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Acesso e qualidade da Atenção Primária à Saúde no Brasil : considerações sobre o Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB)

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FACULDADE DE CIÊNCIAS MÉDICAS

ANA CARINE ARRUDA ROLIM

ACESSO E QUALIDADE DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL: CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROGRAMA DE MELHORIA DO ACESSO E

QUALIDADE DA ATENÇÃO BÁSICA (PMAQ-AB)

CAMPINAS 2018

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ACESSO E QUALIDADE DA ATENÇÃO PRIMÁRIA À SAÚDE NO BRASIL: CONSIDERAÇÕES SOBRE O PROGRAMA DE MELHORIA DO ACESSO E

QUALIDADE DA ATENÇÃO BÁSICA (PMAQ-AB)

Tese apresentada à Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a obtenção do título de Doutora em Saúde Coletiva, na área de concentração em Epidemiologia.

ORIENTADOR: CARLOS ROBERTO SILVEIRA CORRÊA

ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA

ALUNA ANA CARINE ARRUDA ROLIM E ORIENTADA PELO PROF. DR. CARLOS ROBERTO SILVEIRA CORRÊA.

CAMPINAS

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca da Faculdade de Ciências Médicas

Maristella Soares dos Santos - CRB 8/8402

Rolim, Ana Carine Arruda, 1990-

R646a Acesso e qualidade da Atenção Primária à Saúde no Brasil : considerações sobre o Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) / Ana Carine Arruda Rolim. – Campinas, SP : [s.n.], 2018.

Orientador: Carlos Roberto Silveira Corrêa.

Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Ciências Médicas.

1. Acesso aos serviços de saúde. 2. Avaliação da qualidade dos cuidados de saúde. 3. Atenção primária à saúde. I. Corrêa, Carlos Roberto Silveira, 1954-. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Ciências Médicas. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Access and quality of Primary Health Care in Brazil :

considerations of Brazil's National Program for Improving Primary Care Access and Quality (PMAQ)

Palavras-chave em inglês:

Health services accessibility Quality assurance, health care Primary health care

Área de concentração: Epidemiologia Titulação: Doutora em Saúde Coletiva Banca examinadora:

Carlos Roberto Silveira Corrêa [Orientador] Nelson Rodrigues dos Santos

Suzy Maria Lagazzi

Luiza Jane Eyre de Souza Vieira Fabiano Tonaco Borges

Data de defesa: 26-02-2018

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BANCA EXAMINADORA DA DEFESA DE DOUTORADO

ANA CARINE ARRUDA ROLIM

ORIENTADOR: CARLOS ROBERTO SILVEIRA CORRÊA

MEMBROS:

1. PROF. DR. CARLOS ROBERTO SILVEIRA CORRÊA – FCM/UNICAMP (PRESIDENTE)

2. PROF. DR. NELSON RODRIGUES DOS SANTOS – FCM/UNICAMP (TITULAR)

3. PROF. DRA. SUZY MARIA LAGAZZI – IEL/UNICAMP (TITULAR)

4. PROF. DRA. LUIZA JANE EYRE DE SOUZA VIEIRA – PPSGSC/UNIFOR (TITULAR)

5. PROF. DR. FABIANO TONACO BORGES –MPS/ISC/UFF (TITULAR)

Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas.

A ata de defesa com as respectivas assinaturas dos membros da banca examinadora encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.

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Este trabalho integra a produção científica do Grupo Interdisciplinar de Pesquisas em Saúde (GIPS/CNPq) e contou com o apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES por meio de bolsa de doutorado.

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Talvez este trabalho represente o resultado mais visível de um processo de construção em meio a uma caminhada muito bem acompanhada de amigos e amores. Aprendi aqui que o desenvolvimento de uma tese nem sempre é solitário. Dessa forma, dedico esse espaço para tecer algumas palavras de gratidão àqueles que dela fazem parte direta ou indiretamente ou, ainda, pelo fato de simplesmente terem contribuído no meu trajeto. Eis que chega o momento de expressar os meus sinceros agradecimentos a muitos e tantos adorados.

Primeiramente agradeço ao meu orientador, Carlos Corrêa, carinhosamente chamado Calucho. Desde o mestrado mantemos uma relação de respeito mútuo que trouxe mais leveza na construção desta tese e de todas as pesquisas empreendidas ao longo do caminho. Agradeço por sua amizade, paciência, pelos tantos encontros encorajadores e pela confiança depositada no meu trabalho.

Agradeço aos professores que gentilmente avaliaram esta pesquisa durante a sua construção: os professores Gastão e Nelsão por participarem da minha qualificação; os Professores Everardo Nunes e Juan Fernandez pelas contribuições durante a disciplina SC 421 e os membros da banca de defesa, Prof. Fabiano, Prof.ª Suzy e Prof.ª Jane Eyre pela disponibilidade, pela acolhida e pelas valiosas contribuições. Agradeço ainda aos colegas que, com muita disposição, contribuíram com a leitura do trabalho e compuseram a banca examinadora como suplentes: Sóstenes Ericson e Rauni Alves.

Agradeço profundamente à Professora Cláudia Pfeiffer pelo permanente incentivo à minha entrada e deleite na teoria do discurso e pela leitura atenta e críticas construtivas aos meus vários manuscritos, que nem sempre foram produzidos com clareza.

Agradeço ao Juanito Costa que, com muita habilidade e carinho, colaborou definitivamente para a construção das análises advindas dos extensos bancos de dados dos ciclos do PMAQ-AB.

Agradeço aos amigos da eterna Casa de Tota que partilharam comigo momentos de muito, muito afeto. Não é possível explanar aqui a riqueza que foi a

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permanecerem comigo por dias e noites de risos e choros e por cada gesto de amor a mim dedicado. Devo a vocês muito do que consegui. Agradeço ainda à Fabiana Peroni, Lucas Melo e à Ivana Cesar, que são também parte de uma família construída pela amizade.

Às amigas de caminhada, Mercês Santos, Elizabeth (Bel) Cabral e Bruna Nascimento, mulheres incríveis que muito me inspiram na Saúde Coletiva e fora dela.

Aos amigos da minha turma do doutorado, em especial Cadu Amaral, Núbia Vianna, Pedro Abreu e Mônica Martins que compartilharam momentos de aprendizado e crescimento acadêmico e de vida. Aqui também agradeço a Márcio Melo por seu companheirismo e sua sensibilidade e às companheiras do grupo de pesquisa Karla Amorim, Jane Kelly, Letícia Faria e Valéria Jodjahn pelos momentos divididos por perto e à distância.

Aos colegas de docência pelas aprendizagens que me ajuda(ra)m na construção de um projeto de ensino para a Saúde Coletiva: da FAM, Valéria Masson, Valéria Figueiredo, Virginia Volpato e Cris Castro; e da UECE, em especial às Professoras Graça Barbosa e Gisele Arruda e aos Professores José Maria Ximenes, Leilson Lira e André Moura.

Às amigas de encontros e reencontros de Fortaleza Carolina Capistrano, Caroline Nobre, Carolina Sharlene, Ana Rita e Nayara que acompanham a minha caminhada, às vezes de perto, às vezes de longe e sempre com pensamento positivo e muito carinho. Agradeço também à Ana Cléa, companheira de leituras, conversas e viagens em função da análise do discurso.

À minha família, minha principal fonte de amor, eu agradeço pelo apoio desmedido e amparo permanente. Aos meus pais, Nonato e Anapaula, e ao meu noivo, Necy, não somente agradeço como dedico este trabalho. Ao meu irmão, aos meus avós, tios e primos, sou grata pelos ensinamentos e incentivos. À minha sobrinha Anne Isabelly agradeço por todo o amor a mim dedicado em forma de gestos e palavras. Sem vocês não seria quem sou e, certamente, não teria chegado aqui.

