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Brincadeira de mamãe

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Academic year: 2021

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ZÉLIA ALVES CORDEIRO

“BRINCADEIRA DE MAMÃE: SUBJETIVIDADES ENTRELAÇADAS”

Tubarão/SC 2013

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ZÉLIA ALVES CORDEIRO

“BRINCADEIRA DE MAMÃE: SUBJETIVIDADES ENTRELAÇADAS”

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Educação da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação.

Orientador: Professor Christian Muleka Mwewa, Dr.

Tubarão/SC 2013

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ZÉLIA ALVES CORDEIRO

“BRINCADEIRA DE MAMÃE: SUBJETIVIDADES ENTRELAÇADAS”

Esta dissertação foi julgada adequada à obtenção do título de Mestre em Educação e aprovada em sua forma final pelo Curso de Mestrado em Educação, da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Tubarão, _____ de ______________ de 2013.

______________________________________________________ Professor Christian Muleka Mwewa, Dr.

Orientador - Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Profª. Eloisa Acires Candal Rocha, Drª.

Examinadora - Universidade Federal de Santa Catarina

______________________________________________________ Profª. Vera Lúcia Chacon Valença, Drª.

Examinadora - Universidade do Sul de Santa Catarina

_____________________________________________________ Profª. Caroline Machado Momm, Drª.

Examinadora - Universidade Federal de Santa Catarina /Núcleo do Desenvolvimento Infantil

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Dedico à minha família:

Àquela que me deu origem e onde fixei as minhas raízes.

E à linda família que, com a graça e a proteção de Deus, eu pude constituir.

Com afeto, a Júlio, esposo e companheiro que soube entender o momento especial que eu estava vivendo com seus desafios às minhas dúvidas e limitações e aos quais com sua presença e apoio pude ultrapassar.

Com um amor doce e infinito, a Brenda, filha querida, compreensiva e pacienciosa, uma mão amiga.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à Universidade do Sul de Santa Catarina, centro de pesquisa, extensão e difusão do conhecimento e da cultura, pela aceitação, qualificação e orientação de meu projeto ao Programa de Pós-graduação em Educação. Agradeço pelo acompanhamento seguro durante o desenvolvimento da dissertação ao Curso de Mestrado em Educação.

A realização desse Mestrado em Educação vai além de um anseio intelectual, da mera curiosidade científica – é a retomada de uma trajetória iniciada com a opção pela Educação Infantil como matéria de trabalho, pesquisa e encantamento cotidiano.

Agradeço aos professores do Mestrado em Educação que acolheram as minhas falas, interpretando-as e indicando-me o melhor procedimento de registrá-las com fidelidade.

Em especial, agradeço ao professor Doutor Christian Muleka Mwewa cujas orientações enriqueceram teórica e praticamente a minha pesquisa. Trabalhar a partir de sua orientação experiente, clara, segura criou um vínculo importante e necessário de confiança, fundamental na atividade intelectual.

Agradeço, ainda, às professoras doutoras Eloisa Acires Candal Rocha, minha examinadora da Universidade Federal de Santa Catarina; Vera Lúcia Chacon Valença, da Universidade do Sul de Santa Catarina e Caroline Machado Momm, da Universidade Federal de Santa Catarina/Núcleo do Desenvolvimento Infantil, que tanto dedicação exerceram a função de examinadoras desta acadêmica.

Agradeço, também, aos colegas de caminhada no Centro Educacional Infantil e no próprio curso porque sua presença me animou e me confortou na hora necessária.

Principalmente, agradeço às crianças do Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II de Araranguá/SC por se fazerem presentes na minha vida, enriquecendo-a com suas personalidades que vejo, pouco a pouco, desenvolverem-se e diferenciarem-se – o meu universo cotidiano e desafiador.

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Brincando de casinha

Minha casa tem jardim, Minha casa tem quintal, Minha casa tem cozinha, Minha casa tem varal.

Das ervinhas faço chá, prá dor-de-tudo passar. Dos legumes faço sopa, prá ter saúde sem engordar. Tudo fica tão gostoso, quando estou no meu lugar, Que noutro quintal (nem pensar!),

Não pretendo morar.

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RESUMO

A presente dissertação se ocupou em pesquisar a respeito da brincadeira de mamãe (mais comumente conhecida como brincadeira de casinha) e sua contribuição no desenvolvimento da criança no contexto social do Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II em Araranguá/SC. Para tanto estabelecemos o paralelo e o entrelaçamento de algumas teorias relacionadas ao tema do brincar na infância, enfatizando a importância da brincadeira de mamãe, vivenciada no dia a dia da criança na faixa etária da Educação Infantil. Algumas observações preliminares originaram o seguinte questionamento: Por que nas brincadeiras rotineiras na faixa etária de três e quatro anos, a brincadeira de mamãe/casinha é tão

significativa para as crianças do Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II em

Araranguá/SC? O percurso realizado iniciou-se por coleta de dados com instrumentos como questionários e observações realizadas no período de abril a junho de 2012 cujo propósito foi compreender o porquê das crianças com idade entre três e quatro anos em uma turma de vinte e dois alunos do Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II de Araranguá/SC gostavam tanto da brincadeira de mamãe. Os resultados apontam para a possibilidade de que a brincadeira de mamãe reflete, em alguma medida, as subjetividades entrelaçadas oriundas das relações travadas no cotidiano das crianças com seu meio escolar e familiar. Percebe-se o importante diferencial que o mundo da imaginação proporciona, isto é, o fazer de conta como a possibilidade de fazer e refazer, tendo a segurança consciente de que os atos ali vivenciados nada mais são do que possibilidades.

Palavras-chave: Brincadeira de mamãe. Brincar de casinha. Criança. Entrelaçamento de subjetividades. Infância.

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ABSTRACT

This dissertation research busied about Mom's play (more commonly known as the outhouse joke) and its contribution to child development in the social context of the Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II em Araranguá/SC. To establish both the parallel and interlacing of theories related to the theme of play in childhood, emphasizing the importance of mother's play, experienced in everyday life of the child in the age group of early childhood education. Some preliminary observations led to the question: Why play in routine aged three and four years, play the mother / house is so significant for children's Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II em Araranguá/SC? The route taken was started by collecting data with instruments such as questionnaires and observations made during the period from April to June of 2012 whose purpose was to understand why children aged three and four years in a class of twenty-two students of the Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II em Araranguá/SC were so fond of playing Mom. The results point to the possibility that Mommy's play reflects, to some extent, intertwined subjectivities arising from relationships developed in the daily lives of their children through school and family. Realizes the important difference that the world of imagination provides, ie, pretend like the ability to make and remake, with safety aware that there experienced acts are nothing more than opportunities.

