• Nenhum resultado encontrado

Clínica e maneio de fauna selvagem em centros de recuperação e jardins zoológicos e o seu papel na conservação de fauna selvagem

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Clínica e maneio de fauna selvagem em centros de recuperação e jardins zoológicos e o seu papel na conservação de fauna selvagem"

Copied!
80
0
0

Texto

(1)

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro

Clínica e maneio de fauna selvagem em centros de

recuperação e jardins zoológicos e o seu papel na

conservação de fauna selvagem

Dissertação de Mestrado do Mestrado Integrado em Medicina

Veterinária

Joana Filipa Pereira Cardoso

Orientador: Professor Doutor José Manuel de Melo Henriques

de Almeida

Coorientadora: Doutora Cristina Harumi Adania

(2)
(3)

iii Declaração

Nome: Joana Filipa Pereira Cardoso C.C:14192760

Telemóvel: (+351) 919024543

Correio electrónico: joanafilipacardoso3@gmail.com

Designação do Mestrado: Mestrado Integrado em Medicina Veterinária Título da dissertação de mestrado em medicina veterinária:

Clínica e maneio de fauna selvagem em centros de recuperação e jardins zoológicos e o seu papel na conservação de fauna selvagem.

Orientador: Professor Doutor José Manuel de Melo Henriques de Almeida Coorientadora: Doutora Cristina Harumi Adani

Ando de conclusão: 2018

Declaro que esta dissertação de mestrado é o resultado da minha pesquisa e trabalho pessoal sob orientação dos meus supervisores. O seu conteúdo é original e todas as fontes estão devidamente mencionadas no texto e na bibliografia final. Declaro ainda que este trabalho não foi apresentado em nenhuma outra instituição para obtenção de qualquer grau académico.

Vila Real, 21 de Fevereiro de 2018 Joana Filipa Pereira Cardoso

(4)
(5)

v

(6)
(7)

vii Agradecimentos

Um enorme agradecimento ao meu orientador, o Professor Doutor José Manuel Almeida pelas orientações fornecidas ao nível científico, profissional e pessoal, pelos conhecimentos e exigência que me transmitiu e pela forma como me apoiou na concretização do estágio assim com na elaboração na dissertação de mestrado.

À minha coorientadora, a Dra. Cristina Harumi Adania, pela oportunidade, aprendizagem, pela exigência e pelos conhecimentos transmitidos e de fato, pelo seu excelente trabalho e esforço duradouro a nível da conservação.

À Dra. Helen Bateman-Jackson, por toda a aprendizagem, acolhimento e experiência proporcionada.

Ao Dr. Nuno Alvura por toda a ajuda e experiência prática que me proporcionou.

À equipa do Jardim Zoológico da Maia e da Associação Mata Ciliar, salientando as médicas veterinárias com as quais tive o prazer cruzar, conhecer e aprender.

A todos aqueles que me acompanharam durante a vivência em Vila Real e no acompanhamento dos meus objetivos, em especial às grandes amizades nutridas na Mui Nobre Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.

Sem dúvida um grande e sincero agradecimento aos meus familiares, destacando os meus pais por todo o apoio ao longo da minha vida e pelo esforço em tornarem possíveis os meus sonhos.

(8)
(9)

ix Resumo

A conservação de vida selvagem, onde a conservação in-situ e ex-situ se encontram correlacionadas, é uma complexa tarefa que tem ganho voz desde o séc. XIX, cujo empenho e sucesso dependem de um envolvimento multidisciplinar na qual todas as valências têm um papel importante, estando nelas incluídas a medicina veterinária. A necessidade de ações conservacionistas advém da ação antropogénica exercida no ambiente, que é o principal fator de ameaça de extinção. A medicina da conservação é uma área em desenvolvimento que tende para a resolução de problemas em que vê a saúde como um todo, relacionando a saúde meio ambiente, das populações selvagens, dos animais domésticos e do Homem.