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funcionários do programa que apoiaram e incentivaram a realização desta pesquisa.

Há muito mais a quem agradecer... A todos aqueles que, embora não nomeados, destinaram a mim os seus apoios em diferentes momentos e por suas acolhidas e presenças afetivas. Àqueles que estiveram comigo e, em um gesto de amor, entenderam as minhas ausências ou presenças parciais e incentivaram a finalização desse importante projeto, aqui ofereço o meu carinhoso muito obrigada!

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O objetivo dessa proposta é compreender os possíveis efeitos de sentidos produzidos a partir dos discursos das Portarias do Ministério da Saúde nº 1.654/2011 e nº 1.645/2015, que institui e dispõe sobre o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade (PMAQ-AB) respectivamente, sobre as questões referentes ao acesso e à qualidade da Atenção Primária e como esses efeitos se reverberam na construção dos dados quantitativos da avaliação externa. Trata-se de uma proposta de estudo cujo referencial teórico-metodológico se apoia (i) na análise do corpus constituído pelos documentos oficiais do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Atenção Básica (PMAQ-AB) e outros materiais relacionados às condições de produção do Programa por meio da Teoria do Discurso da linha francesa apresentada por Michel Pêcheux e (ii) na análise da consistência interna dos dados referentes à Avaliação Externa (3ª fase) do Primeiro e Segundo Ciclo do PMAQ-AB divulgados em 2015 e 2017 através do coeficiente alfa de Cronbach. Discursivamente, compreendemos a saúde, enquanto objeto de avaliação, repercutindo efeitos dos pré-construídos: julgamento de valor, eficiência, eficácia e efetividade. Nesse contexto, o de avaliação em saúde, o PMAQ-AB traz a noção de

qualidade enquanto elemento marcador do mérito, que pode levar o processo de

trabalho em saúde das equipes de atenção básica ao reducionismo a partir do movimento de valorização do trabalho com (para) eficiência, e acesso como um instrumento de legitimação e reiteração da avaliação da qualidade, nos moldes do Programa. Finalmente, a análise de confiabilidade para a resposta aos padrões de qualidade da avaliação externa do PMAQ-AB aponta para melhor confiabilidade do questionário no Segundo Ciclo, a partir da redefinição dos padrões de qualidade e a reorganização dos itens e dimensões do instrumento.

Palavras-chave: Acesso aos Serviços de Saúde. Avaliação da Qualidade dos Cuidados de Saúde. Atenção Primária à Saúde.

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This proposal aims to understand the possible effects of senses produced from the speeches of the Brazilians Ministry of Health n. 1654 / 2011 and n. 1645 / 2015, which establishes and disposes of the National Program for the Access and Quality Improvement in Primary Care about access and quality of Primary Care (PMAQ-AB) and how these effects reverberate in the quantitative external evaluation data. This study is supported by the theoretical and methodological framework that is based on (i) Discourse Analysis (DA) of the French School proposed by Michel Pêcheux for analyze the discourses of access and quality within the framework of the Brazilian Unified Health System by means of PMAQ-AB and (ii) on the analysis of internal consistency of the data on the External Evaluation of the First and Second Cycle of the PMAQ-AB using the Cronbach's alpha coefficient. Discursively, we understand the health evaluation reflecting the effects of the pre-constructed: value judgment, efficiency, efficacy and effectiveness. In this context, the PMAQ-AB brings “quality” as a marker of merit, which can take the work process in the primary health care to reductionism based on the valorization of work with (for) efficiency, and “access” as an instrument of legitimation and reiteration of the quality evaluation. Finally, the Alpha‟s Cronbach analysis pointed out to a better internal consistency of the PMAQ‟s Second Cycle, about the redefinition of the quality standards and the reorganization of the items and dimensions of the instrument.

Keywords: Health Services Accessibility. Quality Assurance, Health Care. Primary Health Care.

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Figura 1. Valores, Princípios e Elementos Estruturantes da Atenção Primária à Saúde. ... 36

MANUSCRITO 2

Figura 1. Fases do PMAQ-AB descritas na Portaria GM/MS n. 1.654/2011 ... 115 Figura 2. Fases e eixo estratégico transversal do PMAQ-AB descritos na Portaria GM/MS n. 1.645/2015... 116

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Quadro 1. Abordagens da Atenção Primária à Saúde ... 33 Quadro 2. Organização avaliativa do Primary Care Assessment Tool

(PCATool-Brasil) no que se refere às dimensões da Atenção Primária à Saúde ... 39 Quadro 3. Quadro-síntese das características dos estudos incluídos na revisão de acordo com os autores, ano de publicação, título do artigo, periódico e reflexões do artigo a partir das contribuições da análise do discurso, 2017 ... 54 Quadro 4. Dados do Primeiro e Segundo ciclos do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) ... 66 Quadro 5. Dimensões da Matriz de Pontuação da Avaliação Externa com percentual para certificação da Avaliação Externa do Primeiro e Segundo ciclo do PMAQ-AB ... 69

MANUSCRITO 2

Quadro 1. Comparativo das diretrizes do PMAQ-AB na Portaria GM/MS nº 1.654/2011 e na Portaria GM/MS nº 1.645/2015. Brasil, 2011 e 2015. ... 124 Quadro 2. Processos parafrásticos na nomeação do PMAQ-AB ... 128 Quadro 3. Estruturas textuais de significação do PMAQ-AB na Portaria GM/MS nº

1.654/2011. Brasil, 2011 ... 129 Quadro 4. Dimensões da Matriz de Pontuação da Avaliação Externa com percentual

para certificação da Avaliação Externa do Primeiro e Segundo ciclo do PMAQ-AB. Brasil, 2011 e 2015 ... 130

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Tabela 1. Matriz de resultados de n indivíduos respondendo a um questionário através de itens associados à dimensão ou objeto de interesse ... 75

MANUSCRITO 3

Tabela 1. Distribuição percentual das variáveis de maior relevância na certificação de qualidade das Equipes de Atenção Básica (EAB) na dimensão “Acesso e qualidade da atenção e organização do processo de trabalho”, 1º Ciclo do PMAQ-AB. Brasil, 2012.. ... 146 Tabela 2. Distribuição percentual das variáveis estratégicas da certificação de

qualidade das Equipes de Atenção Básica (EAB) na dimensão “Acesso e qualidade da atenção e organização do processo de trabalho”, 2º Ciclo do PMAQ-AB. Brasil, 2015.. ... 149 Tabela 3. Análise da consistência interna do questionário pelo alfa de Cronbach das

variáveis de maior relevância na certificação de qualidade das Equipes de Atenção Básica (EAB) na dimensão “Acesso e qualidade da atenção e organização do processo de trabalho”, 1º Ciclo do PMAQ-AB. Brasil, 2012... 152 Tabela 4. Análise da consistência interna do questionário pelo alfa de Cronbach das variáveis estratégicas da certificação de qualidade das Equipes de Atenção Básica (EAB) na dimensão “Acesso e qualidade da atenção e organização do processo de trabalho”, 2º Ciclo do PMAQ-AB. Brasil, 2015.. ... 153

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ABRASCO Associação Brasileira de Saúde Coletiva

AB Atenção Básica

AD Análise do Discurso

AMAQ Autoavaliação para Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica

AMQ Avaliação para Melhoria da Qualidade

APS Atenção primária à Saúde

BIRD Banco Internacional de Reconstrução para o Desenvolvimento

BM Banco Mundial

BVS Biblioteca Virtual de Saúde

CDS Coleta de Dados Simplificada

CEBES Centro Brasileiro de Estudos de Saúde

CEO Centro de Especialidades Odontológicas

CEPAL Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe

CNES Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde

CONASEMS Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde CONASS Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde

