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Quilombo Sacopã – Uma análise Arquivística

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Academic year: 2021

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DEPARTAMENTO DE CIENCIA DA INFORMAÇÃO – GCI CURSO DE GRADUAÇÃO EM ARQUIVOLOGIA

Dario de Oliveira Roxo Filho

QUILOMBO SACOPÃ – UMA ANÁLISE ARQUIVÍSTICA

NITERÓI 2017

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Dario de Oliveira Roxo Filho

QUILOMBO SACOPÃ – UMA ANÁLISE ARQUIVÍSTICA

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal Fluminense como requisito para obtenção de grau de Bacharel em Arquivologia.

Orientadora: Lindalva Rosinete Neves

NITERÓI 2016

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Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Central do Gragoatá F676 FILHO, Dario de Oliveira Roxo

Título: QUILOMBO SACOPÃ – UMA ANÁLISE ARQUIVÍSTICA.

Quantidade de folhas: 33

Orientadora: Lindalva Rosinete Silva Neves

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em

Arquivologia) Universidade Federal Fluminense, 2016. Bibliografia: f. 32-33.

1.Família Pinto. 2. Análise Arquivística 3. Quilombo Sacopã 4. Centros de Referência,

I. Lindalva Rosinete Silva Neves . II. Universidade Federal Fluminense. Instituto de Arte e Comunicação Social. III. Quilombo Sacopã – Uma Análise Arquvística

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Dario de Oliveira Roxo Filho

QUILOMBO SACOPÃ – UMA ANÁLISE ARQUIVÍSTICA

Aprovado em ________________________________________________

BANCA EXAMINADORA:

__________________________________________ Profª. Lindalva Rosinete Silva Neves

UFF – Universidade Federal Fluminense

__________________________________________ Profª Esther Hermes Luck

UFF – Universidade Federal Fluminense

____________________________________________ Profª Jacqueline Ribeiro Cabral

UFF – Universidade Federal Fluminense

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Ciência da Informação da Universidade Federal Fluminense como requisito para obtenção de grau de Bacharel em Arquivologia.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente ao meu criador que me deu forças nessa longa caminhada, sempre com muita luz. Agradeço a minha família por ter me dado todo o suporte apoio que eu precisava para que pudesse chegar ate aqui.

Agradeço a minha mãe Rose por toda a luta e bravura em me criar sempre pensando no objetivo de um dia eu conseguir um lugar em uma universidade federal, sempre me apoiando nos momentos difíceis e não me deixando abalar por nada. Agradeço ao meu pai por toda a estrutura que ele me deu para que pudesse estudar e atingir meus objetivos e agradeço também a minha tia Dulce e minha prima Bárbara pelos conselhos e por sempre me deixar dormir em sua casa em Niterói.

Agradeço aos amigos Bruno, Daniel, Rozena e Larissa que sempre me ajudaram nos momentos mais difíceis na faculdade e pelas conversas sempre divertidas e que tornaram a caminhada mais leve. Agradeço a todos os outros amigos também, os ENEARQ’S e aos churrascos no Sr. Luiz na Cantareira.

Agradeço a minha namorada Fernanda pelas dicas e paciência na reta final, agradeço também meus avós Moreira e Josefa que foram decisivos pela minha permanência na faculdade. Agradeço a todos os professores da UFF em especial a Lindalva e Ana pela paciência comigo. Obrigado!

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RESUMO

Este trabalho busca realizar a análise do conjunto de documentos referente à Família Pinto do Quilombo Sacopã. O objeto de estudo da análise foram os documentos acumulados pela família. A partir da análise dos documentos, foi constatada a necessidade e importância do tratamento técnico do acervo, para viabilizar o acesso à informação, evidenciando a necessidade do cumprimento do papel social dos Centros de Referência. Os desdobramentos desse processo culminaram na constatação da urgência em salvaguardar documentos sobre os quilombos e sobre o Quilombo Sacopã e a Família Pinto. Destaca-se neste trabalho, a possibilidade da construção da memória coletiva, a partir de registros de fundamental importância para compreensão da história de resistência do Quilombo Sacopã.

Palavras chave: Quilombo Sacopã, Análise Arquivística, Centros de Referencia,

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ABSTRACT

This work seeks to perform the analysis of the set of documents referring to the Pinto Family of Quilombo Sacopã. The object of study of the analysis were the documents accumulated by the family. From the analysis of the documents, it was verified the need and importance of the technical treatment of the collection, to make the access to information viable, evidencing the need to fulfill the social role of the Reference Centers. The unfolding of this process culminated in the urgent need to safeguard documents on the quilombos and Quilombo Sacopã and the Pinto Family. In this work, we highlight the possibility of building collective memory, based on records of fundamental importance for understanding the history of resistance of Quilombo Sacopã.

Keywords: Quilombo Sacopã, Archival Analysis, Reference Centers, Quilombo,

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Entrada do Quilombo Sacopã 18

Figura 2 Quintal Quilombo Sacopã 18

Figura 3 Placa com artigo 68 do ADCT que trata do reconhecimento dos remanescentes quilombolas.

