum diligência tenha possibilidade de o conhecer completa e efectivamente.

Como melhor explica o Acórdão do STJ de 8.4.10 (http://www.dgsi.pt Proc. nº 3501/06.3TVLSB.C1.S1), “este dever de comunicação, situado na fase de negociação ou pré-contratual, destina-se a que o aderente possa conhecer, com a necessária antecipação relativamente ao momento da consumação do negócio, o respectivo conteúdo contratual, de modo a poder apreendê-lo, nas suas efectivas e reais consequências prático-jurídicas, outorgando-lhe, deste modo, um espaço de reflexão e ponderação sobre o âmbito e dimensão das vinculações que lhe irão resultar da celebração do negócio. Como decorre, aliás, expressamente, do nº 2 do referido ar. 5º, o âmbito de tal dever de comunicação terá de se determinar em concreto, tendo em conta a capacidade e o nível cultural do interessado – em função do qual se determinará a comum diligência a que identicamente estará vinculado – e a extensão e complexidade das cláusulas contratuais em causa”.

Significa isto que a comunicação a que o proponente está vinculado não se traduz, na situação que nos ocupa, num facto. Trata-se, antes, de uma conclusão, a extrair de um conjunto de factos e circunstâncias que, em determinado caso concreto, nos permite afirmar que o proponente satisfez o específico dever que a lei lhe impõe.

(13)

Destarte, não pode esta Relação alterar a resposta dada pela 1ª instância no sentido pretendido pela apelante. Mas, por idêntica ordem de razões, também não pode aceitar a resposta dada.

É que, quando o juiz submete à prova, em vez de factos, juízos conclusivos ou de valor – e na ausência de preceito que directamente estabeleça a respectiva consequência – deve considerar-se não escrita a resposta que incide sobre aqueles juízos por aplicação analógica do disposto no nº 4 do artigo 646º do Cód. Proc. Civ. - cfr. a propósito numerosa jurisprudência, de que se cita, a título exemplificativo, Ac. STJ de 9.10.03, in http://www.dgsi.pt.JSTJ000, Proc. nº 03B1816 e Ac. STJ de 15.1.04, in http://www.dgsi.pt.JSTJ000, Proc. nº 03B1816.

Declaramos, pois, não escrita a resposta negativa dada pela 1ª instância.

II - A segunda questão a tratar respeita à nulidade do contrato declarada na sentença.

Entende a apelante que cumpriu os seus deveres de comunicação e informação, pelo que as cláusulas gerais do contrato celebrado não deveriam ter sido excluídas. Mas, ainda que o tivessem sido, as condições particulares do contrato contêm os aspectos essenciais a considerar, desse modo não implicando a nulidade do negócio.

Ao aplicar o direito à factualidade que deu como provada, a 1ª instância, a título de “questão prévia” – mas que se revelou a única questão a ser abordada -considerou nulo o contrato celebrado entre as partes (uma vez que a ré não tinha logrado demonstrar que comunicara as respectivas condições gerais, assim excluídas do acordo, verificava-se uma indeterminação de aspectos essenciais, sem possibilidade de integração) e determinou a consequente restituição das prestações. Neste particular, tendo em conta, por um lado, a

(14)

impossibilidade de restituição do gozo do veículo e, por outro, o excesso que representaria fazer equivaler o valor desse gozo aos alugueres convencionados, a 1ª instância recorreu ao nº 3 do artigo 566º do Cód. Civ. e concluiu dever a ré restituir ao autor metade da totalidade dos alugueres pagos, ou seja, 9.566,85€.

Em termos estritamente lógicos, impor-se-ia, em primeiro lugar, analisar a factualidade provada em ordem a concluir pelo (in)cumprimento dos deveres de comunicação e informação por banda da ré (artigos 5º e 6º do DL 446/85). Da conclusão a que chegássemos derivaria a exclusão ou conservação das cláusulas contratuais gerais do contrato (artigo 8º alíneas a) e b) do mesmo diploma). E, se excluídas fossem, cumpriria ponderar o conteúdo das condições particulares, de molde a concluir pela subsistência ou nulidade do negócio (artigo 9º do citado DL).

Na situação em apreço – e por razões que adiante melhor explicaremos – começaremos pelo último aspecto referido.

Perante a violação dos deveres de comunicação e informação por parte de quem submete o contrato à adesão de outrem, a lei prevê que, excepcionalmente, o contrato – com todas as suas cláusulas, gerais ou não – seja declarado nulo. Para tanto, é, porém, indispensável que as cláusulas do contrato que não foram excluídas por força do artigo 8º do DL 446/85, conjugadas com as normas supletivamente aplicáveis ao negócio em questão e recorrendo às regras de integração dos negócios jurídicos, conduzam a um resultado em que de todo se não conseguem determinar aspectos essenciais do contrato ou em que ocorre um desequilíbrio nas prestações gravemente atentatório da boa fé (artigo 9º nº 1 e 2 do citado diploma).