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LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

CEI Centro Educacional Infantil CF/88 Constituição Federal de 1988 CLT Consolidação das Leis do Trabalho ECA Estatuto da Criança e do Adolescente LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação NDI Núcleo de Desenvolvimento Infantil NEI Núcleo de Educação Infantil

SESAS Secretarias de Bem Estar Social da Família UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância

UNISUL Universidade do Sul de Santa Catarina

ANPED Associação Nacional de Pesquisa e Pós Graduação em Educação CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CEB Câmara da Educação Básica

CMEIs Centros Municipais de Educação Infantil CNE Conselho Nacional de Educação

COEDI Coordenação de Educação Infantil COEPRE Coordenação de Educação Pré-Escolar

CONPEB Comitê Nacional de Políticas da Educação Básica DAE Departamento de Administração Escolar

DCN-EI Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Infantil DEI Divisão de Educação Infantil

DEPE Divisão de Educação Pré-Escolar

FESC Fundação Educacional de Santa Catarina

INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais LBA Legião Brasileira de Assistência

LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação MEC Ministério da Educação e Cultura MRC Movimento de Reorientação Curricular NDI Núcleo de Desenvolvimento Infantil

NUPEIN Núcleo de Estudos e Pesquisas da Educação na Pequena Infância OMEP Organização Mundial de Educação Pré-Escolar

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PCN Parâmetros Curriculares Nacionais PNE Plano Nacional de Educação PPP Projeto Político-pedagógico

PROEPRE Programa de Educação Pré-Escolar PSEC Plano Setorial de Educação e Cultura

PSECD Plano Setorial de Educação, Cultura e Desporto

RCNEI Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil RME Rede Municipal de Educação

SESAS Secretaria de Educação, Saúde e Assistência Social SME Secretaria Municipal de Educação

UFSC Universidade Federal de Santa Catarina

UNESCO Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura CONSED Conselho Nacional de Secretários da Educação

ANFOPE Associação Nacional pela Formação de Profissionais da Educação UNDIME União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 12

CAPÍTULO 1: CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS SOBRE A EDUCAÇÃO INFANTIL

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CAPÍTULO 2: NOTAS SOBRE A INFÂNCIA E A CRIANÇA 25

2.1 Evolução Histórica da Infância e a Criança 25

2.2 Infância e Criança na Constelação Teórica 28

CAPÍTULO 3: BRINCADEIRA DE MAMÃE: SUBJETIVIDADES ENTRELAÇADAS

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3.1 O caminhar da Instituição Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II 45

3.2. A rotina do CEI Cantinho do Amor II 46

3.3. A Paisagem do CEI Cantinho do Amor II: a Realidade da Instituição 48

3.4. O Cotidiano da Turma: possibilidades e experiências 53

CAPÍTULO 4: A MEDIAÇÃO DO LÚDICO: A RELAÇÃO ENTRE AS

INSTÂNCIAS DA BRINCADEIRA E DA VIDA FAMILIAR 75

CONSIDERAÇÕES FINAIS 115

REFERÊNCIAS 120

ANEXO A - Cuidados Éticos da Pesquisa 128

APÊNDICE A - Roteiro da Entrevista Semiestruturada com as Professoras das

Crianças com idades entre três e quatro anos 130

APÊNDICE B - Entrevista Semiestruturada para as Mães de Crianças de três e

quartos anos da CEI Cantinho do Amor II 131

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INTRODUÇÃO

Sou homem;

nada que seja humano me é estranho.

Terêncio

As pesquisas no campo da infância têm reforçado a importância do brincar na Educação Infantil. A questão da brincadeira consegue, lentamente, se incorporar como uma experiência de cultura infantil nas práticas pedagógicas. Em muitas situações, porém, o brincar tem sido restringido a uma atividade paralela e de menor valor, um verdadeiro passatempo, a liberação de energias ou o relaxamento dos que nela estão envolvidos.

Este texto defende que os espaços da escola e os tempos institucionais deveriam garantir às crianças a possibilidade de imaginar, fantasiar, criar novas ordens, estabelecer laços de amizade, relações de sociabilidade e construir suas culturas próprias. A compreensão do brincar tem importantes implicações pedagógicas circunscritas à necessidade de a escola favorecer a ampliação das experiências das crianças, pois “quanto mais [a criança] veja, ouça, experimente, quanto mais aprenda e assimile, quanto mais elementos reais ela disponha em sua experiência, tanto mais considerável e produtiva será [...] a atividade de sua imaginação” (VIGOTSKI, 1987, p. 18).

A ciência da educação vem desenvolvendo importantes estudos nas últimas décadas tanto em relação às pesquisas educacionais quanto aos modelos conceituais e aos métodos de trabalho. O texto optou por um caráter epistêmico, descritivo, crítico, sintético e dinamizador de pesquisa na tentativa de estabelecer uma dialética entre o pensamento, a teoria e a prática na educação infantil. Daí, a razão pela qual a coleta de dados foi realizada em referenciais teóricos, seguindo fontes de informação de campo e bibliográfica, ou seja, primeiro se estabeleceu um contato com o campo e depois retornamos às referências bibliográficas estabelecendo um movimento de idas e vindas intermediado pela reflexão.

A pesquisa teve como locus um ambiente educacional de crianças de 0 a 4 anos de uma entidade filantrópica. Partindo de um estudo etnográfico, a pesquisa analisou e descreveu como as crianças de uma turma de alunos de 3 a 4 anos se portavam em suas brincadeiras, em especial, na brincadeira de mamãe, colocando sua realidade familiar no contexto escolar através da brincadeira, uma realidade cuja observação reiterada despertou o interesse de realizar a pesquisa. O Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II na cidade de Araranguá/SC atende 80 crianças de 0 a 4 anos, de uma comunidade de baixa renda, na Vila

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São José, conhecida como Vila Samaria ou Buraco Quente, devido aos problemas sociais vivenciados pelos seus moradores. Dentre estes problemas pode-se citar a dependência química ao uso de drogas e alcoolismo, prostituição, falta de infraestrutura sanitária, pouco policiamento etc., ou seja, a quase ausência do Estado.

Para que se pudessem esclarecer pontos essenciais da pesquisa, com visões diferenciadas da brincadeira de mamãe ou “brincadeira de casinha1”, os procedimentos utilizados foram qualitativos e quantitativos assumindo abordagem teórico-metodológica de caráter etnográfico. Além do olhar da pesquisadora, os estudos foram focados na compreensão das crianças e de suas infâncias, nos diversos contextos do seu brincar, a partir do questionamento dos porquês de esse brincar ser tão significativo2 para essas crianças em suas brincadeiras cotidianas e rotineiras.

No transcurso da abordagem etnográfica, junto aos estudos bibliográficos referentes ao tema, foram elaboradas “as categorias iniciais de análise, as perguntas e questionamentos” (ANDRÉ, 1995, p. 106) que orientaram a coleta de dados, tais como: ‘as concepções teóricas de infância, criança, educação infantil; as subjetividades entrelaçadas na brincadeira de mamãe; a Instituição Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II; o lúdico e a sua mediação entre as instâncias do vivenciado e do faz de contas’ (imaginado).

No segundo momento, que corresponde ao “trabalho de campo propriamente dito, que envolve a observação direta e intensiva e as estratégias que visam captar as opiniões e representações dos atores sociais” (ANDRÉ, 1995, p. 107), e no intuito de “apreender a situação e descrever a complexidade” (GOLDENBERG, 2003, p. 34) das relações que se estabelecem num ambiente social concreto, foram realizados os dois momentos de inserção no campo, juntamente com a realização de entrevistas e análise de documentos que foram detalhadas em busca de seu significado. Para a realização desses procedimentos, transitou-se pelas comunidades atendidas pelo CEI Cantinho do Amor II, conversando com famílias, moradores e pessoas relacionadas à vida cotidiana na instituição.

A pesquisa partiu do questionamento: Por que nas brincadeiras rotineiras na faixa etária de três e quatro anos, a brincadeira de mamãe/casinha é tão significativa para as

criançasCentro Educacional Infantil Cantinho do Amor II em Araranguá/SC?

1 Diante da necessidade de reafirmar o local discursivo (MWEWA, 2011) dos agentes envolvidos neste texto nos referiremos à “Brincadeira de casinha” enquanto Brincadeira de mamãe, pois esta denominação reflete a referência a esta brincadeira naquele contexto.

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Fez-se um cotejamento com o campo e percebeu-se a reincidência desta brincadeira em diversos dias das nossas observações preliminares.

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O objetivo principal da pesquisa foi analisar as relações e tensões que as crianças do Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II em Araranguá/SC estabelecem entre si durante o momento da brincadeira de mamãe.

Essa análise parte, portanto, da consideração de que a brincadeira é um palco de experiências subjetivas para todas as crianças, no local em que elas vivem e por meio de negociações com adultos e de produções, a partir da imaginação, de uma série de culturas com seus pares, ou seja, com outras crianças.