19

Figura 4 Luiz Pinto Próximo à churrasqueira. 20 Figura 5 Manoel Pinto Jr e sua Esposa Eva 20 Figura 6 – Lagoa Rodrigo de Freitas ante da

urbanização

21

Figura 7 Lagoa Rodrigo de Freitas nos dias atuais. 21 Figura 8 Regina Casé comemorando seu

aniversário no Quilombo Sacopã, acompanhada dos cantores e compositores Zeca Pagodinho e Arlindo

Cruz.

23

Figura 9 Convite a feijoada 23

Figura 10 Policiais armados colocando correntes no portão do Quilombo Sacopã, impedindo eles de saírem.

25

Figura 11 Luiz Sacopã mostra o documento de reconhecimento de domínio do INCRA

25

Figura 12 Festa de comemoração pelo reconhecimento do INCRA

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO... 10 2 QUILOMBO... 13 3 QUILOMBO SACOPÃ... 18 4 ANÁLISE ARQUIVÍSTICA... 27 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS... 29 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS... 30

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INTRODUÇÃO:

Este trabalho tem como tema principal o Quilombo Sacopã, e a partir daí tem como objetivo principal apresentar a história de resistência da família Pinto, de modo a auxiliar trabalhos futuros na elaboração de propostas para uma melhor organização dos documentos produzidos ao longo do tempo.

O quilombo, em geral, é marcado por histórias de resistência onde se precisa a todo o momento provar (no âmbito do Direito) a posse de suas terras e que podem continuar realizando suas atividades tradicionais. Dessa forma, logo se produziu diversos documentos que devem ser tratados e guardados para garantir a preservação de sua história e servir de prova em suas batalhas jurídicas que estão longe de terminar.

Essa análise busca uma base interdisciplinar entre arquivologia e antropologia, prática rara mesmo no meio acadêmico, para que se possa explicar o que é quilombo, qual a sua importância, e também mostrar a importância de se preservar a memória dos quilombos através de centros de referência.

Comumente, os arquivos são considerados como um "conjunto de documentos produzidos e recebidos por órgão público, instituições de caráter público, entidades privadas, família ou pessoa, em decorrência do exercício de suas atividades, independente da natureza do suporte”. Desse modo, seria

um sistema (semi-) fechado de informação social materializada em qualquer tipo de suporte, configurado por dois fatores essenciais – a natureza orgânica (estrutura) e a natureza funcional (serviço / uso) – a que se associa um terceiro – a memória – imbricado nos interiores (SILVA et al., 1999).

Logo, a memória se constitui em um elemento presente na configuração de um arquivo. Segundo Siqueira (2012, p.22), fazendo referência aos conceitos desenvolvidos por Michael Pollack, Jacques Le Goff e Paul Ricouer:

a memória, elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual como coletiva, procura pensar o passado para compreender o presente, portanto sem memória não há passado e é através do testemunho que ela se transforma em história (SIQUEIRA, 2012).

Em suas análises sobre memória coletiva, Maurice Halbwachs discorre sobre a ideia de que a memória individual, absolutamente desconexa da memória social, é uma abstração desprovida de significado. O autor Jacques Le Goff (1984, p.47) defende que “a memória, onde cresce a história, que por sua vez a alimenta, procura

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salvar o passado para servir o presente e futuro. Devemos trabalhar de forma que a memória coletiva sirva para a libertação e não para a servidão dos homens”. Já Pierre Nora (1993, p. 13) denomina como “lugar de memória” o espaço de guarda e preservação desta memória, ou seja,

os lugares de memória nascem e vivem do sentimento que não existe memória espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso manter os aniversários, organizar as celebrações, pronunciar as honras, fúnebres, estabelecer contratos, porque estas operações não são naturais [...]Se vivêssemos verdadeiramente as lembranças que eles envolvem, eles seriam inúteis. E se em compensação, a história não se apoderasse deles para deformá-los, transformá-los, sová-los e petrificá-los eles não se tornariam lugares de memória. É este vai- e –vem que os constitui: momentos de história arrancados do movimento de história, mas que lhe são devolvidos [...] (PIERRE, 1993).

Tradicionalmente, os arquivos são considerados como lugares de memória pela estrutura de sua formação e finalidades. Além de servirem de instituições de gestão, guarda e preservação. Também são responsáveis pelo processamento técnico de acervos documentais, permitindo à sociedade o acesso e a recuperação da informação e ao uso de seu conteúdo informacional e probatório. Rousso (1996, p.4) revela que:

o arquivo é sempre o produto de uma linguagem própria, que emana de indivíduos singulares ainda que possa exprimir o ponto de vista de um coletivo (administração, empresa, partido político etc.) Ora, é claro que essa língua e essa escrita devem ser decodificadas e analisadas. Mas, mais que de uma simples “critica interna”, para retomar o vocabulário ortodoxo, trata-se aí de uma forma particular de alteridade [...], portanto a possibilidade de um documento original resistir ao tempo e acabar um dia sobre a mesa do historiador não conferem a esse vestígio particular uma verdade suplementar diante de todas as outras marcas do passado: existem mentiras gravadas no mármore e verdades perdidas para sempre (ROUSSO, 1996).