Sucede que nenhum desses resultados de verifica na situação em análise, limitando-se a sentença a afirmar, sem a mínima fundamentação e como consequência (aparentemente automática) da exclusão das cláusulas

(15)

contratuais gerais, que ocorria uma indeterminação de aspectos essenciais sem possibilidade de integração.

Com efeito, consta das condições particulares do contrato nº 622001-AL-0 , com a data de 12.9.02 e assinado pelo autor, por … (a título de “o cônjuge”) e pela ré (vd. fls. 11) que entre esta, na qualidade de locadora, e o autor, na posição de locatário, é “ajustado e reciprocamente aceite o seguinte contrato de aluguer de veículo automóvel sem condutor”. De seguida, identifica-se o “objecto do aluguer” (marca, modelo, matrícula, cilindrada, combustível e nº de chassis do veículo automóvel), definem-se as “condições do aluguer” (duração do mesmo especificandose a data de início e fim valor – base e com IVA -data de vencimento e periodicidade das rendas e valor da caução), refere-se o “local de pagamento das rendas” e identifica-se a “data e local de entrega” do veículo.

Ora, sendo certo que a expressão “aluguer” é comummente entendida pela larga generalidade das pessoas, seja qual for o respectivo grau de instrução, e que das referidas condições particulares constam todos os elementos necessários à concretização daquele contrato - respeitando, aliás, integralmente o disposto no artigo 17º do DL 354/86, de 23.10 – não temos qualquer dúvida em concluir pela subsistência do acordo celebrado entre autor e ré.

A validade do contratado, ainda que integrando apenas o estipulado nas condições particulares, impede, naturalmente, a aplicação do disposto no artigo 289º do Cód. Civ., no qual a sentença fundou a condenação da ré.

III - Chegados a tal conclusão, queda prejudicada a apreciação das demais questões que, a título subsidiário, a apelante suscitava.

Por outro lado, evidenciam-se agora as razões pelas quais não se mostra necessário apreciar se a apelante cumpriu ou não os seus deveres de comunicação e/ou informação.

(16)

Em primeiro lugar, porque – nada tendo a ré peticionado na acção, ou seja, não pretendendo fazer qualquer direito que decorra das cláusulas contratuais gerais – é-lhe indiferente que as mesmas se tenham ou não excluídas do contrato, uma vez que já alcançou o seu desiderato.

Em segundo lugar, porque – não tendo o apelado feito uso do disposto no artigo 684º-A do Cód. Proc. Civ. – a exclusão ou não exclusão das cláusulas contratuais gerais é para si irrelevante, na medida em que esta Relação nunca poderá apreciar os pedidos que formulou contra a ré.

Os mesmos motivos justificam que não se proceda, oficiosamente, à anulação parcial do julgamento (nos termos do nº 4 do artigo 712º do Cód. Proc. Civ.), não obstante a decisão sobre a matéria de facto pecar por deficiência. Com efeito, tendo sido dispensada a condensação, o tribunal tem de se pronunciar sobre todos os factos alegados pelas partes nos articulados, dando-os como provados ou não provados, independentemente da sua (ir)relevância para a solução do pleito.

*

Por todo o exposto, acordamos em julgar a apelação procedente e, em consequência, revogamos a decisão recorrida, ora absolvendo a ré dos pedidos. Custas pelo apelado.

Lisboa, 18 de Dezembro de 2012

Maria da Graça Araújo José Augusto Ramos João Ramos de Sousa

(17)

Referências

Documentos relacionados

A douta sentença recorrida omite, ainda, as circunstâncias e os factos que conduzem à verificação do elemento objectivo do tipo do crime pelo qual vem o recorrente condenada, pois

Somente com o Código de 1950 é que a função, no âmbito federal, passou a ser exercida pelo Procurador Geral da República, à época encarregado tanto do papel de advogado do estado

Com relação ao CEETEPS, o tema desta dissertação é interessante por se inserir no Programa de Educação de Jovens e Adultos (PROEJA), sob a tutela da Coordenação de

Tendo em conta os factos dados como indiciariamente provados – que os outros factos alegados pelos pais não poriam em causa, mesmo que também ficassem provados - considera-se que

Ainda invoca que os factos dados como provados na sentença recorrida e que identifica, imputados ao Autor relativamente às trabalhadoras (...), (...) e (...) não

um papel relevante do serviço públi- co em termos democráticos não pode deixar de significar a atribuição a este serviço de um lugar central no sistema geral dos media;

Ainda que assim não fosse, não se colhe do elenco dos factos provados o receio de extravio ou dissipação da cortiça; tal como exarado na sentença recorrida, «os sobreiros de onde

IX) Contudo, na douta sentença recorrida, entendeu-se que o contrato celebrado entre a impugnante e o B… (…), do qual resultou o pagamento no valor de 35.000.000$00, não foi