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Vantagens e Desvantagens do Pluralismo Teórico em Psicanálise Altamirando Matos de Andrade Júnior*

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Fepal - XXIV Congreso Latinoamericano de Psicoanálisis - Montevideo, Uruguay “Permanencias y cambios en la experiencia psicoanalítica" – Setiembre 2002

Vantagens e Desvantagens do Pluralismo Teórico em Psicanálise

Altamirando Matos de Andrade Júnior*

Hoje em dia, com o pluralismo teórico em Psicanálise que já está consolidado, temos que aprender a separar as suas vantagens das suas desvantagens. Talvez esta separação seja útil para que possamos buscar benefícios para a eficácia clínica e mesmo para as compreensões dos fenômenos psíquicos observados. No entanto, seria de suma

importância fazer-se a separação do que seria uma confluência teórica de um ecletismo quanto a idéias teóricas diferentes.

Na confluência teórica as idéias se aproximam, dialoga-se sobre conceitos ou princípios teóricos guardando a especificidade de cada conceito ou corpo teórico. No ecletismo, acumulam-se idéias diferentes borrando a especificidade de cada uma delas, fazendo com que não fique claro qual a teoria que embasa um determinado autor, dando-nos a impressão de um livre atirador.

Penso que Thomas Ogden seja o exemplo de um autor que trabalha livremente com idéias teóricas diferentes sem misturá-las num ecletismo que termina por levar a uma falta de clareza. Ogden utiliza a compreensão da identificação projetiva como uma maneira de entender a comunicação do paciente. Também utiliza o conceito de

fenômeno transicional para compreender o funcionamento de determinadas estruturas mentais, ou mesmo para entender e explicar vivências psíquicas percebidas em seus pacientes. Embora Ogden dê muita importância à privacidade do analista e à do paciente, no sentido de valorizar os silêncios, tomando emprestado uma idéia de Winnicott quanto a não interpretação em certos momentos da análise, sendo mais

importante se manter numa atitude de escuta que interpretativa, compreende também os silêncios como parte de uma transferência total, utilizando um conceito do referencial kleiniano (Joseph).

O pluralismo em Psicanálise é inevitável e acontece desde o seu início, quando vários pioneiros ao discordarem de Freud saíram do movimento psicanalítico e foram constituir outras escolas de pensamento. Estes passaram a se distanciar dos pilares fundamentais que sustentam a Psicanálise enquanto teoria, técnica e método de investigação. Embora com algumas divergências de Freud, muitos autores se mantiveram dentro do

movimento psicanalítico e até mesmo ampliaram os conhecimentos e contribuíram para a evolução da Psicanálise. Este é o caso de Ferenczi, Fairbairn, Klein, os mais antigos, e Kohut e os chamados intersubjetivistas, mais recentes. Isto para citar somente alguns expoentes.

Poderíamos pensar que uma vantagem do pluralismo está no fato de que a mente humana é por demais complexa para que somente uma teoria possa dar conta de seu entendimento além de servir de único paradigma para poder pensá-la. Nenhuma das

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correntes do pensamento psicanalítico consegue por si só apreender a dimensão do aparelho psíquico. Seria importante haver algo que permitisse o diálogo entre autores diferentes e escolas diferentes. Também seriam necessários paradigmas mínimos sobre os quais diferentes analistas pudessem concordar. Finalmente seria necessário que nós, analistas, conseguíssemos conversar uns com os outros ancorados em bases teóricas sólidas e não ancorados em doutrinas explicadas como fatos psíquicos (Hermann, 1998, 2001). O que não podemos é tomar as discussões e as críticas sobre teorias e escolas diferentes de modo pessoal.

E quanto às desvantagens? Estas, se existem, seriam mais para os Psicanalistas do que para a própria Psicanálise. O Psicanalista, como conseqüência do pluralismo teórico, foi obrigado a dialogar com seus pares, a ter que conhecer outras teorias e autores diferentes daqueles com os quais estava habituado a lidar. Este fenômeno, no meu entender, é extremamente benéfico para o desenvolvimento da Psicanálise como corpo teórico, porque permite o estudo da teoria, da técnica e da teoria da técnica. O método

psicanalítico pode também se beneficiar do estudo e das discussões entre as diferentes escolas do pensamento psicanalítico, pois a ampliação do debate incrementa a reflexão sobre o método.

O pluralismo teórico levou o Psicanalista a escutar e apreender outros autores, o que pode ser incômodo para alguns, embora não o seja para a maioria. Por outro lado teve também que pensar sobre o estado de espírito que pode reger o fato de, por exemplo, ter que confluir idéias diferentes, ter que questionar seus próprios pilares de sustentação teóricos, ter que rearrumar suas concepções sobre os fenômenos observados, enfim, ter algum trabalho extra, que acaba sendo recompensador. Isto tudo talvez estimule o analista de hoje em dia a ser mais estudioso e mais criterioso em suas afirmações, pois passou a ter que conviver com o pluralismo dentro de seu referencial, adote ele esta postura ou não. Os debates entre teorias diferentes tendem a serem feitos com base no método psicanalítico, nos estudos de casos e em outros fatores de observação dos fenômenos psíquicos.