Como objetivos intermediários ou específicos o estudo pretendeu, ainda: a)

procurar reconhecer e compreender as significações produzidas por aquelas crianças naquele contexto social [creche] durante o momento da brincadeira de mamãe de modo a se construírem como sujeitos; b) verificar as estratégias que potencializam o desenvolvimento da afetividade e da subjetividade através do lúdico no contexto da creche, pelas crianças dessa faixa etária (três e quatro anos); c) avaliar a influência dos pares e do adulto, na participação das crianças na cultura adulta; d) socializar os resultados constatados com outros estudiosos do tema, pela utilização de registros de imagens e falas dos envolvidos.

A opção por este tipo de pesquisa se deve ao entendimento de que a pesquisa etnográfica nos fez acreditar que o conhecimento se constrói pela interação entre seres humanos, desenvolvida em contexto social e no ambiente escolar e, por isso, ‘ele está ligado ao cotidiano da criança’. E, considerando que a criança é um indivíduo determinado no espaço e no tempo, não um elemento pertencente a uma espécie distinta, ela faz parte de um contexto em que se inserem os demais indivíduos. Como referem Rivero, Coutinho e Batista (2009, p. 29), “[...] tratava-se de procurar conhecer as significações produzidas por aquelas crianças naquele contexto social”, diante da necessidade de se rever os modos como se aprende a olhar para as ações sociais das crianças, dentre elas as brincadeiras.

Optou-se pelo método etnográfico, pois, segundo Corsaro (2011, p. 63), a etnografia “é um método eficaz para estudar crianças porque muitos recursos de suas interações e culturas são produzidos e compartilhados no presente e não podem ser obtidos facilmente por meio de entrevistas reflexivas ou questionários”.

As “subjetividades entrelaçadas” se justificam pela constatação de que há algo em comum entre as crianças. Essa ligação entre elas acontece - vivam elas onde viverem, falem o idioma que falarem, tenham a cultura que tiverem – porque elas vivenciam as mesmas experiências oriundas do meio em que estão inseridas, materializada na brincadeira de mamãe. Ou seja, a brincadeira acaba sendo um palco de experiências subjetivas para todas as crianças, não da mesma forma, mas a partir do local em que vivem partem do mesmo

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pressuposto. As crianças se aproximam e entrelaçam suas experiências na brincadeira, (re)produzindo o que ouvem, veem e aprendem/apreendem nas relações sociais com seus pares ou com os adultos da sua vida, adaptando-os e transformando-os, posicionando-se em alguma medida. Dessa forma, a criança é um sujeito transformador de sua realidade social, pois interage no meio social em que convive, estando em constante comunicação entre ela e os adultos que lhes rodeiam, permitindo a assimilação das experiências vivenciadas.

Por isso, esta dissertação envolve um trabalho de campo que se estendeu de abril a junho de 20123 pelo qual a pesquisadora teve acesso a um grupo de crianças e realizou observação intensiva, registrada em um Diário de Campo (caderno de anotações), possibilitando-lhe uma aproximação na compreensão de como é o cotidiano para os membros do grupo, suas configurações físicas e institucionais, suas rotinas diárias, seus valores que medeiam essas atividades e contextos.

A partir de uma primeira incursão a campo, a pesquisa etnográfica comprovou que o conhecimento se constrói pela interação entre seres humanos, desenvolvida em contexto social e no ambiente escolar. A pesquisa etnográfica está ligada ao cotidiano da criança que, por ser um indivíduo determinado no espaço e no tempo, não um elemento pertencente a uma espécie distinta, mas que faz parte de um contexto junto com aos demais indivíduos.

A coleta de dados foi feita a partir da observação prolongada e intensiva da brincadeira de mamãe, durante o período (abril/junho 2012), após ter ocorrido a aceitação da pesquisadora pelo grupo, evento que lhe garantiu o status de observadora do grupo em questão. Essa aceitação permitiu que fossem documentadas as mudanças e transições nas vidas das crianças, além da compreensão da socialização como um processo de produção e reprodução. E enfim, a descoberta dos pontos de vista infantis para saber o que representam as brincadeiras de mamãe para esse grupo de crianças.

Para o procedimento de coleta de dados buscou-se uma aproximação àquilo que Corsaro denomina como “análise sociolinguística refinada do discurso porque só assim [é] possível documentar os significados dos jogos infantis e das atividades de suas culturas de pares” (2011, p. 67). Foi utilizado o questionário semiestruturado com perguntas abertas para as professoras. Com algumas mães, foi realizada uma entrevista em profundidade, da qual o retorno foi espontâneo e que pôde servir para a percepção da pesquisadora sobre o contexto sociocultural e, em alguma medida, emocional das crianças.

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O cronograma da pesquisa de campo sofreu alteração no decorrer do trabalho de campo, incluindo algumas datas do mês de outubro. (Nota da autora).

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Salienta-se que todos os procedimentos metodológicos só foram possíveis graças ao embasamento realizado nos referenciais bibliográficos, fundamentalmente William A. Corsaro (2011), Eloísa Acires Candal Rocha & Sonia Kramer (2011), Ana Cristina Richter (2011), Caroline Machado Momm (2005), Luciana Esmeralda Ostetto (2000) e seguiram as fontes de informação de campo tais como o uso da observação da brincadeira/brinquedos das crianças e dos desenhos infantis.

Reafirma-se que o estudo adotou o método etnográfico porque ele exige a descrição densa, aquela que “ultrapassa o exame microscópico das ações e que se dirige para sua contextualização abrangente para capturar eventos e ações como são entendidos pelos próprios atores, ou seja, pelas crianças” (CORSARO, 2011, p. 65) – enfim, é a investigação com crianças e não sobre crianças. Portanto, foram seguidos paradigmas interpretativos e de dimensão qualitativa, dentro de uma concepção construtivista, subjetivista e de uma estratégia como método a combinação, onde o objeto de estudo tenta fortalecer a validade do segundo e não se preocupa com a convergência de resultados, mas com uma combinação metodológica adequada próximo dos dados coletados. (CORSARO, 2011).

Com essa percepção, procedeu-se à coleta de dados, tendo-se realizado entre quinze a vinte observações4, a fim de compreender as diferentes significações que as crianças elaboram na representação lúdica através da brincadeira. A observação ocorreu com crianças de 3 e 4 anos em uma de turma com 22 alunos no decorrer de suas atividades lúdicas como, por exemplo, brincadeiras de casinha, que chamam de brincadeira de mamãe, sem interferência do adulto, para aproximá-lo da sua realidade sociofamiliar.

No entanto, esse estudo somente foi possível a partir de uma pesquisa profunda que considerou aspectos teóricos e metodológicos do campo da educação, em especial, da educação infantil. A observação do processo do desenvolvimento da criança, portanto, foi realizada através do lúdico, numa demonstração de que a aprendizagem é ativa, dinâmica e contínua.

Ou seja, a aprendizagem é uma experiência basicamente social que tem a capacidade de conectar a criança e o seu meio. Percebeu-se que a maioria delas é educada pelas mães, ou pais ou pelos avós separadamente.

É importante observar que o conceito de família tem mudado porque, hoje, essa entidade se tornou agrupamento ou organização familiar multifacetada com diferentes

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configurações5. Na nossa trajetória profissional, deparamo-nos com várias formas de organização familiar. Essa realidade do cotidiano possibilitou observar diferentes relações parentais e no comportamento infantil, pela existência de uma cadeia complexa de interações entre a criança e seus pais. Observamos famílias tradicionais, com marido, mulher e filhos; família monoparentais, nas quais os filhos vivem com a mãe ou com o pai, separadamente; famílias recasadas, com filhos que vivem com um dos pais recasado; famílias ampliadas, nas quais as crianças são cuidadas pelas avós ou tios etc. Independentemente da maneira em que estejam estruturadas as famílias, as possíveis interações entre pais e filhos, adultos e crianças, estabelecidas através das brincadeiras podem possibilitar diferentes motivações para um melhor desenvolvendo cognitivo da criança.