DAB Departamento de Atenção Básica do Ministério da Saúde

DATASUS Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde

EAB Equipe de Atenção Básica

ESF Estratégia Saúde da Família

FD Formação Discursiva

FMI Fundo Monetário Internacional

GIPS Grupo Interdisciplinar de Pesquisas em Saúde

IES Instituição de Ensino Superior

LABEURB Laboratório de Estudos Urbanos da Unicamp

NASF Núcleo de Apoio à Saúde da Família

NHS Sistema Nacional de Saúde Britânico (National Health System)

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OPAS/PAHO Organização Panamericana de Saúde

PACS Programa de Agentes Comunitários de Saúde

PCATool Instrumento de Avaliação da Atenção Primária (Primary Care

Assessment Tool)

PEC Prontuário Eletrônico do Cidadão

PET-Saúde Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde

PSF Programa Saúde da Família

PMAQ-AB Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica PMAQ-CEO Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade dos Centros de

Especialidades Odontológicas

PQAVS Programa de Qualificação das Ações de Vigilância em Saúde PROADESS Programa de Avaliação do Desempenho do Sistema de Saúde PROESF Projeto de Expansão e Consolidação da Estratégia Saúde da

Família

QUALICOPC Quality and Costs of Primary Care in Europe

RAS Redes de Atenção em Saúde

SAUDE LEGIS Sistema de Legislação da Saúde

SIS Sistemas de Informação em Saúde

SISAB Sistema de Informação da Atenção Básica

SUS Sistema Único de Saúde

UBS Unidade Básica de Saúde

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

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APRESENTAÇÃO ... 19

INTRODUÇÃO ... 22

OBJETIVOS ... 25

Objetivo geral ... 25

Objetivos específicos ... 25

REFERENCIAL TEÓRICO E REVISÃO DE LITERATURA ... 26

CAPÍTULO 1: Considerações sobre a avaliação da qualidade da atenção primária à saúde a partir de seus atributos ... 27

Atenção Primária como estratégia de proteção social nos sistemas nacionais de saúde ... 28

A definição dos atributos e a qualidade da APS ... 34

A organização da Atenção Primária brasileira: atenção básica e a Estratégia Saúde da Família ... 39

Avaliação da APS no contexto brasileiro ... 42

METODOLOGIA ... 47

CAPÍTULO 2: Contribuições da Análise do Discurso pecheutiana para a Saúde Coletiva ... 48

Aspectos conceituais da Análise do Discurso de Michel Pêcheux como referencial teórico-metodológico ... 50

Utilização da Análise do Discurso como referencial analítico no campo da saúde coletiva ... 53

Possibilidades de aplicação conceitual e metodológica à investigação científica no campo da saúde coletiva ... 57

Conclusão ... 59

CAPÍTULO 3: Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB): desenho, operacionalização e resultados ... 60

O desenho do Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) ... 61

A operacionalização do PMAQ-AB ... 65

Os resultados do PMAQ-AB: retratos da atenção básica e os microdados de avaliação externa ... 68

Os resultados da avaliação externa do PMAQ-AB: por onde começar? ... 71

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SAÚDE? UMA ANÁLISE SOBRE SUAS CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO A PARTIR

DA SEGUNDA GUERRA ... 78

Resumo ... 78

Introdução ... 79

Das condições de fundação do Banco Mundial ... 81

O funcionamento do Banco Mundial ... 83

Avaliação na Área da Saúde... 88

Referências ... 99

MANUSCRITO 2: DISCURSOS SOBRE ACESSO E QUALIDADE EM SAÚDE PRODUZIDOS PELO PMAQ-AB ... 103

Resumo ... 103

Introdução ... 104

As condições de produção do PMAQ-AB e a valorização da avaliação da atenção básica ... 105

A análise do discurso ... 108

Adentrando ao texto da primeira portaria do PMAQ-AB ... 112

A atual portaria do PMAQ-AB: aproximações e distanciamentos ... 113

Aprofundando as questões ... 116

Considerações finais sobre um gesto analítico ... 133

Referências ... 134

MANUSCRITO 3: O ATRIBUTO ACESSO DE PRIMEIRO CONTATO NO PMAQ-AB: ANÁLISE DOS INSTRUMENTOS DE AVALIAÇÃO EXTERNA ... 138

Resumo ... 138 Introdução ... 139 Método ... 142 Resultados ... 145 Discussão ... 154 Referências ... 157

DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 161

REFERÊNCIAS ... 169 ANEXO A ... 180 ANEXOS B ... 181 ANEXO C ... 184 ANEXO D ... 189 ANEXO E ... 193

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APRESENTAÇÃO

Eu tenho à medida que designo – e este é o esplendor de se ter uma linguagem. Mas eu tenho muito mais à medida que não consigo designar. A realidade é a matéria-prima, a linguagem é o modo como vou buscá-la – e como não acho. Mas é do buscar e não achar que nasce o que eu não conhecia, e que instantaneamente reconheço. A linguagem é o meu esforço humano. Por destino tenho que ir buscar e por destino volto com as mãos vazias. Mas - volto com o indizível. O indizível só me poderá ser dado através do fracasso de minha linguagem. Só quando falha a construção, é que obtenho o que ela não conseguiu. (Clarice Lispector, 1964. A paixão segundo G.H.)

O presente trabalho começou a ser construído a partir de uma permanente inquietação com as dificuldades no âmbito da minha vivência no Sistema Único de Saúde (SUS). Percebendo que tais dificuldades não incomodam somente a mim, esta tese pretende trazer uma abordagem compreensiva para alguns eixos estruturantes do nosso sistema de saúde.

Esta tese faz parte, nos planos normativo e formativo, da construção do meu percurso profissional. Em norma, pois não é possível me tornar doutora sem a elaboração deste material, mas no que se refere à minha formação, este trabalho em muito contribuiu para meu amadurecimento como enfermeira, pesquisadora do/para o SUS e militante por uma saúde pública que respeite o povo brasileiro em seus direitos.

Meu contato com as políticas e práticas de saúde coletiva se deu ainda na graduação. Na minha identidade de coletivista carrego um importante marco de ter sido aluna bolsista do Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde (PET-Saúde), experiência que orientou meu caminhar profissional desde então. Foi a partir das experiências de pesquisa e extensão apoiadas e estimuladas pelo PET-Saúde que eu tive minhas primeiras aproximações com a realidade sempre controversa da Atenção Primária.

O interesse pela atenção primária, despertado ainda na graduação, alavancou-se durante o mestrado em Saúde Coletiva, realizado entre 2012 e 2013. Nesse período, pesquisei temas referentes às atribuições e processo de

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trabalho de profissionais da Estratégia Saúde da Família. Nesse período, também vivenciei a organização e o funcionamento dos serviços de saúde de um município do interior cearense como enfermeira, o que despertou mais curiosidade em mim e, porque não dizer, um incômodo que me motivou a compreender o que há de errado com o nosso SUS.

Ao longo do meu processo formativo (que não está encerrado) o Brasil tem passado por uma vasta crise de caráter essencialmente político que em muito influenciou na escrita deste trabalho. Em 2013, um importante movimento de reivindicação de direitos explodiu no país impulsionado pela classe trabalhadora jovem, de renda média, que reivindicou a ampliação de direitos sociais como o transporte público gratuito e a garantia de direitos constitucionais, como o acesso público à saúde e educação de qualidade. Três anos depois, em 2016, uma manobra política com o apoio da mídia, de parte do poder legislativo e judiciário foi responsável pela deposição da presidenta Dilma Rousseff, o que representou um duro golpe dirigido contra as políticas públicas que sempre tiveram como bandeira a ampliação das demandas dos movimentos sociais e dos trabalhadores e a sua representação política e social, como é o caso do Sistema Único de Saúde. Este panorama é importante ser mencionado, uma vez que, ao tempo que muito pude entender sobre as razões pelas quais o SUS “não deu certo” em seus vinte e tantos anos, vivi (e vivo) uma realidade onde há certa desesperança de melhora.