O presente relatório foi desenvolvido durante o estágio num jardim zoológico e num centro de recuperação de animais selvagens. Os temas desenvolvidos foram escolhidos com o intuído de dar uma visão sobre atividades in-situ e ex-situ que o médico veterinário pode desempenhar na área da medicina da conservação, dando realce nos felinos selvagens. Será abordado o enriquecimento ambiental, pela importância para populações pertencentes a coleções de zoos e em animais em processos de reabilitação. No segundo capítulo será descrita uma pesquisa acompanhada para a espécie Panthera onca com o intuito de demostrar as possibilidades do uso de métodos não invasivos para o doseamento de hormonas esteroides e, por último serão relatados dois casos clínicos, um num indivíduo da espécie Alouatta guariba clamitans e outro num Puma concolor, onde foi instituída a terapia de ozono de forma a dar a conhecer esta terapia no auxílio de muitos tratamentos e a perspetiva das suas aplicações in-situ.

Palavras-chave: Medicina da conservação, Felinos selvagens, Enriquecimento ambiental, Doseamento hormonal não invasivo, Ozonoterapia

(10)
(11)

xi Abstract

Conservation of wildlife, where in-situ and ex-situ conservation are correlated, is a complex task that has gained voice since the 19th century, whose commitment and success depend on a multidisciplinary involvement in which all valences play an important role, including veterinary medicine. The need for conservation actions stems from anthropogenic action in the environment, which is the main threat of extinction. Conservation medicine is a developing area that tends to solve problems in which it views health as a whole, relating the health of the environment, the wild populations, domestic animals and human.

This report was developed during the internship at a zoo and wildlife recovery center. The themes developed were chosen with the aim of giving an insight into in-situ and ex-situ activities that the veterinarian can play in the field of conservation medicine, highlighting wild cats. Environmental enrichment will be addressed, by the importance for populations belonging to collections of zoos and in animals in rehabilitation processes. In the second chapter an accompanying research will be described for the Panthera onca species in order to demonstrate the possibilities of the use of noninvasive methods for the determination of steroid hormones and, finally, two clinical cases will be reported, one in an individual of the species Alouatta guariba clamitans and another in a Puma concolor, where ozone therapy was instituted in order to make this therapy known in order to aid in many treatments and the perspective of its in-situ applications.

Key-words: Conservation medicine, Wild cats, environmental enrichment, Non-invasive hormonal monitoring, Ozone therapy.

(12)
(13)

xiii Índice

Introdução ... 1

Capítulo 1. Enriquecimento ambiental ... 9

1.1.Introdução ... 9

1.3. Discussão ... 17

Capítulo 2. Doseamento hormonal não invasivo ... 19

2.1. Introdução ... 19

2.2. Estudo endócrino em Panthera onca na AMC ... 24

2.3. Conclusão ... 30

Capítulo 3. Ozonoterapia... 31

3.1. Introdução ... 33

3.2. Descrição dos casos observados ... 39

3.3. Discussão ... 44

Conclusão ... 45

Bibliografia ... 49

ANEXO 1. Descrição dos comportamentos observados em felinos durante a implementação do enriquecimento ambiental no Jardim Zoológico da Maia: (Adaptado de (Stanton, Sullivan, & Fazio, J.M., 2015)): ... 61

(14)
(15)

xv Índice de Figuras

Figura 1- a) Resgate a P. concolor devido a caça ilegal b) Estragos em viatura após acidente com P. concolor... 7 Figura 2- Diversas espécies de aves apreendidas devido ao tráfico. ... 7 Figura 3- Hibrido resultante do cruzamento entre diferentes espécies de Sagui sp. ... 8 Figura 4- Órfãos a) Myrmecophaga tridactyla, b) Callicebus personatus nigrifrons e c)

Ramphastos toco. ... 8

Figura 5- a) Tigre Asha a exibir comportamento de brincadeira na piscina com a fruta contendo carne no seu interior b) Tigre Jasmim exibir comportamento de brincadeira com a fruta contendo carne no seu interior. ...13 Figura 6- a) e b) Tigre Ankur exibindo comportamento de morder o saco de sarapilheira com carne no seu interior e c) exibindo comportamento de lamber nas paredes da piscina. ...13 Figura 7- Leoa Ana a manipular uma melancia contendo com carne no seu interior. ...15 Figura 8 - a) Lince com bola de palha suspensa no teto b) Lince com bola de palha depois de a remover do suporte c) Linces a exibir comportamento de brincadeira com bola de voleibol. ...16 Figura 9- Leoa Ana interagindo com bola de palha contendo fezes de cabra anã. ...17 Figura 10- Gerador de ozono medicinal. ...39 Figura 11- Administração de ozono a) Aplicação tópica com saco de silicone, b) Insuflação retal e c) Administração subcutânea. ...41 Figura 12- a) e b) Lesões antes da terapia com ozono; c) Lesões ao fim de 3 dias de terapia com ozono; d) Lesões ao fim de 7 dias de terapia com ozono e e) Lesões ao fim de 9 dias de terapia com ozono. ...42 Figura 13- a) Acupunctura e b) Insuflação retal de ozono. ...44