A nova Sociologia da Infância possui como ponto central a consideração de que as crianças participam coletivamente, de maneira ativa, na sociedade da qual fazem parte (CORSARO, 2011). Assim, buscou-se a compreensão das crianças como agentes sociais ativos e criativos que produzem e reproduzem cultura, e da infância, como categoria estrutural, entendida como o período social e historicamente construído no qual as crianças vivem suas vidas, sendo expostas a distintas pressões sociais semelhantes as da fase de vida adulta (CORSARO, 2011).

Entre os sociólogos, Sarmento (2008, p. 19) considera que “[...] ao incorporar na sua agenda teórica a interpretação das condições atuais de vida das crianças, a Sociologia da Infância insere-se definitivamente na construção da reflexividade contemporânea sobre a realidade social.” É por isso que, ao estudar a infância, percebe-se não é apenas com as crianças que a disciplina se ocupa: é a totalidade da realidade social o que ocupa a Sociologia da Infância, conclui o autor. Os dois temas centrais da nova Sociologia da Infância (a infância, como categoria estrutural, e as crianças, como atores sociais) são analisados em relação ao contexto amplo da sociedade como um todo. (CORSARO, 2011).

A justificativa da importância do tema escolhido inclui o fato de o CEI Cantinho do Amor II, localizado na cidade de Araranguá/SC atender a 86 crianças de 0 a 4 anos de uma comunidade de baixa renda, no bairro Vila São José. Acredita-se que em uma instituição escolar dessa natureza, filantrópica, o papel da Educação Infantil não se resume em cuidar, mas também em educar, desenvolvendo a afetividade e o cognitivo da criança através do

5 Durante a história, a família sofreu modificações significativas em sua estrutura e nas suas relações internas com as crianças. O sentimento de família moderna nuclear desenvolveu-se simultaneamente ao sentimento moderno da infância. A criança adaptou-se a essa modificação. As famílias passaram a ser menos numerosas e o paradigma constituído por pai, mãe e filhos deixou de ser o único modelo socialmente aceito, o que deu origem a diferentes configurações familiares. (CORSARO, 2011).

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lúdico. Justifica-se, também, esta escolha pela percepção de que através da brincadeira da mamãe as crianças retratam (teatralizam) sentimentos como angústia, insegurança, medo, tristeza, alegria e esperança, como demonstrada nas observações, importantes na interpretação das atividades dos adultos pela criança e na construção da sua individualidade/personalidade. As observações, também, trazem que a figura materna é a mais importante e presente em suas vidas - e este fato contribuiu para a escolha do tema, atribuindo-lhe importância no contexto da população estudada.

Dentro dos procedimentos metodológicos, a coleta dos dados foi planejada para acontecer no decorrer de um período de abril a junho de 20126, adequado para observar/analisar o cotidiano da brincadeira de mamãe entre as crianças de 3 a 4 anos. Estas crianças são integrantes de uma turma de 22 crianças do Centro de Educação Infantil, através de suas atividades lúdicas como brincar de casinha, brincadeira de mamãe dentre outras, sem a interferência da professora. Enfim, no momento em que se manifestam as subjetividades entrelaçadas no sério dever do brincar.

Este texto foi estruturado em quatro capítulos, sendo o primeiro, intitulado “A Educação Infantil no Brasil e em Santa Catarina”, no qual se abordam a evolução histórica da Educação infantil no país e os primeiros registros de Florianópolis/SC. O segundo, - “Educação Infantil no Brasil” – é estruturado sobre alguns pontos em relação à história da infância. O terceiro capítulo – “Brincadeira de Mamãe: subjetividades entrelaçadas” – versa sobre o Centro Educacional Infantil Cantinho do Amor II (localização, realidade da instituição, suas rotinas, o cotidiano das turmas, professoras, funcionários e auxiliares e, principalmente, as crianças de três e quatro anos que a frequentam). Finalmente, no capítulo quatro – “A mediação do lúdico: a relação entre as instâncias do vivenciado e do faz de conta” – faz-se uma pormenorizada descrição, interpretação e análise dos resultados obtidos em campo.

Os resultados apontam para a possibilidade de que a brincadeira de mamãe reflita, em alguma medida, as subjetividades entrelaçadas oriundas das relações travadas no cotidiano das crianças com seu meio escolar e familiar. Percebe-se o importante diferencial que o mundo da imaginação proporciona, isto é, o fazer de conta como possibilidade de fazer e refazer, tendo a segurança consciente de que os atos ali vivenciados nada mais são do que possibilidades.

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CAPÍTULO 1: CONSIDERAÇÕES TEÓRICAS SOBRE A EDUCAÇÃO INFANTIL

Brincar com as crianças não é perder tempo, é ganhá-lo. Se é triste ver meninos sem escola,

mais triste ainda é vê-los sentados enfileirados em salas sem ar, com exercícios estéreis, sem valor para a formação do homem.

Carlos Drumonnd de Andrade

A Educação Infantil no Brasil, como no estado de Santa Catarina, teve diversos caminhos nos seus percursos. Luciana Esmeralda Ostetto (2000), pesquisadora da história da Educação Infantil em Santa Catarina, relata a trajetória desse ciclo da educação em Florianópolis, no período de 1976 a 1996: sua origem, suas mudanças, regulamentações e contribuições em todo o estado. Resgata o histórico das instituições responsáveis pela educação infantil de zero a seis anos nas diferentes regiões brasileiras e leva à compreensão das dimensões sociais, políticas e educativas que as creches e pré-escolas assumem, explicando suas funções sociais bem como as motivações políticas e orientações pedagógicas que as sustentam modernamente. A inclusão da educação infantil como política pública de educação é recente.

O objetivo de Ostetto é a conscientização de todos os segmentos educacionais, políticos e sociais sobre a importância que as Creches e as Pré-escolas da Educação Infantil assumem, hoje, pelo cumprimento das funções pelas quais foram criadas. É neste contexto que localizamos as reflexões do presente capítulo.

A trajetória da Educação Infantil no Brasil teve início nos tempos do Brasil Colônia. Esse tipo de educação foi chamado de asilo, roda dos expostos, jardim de infância, creche, pré-escola porque, naquele tempo, o abandono era um fenômeno corrente. A criação de asilos para crianças órfãs e abandonadas, pois o poder público não se ocupava de questões dessa natureza, esse desinteresse dava espaço a instituições chamadas Roda dos Expostos, Casa dos Expostos ou Depósitos dos Enjeitados, mantidas pela caridade pública, sob a responsabilidade das Irmandades de Misericórdia.

O surgimento da creche no Brasil se deu em final do século XIX e início do século XX, no Rio de Janeiro, com o nome de Companhia Fiação e Tecidos Corcovados, para os filhos dos operários. Segundo Ostetto (2000a), a criação da creche se dá num contexto de transformação econômica e política. O Brasil transforma-se em republicano e ensaia sua entrada no cenário da indústria com a introdução de mão de obra especializada europeia, uma vez que as cidades em desenvolvimento não absorveram a mão de obra escrava tornada livre,

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porque os imigrantes preocuparam-se em criar espaços para seus filhos. A creche no Brasil surge acompanhando a crescente urbanização e a necessidade de reprodução da força de trabalho, pela liberação da mulher/mãe para o mercado de trabalho até a uma visão de mais longo prazo em preparar pessoas nutridas e sem doenças.