À medida que a pesquisa histórica da tese esteve sendo realizada, uma nova história foi sendo redesenhada. Assim, muito do que escrevi se mostrou mais compreensível a partir deste panorama vivido, por outro lado, algumas análises não pareciam mais adequadas. Minha participação nos movimentos de resistência na universidade e na rua me mostrou um SUS que sempre remou contra muitas marés, mas que firmemente tem resistido como uma vitória popular, mesmo distante do projeto vitorioso da década de 1980.

A minha entrada na análise do discurso (AD) é outro movimento importante para este trabalho. Em 2014, quando da entrada no doutorado, ainda com inquietações que trazia da prática, mas com muitas incertezas sobre a condução da pesquisa, tive contato com o Grupo Interdisciplinar de Pesquisas em Saúde (GIPS), do qual passei a fazer parte. O GIPS, liderado

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pela Prof.ª Dr.ª Claudia Pfeiffer, pesquisadora do Laboratório de Estudos Urbanos (Labeurb), e pelo Prof. Dr. Carlos Corrêa, meu orientador, desde 2004, tem trabalhando discursivamente questões do campo da saúde coletiva, no âmbito das políticas públicas e das práticas de saúde. Foi através do GIPS que eu trouxe para o trabalho as questões relativas ao acesso e à qualidade em saúde, mais especificamente da atenção primária. A minha aproximação com a teoria do discurso de Michel Pêcheux, já trabalhada pelo Grupo, se deu mais com o objetivo de compreender as minhas perguntas, do que de respondê-las. Nesse sentido, meu processo formativo para a AD é mais de desconstrução (de uma relação ingênua com a linguagem) para a compreensão (de mecanismos de construção e circulação de verdades cotidianas).

Finalmente, o Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB), como objeto de estudo foi uma escolha que representa o interesse de olhar para as questões do acesso e qualidade da atenção primária. Assim, ainda durante o meu processo formativo, busquei contato com a gestão municipal de um município do interior cearense para compreender os processos e desdobramentos do PMAQ-AB no âmbito local, em seu terceiro ciclo. A experiência de apoiar (mesmo parcialmente) a preparação de um município brasileiro e de suas equipes de atenção básica para o Programa (na época para a realização da autoavaliação e o recebimento da avaliação externa) contribuiu significativamente para elucidar questões pretendidas neste trabalho.

Aqui, portanto, reúno algumas análises compreensivas sobre questões de interesse para saúde, a partir de minhas leituras no campo da enfermagem, da saúde coletiva e, por último, da análise do discurso. Essas análises estão sempre permeadas de minhas impressões do cotidiano da prática dos serviços, advindas do meu olhar incômodo para os entraves do SUS, como enfermeira, pesquisadora e apoiadora. Sem a promessa de que todos os incômodos sejam respondidos (sequer compreendidos ou revelados), nesta tese carrego a esperança de que minhas impressões colaborem para a construção de uma perspectiva crítica e reflexiva sobre o SUS que queremos.

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INTRODUÇÃO

Esta tese é o consolidado de alguns dos trabalhos desenvolvidos durante o doutorado e está estruturada em partes subsequentes que completam uma análise discursiva de um corpus constituído a partir de discursos produzidos por documentos do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) e uma análise quantitativa das variáveis do referido programa.

Os resultados se organizam em três partes subsequentes e complementares e percorrem um caminho teórico-analítico a fim de refletir sobre as seguintes perguntas: De que forma as condições de produção que sustentam os discursos sobre avaliação em saúde se inscrevem no discurso do AB? Quais os efeitos de sentido a materialidade do discurso do PMAQ-AB traz para a reorientação da oferta de saúde no Brasil?

A primeira parte desta tese localiza e discute brevemente os principais conceitos que serão abordados para a constituição do corpus do trabalho: avaliação da qualidade e atenção primária à saúde.

A descrição da Atenção Primária à Saúde (APS), com seu percurso histórico, discussão de sua terminologia e definição de seus atributos, bem como o movimento de valorização da APS e seus processos avaliativos no contexto brasileiro apresenta-se neste capítulo.

Na segunda parte, os referenciais e desenhos metodológicos são discutidos com mais profundidade no intuito de apresentar a Análise do Discurso como lugar de sustentação da maior parte dessa tese. Nesta parte o Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB), objeto desse estudo, também é detalhadamente apresentado, bem como seus bancos de dados, justificando a escolha da análise de confiabilidade dos instrumentos para o trabalho com os seus dados quantitativos.

O primeiro capítulo desta parte traz um panorama geral do referencial teórico e metodológico de Michel Pêcheux e sua utilização no campo da Saúde Coletiva. É um texto publicado nas atas do 6º Congresso Internacional de

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Investigação Qualitativa, realizado em Salamanca (Espanha), em 2017. Este texto é um aliado na elaboração de análises discursivas no campo da saúde, pois cotidianamente enfrentei dificuldades de divulgar os resultados de pesquisa desenvolvidas ao longo do doutorado a partir do referencial da teoria do discurso de Pêcheux.

Já o segundo capítulo faz uma apresentação do PMAQ-AB e dos bancos de dados provenientes da avaliação externa, tendo em conta a discussão sobre a avaliação de desempenho, o uso do big data e a técnica de validação de conteúdo de instrumentos de pesquisa em saúde. Essa discussão se apresenta para facilitar o entendimento de como as questões referentes ao acesso e à qualidade da Atenção Primária, compreendidas discursivamente, estão imbricadas quantitativamente na construção dos dados de avaliação externa do PMAQ-AB.

A terceira parte, nomeada “Resultados”, traz três manuscritos que aprofundam os conceitos tratados na primeira parte a partir dos referenciais metodológicos apresentados na segunda parte.

O primeiro manuscrito, sobre avaliação em saúde e qualidade, foi escrito de maneira a dar visibilidade aos pré-construídos e condições de produção do discurso que estabilizam o sentido de avaliação como um instrumento necessário para a garantia da qualidade dos serviços de saúde. Para tanto, centramos atenção no cenário histórico de quando a avaliação passou a fazer parte das preocupações do Banco Mundial para compreender quais as relações imbricadas entre a constituição do Banco e seu olhar para a avaliação e as estratégias avaliativas de políticas públicas de saúde brasileiras atuais. Este texto, em sua forma original, foi escrito para submissão à Revista História, Ciências, Saúde – Manguinhos na seção de análises.

Para a construção do segundo artigo, adentramos na análise do discurso propriamente dita tendo como linha central do corpus de análise os documentos oficiais do Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade na Atenção Básica (PMAQ-AB). Os procedimentos de análise foram feitos por etapas que correspondem à tomada em consideração de propriedades do discurso referidas em seu funcionamento (Orlandi, 2015).

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O terceiro artigo tem como objeto de estudo o que hoje se conforma como os resultados da implantação do programa no país, os “microdados de avaliação externa do PMAQ-AB” em seu primeiro e segundo ciclo. A partir da análise estatística descritiva e de confiabilidade dos instrumentos de coleta de dados do PMAQ-AB, pretende-se verificar quantitativamente aspectos relativos à qualidade do acesso para o Programa.

Por fim, a discussão geral e considerações finais aproximam aspectos que foram levantados individualmente, na tentativa de responder ao objetivo geral da tese. Assim, finaliza-se acerca do que foi apresentado e discutido no corpo do trabalho.

