Profissão Solene de Ir. Lúcia.
Mosteiro de Uberaba
S. Pedro e S. Paulo – 28.06.2015.
Caríssimos Irmãos e Irmãs:
Esta celebração dos Apóstolos Pedro e Paulo nos leva, indiscuti-velmente, à reflexão sobre a Igreja, chamada a dar continuidade à obra da redenção, que seu Esposo operara no altar da cruz; que o faremos muito sucinta e discretamente.
Antes de subir ao patíbulo, Jesus ceando com seus amigos deixa-lhes um memorial a ser celebrado até sua volta. Entrega-se aos discípulos nas espécies do Pão e do Vinho, e, ao tomar todos do mesmo Cálice e do mesmo Pão, suplica-lhes a unidade na mesma fé e na vida a mesma cari-dade.
Subindo aos céus, ordena-lhes chegar até os confins do mundo para tornar a todos filhos de Deus, batizando-os em nome do Pai e do Fi-lho e do Espírito Santo.
Não os deixa órfãos, enviando o Consolador, no mesmo dia da ressurreição, e, com todos reunidos num mesmo lugar, no dia de Pente-costes, a há a efusão do Espírito Santo.
A Igreja nasce na cruz, com o Sangue e a Água correndo do lado ferido do Novo Adão adormecido. Na Ascensão, do Ressuscitado, recebe o mandato de fazer todos os homens filhos de Deus – dilatar o Reino do
perdão – e, em Pentecostes, é confirmada e fortificada como o Novo Is-rael, onde seus membros têm o Espírito Santo para celebrar a fé, estar em oração e realizar, na diversidade de corações e pensamentos, sem te-mor, o anúncio do nome de Jesus Cristo a todos os povos, línguas e na-ções.
Pedro e Paulo, colunas da Igreja, tão diferentes em personalida-de, ambos com um amor incomensurável a Cristo e à sua Igreja, tomando rumos diversos na evangelização de povos concluem o “bom combate da
fé” em Roma. Um crucificado, tortura própria de escravos e estrangeiros,
outro decapitado, por ser cidadão romano.
Aqui estamos, caros irmãos e irmãs, porque somos herdeiros da fé e dos sacramentos que nos transmitiram os Apóstolos, que amaram a Cristo e a Igreja e, nesta Eucaristia, testemunhar a oblação de Ir. Lúcia unida à oblação do Cristo sobre o altar.
A vida monástica, como bem o sabemos, elaborada por São Bento sob o fundamento dos Apóstolos e sendo um espaço eclesial para alguns batizados, nada mais se propõe além da vivência do Evangelho. Contudo, sob um aspecto que lhe é próprio: a castidade por causa do Reino, que inaugura a novidade escatológica do Reino futuro.
Obra do Espírito Santo para o bem da Igreja, o monaquismo bene-ditino se constitui por homens ou mulheres celibatários que se ocupam
proferem um voto denominado “conversão de seus costumes”, além de esta-bilidade numa comunidade concreta e obediência a seu Abade ou Aba-dessa e a seus co-irmãos e irmãs.
Esse voto – conversão dos costumes – refere-se a uma forma de vida cotidianamente organizada para estar com Deus. Tudo o que distan-cia a monja desse projeto de estar com Deus, é desrespeito, não ao Au-tor de toda a vocação, mas à Igreja.
Quando pessoas vêm aos nossos Mosteiros, elas esperam e têm o direito de encontrar monges ou monjas e não apenas homens ou mulhe-res irmulhe-responsavelmente vestidos com indumentárias medievais. Temos consciência dessa realidade? Acredito que não o suficiente.
Vivemos numa cultura onde o que importa é o fenômeno, sua aparência do real, seu impacto emocional, seu efeito especial, a futilida-de convencional, o bombarfutilida-deio visual, a mediocridafutilida-de confundida com o essencial, sua existência apenas virtual. Como reagimos a isso tudo? Na-damos contra essa maré forte e avassaladora na barca de Pedro? O que mais nos incomoda: admiração ou crítica?
Urge, neste mundo inteligentemente hostil à Igreja do Cristo, ser-mos, nós monges e monjas, coerentes com a vida que Deus escolhera para nós desde toda a eternidade. A salvação de muitos, também depen-de depen-de nossa fidepen-delidadepen-de à vocação depen-de sinais eloquentes da vida futura.
Nossas divergências e dificuldades, como as tiveram Pedro e Pau-lo, se têm o mesmo fundamento: buscar a Deus e servir a Igreja, não se-rão empecilhos para estarmos juntos na alegria e na paz. Num mosaico as pedras são desiguais, mas necessárias para completar a obra projeta-da pelo artista. São uniprojeta-das umas às outras pela argamassa que as susten-tam. No mosaico monástico o que nos une é a argamassa da caridade; caso contrario, não teríamos lugar nessa obra divina.
Caríssima Ir. Lúcia, soube que a senhora antes de ingressar no Mosteiro era professora. Sabe, pois, melhor do que nós, que ensinar é uma arte à qual se exige dedicação, criatividade, inteligência e humilda-de.
No Mosteiro de N.S. da Glória, de alguma forma, dará continuida-de à vocação continuida-de “pedagoga”. Do lugar oncontinuida-de se encontra na comunidacontinuida-de, será sempre chamada a ensinar suas irmãs e a tantos oblatos, amigos e pessoas que freqüentam essa casa de Deus, mais com gestos e opções do que com palavras. Mas, ensinar o que? Ensinar-lhes essa realidade: aquele que está verdadeiramente com Deus, está e estará sempre como seu instrumento e sacramento de amor e salvação a homens e mulheres, que O buscam, freqüentemente, enganados por uma cultura onde o que importa é o fenômeno, sua aparência do real, seu impacto emocional, seu efeito especial, a futilidade convencional, o bombardeio visual, a
me-uma cultura profundamente religiosa, mas não cristã; me-uma cultura que fabrica igrejas e seus deuses, mas à sua estatura; uma cultura que desco-briu: mexer com sentimentos e a fé dos humanos é um dos melhores in-vestimentos; uma cultura onde Jesus Cristo também tem seu altar garan-tido no Pantheon da nossa orgulhosa pós-modernidade.
O amor a Cristo de Pedro e Paulo a estimule sempre para uma vi-vência autêntica de vida monástica.