Em Arquivologia, toda informação registrada em suporte material utilizada para consulta, estudo, prova ou pesquisa é definida como documento. Esta palavra tem raiz etimológica, das palavras latinas docere (ensinar) e documentum (aquilo que ensina), portanto, o documento traz consigo a possibilidade do ensino, levando em consideração seus atributos jurídico, cultural e histórico. Entretanto, nem todo documento, pode ser considerado documento de arquivo. Segundo Schellenberg (2002, p.37), “devem ter sido criados e acumulados na consecução de algum objetivo”. Segundo Bellotto (2002, p.37):

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os documentos de arquivo são produzidos por uma entidade pública ou privada ou por uma família ou pessoa no transcurso das funções que justificam sua existência como tal, guardando esses documentos relações orgânicas entre si. Surgem, pois, motivos funcionais administrativos e legais. Tratam, sobretudo de provar, de testemunhar alguma coisa (BELLOTO, 2002).

Na busca por instituições que fazem salvaguarda de documentos sobre os remanescentes quilombolas, me deparei com a escassez e fragmentação das coleções. Os lugares de memória são lugares de privilégios, portanto, existem interesses que norteiam a escolha do que deve ser memorável ou não. Este fato nos dá pistas da existência escassa de Centros de Referência sobre a cultura negra e os quilombolas. As disputas em torno de suas memórias, bem como o embate de narrativas, fazem dos quilombolas objeto de uma extensa discussão sobre seus múltiplos significados e heranças históricas. Os documentos de arquivo revelam-se como “arsenal da administração” e “celeiro da história” ao prover o registro das atividades de instituições, seja públicas ou privadas, atuando a priori como importantes mecanismos administrativos e a posteriori como fonte de evidências de intenções e fatos, servindo como base de análise para pesquisas e produtos culturais. Para além de uma recuperação fiel de um passado ou mesmo um “resgate”, a história se lança na árdua tarefa de interpretar a partir de documentos e fontes o contexto de criação dos mesmos, considerando diversos fatores que influenciaram no fato histórico, inclusive relatos orais.

A pesquisa deste trabalho de conclusão de curso baseou-se na pesquisa documental do quilombo Sacopã, mais precisamente os documentos armazenados na residência da família Pinto e que evidenciam toda a história de resistência da família, localizado na Lagoa no Rio de Janeiro. O objetivo dessa pesquisa é a análise de todos os documentos da família Pinto e depois propor uma melhor forma de organização. No primeiro capítulo são apresentados os conceitos básicos e fundamentais sobre quilombo; no segundo capítulo é apresentada a família Pinto e sua história; no terceiro capítulo são mostrados através de imagens, os documentos preservados pela família Pinto, e também é feito a análise dos documentos; e por último, na conclusão é feita a proposta de organização dos documentos.

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2 – QUILOMBO

O termo quilombo é uma categoria jurídica usada pelo Estado brasileiro a partir da Promulgação da Constituição Federal de 1988, com o objetivo de assegurar a propriedade definitiva às comunidades negras rurais dotadas de uma trajetória histórica própria e relações territoriais específicas, bem como ancestralidade negra relacionada com o período escravocrata, ou seja, o termo quilombo se refere a um “grupo que desenvolveram práticas cotidianas de resistência” (O’DWYER - 1995). Nesse sentido, há outras terminologias para o termo quilombo, como Terras de Preto, Terras de Santo, Mocambo, Terra de Pobre, entre outros.

Para que um grupo de pessoas seja enquadrado na categoria de Quilombo e possa ter suas propriedades asseguradas conforme o artigo 68 do ADCT (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), o grupo precisa comprovar e atender certos pré-requisitos para que se possa usufruir de seus direitos e consequentemente ser considerado Remanescentes Quilombola.

Embora a atual Constituição brasileira tenha se referido aos quilombos em mais de um dispositivo, não há uma definição constitucional de quilombo e nem seria o caso. Quilombo pode ser considerado “o lugar e a comunidade formados principalmente por negros escravos ou ex-escravos, eventualmente longe das fazendas e cidades, em busca de liberdade e identidade” (ROTHENBURG - 2012) Juridicamente, existe uma definição oficial, normativa, dada pelo Decreto 4.887/2003 no art. 2º: “consideram-se remanescentes das comunidades dos quilombos, para os fins deste Decreto, os grupos étnico-raciais, segundo critérios de auto atribuição, com trajetória histórica própria, dotados de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida”. Esta definição leva em conta a existência do grupo que é a unidade de sentido das comunidades tradicionais. Portanto é

(...) preciso, sobretudo, que esses sujeitos históricos presumíveis existam no presente e tenham como condição básica o fato de ocupar uma terra que, por direito, deverá ser em seu nome titulada (como reza o artigo 68º do ADCT). Assim, qualquer invocação ao passado, deve corresponder a uma forma atual de existência, que pode realizar-se a partir de outros sistemas de relações que marcam seu lugar num universo social determinado. (O’DWYER, 2002).