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OBJETIVOS

Objetivo geral

Compreender os possíveis efeitos de sentidos produzidos a partir dos discursos das Portarias nº 1.654/2011 e nº 1.645/2015, que institui e dispõe sobre o Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade (PMAQ-AB) respectivamente, sobre as questões referentes ao acesso e à qualidade da Atenção Primária e como esses efeitos se reverberam na construção dos dados quantitativos de avaliação externa.

Objetivos específicos

- Compreender as condições de produção dos sentidos de avaliação no discurso da saúde;

- Compreender os sentidos estabilizados de acesso e qualidade da atenção primária em saúde presentes na materialidade discursiva do Programa de Melhoria do Acesso e Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB);

- Analisar a confiabilidade das variáveis relativas ao atributo acesso de primeiro contato nos instrumentos de avaliação externa do Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB).

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PARTE I

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CAPÍTULO 1: Considerações sobre a avaliação da qualidade da

atenção primária à saúde a partir de seus atributos

Desde o início do século XX, a Atenção Primária à Saúde (APS) vem sendo discutida a partir de algumas interpretações que variam entre a APS enquanto atenção primária seletiva, como um programa destinado a populações e regiões de maior pobreza e vulnerabilidade social a partir de tecnologias simples e de baixo custo; um nível de atenção de sistema de saúde, aquele mais próximo à comunidade (geralmente referido como porta de entrada) e orientado de maneira a minimizar os custos econômicos e a satisfazer as demandas da população; e como uma estratégia de organização do sistema de atenção à saúde, compreendendo-a como uma forma organização do próprio sistema de saúde para a satisfação das necessidades, demandas e representações da população (Mendes, 2015, p.32). A depender das interpretações, tem-se ainda dispersão em torno do uso dos termos Atenção Primária à Saúde e Atenção Básica, que, por vezes tomados como sinônimos, levantam sentidos diferentes sobre a organização de cuidados primários.

Fala-se que a discussão remonta o início do século XX, pois a APS, enquanto conceito, foi tomada como referência pelo Relatório Dawson que, em 1920, no Reino Unido, projetou-a como um nível dos sistemas de saúde. No entanto, como veremos, foi na década de 1970 que a discussão foi ampliada em escala mundial a partir dos desdobramentos da Conferência de Alma-Ata, que a definiu como:

“cuidados essenciais baseados em métodos de trabalho e tecnologias de natureza prática, cientificamente críveis e socialmente aceitáveis, universalmente acessíveis na comunidade aos indivíduos e às famílias, com a sua total participação e a um custo suportável para as comunidades e para os países, à medida que se desenvolvem num espírito de autonomia e autodeterminação” (OMS/UNICEF, 1979).

O conceito de qualidade da atenção primária foi uma discussão posterior que levou em conta os estudos de Starfield (2002). A autora estadunidense conceituou a APS por meio de quatro atributos essenciais: o acesso de primeiro contato, a longitudinalidade, a integralidade e a coordenação do cuidado (Starfield, 2002, p.365-6). Além desses, também definiu três atributos

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derivados: a orientação familiar, a orientação comunitária e a competência cultural (Starfield, 2002).

Embasado neste marco conceitual para a Atenção Primária à Saúde (APS), uma proposta de avaliação da efetivação dos serviços primários foi desenvolvida a partir de um instrumento que mede a presença e a extensão dos quatro atributos essenciais e dos três atributos derivados da atenção primária, além do grau de afiliação do usuário ao serviço de saúde. Muitas propostas de avaliação da APS têm como referencial esse instrumentoI, por vezes, utilizado em formato reduzido, traduzido ou adaptado (Prates et al., 2017).

O propósito deste capítulo é descrever a Atenção Primária à Saúde (APS), (re)construindo seu percurso histórico, discutindo sua terminologia e a definição de seus atributos, bem como o movimento de valorização da APS e seus processos avaliativos no contexto brasileiro.

Atenção Primária como estratégia de proteção social nos sistemas nacionais de saúde

Para a compreensão sobre o papel estratégico do que hoje conhecemos como Atenção Primária à Saúde (APS) nos sistemas nacionais, colocaremos em perspectiva as noções de proteção social nos sistemas nacionais, além de visibilizar algumas das discussões a respeito do próprio termo APS.

Tomemos aqui a definição de seguridade social que consta na Constituição Federal Brasileira de 1988, onde a atenção à saúde está inserida: “A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos

I O Instrumento de Avaliação da Atenção Primária (PCATool – Primary Care Assessment Tool) foi

desenvolvido por Starfield e colaboradores (Starfield et al, 2000; Starfield, Xu e Shi, 2001) na Johns Hopkins Primary Care Policy Center (PCPC)com base no modelo de avaliação da qualidade de serviços de saúde proposto por Donabedian (2005).

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relativos à saúde, à previdência e à assistência social” (Brasil, 1988). O que nesse recorte está empregado como direito, é a evidência de que há uma responsabilidade do poder público e da sociedade na oferta de ações e serviços de proteção às pessoas. No entanto, o sujeito-de-direitoII apontado aqui não é transparente e não se constituiu sem influência histórica.

Os primeiros sistemas de proteção social foram: a família, a comunidade, as associações filantrópicas e religiosas (Kuschnir, Fausto, 2014, p. 96). A relação do homem com o trabalho (organização de categorias profissionais, associação de trabalhadores, etc.) foi o que mediou a criação de dispositivos organizados de maneira autônoma para a proteção de grupos de pessoas a partir de contribuições para a criação de um fundo de proteção contra o risco financeiro. O Estado intervém tardiamente através da criação de um aparato jurídico para a institucionalização da solidariedade (Vianna, 2002, p.3; Kuschnir, Fausto, 2014, p. 96).

O primeiro seguro social conhecido foi instituído por Bismarck, na Alemanha, nos anos 1880, que foi expandido para outros países europeus no período e tinha por objetivo o enfrentamento do movimento operário conformando uma proposta intencional de organização do universo do trabalho – o corporativismo submetido ao Estado – e de controle social (Vianna, 2002, p.4). Hoje compreendemos esta forma de seguro social com um caráter assistencialista (implicava um contrato entre partes, sendo o Estado uma delas) e de natureza meritocrática (faz jus a um benefício aquele que, por sua inserção na estrutura ocupacional, efetuou preteritamente uma contribuição correspondente), distante, portanto, do ideário de direito sustentado atualmente.

II Tomamos aqui a noção de sujeito de direito a partir do pensamento de Haroche (1992) que analisa a

emergência de um sujeito vinculado à emergência do próprio Estado. No século XIII, reconhecia-se a existência de um “sujeito-religioso” subordinado às práticas religiosas e ao dogma cristão. O enfraquecimento da Igreja e o avanço do aparelho jurídico conduziram à formação do “sujeito-de-direito”, responsável por suas ações, com deveres e direitos, e que constituiu uma nova forma de assujeitamento, o da “autonomia relativa do sujeito” um paradoxal processo de autonomização inscrito na questão da determinação.

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Um marco no que concebemos como seguridade social foi o Relatório Beveridge que, em 1946, se tornou o documento norteador do chamado

Welfare System, que previa proteção do nascimento à morte (Vianna, 2002,

p.5). Este relatório deu as bases do Serviço Nacional de Saúde britânico (em inglês, NHS), que foi implementado para fornecer atenção integral e universal à saúde, com recursos oriundos do Estado.

Esta concepção de seguridade social em muito contribuiu para a organização da saúde em torno dos serviços primários. No entanto, desde a década de 1920 a noção de atenção primária como parte de um sistema de saúde já circulava na Europa, em virtude do relatório de Bertrand Dawson, médico inglês que trabalhou na organização de serviços de emergência na I Guerra Mundial (Mendes, 2015, p.29). Este relatório propôs uma reestruturação do modelo de atenção à saúde em serviços organizados segundo os níveis de complexidade e os custos do tratamento, no Reino Unido. Centros de saúde primários deveriam resolver a maior parte dos problemas de saúde da população e funcionar como a porta de entrada e núcleo do sistema, de forma vinculada e com o suporte de centros de saúde secundários e hospitais (Kuschnir, Fausto, 2014, p. 98).