(16)

xvi Lista de abreviaturas

AMC- Associação Mata Ciliar

CITES- Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e da Flora Selvagem Ameaçadas de Extinção

IA- Inseminação artificial

IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IM- Intra-muscular

IUCN- União Internacional para Conservação da Natureza IV- Intra-venoso

MAE- Membro anterior esquerdo MPD- Membro posterior direito PO- Per os

SC- Subcutâneo UV- Ultravioleta

(17)

1 Introdução

Como resposta às alterações ambientais com origem antropogénica, na década de 90 do século XX, na América do Norte emergiu uma nova disciplina, a medicina conservacionista, definida por Deem e colegas como “a aplicação da medicina para melhorar a conservação da vida selvagem e dos ecossistemas” onde refere que a saúde dos seres vivos é uma manifestação do estado de saúde do ambiente ( Jakob-Hoff & Warren, 2012; Deem, Karesh, & Weisman, 2001). O conceito de conservação definido pela IUCN indica que são “todas as medidas tomadas para aumentar a sobrevivência de espécies e respetivos habitats” (IUDZG & CBSG(IUCN/SSC), 1993) e em 2002, a IUCN também descreve a conservação in-situ como “a conservação dos ecossistemas e habitats naturais e a manutenção e recuperação de populações viáveis de espécies nas suas envolvências naturais” e a conservação ex-situ como “a conservação de componentes de diversidade biológica fora dos seus habitats naturais” (IUCN, 2002). Em 2003 foi descrito as várias atividades que poderiam ser incluídas dentro da conservação in-situ, como resgates de espécies ameaçadas, a proteção e a recuperação de habitats, as reintroduções e o apoio geral a populações selvagens. Enquanto as atividades ex-situ incluiriam a gestão da genética e de programas de reprodução em cativeiro de espécies ameaçadas, ações de investigação e educação (Tribe & Booth, 2003). Adicionalmente, o conceito sorta-situ foi apresentado como o aproveitamento das populações ex-situ para a recolha de dados em falta que possam ser úteis à conservação de populações selvagens, sendo mais um exemplo dos benefícios na manutenção de populações em cativeiro (Aguirre, 2009). Salientando que estas novas abordagens acarretam novos avanços na medicina, levando a progressos na medicina preventiva e novas terapêuticas, na saúde, no bem-estar, na nutrição e no maneio reprodutivo (Tolhurst, Grogan, Hughes, & Scott, 2016; Mullineaux, 2014; Miller, 1992).

Desde então, um crescente número de profissionais, como os médicos veterinários, os médicos, os biólogos e as organizações ambientais têm suportado esta nova abordagem sendo este conjunto de profissionais das mais diversas áreas a chave para a conservação de vida selvagem (Deem S. , 2007; Deem, Karesh, & Weisman, 2001; Miller, 1993; Schwind, Gilardi, Beasley, Mazet, & Smith, 2015).

Os jardins zoológicos têm um papel importante na conservação. Já não são apenas coleções de animais exóticos expostos ao público usados para mostrar estatuto e poder na sociedade. Os zoos deixaram de ser menageries e progrediram para locais que desempenham papéis cruciais para a conservação (Santymire, 2013; Patrick, Matthews,

(18)

2

Ayres, & Tunnicliffe, 2007). Em 1993, surgia a World Zoo Conservation Strategy (WZCS) para o debate de estratégias que podem ser utilizadas pelos zoos para contribuir para a conservação global e qual a importância da educação do público para esse efeito (Wheater, 1995) uma vez que os animais em cativeiro apresentam elevado valor genético e o seu estudo permite a compreensão de alguns aspetos dos animais congéneres presentes na natureza (Aguirre, 2009).