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Normalmente, datas precisas não são capazes de representar de forma justa o percurso histórico dos remanescentes de quilombos. Sendo assim, não é uma anormalidade a formação de comunidades quilombolas após a abolição oficial da escravatura no Brasil, em 1888. Com relação à individualidade étnica: algum branco que se tenha integrado à comunidade dela faz parte ainda que não possua ancestralidade negra – já que a definição normativa é reportada ao grupo em linhas gerais. Desse modo, não devemos associar o conceito de quilombo a estereótipos ou rótulos. Muitas das vezes

veiculam uma imagem ingênua e romântica de descendentes negros de escravos fugidos que se esconderam em lugares remotos e hoje teriam uma vida campesina humilde e bucólica, mesmo que essa representação possa corresponder à realidade. Também aqui o mito do bom selvagem tende a desapontar, à medida que não corresponde à atualidade e à realidade humana. (ROTHENBURG, 2013)

Portanto, a existência de comunidades quilombolas em áreas urbanas (como por exemplo, a Sacopã no Rio de Janeiro-RJ) ou sua inserção no contexto atual (com a prática de atividades econômicas como o ecoturismo) não desqualifica a identidade étnico-social, nem as reivindicações jurídicas.

O decreto 4887/2003 regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por comunidades remanescentes quilombolas. Esse decreto utiliza critérios para manter a fronteira entre o grupo e o mundo externo, no caso dos remanescentes quilombolas, “costuma ser determinada por sua origem comum e formação no sistema escravocrata” (BARTH, 1969). Assim sendo, segundo o art. 68 do ADCT:

A identidade quilombola assume duas vertentes: uma individual, quando depende da consciência de cada membro para se reconhecer como quilombola, e ao mesmo tempo uma coletiva que para ser aceito como membro daquela comunidade precisa de sua anuência, de acordo com os critérios de pertencimento do grupo, estabelecidos coletivamente. Não cabe, portanto, a nenhum agente externo nem a rotulação nem a negação da identidade de um grupo étnico. Essa autoafirmação identitária diz respeito somente aos membros do grupo. Não basta apenas que um indivíduo afirme ou negue sua identidade étnica, é necessário que esta identidade seja referendada pelo coletivo. (INCRA, 2003)

Após o artigo 68 do ADCT na constituição de 1988, se fez necessário um “atestado”, relatório antropológico, de reconhecimento quilombola que:

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representa um tipo de intervenção num campo específico de articulação e envolvimento do mundo intelectual com os movimentos sociais e a mobilização de grupos étnicos, os quais reivindicam o direito à diferença cultural, à reprodução de suas práticas econômicas e sociais, bem como o respeito pelos seus saberes tradicionais. (O’DWYER – 2007, p.7)

Mas após o decreto 4.887/2003, a participação de antropólogos no processo foi desconsiderada na medida em que não se fariam mais necessários, pois se entendia que a consciência de sua identidade deveria ser considerada como critério fundamental para identificação. Logo, a ABA (Associação Brasileira de Antropologia) fez uma série de questionamentos a esse novo critério que tirou a importância dos relatórios antropológicos no processo de reconhecimento, defendendo a ideia que a autoatribuição prescinde dos relatórios antropológicos, que por sua vez, fornecem elementos para que o grupo possa se defender de possíveis questionamentos e processos jurídicos. Nesse sentido

A ABA, presente na audiência pública antes da promulgação do Decreto, defendeu que a auto-definição utilizada pelos próprios atores sociais não prescinde da realização de estudos técnicos especializados que venham a descrever e interpretar a formação de identidades étnicas no bojo do processo de reconhecimento das comunidades negras rurais remanescentes de quilombos, na medida em que esses estudos tragam subsídios para uma decisão governamental e forneçam elementos para que o próprio grupo possa se defender de possíveis formas de intervenção estatal que possibilite apenas a reprodução das categorias sociais, sem garantir as condições para a perpetuação de padrões culturais, modos de vida e territorialidades específicas. No documento encaminhado pela ABA à Casa Civil da Presidência da República, após a audiência pública sobre o Decreto, dizíamos que deixar por conta de uma futura ação judicial a defesa do ato de reconhecimento dos direitos constitucionais pelo Estado, como considerado por alguns representantes dos quilombolas e de agências governamentais, poderia representar uma enxurrada de questionamentos na esfera judicial, o que terminaria por inviabilizar que se cumpram os direitos assegurados pela Constituição Federal de 1988. Após a promulgação do Decreto 4887, de 20 de novembro de 2003, que regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por comunidades remanescentes de quilombos de que trata o art. 68 do ADCT, o Partido da Frente Liberal – PFL, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI n°3.239-9/600 – DF – em face do Decreto n° 4887/2003. Os pareceres sobre a improcedência da ação, emitidos pela Procuradoria Geral da República e pela Advocacia Geral da União, recorrem ao livro da ABA “Quilombos: identidade étnica e territorialidade”. (O´DWYER, 2002)

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utilizam seus argumentos na defesa do Decreto, principalmente sobre o critério de autoatribuição, que tem orientado a elaboração dos relatórios de identificação ou os também chamados Laudos Antropológicos, no contexto da aplicação dos direitos constitucionais às comunidades negras rurais consideradas remanescentes de quilombos. (OLIVEIRA, 2016)

Após Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pelo PFL, o MDA e o INCRA, contataram a ABA para novamente contarem com a participação de antropólogos no bojo dos processos de reconhecimento territorial das comunidades remanescentes de quilombo. Assim foi editada nova Portaria, a n° 20, que prevê a elaboração de estudos e relatórios antropológicos.