O funcionamento do NHS durante as décadas seguintes consolidou um reconhecido modelo de sucesso do desempenho da APS em um sistema nacional. A adoção do médico generalista (o general practioner) foi uma demonstração da importância do vínculo do sistema de saúde com a comunidade na mudança do perfil de adoecimento da população, além de campanhas de imunização, incentivo ao desenvolvimento de estudos na epidemiologia (Campbell, 2016).

Em 1978, a conferência de Alma-AtaIII definiu a APS como:

III A Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, ou Conferência de Alma-Ata, foi

discutida na obra de Litsios (2002) onde o autor retrata os eventos que antecederam a conferência e o papel da União Soviética na realização do evento, ocorrido onde na antiga capital do Cazaquistão Soviético. Muito resumidamente, o autor conta da resistência da Organização Mundial da Saúde (OMS)

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“Atenção essencial à saúde baseada em tecnologia e métodos práticos, cientificamente comprovados e socialmente aceitáveis, tornados universalmente acessíveis a indivíduos e famílias na comunidade por meios aceitáveis para elas a um custo que tanto a comunidade como o país possa arcar em cada estágio de seu desenvolvimento, um espírito de autoconfiança e autodeterminação. É parte integral do sistema de saúde do país, do qual é função central, sendo o enfoque principal do desenvolvimento social e econômico global da comunidade. É o primeiro nível de contato dos indivíduos, da família e da comunidade com o sistema nacional de saúde, levando a atenção à saúde o mais próximo possível do local onde as pessoas vivem e trabalham, constituindo o primeiro elemento de um processo de atenção continuada à saúde” (OMS, 1979).

Dessa forma, sistemas de saúde ao redor do mundo passaram a reorganizar a atenção à saúde a partir dos princípios da APS. No entanto, ainda que o discurso oficial fosse da implementação da APS como “parte integral do sistema de saúde do país, do qual é função central”, inclusive no Brasil, na prática as várias vertentes de interpretação dos cuidados primários coexistiram, mostrando experiências com enfoques diferentes ao redor do mundo e, naturalmente, também com resultados diferentes. A OPAS/OMS reconhece quatro vertentes de APS (OPAS, 2008, p.4): APS seletiva, APS como nível primário e APS abrangente e APS de enfoque em saúde e direitos humanos.

O conceito de Atenção Primária “Seletiva” foi fundamentalmente ancorado em análises de custo-eficácia (Mello, Fontanella, Piva, 2009). Essa abordagem foi inaugurada a partir dos encontros de grandes agências financiadoras internacionais (Fundação Rockfeller, Banco Mundial, UNICEF, Agência de Desenvolvimento Internacional dos EUA, Fundação Ford, Centro de Pesquisa e Desenvolvimento Internacional do Canadá, entre outras) em Bellagio, na Itália, desde 1979, para discutir o custo e a abrangência das

em realizar a conferência, em virtude da insistência em programas focais de erradicação da malária e controle de outras doenças. A União Soviética, no entanto, sustentava uma posição de que havia necessidade de investimento no desenvolvimento dos sistemas universais de saúde mais do que atenção à malária. A Conferência de Alma-Ata foi uma vitória dos soviéticos na recomendação dos princípios para o desenvolvimento de serviços de saúde.

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propostas da APS de Alma-ata e se apoiou na oferta de um pacote seletivo de cuidados básicos em saúde (Cueto, 2004).

A APS como nível primário representa o primeiro nível de contato dos indivíduos, da família e da comunidade com um sistema de saúde que também dispõe de outros níveis de atenção. É, portanto, um modo de organizar e fazer funcionar a porta de entrada do sistema, enfatizando a função resolutiva desses serviços sobre os problemas mais comuns de saúde (Mendes, 2015).

A APS abrangente é aquela definida na Declaração de Alma-ata e aprovada, por unanimidade, como meta de seus países membros para atingir a “saúde para todos no ano 2000” (OMS, 1979). Essa interpretação depende de um conceito ampliado de saúde(a saúde como produto da relação entre seus determinantes e condicionantes, como hábitos de vida, ambiente, educação e trabalho) e implica a articulação da APS como parte e como coordenadora de uma Rede de Atenção à Saúde (RAS) (Mendes, 2015).

A APS com enfoque em Saúde e Direitos Humanos enfatiza a compreensão da saúde como direito humano e a necessidade de abordar os determinantes sociais e políticos mais amplos da saúde (OPAS/OMS, 2008). Difere em sua ênfase sobre as implicações sociais e políticas da declaração de Alma-ata mais do que sobre os próprios princípios.

O Quadro 1 resume cada uma dessas abordagens da APS, detalhando suas ênfases (Quadro 1).

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Quadro 1. Abordagens da Atenção Primária à Saúde.

Abordagem Definição ou conceito de APS Ênfase

APS Seletiva

Enfoca um número limitado de serviços de alto impacto para enfrentar alguns dos desafios de

saúde mais prevalentes nos países em

desenvolvimento. Os serviços principais tornaram-se conhecidos como GOBI (monitoramento de crescimento, terapia de reidratação oral, amamentação e imunização) e algumas vezes incluíram complementação alimentar, alfabetização de mulheres e planejamento familiar.

Programa específico

desti-nado a populações e

regiões pobres a quem se oferece, exclusivamente, um conjunto de tecnologias simples e de baixo custo, provido por pessoal de bai-xa qualificação profissional.

Nível primário

Refere-se à porta de entrada do sistema de saúde e ao local de cuidados contínuos de saúde para a maioria das pessoas, na maior parte do tempo. Trata-se da concepção mais comum dos cuidados primários de saúde em países da Europa e em outros países industrializados. Em sua definição mais estreita, a abordagem é diretamente rela-cionada à disponibilidade de médicos atuantes com especialização em clínica geral ou medicina familiar. Nível de atenção em um sistema de serviços de saúde APS abrangente

Compreende a definição de APS na Declaração de Alma Ata, como uma forma singular de apropriar, recombinar e reordenar todos os recursos do sistema para satisfazer às necessidades, demandas e representações da população.

Uma estratégia para

organizar os sistemas de atenção em saúde e para a

sociedade promover a saúde. Enfoque em Saúde e Direitos Humanos

Defende que o enfoque social e político da APS deixou para trás aspectos específicos de doenças e que as políticas de desenvolvimento devem ser mais inclusivas, dinâmicas, transparentes e apoiadas por compromissos financeiros e de legislação.

Uma filosofia que permeia os setores social e de saúde.

Fonte: OPAS/OMS, 2008; Mendes, 2015.

Em países da Europa e em outros países ditos desenvolvidos, a APS foi vista primariamente como o primeiro nível de serviços de saúde para toda a população (OPAS, 2008, p.5). No mundo em desenvolvimento, a APS foi originalmente “seletiva”, concentrando-se em algumas poucas intervenções de alto impacto para combater as causas mais prevalentes de mortalidade infantil e algumas doenças infecciosas (Kuschnir, Fausto, 2014). Uma abordagem nacional abrangente da APS foi implementada em apenas poucos países, embora outros pareçam caminhar nesta direção. No Brasil, a APS tem sido pensada como parte e coordenadora de uma Rede de Atenção à Saúde (RAS), embora tenhamos dificuldades em superar o modelo de APS seletiva, na qual estruturamos a atenção primária durante muitos anos (Mendes, 2015).

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Além das diferentes abordagens em relação ao escopo de ações e objetivos da atenção primária nos sistemas de saúde, há ainda a frequente utilização de termos diferentes para designação da APS. Os mais comuns são: Atenção Primária – ou Atenção Primária à Saúde (APS) – e Atenção Básica, termo correspondente à APS no BrasilIV.