A necessidade de estratégias conservacionistas advém das adversidades que o mundo natural enfrenta e que estão intimamente relacionados com a atividade humana devido à constante destruição e fragmentação de habitats que resultam no desaparecimento, isolamento de inúmeras populações e aumentam a proximidade entre espécies domésticas, selvagens e o homem. Isto tem como consequência a diminuição variabilidade genética das populações o que torna as populações mais suscetíveis a doenças como possíveis zoonoses (Aguirre, 2009; Deem S. , 2007; Deem, Karesh, & Weisman, 2001; Lanfranchi, Ferroglio, Poglayen, & Guberti , 2003; Silva, 2005). Relativamente a este ponto, a que Wildlife Conservation Society (WCS) organizou-se sob a bandeira de "One World, One Health" e implementou o objetivo de construir "pontes interdisciplinares para a saúde num mundo globalizado", resultando em 12 recomendações conhecidas como os Princípios de Manhattan ( Schwind, Gilardi, Beasley, Mazet, & Smith, 2015; Jakob-Hoff & Warren, 2012). O presente relatório de estágio intitulado de “Clínica e maneio de fauna selvagem em centros de recuperação e jardins zoológicos e o seu papel na conservação de fauna selvagem” foi elaborado no decorrer das atividades desenvolvidas em Portugal, no Jardim Zoológico da Maia, e no Brasil, na Associação Mata Ciliar (AMC), no âmbito do regulamento de Ciclo de Estudos conducente ao Grau de Mestre da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, com o propósito do desenvolvimento de competências médico veterinárias na área da conservação de vida selvagem como suporte ao aprofundamento e desenvolvimento das minhas competências profissionais. Ao longo do trabalho serão desenvolvidos os temas enriquecimento ambiental, doseamento hormonal através de métodos não invasivos e ozonoterapia, atividades que serão aprofundadas nos felinos selvagens (espécies onde houve maior contato durante estas atividades), que foram as escolhidas pelo fato de em conjunto representarem abordagens de conservação in-situ e

ex-situ anteriormente descritos e são exemplos de diferentes abordagens que o médico

veterinário pode laborar na área da medicina da conservação.

A preservação de espécies da ordem carnivora ou a sua necessidade sempre esteve presente culturalmente. Nesta ordem encontram-se os felinos que são encontrados na arte

(19)

3

desde as pinturas rupestres. Atualmente continuam a adornar a cultura estando presentes no sistema monetário de países, usado nos brasões familiares, em equipas desportivas, etc. (Loveridge, Wang, Frank, & Seidensticker, 2010). A família Felidae é representada por 32 espécies selvagens apresentando uma vasta distribuição por diferentes biótopos Excetuando a Antárctida e a Austrália. Destas, 22 encontram-se na Ásia onde 14 são endémicas. A Europa possui 7 espécies, assim como a Africa e a América possui 12 (Nowell & Jackson, 1996). Contudo, a ampla distribuição e abundância destas espécies têm diminuído levando a que grande parte das espécies se encontre ameaçada (Adania, Silva, & Felippe, 2014). A forma, dieta, tamanho e hábitos de vida variados, destas espécies estão associados à ocupação de nichos variados tendo um papel importante no topo da cadeia alimentar. Regulando o tamanho das populações das suas pressas contribuindo para o equilíbrio dos ecossistemas, sendo um indicador do equilíbrio dos ecossistemas (Cheida, Nakano-Oliveira, Fusco-Costa, Rocha-Mendes, & Quadros, 2011). Dentro desta família, os grandes felinos necessitam de grandes territórios e as populações viáveis exigem grandes extensões de habitat e populações de presas adequados. Assim, as estratégias para a proteção de grandes felinos também oferecem proteção para grandes "ecossistemas funcionais", sendo este o fator mais determinante e importante para a conservação destas espécies. Ou seja, onde existam populações prósperas de felinos há uma indicação de que os ecossistemas que os suportam são saudáveis (Seidensticker, Christie, & Jackson, 1999; Soulé & Simberloff, 1986; Noss, Quigley, Hornocker, Merrill, & Paquet, 1996). Quando se escreve sobre grandes felinos faz-se uma distinção não taxonomica pelo tamanho entre as espécies (grandes felinos: PV> 35Kg e pequenos felinos: PV< 35Kg), estando incluídos nesta categoria as espécie do género Panthera (P. tigris, P. leo, P. pardus, P. onca e P.