Por fim, temos também regulamentado no decreto 4.887/2003 a questão do território quilombola, que são terras ocupadas pelos remanescentes e são utilizadas para reprodução física, social e cultural. É importante que ao titularizar um território como quilombola não só se leve em consideração a ocupação atual das terras, mas também os espaços necessários à reprodução física e social da comunidade, nos limites das características e valores cultivados pela comunidade. Ou seja, território quilombola é:

Segundo o Artigo 2º do Decreto 4.887/2003, são consideradas terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos as utilizadas para a garantia de sua reprodução física, social, econômica e cultural. Dessa forma, tal caracterização legal abrange não só a assim chamada ocupação efetiva atual, mas também o universo das características culturais, ideológicas, valores e práticas dessas comunidades. Assim sendo, um território se constitui a partir de uma porção específica de terra acrescida da configuração sociológica, geográfica e histórica que os membros da comunidade construíram ao longo do tempo, em sua vivência sobre a mesma. Assim sendo, um território seria um ente que sobrepõe a terra e a carga simbólica agregada a mesma, a partir de seu uso pleno e continuado pela ação de um determinado grupo humano. É a partir da efetiva incorporação dessas características físicas e simbólicas (a terra e a vida social específica que ocorre sobre a mesma) que os membros dessas comunidades se reproduzem física e socialmente e se apresentam modernamente enquanto titulares das prerrogativas que a Constituição lhes garante. É o domínio dessas características que acabam por vincular as pessoas ao território, e não o contrário, pois o território é o todo que garante a continuidade da vida e a comunidade e seus membros são uma de suas partes. É por esse motivo que ao se regularizar um território quilombola é preciso se considerar a ocupação atual das terras, mas igualmente os espaços para tanto necessários à reprodução física e social da comunidade, nos limites das características e valores cultivados pela comunidade (INCRA, 2003).

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O grupo passa por todo esse processo, pois busca também o reconhecimento como comunidade quilombola, cidadania e territorial. Após passar por todos os pareceres jurídicos e técnicos, o INCRA publica a portaria reconhecendo e delimitando todos os limites do território quilombola e define reconhecimento do território quilombola como:

toda a extensa fase de negociação para conciliação de interesses públicos e de julgamento de contestação e recursos de interesses privados, a Presidência do Incra publica Portaria reconhecendo e declarando os limites do território quilombola. A portaria é publicada no Diário Oficial da União e do Estado e deve conter o memorial descritivo do perímetro do território quilombola em vias de regularização. (INCRA, 2003)

Os remanescentes quilombolas não buscam apenas o reconhecimento no âmbito jurídico, mas também no meio social e de cidadania. O grupo busca esse reconhecimento para ser mais bem respeitados na sociedade em geral, pelo modo de agir e demonstrar seus valores de forma clara. Portanto, o reconhecimento da identidade quilombola é:

utilizada como uma afirmação positiva no reconhecimento de si mesmo como ser social. Assim, além do reconhecimento jurídico há o reconhecimento como “ente moral” e, neste caso, ainda segundo o autor acima citado, a manifestação mais geral desse reconhecimento seria expresso como respeito. Neste sentido, trata-se de uma luta dessas populações não apenas por ganhos materiais, mas também pela cidadania, traduzida como busca de respeitabilidade a si mesmos, de seus valores e formas de ver o mundo. (CARDOSO DE OLIVEIRA, 2006).

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3 – Quilombo Sacopã

Figura 1: Entrada do Quilombo Sacopã. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

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O quilombo Sacopã se localiza na Ladeira Sacopã, 250, no bairro Lagoa Rodrigo de Freitas, município do Rio de Janeiro (Figura 1). E ainda hoje, mesmo com a urbanização da Lagoa, é um lugar com muito verde, árvores, matas, e animais, como por exemplo, ave dos mais variados tipos, cobra de todos os tipos, entre outros (Figura 2). É um quilombo no meio urbano, possui uma área 6404,17 m², de perímetro de 447,6 m delimitada pelo INCRA como imóvel destinado à propriedade coletiva da comunidade remanescente de quilombos Sacopã, nos termos do art. 68 dos ADCT (Ato das disposições constitucionais transitórias da CRFB/88), como mostrado na Figura 3.

Figura 3 – Placa com artigo 68 do ADCT que trata do reconhecimento dos remanescentes quilombolas. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

Os integrantes da comunidade remanescente desse quilombo se auto reconheceram quilombolas em 1999, mas só em 2005 alcançaram a certificação da Fundação Cultural Palmares. A comunidade quilombola Sacopã é integrada pela família Pinto, composta por aproximadamente 50 pessoas, das quais 26 habitam a Ladeira Sacopã, e tem em Luiz Pinto (conhecido como Sacopã) o seu líder (Figura 4), a pessoa que hoje fica à frente de todas as disputas e do movimento de resistência. O núcleo familiar estabeleceu vínculos com o espaço em 1939, quando se fixou no local dez anos após a chegada do patriarca Manoel Pinto Jr.