A frequente discussão que se apresenta em torno das terminologias de atenção primária revela que, mais que uma questão de preferência, os termos empregados têm diferentes significados epistemológicos, construídos ao longo do tempo e influenciados historicamente.

Na literatura, encontramos evidências de que o termo Atenção Básica tem raízes na APS seletiva, incentivada pelas agências financiadoras internacionais na organização das ações de saúde (Gil, 2006, p.1179; Mello, Fontanella, Piva, 2009, p.209-210), especialmente ao considerar a perspectiva com que foi desenvolvida a Saúde da Família no Brasil. O termo Atenção Primária à Saúde, por outro lado, não tem uma base conceitual clara, tendo sido usado pela primeira vez em documentos oficiais vinculados à igreja católica, na década de 1970, e influenciou a OMS no emprego do vocábulo (Mello, Fontanella, Piva, 2009, p.206).

Neste trabalho, com exceção dos trechos diretamente retirados dos documentos emitidos pelo Ministério da Saúde ou àqueles que fazem referência a esses documentos, optou-se pela utilização do termo Atenção Primária (à Saúde), universalmente utilizado por pesquisadores do tema.

A definição dos atributos e a qualidade da APS

No que se refere aos enfoques e abordagens da Atenção Primária à Saúde, a pesquisadora Bárbara Starfield e seu grupo de trabalho na

IV No Artigo 1º, Parágrafo único da PNAB, está descrito: “a Política Nacional de Atenção Básica considera

os termos Atenção Básica - AB e Atenção Primária à Saúde - APS, nas atuais concepções, como termos equivalentes” (Brasil, 2017).

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Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, operacionalizaram a concepção de APS em sua perspectiva abrangente, aquela que organiza os sistemas de atenção em saúde e para a sociedade promover a saúde (Starfield, 2002).

A construção de seu modelo em muito influenciou a chamada “APS Renovada” (OPAS, 2008), proposta da Organização Panamericana de Saúde (OPAS) para a reconfiguração da APS a partir de considerações sobre: (1) o surgimento de novos desafios epidemiológicos que exigiam a evolução da APS para enfrenta-los; (2) a necessidade de corrigir os pontos fracos e as inconsistências presentes em algumas das abordagens amplamente divergentes da APS; (3) o desenvolvimento de novas ferramentas e o conhecimento de melhores práticas que a APS pode capitalizar de forma a ser mais eficaz; (4) e um crescente reconhecimento de que a APS é uma ferramenta para fortalecer a capacidade da sociedade de reduzir as iniquidades na área da saúde (OPAS, 2008, p.iii). Nesse construto, o trabalho de Starfield (2002) esteve muito relacionado ao ponto três.

Tendo como mecanismo proposto para a renovação “a transformação dos sistemas de saúde, de modo que estes adotem a APS como seu fundamento” (OPAS, 2008, p.iii), a OPAS passou a considerar que tais sistemas

“[devem ser] dirigidos por princípios da APS, capazes de responder às necessidades em saúde da população, com orientação para a qualidade, responsabilidade governamental,

justiça social, sustentabilidade, participação e

intersetorialidade.” (OPAS, 2008, p.iii-iv)

Orientação para a qualidade é tomado aqui em uma perspectiva

organizacional de adoção de práticas de gerenciamento e organização, para o alcance da eficiência e efetividade (OPAS, 2008, p. iv), conceitos associados à

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noção de qualidade oriunda da indústria, conforme veremos em capítulo posteriorV.

Nesse bojo, a APS foi definida como um conjunto de valores – direito ao mais alto nível de saúde, solidariedade e equidade – um conjunto de princípios – responsabilidade governamental, sustentabilidade, intersetorialidade, participação social, entre outros – e como um conjunto indissociável de

elementos estruturantes (atributos) do sistema de saúde: acesso de primeiro

contato, integralidade, longitudinalidade, coordenação, orientação familiar e comunitária e competência cultural (Figura 1).

Figura 1. Valores, Princípios e Elementos Estruturantes da Atenção Primária à Saúde.

Fonte: Elaborada pela autora. Adaptada de: Brasil, 2010a.

V Esta noção de qualidade da APS difere daquela proposta pela Organização Mundial de Saúde (OMS),

que se orienta para a obtenção de padrões e valoriza a busca por evidências, conforme descreve: “os serviços de atenção primária à saúde devem ser social e culturalmente aceitáveis e em conformidade com os padrões de prática científica e clínica, e em um nível que será percebido como adequado pelos beneficiários” (Al-Assaf, Sheikh, 2004).

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O atributo acesso de primeiro contato é a “acessibilidade e uso do serviço a cada novo problema ou novo episódio de um problema” (Starfield, 2002, p.61). Indica os serviços de porta de entrada regularmente procurados cada vez que os usuários necessitam de atenção em caso de novo problema de saúde ou de acompanhamento para um problema de saúde. Esse atributo envolve acessibilidade e acesso, termos frequentemente utilizados como sinônimos, mas que resguardam diferenças.

A longitudinalidade “pressupõe a existência de uma fonte regular de atenção e seu uso ao longo do tempo” (Starfield, 2002, p.62). Significa a responsabilidade assumida pela equipe em relação ao usuário quanto à continuidade da relação equipe/usuário ao longo da vida, independente da ausência ou presença de doença.

A integralidade implica em “fazer arranjos para que o paciente receba todos os tipos de serviços de atenção à saúde” (Starfield, 2002, p.62). É a capacidade do serviço em reconhecer a variedade completa das necessidades do paciente e disponibilizar os recursos para abordá-las. Este atributo, para a autora, deve ser orientado tanto para o nível populacional, em que as necessidades da população definem a variedade dos serviços, quanto para o nível institucional, onde a variedade se baseia em diretrizes, normas e protocolos (Starfield, 2002, p.62).

A coordenação do cuidado, que é a “disponibilidade de informações a respeito de problemas e serviços anteriores e o reconhecimento daquela informação na medida em que está relacionada às necessidades para o presente atendimento” (Starfield, 2002, p.365-6). Diz respeito à integração dos sistemas de saúde e qualidade do cuidado. A OMS destaca o papel da

coordenação como atenção continuada relacionando-a à

abrangência/integralidade:

A atenção continuada é um complemento à abrangência no sentido de requerer integração entre todas as partes do sistema de saúde, a fim de garantir o atendimento às necessidades e o prosseguimento dos cuidados de saúde ao longo do tempo e dos diferentes locais e instâncias de cuidados, sem interrupção. Para a população, o cuidado continuado implica em acesso contínuo a referências e contra– referências por toda a vida, a todos os níveis do sistema de saúde e, algumas vezes, a outros serviços de seguridade

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social. No âmbito dos sistemas, a atenção continuada requer o desenvolvimento de redes de serviços e de prestadores, sistemas apropriados de informação e gestão, incentivos, políticas e procedimentos, e treinamento de prestadores de serviços, equipes e administradores de saúde. (OMS, 2008, p.13)

Além desses, também definiu três atributos derivados: a orientação familiar, decorrente da consideração do contexto familiar na atenção integral; a orientação comunitária, que decorre do reconhecimento das necessidades sociais; e a competência cultural, que envolve a atenção às necessidades de uma população com “características culturais especiais” (Starfield, 2002, p.538-540).

Com essa conformação de APS, logo se propôs um modelo para a avaliação da efetivação desses atributos. Starfield e colaboradores (Starfield et al., 2000; Starfield, Xu e Shi, 2001) desenvolveram o Instrumento de Avaliação da Atenção Primária (PCATool – Primary Care Assessment Tool).