Para Campos, Rosemberg, Ferreira (1995, p. 63), anteriormente, as ações de atendimento estavam dispersas em diversas áreas (assistência, saúde, trabalho e educação) e os critérios de funcionamento eram estabelecidos por órgãos da saúde (Ministério e Secretarias Estaduais e Municipais) para as creches e berçários que, em geral, atendiam crianças filhos/as de mães a trabalhadoras e de famílias pobres. Durante muito tempo predominou uma visão de que a criança pequena necessitava apenas de guarda.

Antes da Constituição Federal de 1988, apenas os filhos de mulheres trabalhadoras urbanas tinham garantia legal a esses cuidados, num chamado “local de guarda”. Na prática, essa ação assegurada pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de 1943 e regulamentada por um conjunto de portarias ministeriais não se efetivou plenamente devido à ineficiência da fiscalização e o baixo montante de multa prevista.

A primeira referência no Brasil é feita pelo médico Carlos da Costa, editor do jornal A Mãi de Família (1879), que sugere a manutenção do nome francês créche 7; a ela caberá dar o pão e a educação. O termo ‘pedagógico’ será utilizado apenas para as pré-escolas e jardins da infância que diferem muito da creche, pois sua clientela são os filhos das famílias ricas. Esta diferença acentua o fosso social que separa creches de jardins de infância e pré-escolas. Ferranti (2002) esclarece que nas mudanças no discurso sobre a creche, há um aspecto que persiste desde seu nascimento e que está na sua origem: “[...] ela é destinada às classes pobres e deverá suprir a ausência materna, oferecendo a maternagem como manifestação do amor”.

Conforme Ostetto (2000a), a creche do Rio de Janeiro seguia a proposta que existia na França; ela atendia criança até dois anos de idade e a mãe podia amamentar duas vezes ao dia, sendo que o restante da alimentação era ministrado com mamadeira; nessas creches, a cada ama eram designadas de cinco ou seis crianças. A creche era para filhos de mães pobres, trabalhadoras e de boa conduta; funcionava das 05h às 20h30min da noite, fechando aos domingos e dias de festas.

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Ainda segundo Ostetto (2000a), no Brasil, antes de ser criada a primeira creche, já tinham sido criados o Jardim de Infância Menezes Vieira (1875), no Rio de Janeiro; o Jardim de Infância da Escola Americana, em São Paulo (1877) e o Jardim de Infância Caetano de Campos, junto à Escola Normal de Caetano Campos, em São Paulo (1896). Criados para famílias abastadas, os jardins eram estabelecimentos para educar; as creches, visando às crianças pobres, filhos/as de trabalhadoras, eram para cuidar; a primeira, mais ligada a assistencialismo e o cuidado, e a pré-escola mais ligadas à educação e à preparação para a escolarização formal. As funções administrativas das creches eram vinculadas à Secretaria de Bem-Estar e da Família e à Secretaria de Assistência, enquanto as do pré-escolar à Secretaria de Educação, um sistema utilizado em todo o Brasil. Moysés Kuhlmann Jr. (1991), pesquisando sobre a “educação assistencialista”, percebeu que sua característica principal é forma ideológica de encaminhar esta educação como favor e não como direito dos sujeitos.

Esse contexto foi vivenciado até aos anos de 1980; a partir daí começa uma nova discussão que permanece até hoje: “O atendimento à criança de zero a seis anos é assistência ou educação8?”. Com a Constituição de 1988, a Educação Infantil passa a ser um direito da criança de zero a seis anos (cap. III, art. 208, inciso IV), sendo o dever de o Estado fornecê-la; um direito reafirmado no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), na Lei de Diretrizes e Bases (LDB) e na Política de Educação Infantil (MEC/94).

Com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases (LDB/96), aconteceu um grande marco na história da Educação Infantil, visto que o seu artigo 30 reza que “A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, tem como a finalidade do desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físicos, psicológicos, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.” (BRASIL, 1966). Ela não fala em pré-escola e sim em Educação Infantil, significando que a idade de zero a seis anos tem uma identidade em si mesma, ela não está apenas definida pela futura inserção na escola.

O texto sobre a Educação Infantil, de Luciana Esmeralda Ostetto (2000a), referente a Florianópolis/SC, retratou a trajetória da rede municipal, desde os anos de 1970 até

8 Para melhor ilustrar a amplitude desta discussão no Brasil, na Universidade Federal de Santa Catarina existe o “Núcleo de Estudos e Pesquisas da Educação na Pequena Infância” (NUPEIN), coordenado pela professora Drª Eloisa Acires Candal Rocha e Dr. João Josué da Silva Filho (EED/CED) cujos objetivos são: 1. aprofundar o conhecimento sobre as instituições que ofertam educação infantil (0 a 6 anos), suas práticas e organização; 2. subsidiar a elaboração de políticas para a área e participar de fóruns e associações; 3. subsidiar o trabalho de formação de educadores nos diversos níveis: graduação, pós-graduação e formação em serviço; 4. organizar e manter Bases de Dados sobre informações que interessem à área.

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dias atuais, mapeando aspectos e fatos históricos como a Roda dos Expostos que foi criada junto ao Hospital de Caridade (1828). O resgate histórico da instituição noticia que “[...] as crianças abandonadas eram descendentes de escravas que sonhavam com a liberdade para seus filhos ou, então, eram filhos de uniões ilegítimas e de procriação fora do casamento”. (OSTETTO, 2000a).

Ostetto (2000b) afirma que a Educação Infantil pública municipal de Santa Catarina inicia-se em 1976, com a inauguração do Núcleo de Educação Infantil (NEI) da Coloninha e no Ribeirão da Ilha no Rio Vermelho em Florianópolis/SC, com quatro turmas de quatro aos seis anos, em período parcial, com a finalidade de atender as necessidades dessas comunidades. Hoje, há duas modalidades educativas, ou seja, Creche e Núcleo de Educação Infantil. As Creches atendem crianças de 0 a 6 anos em período integral e os Núcleo atendem crianças de 4 a 6 anos em período parcial. As creches são vinculadas às Secretarias de Bem Estar Social da Família (SESAS) e o NEI à Secretaria Municipal de Educação.

Nesse período, foi elaborado o primeiro Projeto Núcleo de Educação Infantil, um documento com finalidades, justificativa, objetivos, metas, área de influência e condições para sua execução; sua implantação certificou que havia unidades pilotos de pré-escolar que propunham o desenvolvimento de um Sistema de Pré-escolar de forma gradual e progressiva. O documento tem como justificativa “favorecer o desenvolvimento integral da criança em seus primeiros anos de vida [...]; as lacunas e deficiências (carências) provenientes da estrutura familiar; preparar as crianças para realizar, satisfatoriamente, a aprendizagem na escola primária.” (OSTETTO, 2000b). O projeto foi aplicado, primeiramente, no interior da ilha, ou seja, na zona rural, onde as crianças eram mais carentes e o índice de repetências era alto: Rio Vermelho, Ribeirão da Ilha e Coloninha (SESAS, 1976, p. 4). De 1976 a 1979, foram criados outros Núcleos de Educação Infantil, como: Saco dos Limões, Prainha, Costeira, Trindade, Coqueiros, Abraão, Capoeiras, no período previsto pelo projeto. Os Núcleos eram mantidos com recursos da Prefeitura Municipal repassados pelo MEC.

Em 1979, o Núcleo de Educação Infantil da Coloninha ganhou uma sede, passando a se chamar Creche Professora Maria Barreiro e foi ampliado o atendimento de criança de 0 a 6 anos em período integral de doze horas diárias.