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Figura 4 - Luiz Pinto Próximo à churrasqueira. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

O patriarca Manoel Pinto Jr (Figura 5) veio ao Rio de Janeiro em busca de trabalho, para ajudar no sustento da família, enquanto sua esposa Eva trabalhava em Friburgo, mas não era o suficiente. Encontrou no bairro da Lagoa seu trabalho, em 1929. Logo começou sua atividade na Lagoa, na época, um bairro da classe operária, e ocupou um pedaço de terra rodeado de trilhas e mata para ser sua moradia, a Ladeira Sacopã.

Figura 5 - Manoel Pinto Jr e sua Esposa Eva. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

Na década de 60 deu se início um processo de urbanização do bairro da Lagoa, onde milhares de pessoas foram removidas de suas casas nas favelas da Catacumba, através da política de remoção da população carente. Essa política visava construir inúmeros edifícios e com isso “elitizar” o bairro da Lagoa que

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deixaria de ser composto por famílias que pertencia à classe operária para ser um bairro de classe alta. Desse modo, muitos dos moradores mais antigos foram removidos também da ladeira Sacopã. Muitos possuíam laços afetivos extremamente fortes como é o caso de Bráulio que viu sua família removida da ladeira Sacopã e hoje mora no quilombo Sacopã porque como ele mesmo diz “fui adotado pela família Pinto” (Bráulio). A política de remoção afetou diretamente o quilombo Sacopã, e a partir de 1970 ocorre à valorização do bairro da Lagoa e com isso se inicia a história de resistência dos seus moradores quilombolas (Figuras 6 e 7). A partir daí começam os processos jurídicos e consequentemente a “briga” entre a família Pinto, que pretende continuar morando no local, e alguns vizinhos que almejam a remoção imediata da família do lugar.

Com o objetivo de conseguir a estabilidade proporcionada pela certificação de posse das terras, a família Pinto optou pela pretensão judicial de usucapião em 1975, processo judicial que foi dado em favor dos familiares Sacopã em primeira instância. Os oponentes inconformados entraram com recurso em objeção à decisão judicial, em segunda instância foi decidido contra a família Pinto e corre até os dias atuais na Justiça Federal. O processo de usucapião durante algum tempo permitiu

Figura 6 – Lagoa Rodrigo de Freitas ante da urbanização. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

Figura 7 – Lagoa Rodrigo de Freitas nos dias atuais. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

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segurança jurídica em relação à posse das terras em que eles viviam e após algumas décadas a esperança de um desfecho favorável à família Pinto diminuiu. A partir daí a família decidiu buscar a posse das terras pelo direito de propriedade coletiva, ou seja, a família resolveu adquirir o reconhecimento de identidade quilombola, a partir de 1989.

Logo após a família Pinto se auto reconhecer quilombola, vale a pena ressaltar que aqui implica “ser julgado e julgar-se a si mesmo de acordo com os padrões relevantes para tal identidade” (BARTH, 2000, p.32) e consequentemente conseguir a identidade de quilombo. Isto pode ser explicado pelo seguinte trecho:

Esta abordagem exigia a elaboração de narrativas públicas sobre o seu cotidiano, desenvolvidas e sustentadas no seio da vida política e jurídica do lugar, o que trouxe nova vida ao processo de usucapião e embora este, após quarenta anos, ainda não tenha chegado ao fim, novos mecanismos de acionamento da posse da terra e dos seus usos como direitos da família como um coletivo puderam tomar o seu lugar, tornando mais complexa a malha de relações com os órgãos públicos e entidades de apoio desta disputa como causa na esfera pública. (ARAGON, 2013).

Mesmo com a remoção da população nas décadas de 70 e 80, teve início um período de crescimento e prosperidade na família Pinto, com a pensão de tia Neném (irmã de Luís Pinto) funcionando a todo vapor, servindo comida principalmente para os trabalhadores que estavam construindo os edifícios na Lagoa, nesse processo de urbanização. A partir do sucesso da pensão, veio à ideia de se fazer samba com feijoada aos finais de semana, e com isso a pensão da tia Neném ficou ainda mais famosa e contava com presenças ilustres como Beth Carvalho, Zeca Pagodinho, Arlindo Cruz e outros artistas, que comemoravam ali seus aniversários (Figuras 8 e 9). Por vezes tia Neném e Luiz Pinto cantavam nas rodas de samba, e Cláudio (filho de Tia Neném) vendia batidas de limão com cachaças produzidas ali mesmo. Cláudio também ajudava na gerência da pensão e por vezes fazia algumas sugestões de melhorias na pensão para sua mãe.

Na década de 80, a proibição do samba proporcionou uma oportunidade de grande união na família e foi “o grande momento da nossa história” (Cláudio, filho de Tia Neném). Os moradores do Quilombo Sacopã tiravam seu sustento da terra onde viviam, com a venda de quentinhas e de carne de porco e com a oficina de carro. É bom deixar claro que "a comunidade afrodescendente encontra nessas atividades, não apenas um meio de expressão de sua cultura, mas um modo de subsistência

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que agrega toda a família." (CASTRO, 2011, p.3). As práticas de subsistência do quilombo transcendem o significado usual de atividade comercial, caracterizando-se como expressão da cultura e da tradição de uma minoria étnica invisibilizada pela falta de um adequado sistema legislativo capaz de concretizar os direitos culturais constitucionalmente reconhecidos.