O PCATool apresenta originalmente versões autoaplicáveis destinadas a crianças (PCATool versão Criança), a adultos maiores de 18 anos (PCATool versão Adulto), a profissionais de saúde e, também, ao gerente do serviço de saúde. Propõe-se a medir a presença e a extensão dos quatro atributos essenciais e dos três derivados da APS.

O PCATool foi criado com base no modelo de avaliação da qualidade de serviços de saúde proposto por Donabedian (2005). Este modelo de avaliação, como vimos, se baseia na mensuração de aspectos de estrutura, processo e resultados dos serviços de saúde.

O instrumento, em 2010, passou por uma adaptação para a realidade brasileira onde cada versão original do instrumento foi transformada em uma ferramenta aplicável por meio de entrevistadores, tendo passado por um processo de tradução e tradução reversa, adaptação, debriefing e validação de conteúdo e de construto, além da análise de confiabilidade (Brasil, 2010a).

Cada atributo essencial identificado no instrumento PCATool-Brasil é formado por um componente relacionado à estrutura e outro ao processo de atenção (Quadro 2).

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Quadro 2. Organização avaliativa do Primary Care Assessment Tool (PCATool-Brasil) no que se refere às dimensões da Atenção Primária à Saúde (APS).

Atributo Dimensão da avaliação

Estrutura Processo

Acesso de primeiro contato Acessibilidade Utilização

Longitudinalidade Grau de afiliação Continuidade do cuidado

Integralidade Serviços Disponíveis Serviços Prestados

Coordenação do cuidado Sistema de Informações Integração de Cuidados

Fonte: Elaborado pela autora. Adaptado de: Brasil, 2010a.

A discussão sobre qualidade se estende ainda para os sistemas de saúde. A autora define ainda em sua obra os chamados aspectos fundamentais, mas não exclusivos da APS, que orientam a mensuração da qualidade dos sistemas de saúde. São eles: “(1) a adequação dos prontuários médicos, (2) a continuidade do pessoal, (3) a comunicação profissional-paciente, (4) a qualidade da atenção e (5) a proteção dos pacientes” (Starfield, 2002, p.489).

A organização da Atenção Primária brasileira: atenção básica e a Estratégia Saúde da Família

No Brasil, a estruturação da Atenção Primária à Saúde (APS) no Sistema Único de Saúde (SUS) resguarda uma profunda sintonia com os movimentos em prol da redemocratização ocorridos na década de 1980. As diversas experiências de organização e oferta da APS no sistema de saúde convergiram para o modelo de Saúde da Família, adotado progressivamente a partir dos anos 1990 (Brasil, 2012, p.27).

Mesmo com a adoção da Saúde da Família como modelo prioritário para a APS, no Brasil coexistem variados modelos de cuidados primários. Mendes (2015, p.38) os descreve:

“Há o modelo tradicional em que médicos e enfermeiros generalistas sem formação específica em saúde da família atendem a uma população com ênfase em consultas médicas e de enfermagem. Há o modelo Semachko, oriundo da experiência russa bolchevique de organização de cuidados primários providos por uma tríade de médicos especialistas: clínico, gineco-obstetra e pediatra. Há o modelo de medicina de família e comunidade estrito senso, calcado em modelos europeus e canadense, em que a centralidade do cuidado faz-se por meio de consultas médicas propiciadas por médicos generalistas ou por especialistas em medicina de família e

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comunidade. E há o modelo do PSF em que se ofertam serviços de médicos e enfermeiros generalistas, de técnicos e/ou auxiliares de enfermagem, de alguns outros profissionais de nível superior sob a forma de Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) e de agentes comunitários de saúde. Há, por fim, modelos mistos que articulam alguns desses diferentes modelos em uma única unidade de APS” (Mendes, 2015, p.38).

A coexistência de tantos modelos pode nos levar à reflexão sobre questões ligadas ao histórico da APS no Brasil.

Pensemos de início no próprio avanço na concepção de (direito à) saúde do Estado brasileiro. A noção de proteção social e a conformação do sistema de saúde no Brasil têm modificado o papel legal do Estado na garantia do direito à saúde, assumindo vários formatos: desde o mais excludente até o universal. Esses aspectos relativos à compreensão da saúde como direito podem se constituir como elementos para o debate.

Historicamente, a APS brasileira teve interferência do relatório dawsoniano, mas o desenvolvimento das ações primárias, estruturalmente, foi mais influenciado pelos pensamentos latino-americanos sobre atenção primária, especialmente dos intelectuais da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), na década de 1950. Esse modelo – não sem interferência do sentido de cuidado à saúde estabilizado na épocaVI – implicou no desenvolvimento de ações focais de prevenção das doenças, incorporando à atenção médica um modelo dirigido especialmente para o grupo materno-infantil e para as doenças infecciosas como tuberculose e hanseníase, além dos denominados “programas de saúde pública”, exercitados com algum grau de verticalidade (Baptista, 2014, p.31;Mendes, 2015, p.30).

Nas décadas de 1970 e 1980, a emergência da proposta de APS, na cena internacional, referendada pela Conferência de Alma-Ata provocou, no Brasil, o desenvolvimento de experiências de expansão da atenção primária

VI Na década de 1940, ocorreu a criação da Organização Mundial de Saúde (OMS) e o desenvolvimento

da máxima “saúde como um estado de completo bem-estar físico, mental e social” (OMS, 1946). A medicina preventiva e comunitária ganhou destaque, no Brasil no período democrático-populista Populista (1946-1967), com a valorização do pensamento social de atendimento integral de saúde.

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seletiva no interior do país (Mendes, 2015, p.31). Como exemplo, temos o Programa de Interiorização das Ações de Saúde e Saneamento (que começou pela região nordeste, em 1976, e alcançou abrangência nacional em 1979). Nos anos 80, como desdobramento do debate promovido na VII Conferência Nacional de Saúde, instituem-se as Ações Integradas de Saúde, que objetivavam a integração de serviços de assistência básica à saúde da população.

Na constituição do Sistema Único de Saúde (SUS), na década de 1990, a APS se coloca como a proposta que assegura os avanços técnicos-operacionais da Constituição Federal de 1988 e, portanto, para a efetivação do novo sistema de saúde. Nos anos seguintes, foram definidas formas de operacionalização e modelos de atenção para a consolidação da APS no SUS, através de uma extensa base regulamentadora federal. Em 2011, o Decreto n. 7.508, que regulamentou a Lei Orgânica do SUS, fez uma clara predileção pela APS no reordenamento do SUS (Brasil, 2011a).

Entre os modelos de atenção, a Saúde da Família tem ocupado um lugar estratégico no Brasil. Este modelo tem inspirações nas experiências do Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), no Ceará, e do Programa Médico de Família, desenvolvido na cidade de Niterói, no Rio de Janeiro, tendo se consolidado a partir dos investimentos financeiros feitos pelo Ministério da Saúde com o apoio de agências de fomento internacionaisVII (Bodstein et al., 2006).

A princípio, em 1994, foi definido como um Programa – o Programa de Saúde da Família (PSF) – em que uma equipe de saúde e a população acompanhada criariam vínculos de co-responsabilidade, o que facilitaria a

VII Considerando o papel que o contexto internacional exerce nas definições das políticas de saúde

brasileiras e seu poder de influência na determinação de modelos e práticas assistenciais, reconhecemos que o investimento do Banco Internacional de Reconstrução para o Desenvolvimento (BIRD) cumpriu um papel central na consolidação do modelo de saúde da família como estratégia prioritária da atenção primária no Brasil. Este investimento se concretizou através do financiamento do Projeto de Expansão e Consolidação da Estratégia Saúde da Família (PROESF), que teve como resultado a extensão da cobertura da ESF em todo território brasileiro (Bodstein et al, 2006).

Referências

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