A partir de 1996, a Educação Infantil da rede municipal de ensino de Florianópolis possui uma Proposta Curricular para as unidades; existem documentos com diversas sínteses relatando ações desencadeadas pelo Movimento de Reorientação Curricular. O MRC discute sobre a Educação Infantil e a importância do planejamento, do registro e da avaliação na rotina do educador para qualificá-lo e prepará-lo para um bom trabalho com as

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crianças. Atualmente, pode-se observar a importância que a sociedade tem dado a Educação Infantil, através de programas sociais, valorização do professor, criação de leis que protegem a criança.

A Educação Infantil em instituições passou a ser vista com outros olhos, passando a ser uma das bases da construção do conhecimento do indivíduo. Isso ocorre porque “[...] torna-se cada vez mais abrangente no mundo contemporâneo a compreensão da infância como uma fase da vida dotada de especificidades e de fundamental importância para a constituição da identidade humana, tanto do ponto de vista subjetivo como do social.” (ROCHA, 2011, p. 367).

Referindo-se ao contexto educacional de uma forma geral, Adilson de Ângelo (2006, p. 9) afirma que a educação tem sido desafiada a um trabalho pedagógico fundamentado na criatividade, no estímulo à reflexão e à ação dos educadores sobre as realidades em que operam. Subvertendo a ideia da infância como lugar em que o sujeito não tem direito à fala, ele propõe a ‘roda da conversa’ como dispositivo que pode contribuir com o trabalho educativo, dessa forma vem se solidificando a importância da educação na afirmação do sujeito infantil, pois “[...] uma pedagogia da educação infantil é movimento que já se encontra assinalado em diferentes dimensões.” (2006, p. 13).

Estudos realizados por Eloisa Acires Candal Rocha (2000), com o intuito de discutir possibilidades de desenvolvimento de uma pedagogia própria para a Educação Infantil, justificam essa nova ótica da Educação Infantil como base da construção do conhecimento do indivíduo. A partir da análise de construções, a autora identifica determinados sinais que “permitem afirmar a possibilidade e o nascimento de uma pedagogia de Educação Infantil que possa analisar criticamente o real, a partir de uma reflexão sistemática que ganha corpo, procedimentos e conceituações próprias”. (ROCHA, 2000, p. 62). A autora percebe quatro pontos distintos e interligados que se apresentam como cruciais a uma pedagogia para educação de crianças pequenas.

O primeiro, é a afirmação de que uma pedagogia específica para Educação Infantil é algo possível, viável, com uma razão de ser. O segundo ponto é a confirmação de que essa especificidade pedagógica já tem o seu nascimento assinalado na história da pedagogia, sendo possível abalizar a sua presença no mundo da educação. O terceiro, é ressaltar o sentido muito próprio de considerar criticamente a realidade da criança, pois “[...] somos informados de que esse movimento possível é subsidiado por uma reflexão continuada e organizada que lhe dá corpo, procedimentos e conceitos próprios”. (ROCHA, 2000a, p. 64).

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Reproduzindo a ideia que procura definir o objeto da Didática e da Prática de Ensino, Rocha (2000a, p. 66) concorda que a ‘prática de ensino’ remete-se à especificidade de cada área de conhecimento a que se refere, enquanto “[...] à Didática caberia estudar a aula, procurando analisá-la e descrevê-la como um fenômeno que apresenta certas peculiaridades e regularidades, independente da diversidade de contextos em que se dá, e da diversidade de conteúdos que nela se desenvolvem”; porém, atribui à Didática Geral a função de subsidiar “o professor a compreender a ‘ação pedagógica no contexto escolar’ e não apenas restrito ao processo ensino-aprendizagem.” (ROCHA, 2000a, p. 67). Ao extrapolar os limites do ensino, abre a possibilidade de relacionar o objeto da didática com aquele que vem a ser o objeto da Educação Infantil e que caracteriza a educação da criança de 0 a 6 anos em instituições de educação e cuidado. A creche e a pré-escoladiferenciam-se essencialmente da escola quanto às funções que assumem num contexto ocidental contemporâneo. (ROCHA, 2000a, p. 68).

A organização do sistema educacional e da legislação própria apresenta contornos bem definidos das suas funções na sociedade brasileira Enquanto a escola se coloca como o espaço privilegiado para o domínio dos conhecimentos básicos, as instituições de Educação Infantil se apresentam, sobretudo, com fins de complementaridade à educação da família. Enquanto a escola tem como sujeito o aluno e como o objeto fundamental o ensino nas diferentes áreas através da aula, a creche e a pré-escola têm como objeto as relações educativas travadas num espaço de convívio coletivo cujo sujeito é a criança de 0 a 6 anos.

Consegue-se, assim, criar um marco diferenciador destas instituições educativas - escola, creche e pré-escola - a partir da função social que lhes é atribuída no contexto social. Há uma relação extremamente vinculada aos processos gerais de constituição da criança: a expressão, o afeto, a sexualidade, a socialização, o brincar, a linguagem, o movimento, a fantasia, o imaginário e, principalmente, as suas inúmeras linguagens. (ROCHA, 2000, p. 72-73).

Segundo Rocha (2000, p. 62), o termo educar no contexto da educação infantil parece dar um caráter mais amplo que o termo ensinar que se refere mais diretamente ao processo ensino-aprendizagem. No caso da educação infantil, o aspecto cognitivo não deve ganhar uma dimensão maior do que as demais dimensões envolvidas no processo de constituição do sujeito/criança, nem reduzir a educação ao ensino.

Na educação das crianças menores de seis anos em creches e pré-escolas, as relações culturais, sociais e familiares têm uma dimensão ainda maior no ato pedagógico. Apesar do compromisso com um ‘resultado escolar’ que a escola prioriza que, em geral, resulta numa padronização, estão em jogo na Educação Infantil as garantias dos direitos das crianças ao bem estar, à expressão, ao

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movimento, à segurança, à brincadeira, à natureza, e também ao conhecimento produzido e a produzir. (ROCHA, 2000, p. 64).

A tarefa das instituições de Educação Infantil, explica Rocha (2000, p. 65), “não se limita ao domínio do conhecimento, assumindo funções de complementaridade e socialização relativas tanto à educação como ao cuidado, e tendo como objeto as relações educativas/pedagógicas estabelecidas entre e com as crianças pequenas (0 a 6 anos)”. Os espaços educativos relacionados à educação e à criança apresentam componentes de interesse comum que necessitam estabelecer um maior diálogo porque o aluno é, antes de tudo, a criança em suas múltiplas dimensões, independentemente de sua faixa etária ser escolar ou não.

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CAPÍTULO 2: SOBRE A INFÂNCIA E A CRIANÇA

A Educação Infantil brasileira passa por um período de expansão, com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996) que estabelece a Educação Infantil como “primeira etapa da Educação Básica, direito da criança de zero a seis anos e dever do Estado”. O texto elucida as questões que dizem respeito à natureza da criança de zero a seis anos, suas necessidades, seu processo de maturação e construção social, temas que exigem estudo e discussões sobre sua especificidade, currículo a ser trabalhado e outros aspectos.

Conforme aponta documento da UNICEF sobre a situação da infância no Brasil (2001), “descobertas recentes têm demonstrado convincentemente que a primeira infância, desde a gestação, é a fase mais crítica da pessoa no que diz respeito ao seu desenvolvimento biológico, cognitivo, emocional e social” (BRASIL, 2001). Por isso, a cada dia, é maior o número de estudos que apontam a importância dos primeiros anos de vida para o desenvolvimento da criança.

Fernandes, em entrevista de Elena Colonna (2011), relata que a ideia da criança como sujeito ativo no processo educativo e como cidadão tinha ficado sem possibilidades teóricas de conceitualização, porque era difícil encontrar as respostas procuradas apenas no domínio científico da psicologia. Compreender as crianças como sujeitos de direitos e como atores sociais da infância como uma categoria geracional, caracterizada pela diversidade exigia a mobilização de novas áreas de conhecimento e o estabelecimento de redes com parceiros sociais diversos, que confluíam para a área da intervenção social com crianças, uma nova área científica: a Sociologia da Infância. As notas são iniciadas pela abordagem da evolução dos conceitos de infância e de criança, essenciais para esta dissertação.