A partir da urbanização da Lagoa e a transformação em um bairro mais residencial, começou os conflitos entre os vizinhos e a família Pinto por conta de suas atividades, pois as principais reclamações dos vizinhos era o "mau" cheiro vindo do galinheiro e dos porcos, dos sons vindos do samba e da oficina. Faz-se necessário dizer também que não são todos os vizinhos que não toleram essas atividades da família Pinto, é apenas uma parte dos vizinhos que não toleram os costumes da família.

Essa nova questão do auto reconhecimento provocou insatisfação nos vizinhos. Na visão equivocada deles seria um absurdo, uma injustiça, por considerarem não haver nesse quilombo resquício histórico escravocrata o que é um equívoco, pois "imaginar que um grupo quilombola se mantenha intocável a transformações culturais e sociais que ocorrem ao longo do tempo, implica desconsiderar o fato de que a cultura é dinâmica e está em transformação"

Figura 8 – Acompanhada dos cantores e compositores Zeca Pagodinho e Arlindo Cruz, Regina Casé comemorando seu aniversário no Quilombo Sacopã. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

Figura 9 – Convite à feijoada. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

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(CASTRO, 2011, p.7). Ao se auto reconhecer quilombola a família Pinto diz para todos que tem uma visão diferente sobre o mundo, em relação às pessoas e ao meio em que está inserida, pois o grupo apresenta certas características e peculiaridades que os torna diferentes do resto da sociedade comum. A terra onde vivem representa o passado, o presente e o futuro porque ali está contido a sua cultura e memória. Ao reivindicar a posse das terras, ou seja, o direito de propriedade coletiva e consequentemente ser contemplado com os direitos culturais que "advêm da identidade quilombola, e asseguram aos remanescentes de quilombo o direito à propriedade definitiva do espaço que estejam ocupando, cabendo ao Estado à expedição dos títulos respectivos" (CASTRO, 2011, p.8).

O reconhecimento como uma comunidade remanescente quilombola, a família Pinto viu as ameaças dos vizinhos se intensificar o que aumentou ainda mais o conflito e o bom relacionamento com a vizinhança. O quilombo Sacopã é avaliado em mais de 160 milhões de reais e com isso aflora o "olho grande" de alguns empresários que querem a posse daquelas terras com intuito de construir condomínios luxuosos naquela área.

Além dos conflitos com os vizinhos, houve delimitação de uma parte daquela área como Parque Ambiental Municipal e consequentemente houve uma grande discussão sobre a permanência da vida cotidiana de humanos junto com todo ecossistema e animais ali presente. O maior questionamento era o fato de que as famílias quilombolas ao viverem ali iriam acabar com todo esse ecossistema presente no lugar, o que era um controverso, pois a família Pinto vive em completa harmonia com os animais e cuidados com as árvores, comprovada no dia a dia da família. Há pouco tempo ficou evidenciado que os quilombolas vivem em harmonia com a natureza e essa questão da retirada da família naquela área por causa dos parques ambiental está resolvida judicialmente.

Apesar de conseguir a delimitação do INCRA (Figura 10 e 11) como comunidade quilombola, a titularização das terras como Comunidade Remanescente de Quilombo não foi dada de maneira integral pela área judicial, ou “reconhecimento entre aspas” (Cláudio, filho da Tia Neném). A família não tem paz ou fim do conflito com os vizinhos, os "ataques" judiciais não cessam e mesmo assim ainda hoje eles vivem no quilombo, mas com certas limitações quanto às suas atividades de subsistência e afirmação cultural, como por exemplo, as atividades de fornecimento

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Figura 10 – Luiz Sacopã mostra o documento de reconhecimento de domínio do INCRA. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

de comidas e as feijoadas aos finais de semana estão proibidas, salvos em alguns casos de datas festivas.

Figura 11 – Festa de comemoração pelo reconhecimento do INCRA. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

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Figura 12 – Policiais armados colocando correntes no portão do Quilombo Sacopã, impedindo eles de saírem. Fonte: ACERVO SACOPÂ.

Até hoje, A família Pinto busca viver em seu lugar com a estabilidade de não ser removido de seu lugar de pertencimento, e não ter mais a sensação de se estar “em uma ilha rodeada por piranhas e tubarões” (Cláudio, filho da Tia Neném). Os processos judiciais de usucapião e o reconhecimento como comunidade Quilombola correm na justiça até hoje e visam à posse das terras para a família Pinto. Atualmente ainda há interesses de pessoas externas na posse das terras e o convívio com os vizinhos continua ruim, mas a união da família que os mantêm fortes para que possam resistir a todos os ataques que sofrem ao longo dos anos.