uncia), a espécie Acinonyx jubatus (Chita) e o Puma concolor. Devido à sua importância

ecológica e ao fascínio pessoal por estas espécies, este estágio foi orientado de modo a obter um maior conhecimento com estes animais na área da medicina da conservação. Olhando ao impacto humano nas espécies, os grandes felinos foram das primeiras espécies a sofrer os efeitos da ação do homem levando ao desaparecimento de muitos. Tendo desaparecido espécies primeiro na Europa, depois na América do Norte pelos europeus e mais recentemente na Africa e na Ásia (Woodroffe, 2001). Desta família, atualmente o lince ibérico, Lynx pardinus é o que se encontra mais ameaçado, segundo a lista vermelha da união IUCN, estando na categoria de extinção. Salvo uma inversão súbita e improvável na tendência da população humana, a marcha para economias em expansão ou atitudes em relação ao mundo natural, a persistência das espécies de grandes felinos no próximo século é um desafio ( Nowell K. , 2002). O seu declínio está relacionado diretamente com a destruição dos seus habitats e a caça, fatores bem visíveis no Brasil, como consequência do

(20)

4

desenvolvimento agrícola e pecuário, da exploração mineira e de madeira, das construções hidroelétricas, expansão urbana, além dos atropelamentos, tráfico e da perseguição direta na forma de caça e abate. Estas pressões colocam entraves à sobrevivência das espécies por levarem as populações ao isolamento e, consequentemente, à diminuição da sua variabilidade genética. Para não falar do impacto que causam no desenvolvimento e agravamento das doenças infeciosas e parasitárias (Loveridge, Wang, Frank, & Seidensticker, 2010; Aguirre, 2009; Adania, Silva, & Felippe, 2014; Filoni, 2005; Woodroffe, 2001).

O meu estágio na AMC consistiu no acompanhamento das atividades dos vários setores, sendo eles o CRAS onde se incluem os subsetores: “clínica”, “filhotes”, “nutrição”, “administração” e “felinos”. A Associação é uma organização sem fins lucrativos que desenvolve diversas ações para a conservação da biodiversidade. Fundada em 1987 no interior do estado de São Paulo, os seus programas consistem na recuperação de áreas degradadas e das matas ciliares (origem do nome da associação). As matas ciliares são florestas que se estendem ao longo de cursos de água de média e grande dimensão na região da Mata Atlântica e do Cerrado Brasileiro, que não se estendem muito para além da zona do curso de água e que o protegem os cursos de água um pouco como as pestanas (cílios) o fazem no olho. Dez anos depois começaram os trabalhos com a fauna através do Centro de Reabilitação de Animais Silvestres (CRAS) e com o Centro para Conservação dos Felinos Neotropicais (Centro de Felinos), situados na cidade de Jundiaí. Em 2012 era inaugurado o Centro Jaguaritê, que consiste num centro veterinário onde se presta cuidados a animais com cuidados especiais, com um bloco cirúrgico, e contém um laboratório onde atualmente são realizadas atividades em colaboração com o Departamento de Reprodução Animal da Universidade de São Paulo e a Equipa do Centro de Pesquisa de Espécies Selvagens Ameaçadas do Cincinnati Zoo, no estado de Ohio, EUA.

O CRAS-AMC tem como propósito a receção de animais feridos, órfãos ou apreendidos, prestando atendimento veterinário, com o objetivo de os devolver ao meio natural após o processo de reabilitação. No entanto, apesar da taxa de óbito ser elevada, o fluxo de entrada e saída dos animais é demasiado lento, com uma média de entrada de 10 animais por dia e com períodos de reabilitação que podem ser muito demorados. Com a necessidade de abrigar mais animais a extensão de área da Associação foi aumentando gradualmente desde da sua fundação. Ao longo dos seus 30 anos de existência, mais de 18.000 animais deram entrada e atualmente alberga mais de 400 indivíduos. Este elevado tempo de permanência é condicionado em muitos casos pelo fato dos animais terem entrado no CRAS-AMC após apreensões a particulares ou na sequência de casos de tráfico,

(21)