Creio ser da maior importância realçar que confluir não significa que uma idéia tenha que ser abandonada em função de outra, nem que esta confluência seja uma mescla de teorias. É necessário uma aproximação reflexiva sobre as diferentes teorias contidas nas diferentes escolas psicanalíticas, permitindo que uma concepção viva ao lado da outra, isto é, que se respeitem as diferenças. O importante não é a negação de uma escola por outra, mas a reflexão e o estudo do método contido nas diferentes escolas. Por muitos anos, os físicos acreditaram que a teoria da relatividade de Einstein tinha superado a mecânica quântica. Com o surgimento da teoria das supercordas, o que foi percebido é que embora existam diferenças irreconciliáveis entre as duas teorias, elas também servem para lidar, com fatos novos observados na física moderna. Desta maneira, a confluência teórica entre escolas diferentes tem permitido aos físicos um avanço em seu campo de estudo.

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dar conta de entender nossos pacientes. Criam-se então impasses e surge um novo modelo que se bem aproveitado, pode nos possibilitar aprofundar e desenvolver a compreensão dos pacientes.

Quando surge uma nova teoria psicanalítica, não necessariamente são abandonados aspectos de outras teorias. As teorias, por mais diferentes que sejam, têm pontos em comum que permitem o diálogo, como os conceitos de transferência, inconsciente e a especificidade da situação analítica (Rocha Barros, 2000). Se não houvesse pontos mínimos em comum estaríamos diante de alguma outra coisa que não a Psicanálise. Foi por impossibilidade desta confluência de teorias, que Freud discordou daqueles autores que questionaram os pilares de sua jovem ciência. Jung, Adler e outros tiveram a

dignidade de fundar outras escolas e a elas darem outros nomes.

Num célebre debate entre André Green e Daniel Stern ocorrido na Unidade de

Psicanálise da Universidade de Londres então coordenada por Sandler, sobre o fato de haver ou não importância da observação de bebês e suas mães para a teoria psicanalítica e para a clínica, Green foi categórico ao afirmar que a pesquisa empírica e aquela

relativa a observação de bebês não teria a menor importância para a compreensão dos fenômenos psíquicos. Green enfatizou que em Psicanálise, o que tem importância é a observação extraída da relação com o paciente e que o local de pesquisa psicanalítica seria o setting analítico. Embora os dois autores concordassem em alguns pontos quanto a definição de Psicanálise e quanto a algumas diferenças entre pesquisa e setting, eles discordaram quanto à importância das pesquisas para a teoria e para a clínica. A confluência entre os dois autores foi muito pequena, mas o exemplo serve bem para evidenciar um rico debate entre autores tão diferentes. Podemos mesmo dizer que o que ocorreu foi um debate entre escolas diferentes, e portanto um debate baseado no

pluralismo de idéias.

O fato de que tanto Green quanto Stern sejam autores conhecidos e consagrados não os torna donos da verdade, outros autores podem concordar ou discordar de um dos dois ou mesmo dos dois, como se deu nos debates que se seguiram às apresentações de Green e Stern. O que tornou possível tal debate foi o fato de haver pontos mínimos em comum entre os debatedores e também o fato de que as teorias foram discutidas a partir de bases teóricas sólidas e não ancoradas em doutrinas explicadas como fatos psíquicos.

Uma das grandes confluências teóricas da atualidade está se dando entre a Psicanálise e as Neurociências. Neste vasto campo tem-se discutido a contribuição da Psicanálise para o tratamento e recuperação de pacientes com lesões neurológicas graves. Kaplan-Solms e Solms (2000), num interessante livro, abordam a contribuição da Neurociência para a Psicanálise. Dizem os autores que o conhecimento das localizações funcionais de áreas corticais para as funções egóicas seria um avanço para a compreensão de funções cognitivas desempenhadas pelo ego. Também dizem que os estudos que levaram a um maior conhecimento da memória, percepção, atenção e outras funções cerebrais e mentais são de suma importância para o estudo integrado das Neurociências com a Psicanálise.

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Para finalizar, gostaria de lembrar que Freud durante toda a sua vida confluiu e divergiu de si mesmo e dos seus pares. Por diversas vezes, Freud questionou aspectos da teoria psicanalítica em desenvolvimento, como os conceitos de trauma e ansiedade. No final de sua vida, Freud, mais uma vez rediscutiu a importância do trauma na gênese dos

distúrbios psíquicos retomando um debate iniciado em seu estudo “Sobre Histeria”. O precioso livro de Ilse Grubrich-Smitis “Early Freud and Late Freud” evidencia e discute

de maneira clara estas questões.

Referências

_ Grubrich-Smitis, I. (1997) Early Freud and Late Freud. London : Routledge and Institute of Psychoanalysis.

_ Hermann, F. (1998) Análise Didática em Tempos de Penúria Teórica. Rev. Bras. Psican., 32: 697-709.

_ (2001) The Training Analysis at a Time When Theory is in Short Supply. IJPA, 82: 57-69.

_ Jones, E. (1953) The Life and Work of Sigmund Freud. Penguin Books. London. _ Kaplan-Solms, K. & Solms, M. (2000) Clinical Studies in Neuro-Psychoanalysis. Karnac Books, London.

_ Kernberg, O. F. (1993) Convergences and Divergences in Contemporary Psichoanalytic Technique. IJPA, 74: 659-673.

_ Ogden, T. H. (1996) Reconsiderando Três Aspectos da Técnica Psicanalítica. Rev. De Psicanálise. SPPA. Vol. III, N.º 3, dezembro.

_ Rocha Barros, E. M. (2000) Um Pouco do meu Aprendizado...Jornal de Psicanálise-Instituto de Psicanálise- SBPSP Vol. 33-2000- N.º 60/61.

_ Sandler, J. et al (2000) Clinical and Observational Psychoanalytic Research : Roots of Controversy. Karnac Books, London.

*Membro Efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro. E-mail : altandr@vento.com.br

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Referências

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