2.1 Evolução Histórica da Infância e a Criança

Por muito tempo, a criança foi considerada um adulto em miniatura. Apenas a partir do século XVI, começou-se a refletir sobre as características específicas da criança pequena e atribuir um significado a essa fase da vida humana. (ARIÈS, 1981). Setores da elite

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defendiam a idéia de que não seria bom para a sociedade como um todo, que se educassem as crianças pobres, propunham a educação da ocupação e da piedade. (OLIVEIRA, 1995).

Ariès (1981) inaugurou uma concepção de infância e contribuiu para a ruptura da ideia de uma única infância, revelando que as configurações (sociais culturais, políticas, econômicas) das sociedades modernas também produzem infâncias e crianças diferentes, constituindo-as categoria plural. Evidentemente, não é possível pensar em uma categoria única de criança.

O percurso histórico de atendimento à criança pequena no Brasil envolve as próprias transformações no contexto social, portanto “a história das instituições pré-escolares não é uma sucessão de fatos que se somam, mas a interação de tempo, influências e temas” (KUHLMANN JÚNIOR, 2000, p. 81). Esse autor comenta que, “muitas vezes, por desconhecermos ou ignorarmos a história, incorremos em discussões que nos parecem novidades, mas que na verdade já vêm sendo discutidas por longa data”.

Segundo Kramer (1982), as creches existem na Europa desde o século XVIII. Os jardins de infância apareceram somente no século XIX, no Brasil. Ambas as instituições, criadas no mesmo período histórico, geralmente são mantidas por religiosos. A infância não era algo a ser aproveitado, a criança era vinculada às condições de rejeição. Daí, o caráter de substituto dos cuidados familiares e de assistência que marcou profundamente a história das instituições destinadas a atender às crianças, práticas arraigadas na cultura brasileira com vestígios até hoje.

Ao longo da história do atendimento pré-escolar brasileiro, percebe-se uma diferenciação no atendimento das crianças de acordo com sua classe social. Para crianças ricas, havia a necessidade de um ambiente estimulador, que promovesse seu desenvolvimento afetivo e cognitivo. Já para as crianças pobres, o atendimento oferecido era mais o de guarda. (OLIVEIRA, 1992). Porém, nos últimos anos, percebe-se uma mudança significativa desta perspectiva segregacionista e mantenedora da situação de vulnerabilidade social para certas camadas sociais.

No Brasil, entre os anos 1980 e 1990, aconteceu o reconhecimento efetivo por parte do Estado do atendimento em instituições de Educação Infantil, consolidando a visão da criança como cidadã, sujeito criativo, indivíduo social, produtora da cultura e da história, ao mesmo tempo em que é produzida, na história e na cultura, que o atendimento deva ser de qualidade, promovendo assim o desenvolvimento da criança em suas diversas dimensões. (OLIVEIRA, 2003).

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Atualmente, acompanham-se ações políticas que mobilizam a favor da Educação Infantil. A educação destinada a crianças de 0 a 6 anos passa a ser reconhecida como direito da criança e dever do Estado na Constituição Federal de 1988, um direito sustentado, também, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990. O caráter educativo da atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/96) integra a Educação Infantil à Educação Básica como um nível de ensino, primeira etapa da educação básica, a qual deve se efetivar mediante atendimento em creches (0 a 3 anos) e pré-escola (4 a 6 anos) de forma gratuita, não obrigatória, independente de classe social, gênero, etnia e raça.

O cenário internacional, a partir de 1960, revelava uma tendência à educação compensatória, baseada no princípio da privação cultural. As crianças menos favorecidas que passavam por privação cultural, compensariam isso na pré-escola. A estratégia de educação compensatória foi assumida no contexto brasileiro como solução para os problemas educacionais e sociais, quando essa forma de educação “já era comprovadamente fracassada em outros países”. (KRAMER, 1982, p. 12).

Enquanto surgiram creches na Europa desde o século XVIII e no século XIX os jardins de infância, no Brasil, creches e jardins de infância são criados no mesmo período histórico. (KRAMER, 1982). O caráter de substituto dos cuidados familiares e de assistência marcou profundamente a história das instituições destinadas a atender criança, com práticas arraigadas na cultura brasileira. A importância dessa fase da vida dos sujeitos e dos objetivos para a criança na Educação Infantil se deve ao fato que esta fase deve assegurar à criança:

1.Sentir-se segura e acolhida no ambiente escolar, utilizando este novo espaço para ampliar suas relações sociais e afetivas, estabelecendo vínculos com as crianças e adultos ali presentes, respeitando a diversidade e valorizando sua riqueza. 2.Tornar-se capaz de desenvolver as atividades nas quais se engaja de maneira

autônoma, e em cooperação com outras pessoas. Desenvolver a capacidade de coordenar pontos de vista e necessidades diferentes dos seus, socializando-se. 3.Interagir com o seu meio ambiente (social, cultural, natural, histórico e

geográfico) de maneira independente, alerta e curiosa, estabelecendo relações e questionamentos sobre o meio ambiente, os conhecimentos prévios de que [ela] dispõe, suas idéias originais e as novas informações que recebe (OLIVEIRA, 2003).

Esses objetivos se propõem a apropriar a criança dos mais diferentes tipos de linguagem construídos pela humanidade (oral, escrita, matemática, corporal, plástica e musical), de acordo com as suas capacidades e necessidades, utilizando-as para expressar o

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seu pensamento e as suas emoções, a fim de compreender e comunicar-se com as outras crianças e os adultos em contextos múltiplos e diferenciados.

A partir do final dos anos 80, os pesquisadores brasileiros encontram em Mikhail Bakhtin, Lev Vigotski e Walter Benjamin as bases teóricas para compreender a educação, a infância e a formação, fundamentadas na Psicologia, na Sociologia e na História, considerando que é importante ver uma perspectiva nacional, partindo das questões da infância no Brasil.

2.2 Infância e Criança na Constelação Teórica9

Vigotski (1987) ensina que para ocorrer o processo de desenvolvimento, a criança deve estar envolvida numa interação de aspectos sociais ocorrida no meio ambiente o qual determina formas complexas, sob funções mentais específicas, dependendo das experiências sociais em que as crianças estão inseridas. (VIGOTSKI, 1987 apud KRAMER, 1982, p. 12).

Seu estudo está centrado no processo de internalização e determinismo, pelo qual a criança se apropria do meio social em que vive, fazendo-a posicionar-se criticamente, sendo um sujeito transformador de sua realidade social, pois a criança interage no meio social em que convive, estando em constante comunicação entre ela e os adultos que lhes rodeiam, permitindo a assimilação das vivências. (KRAMER, 1982, p. 12).

Vigotski afirma que “a criança é um ser ativo que cria e constrói cujo entendimento acontece através de interações sociais”. O autor acredita que é no mundo imaginário e ilusório, presente na criança que o jogo acontece, sendo este baseado na imaginação que surge da ação. Dessa forma, a criança imagina e quando imagina, joga, pois neste imaginar ela cria um mundo de atividades lúdicas que possibilitam a ação do jogo (VIGOTSKI apud KRAMER, 1982, p. 13).

O jogo é relevante para o desenvolvimento da criança, pois é através de atividades lúdicas que ela avança, facilitando a tomada de consciência e autonomia, liberando emoção através de sua percepção. Numa situação imaginária de jogo, faz-se presente a percepção, a qual é um veículo para a atividade lúdica da criança. (KRAMER, 1982, p. 13).