5

que por ordens judiciais necessitam de permanecer em instalações como estas até despacho do processo. O tráfico em si, acarreta outros problemas indiretamente, como animais que fogem ou são soltos em locais que não correspondem aos seus biomas, a possibilidade de reprodução com outras espécies do seu género, resultando, em alguns casos, em animais híbridos férteis, tudo isto com implicações sérias no equilíbrio dos ecossistemas e conservação de espécies. Um bom exemplo é a reprodução entre espécies de Callitrichidae, vulgarmente conhecidos como saguis, que ocorre por todo o país, exemplo também observado durante o estágio, principalmente entre o sagui-tufo-branco (Callithrix

jacchus) e o sagui-tufo-preto (C. penicillata). Neste setor, as atividades a desenvolver consistiam no acompanhamento dos tratadores nas suas tarefas diárias de alimentação, limpeza e desparasitações. O início do estágio na AMC coincidiu com início da primavera no hemisfério Sul, e como tal, houve simultaneidade com a época reprodutiva de muitas espécies, observado grande afluência de animais jovens nesse período. Dado o número de órfãos existentes, foi destacado um setor (“filhotes”) para estes, onde o trabalho consistia na alimentação, maneio e reabilitação dos mesmos. Neste caso, muitas vezes os estagiários eram os responsáveis pelo acompanhamento dos mamíferos, uma vez que necessitavam de cuidados parentais permanentes. Durante a minha permanência neste setor tive a meu encargo três pumas, P. concolor, dois cachorros-do-mato, Cerdocyon thous; três tamanduá-bandeiras, Myrmecophaga tridactyla, uma capivara, Hydrochoerus hydrochaeris; um macaco-sauá, Callicebus personatus nigrifrons; um macaco-prego, Sapajus libidinosus; gambás-orelha-preta, Didelphis aurita; gambás-orelha-branca, D. albiventris e um veado-catingueiro, Mazama gouazoubira. Mas, grande parte dos animais que davam entrada como órfãos, eram aves, que não necessitavam de cuidados permanentes como os mamíferos e eram destacados para o setor “clínica”, mesmo quando não necessitavam de cuidados médicos, mas era necessário elevada vigilância, sendo por isso o local mais adequado até poderem ser devolvidos à natureza ou serem colocadas nas instalações do CRAS. Dentro das espécies observadas, destacaram-se as coruja-do-mato (Megascops choliba), os tucano-toco (Ramphastos toco),os sabiás (Turdos sp.) e as andorinhas (Pygochelidon sp.), espécies observadas em grande número. Na clínica foram observados diversos casos clínicos, em muitos dos quais se instituía a terapia com ozono como prática comum, detalhada no capítulo 3. Neste setor, além da prestação médico-veterinário, o trabalho consistia na receção de animais, entregues por particulares e entidades como polícia federal, proteção civil e bombeiros, em resgates, alimentação e devolução ao meio natural dos mesmos. No setor da nutrição, o trabalho consistia na elaboração dos alimentos para todos os animais da associação e no setor administração foram acompanhadas as atividades burocráticas associadas à receção dos animais, licenças para libertação dos

(22)

6

mesmos, armazenamento dos dados e organização das fichas dos animais. Associado a isto, também houve a oportunidade de acompanhar as atividades de educação ambiental em parceria com escolas, função desempenhada pelos biólogos, com o intuito de alertar para os problemas da fauna a nível nacional e divulgação do trabalho da associação. Adicionalmente, mais duas atividades foram desenvolvidas. Uma vez que, como todas as organizações deste género são alvo de vistorias por parte do IBAMA (O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), é necessário o registo de todas as informações sobre os animais e como tal as necropsias eram realizadas em todos os casos, sendo por isso prestado também ajuda nesta tarefa. Já no final do estágio, foi iniciado um projeto no qual tive a oportunidade de observar o processo de criação de um protocolo para a criação de um recinto para reabilitação da espécie lobo-guará, Chrysocyon brachyurus. O setor “felinos” é um dos setores de destaque, bem diferenciado na associação no qual se insere o Centro de felinos. Neste departamento as atividades consistem no maneio, resgates, libertações e na intervenção veterinária, onde são destacados tratadores e um dos veterinários exclusivamente para este setor. O Centro de Felinos Neotropicais, é um local de referência internacional, fornecendo subsídios para diversas pesquisas, tanto em cativeiro como em vida livre, tendo como objetivo a implementação de estratégias para a conservação das oito espécies de felinos encontrados no território Brasileiro e que também estão presentes na AMC: Panthera onca (Jaguar), Puma concolor (Puma), Leopardus

pardalis (Jaguatirica), Leopardus wiedii (Gato-maracajá), Puma yagouaroundi (Gato