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4 - ANÁLISE ARQUIVÍSTICA

A memória da família pinto no quilombo Sacopã data desde 1929, quando o patriarca Manoel Pinto Jr chegou a Lagoa, uma parte dessa memória é oral e a outra parte é escrita. A parte escrita é composta por todos os doze processos que a família é parte, borderôs e convites para a feijoada com samba na época em que funcionava a pensão da Tia Neném, além de fotografias, diários e filmagens. Muitos documentos dessa parte escrita corroboram e evidencia grande parte da memória oral, memória que ao longo dos anos vem sendo cada vez mais documentada pelos antropólogos vistos a necessidade de salvaguardar e compartilhar ao grande público toda a cultura e história de resistência de uma família afrodescendente com passado escravocrata no Brasil.

Os antropólogos tem tido a preocupação de documentar a memória dos Quilombos pelo Brasil, para que a história de luta desses remanescentes quilombolas não se perca pelo passar dos anos e também que sirva de inspiração para outras famílias com descendência escravocrata e que passam pelo mesmo processo. Essa memória oral é registrada (documentada) através de revistas, entrevistas gravadas em áudio e vídeo.

A família Pinto é parte em 12 processos judiciais que estão acondicionados em um arquivo branco (comprado em 2012), esses processos estão arquivados e organizados em ordem cronológica, identificados nas divisórias por etiquetas e classificados por título do processo, por exemplo, processo de usucapião, processo de reintegração de posse e etc. A pessoa responsável por essa organização é Márcia (sobrinha do Luiz Sacopã e filha do Seu Mosquito) que ela conta com o auxílio do seu tio Luiz para saber a qual processo pertence tal documento para que possa ser devidamente arquivado, é preciso deixar claro que Márcia não possui nenhuma formação na área da arquivologia e nem outra área que faz parte a Ciência da Informação. Márcia mantém sob sua guarda também os jornais com as matérias que repercutem positivamente ou negativamente o resultado dos processos judiciais.

Cláudio, filho da Tia Neném, tem posse dos diários (onde Tia Neném relatava de forma rotineira todos os fatos ocorridos no dia, como por exemplo, conversas com suas ajudantes na cozinha da pensão, além de seus anseios e sentimentos), filmagens e gravações que tinha como protagonista sua vó Eva, fotografias e álbuns

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da família estão também sob sua posse, Cláudio tem o objetivo de um no futuro próximo escrever um romance com base nos diários da Tia Neném.

Assim como Marcia, Claudio também não tem formação na área da Arquivologia e com isso muito dessa documentação/informação que esteve ao longo dos anos sob sua guarda foi se perdendo ao longo do tempo, seja por deterioração do suporte que a informação estava contida ou pela perda devido ao fato de não se ter uma estrutura que tenha uma forma de organização inteligível desses documentos e o tratamento documental necessário para que se possa obter uma melhor conservação desses documentos valiosos que evidenciam e contam a história de resistência vivida ao longo dos anos no Quilombo Sacopã.

Fica claro a dificuldade de se reunir as informações produzidas pela família Pinto em todos esses anos pelo fato de cada uma das 26 famílias que compõem essa grande Família Pinto obter uma parte da documentação. Com isso, a documentação não permanece em conjunto e nem possui uma forma padrão de organização. Ou seja, um membro não sabe de fato quais documentos os outros membros possuem sobre a família Pinto e o Quilombo Sacopã, e consequentemente cada membro pode descartar documentos que ele julgar desnecessário.

A solução seria a criação de um Centro de referência com uma boa estrutura para que se possa oferecer um tratamento aos documentos de qualidade; ter uma equipe de profissionais com formação na área que respeite os princípios da arquivologia e vise à organização Arquivística; e permitir o acesso rápido e eficaz as informações contidas naquele fundo. Desse jeito irá ocorrer a manutenção da memória dos Quilombos para que sirva de inspiração para outros remanescentes quilombolas e para comunidade negra em geral, além da salvaguarda dos quilombos como patrimônio cultural do país.

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5 - Considerações Finais

Este trabalho buscou contribuir para o debate em torno da importância e necessidade da criação dos Centros de Referências que possibilite o acesso eficaz tanto do público geral quanto dos moradores do quilombo com tratamento e organização ideal para que possa salvaguardar a memória dos remanescentes quilombolas.

Entretanto, existem ainda questões e debates a serem discutidos neste sentido, porque as políticas nem sempre contemplam como deveriam estes espaços. Os lugares de memória são marcados por relações de poder, sobretudo, quando o que se pretende preservar as manifestações culturais das minorias, como é o caso dos remanescentes quilombolas.

O objeto da pesquisa é entender como se estabelecem estas relações e como, a partir da reflexão e apropriação desses espaços podemos nos articular politicamente para garantir o direito à informação e à memória.

Assim sendo, vale ressaltar que devemos estar atentos a responsabilidade social e política que trazem os lugares de memória e as implicações que a falta de atenção com estes espaços acarretam para a construção da memória coletiva. Preservar a memória dos remanescentes quilombolas a partir de políticas de salvaguarda é democratizar os espaços, tornando legítimas as manifestações culturais oriundas das classes populares. Foi possível perceber a importância da Tia Neném e Luiz Sacopã como militantes. Isto porque a militância deles era do negro não mais se sujeitar aos desejos dos brancos, como era até a época de seus pais (ex-escravos), e se afirmar em um lugar da “Elite” e com isso conviver com essas pessoas.

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