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O subtítulo busca refletir a multiplicidade teórica na concepção da criança, ou seja, a mesma temática toma e cria novas formas ao ser abordada por diferentes autores.

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Através do jogo, a criança definirá conceitos, criará situações que desenvolvam sua atuação revelando-se em relação às situações reais. (Figura 1, abaixo). Em síntese, o jogo surge do mundo imaginário que contribui para o desenvolvimento da criança.

Figura 1 – Meninas dos anos 50 brincando de casinha/mamãe

Fonte: Material da pesquisadora coletado na rede mundial de computadores, 201210.

O jogo é um elemento básico, onde a atividade lúdica representa ações sob a percepção, pois a criança é livre para determinar suas próprias ações e usa as interações sociais como formas privilegiadas para a aprendizagem, fazendo relações com o meio ambiente. (VIGOTSKI apud KRAMER, 1982, p. 14). Enfim, como afirma o autor, o jogo é produto do social. É uma atividade social aprendida através das interações humanas. Como na Figura 1, foi o adulto ou as crianças mais velhas que ensinaram o bebê a brincar, interagindo e atribuindo significado aos objetos e às ações, introduzindo a criança no mundo da brincadeira. (KRAMER, 1982, p. 15).

No artigo a Sociologia da Infância e a Educação das Crianças, Vera Lúcia Chacon Valença (2011) discorre sobre a construção da Sociologia da Infância, a infância e a interculturalidade, oferecendo algumas contribuições teóricas sobre as repercussões desse novo subcampo da sociologia, suas representações e suas modalidades na compreensão e na educação das crianças. Diz a autora que em consequência das transformações sociais, das representações e das novas modalidades de socialização, “captei a infância transnacional caracterizada pela mobilidade, pela comunicação em redes e pelo uso dos artefatos”. A criança é ativa, possui uma identidade própria, é ao mesmo tempo sujeito e ator social.

A socialização é ressaltada pela existência de uma criança percebida como um “ator social, ser de direitos, sujeitos dos seus atos, enfatizando a complexidade desse ser

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completo”. A construção da sociologia da infância e a interculturalidade no campo da sociologia da infância, para alguns estudiosos, têm olhares diferenciados. Sirota (2006, p.17 apud VALENÇA, 2011) enfatizou a necessidade de compreender como se constrói globalmente a nova posição da criança na modernidade e o que é possível fazer cruzando certo número de olhares que permanecem estranhos entre uns e outros. Montandon e Longchamp (2007, p. 105) afirmam que a sociologia da infância ainda busca ancoradouro teórico específico. Outros pesquisadores pensam que a vida das crianças está mais controlada e institucionalizada e que, se elas ganharam em proteção e em direitos, perderam em responsabilidades e em liberdade de ação.

Montandon e Longchamp (2007, p. 105-126) encontraram diferenças nas experiências de autonomia das crianças, especialmente em aspectos relacionados ao pertencimento social e ao nível de formação dos pais. Encontraram diferenças, também, referentes ao tipo familiar, às práticas parentais ou à relação entre pais e filhos. Enfim, as práticas parentais parecem exercer mais influência do que as dos professores. Se a visão parental da autoridade se distancia em sua maior parte de uma visão estatutária estrita, a autoridade em si não é rejeitada. É a sua maneira de concebê-la e de exercê-la que mudou. (MONTANDON, LONGCHAMP, 2007, p. 105-126).

Outro resultado da pesquisa de Montandon e Longchamp (2007, p. 105-126) é o mito da criança-rei. As crianças de hoje não estão submetidas de maneira indiscutível à instituição familiar e escolar, mas se elas têm a possibilidade de negociar algumas exigências dos adultos, elas reconhecem outras que lhe são impostas sem discussão. Enfim,

[...] as crianças desejam mais autonomia, entretanto têm sentimentos ambivalentes; elas são sensíveis ao que as espera na sua vida adulta e várias delas têm medo de crescer. Elas não se deixam enganar em relação às contradições e aos numerosos hiatos entre o discurso e as intenções dos adultos. (MONTANDON; LONGCHAMP, 2007, p. 105-126).

Segundo Montandon e Longchamp (2007), os pais têm muita dificuldade para traduzir na prática seu discurso sobre a autonomia, pois têm medo dos riscos e dos perigos que seus filhos correm nas cidades. Eles também temem que seus filhos não consigam obter os diplomas necessários a um mundo competitivo. Os professores também se encontram na mesma situação, eles conhecem o discurso pedagogicamente correto, vários deles o subscrevem, entretanto, no pequeno mundo da sala de aula, eles têm dificuldades para aplicá-lo. Enfim, Montandon e Longchamp (2007, p. 105-126) concluem que o emprego de relações entre educadores e educandos, que escape à relação hierárquica tradicional, pede tempo,

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energia e competência aos adultos. Também pedem condições sociais favoráveis, considerando que as melhores intenções não são mais suficientes, as crianças constatam rapidamente a distância entre os discursos e a realidade. Sua experiência está imersa na ambivalência que caracteriza os indivíduos contemporâneos, decorrente de uma conquista paradoxal de autonomia tanto quanto de suportes. Por outro lado, a infância pode ser pensada em outras perspectivas, como por exemplo, na perspectiva de James, Jenks e Prout:

a) a noção de criança socialmente construída. Nela são analisados os discursos e as práticas sociais das crianças, assim como, outros fenômenos sociais;

b) a criança tribal, encontradas nos trabalhos do tipo etnográfico e em outros trabalhos do tipo qualitativo e de abordagem fenomenológica e interpretativa;

c) a criança como membro de um grupo minoritário, que se inscreve entre adultos e crianças, e que interrogam a relação adulto/crianças;

d) a perspectiva de compreender a criança como socialmente estruturada, que se situa nas estruturas sociais, sendo ela percebida como um seguimento de toda sociedade. E, então, fala-se da criança cidadã, com direitos e deveres. (MONTANDON, 2006, p. 47 apud VALENÇA, 2011).

Alan Prout (2004) afirma que a tese sobre “desaparecimento da infância” ajudou a perceber uma modificação no caráter da infância e mudanças das suas condições, evidenciando o enfraquecimento das fronteiras entre infância e idade adulta e fazendo emergir a preocupação por construir um lugar para a infância na Sociologia, iniciando uma Sociologia da Infância11. A eclosão do movimento para uma sociologia de infância se deu num cenário de grandes mudanças sociais em que a infância estava profundamente envolvida (pós-fordismo, modernidade tardia, sociedade em rede da pós-modernidade, sociedade de risco etc.). Esses termos referem-se a fenômenos como:

[...] flexibilização da produção, fragmentação/de identidade, desilusão com o conhecimento racional/especialização, um sentimento de incerteza, risco e insegurança, novas práticas de monitoração e reflexividade, a distribuição de normas de democracia, expansão das redes de conhecimento/circulação ideias novas e mais diversas em um ritmo cada vez mais acelerado, formas de vida familiar, padrões de consumo diversificados e mudanças na participação no mercado de trabalho, no emprego e na economia global. (PROUT, 2004 apud NAZÁRIO; PAULA, 2012).

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Segundo Alan Prout, a Sociologia da Infância surgiu nos anos 1980-1990; três recursos teóricos foram

empregados em sua construção. Primeiro, apoiou-se na Sociologia interacionista, nos Estados Unidos (1960) que problematizou o conceito de socialização que torna as crianças muito passivas. Segundo, nos anos 1990,

sobretudo na Europa, houve um ressurgimento da sociologia estrutural, que vê a infância como um dado permanente da estrutura social. Finalmente, nos anos 1980, na Europa e nos Estados Unidos, o construtivismo social problematizou e desestabilizou todo e qualquer conceito consagrado sobre a infância, enfatizando a especificidade histórica e temporal da infância.

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