Maurisco), Leopardus geoffroyi (Gato-do-mato-grande), Leopardus tigrinus (gato-do-mato-pequeno) e Leopardus colocolo (gato-palheiro). Foi a elaboração de pesquisas no local que teve peso escolha da iniciação do estágio, pois este foi o primeiro setor onde estagiei e onde permaneci mais tempo consecutivo, em que a atividade principal desenvolvida consistiu no acompanhamento numa pesquisa no CJ para a conservação da espécie P. onca, desenvolvido no capítulo 2.

Relativamente ao Jardim Zoológico da Maia, este foi fundado em 1985 por iniciativa da Junta de Freguesia da Maia, com o intuito de criar um espaço pedagógico e de lazer para as crianças. Inicialmente a coleção de animais estava reduzida a dois casais de saguis, três macacos e algumas aves, cedidas pelo Jardim Zoológico de Lisboa. Com o tempo a coleção cresceu gradualmente, apresentando uma maior variabilidade de espécies. Adicionando às suas instalações um reptilário, uma piscina para o leão-marinho (Arctocephalus pusillus

pusillus) e mais recentemente um local de exposição denominado de “Esqueletolândia” onde

se encontram 41 esqueletos de diversos animais, em parte, resultado da parceria com a UTAD. A componente educacional é um dos pontos mais fortes, onde se realizam diferentes

(23)

7

atividades com vista à educação populacional sobre a conservação e a biodiversidade, sendo o público-alvo as crianças.

O meu estágio decorrido neste local envolveu práticas sobretudo de enriquecimento ambiental (desenvolvido no capítulo 1). No decorrer normal do estágio as atividades consistiam na limpeza da clínica e prestação de cuidados médicos aos animais internados e do reptilário, durante a manhã e durante a tarde na preparação das atividades de enriquecimento ambiental, maneio alimentar e necropsias.

a) b)

Figura 1- a) Resgate a P. concolor devido a caça ilegal b)

Estragos em viatura após acidente com P. concolor.

a) b)

Figura 2- Diversas espécies de aves apreendidas

(24)

8 a)

b) c)

Figura 3- Hibrido resultante do cruzamento entre

diferentes espécies de Sagui sp.

Figura 4- Órfãos a) Myrmecophaga tridactyla, b) Callicebus personatus nigrifrons e c) Ramphastos toco.

(25)

9 Capítulo 1. Enriquecimento ambiental 1.1.Introdução

O enriquecimento ambiental é um processo no qual são criados ambientes interativos e complexos aos animais selvagens em cativeiro, possibilitando a manifestação de comportamentos considerados naturais (Shepherdson, 1993). Em estado selvagem, grande parte do tempo e energia que despendem concentra-se na procura de alimento, procura e construção de abrigos, defesa do território e na procura de parceiros para acasalamento (Beresca, 2014). Em cativeiro, como é o caso em jardins zoológicos, estes comportamentos não conseguem ser expressados, devido ao confinamento, ao oferecimento do alimento e à exposição ao público a que estão sujeitos (Mellen & Machee, 2010). Este confinamento acaba por se traduzir num problema de bem-estar para os animais. Como tal, quando se fala de técnicas de enriquecimento ambiental está implícito o objetivo de proporcionar o bem-estar. O bem-estar traduz-se na forma como o animal lida com as condições do ambiente onde se insere e traduz-se no bem-estar físico, comportamental e social dos animais através do fornecimento de condições adequadas para as espécies envolvidas, incluindo, mas não necessariamente, condições das habitações, ambiente, dieta, cuidados veterinários e contato social, quando aplicável (EAZA, 2014).

O objetivo do enriquecimento ambiental é incentivar comportamentos próprios da espécie em questão e de satisfazer as suas necessidades físicas e psicológicas. Para tal, é importante conhecer bem o comportamento da espécie e as particularidades dos animais e as revisões bibliográficas têm um importante papel no início de um programa de enriquecimento ambiental (Stanton, Sullivan, & Fazio, J.M., 2015; Del-Claro, 2004; Shepherdson, 1993; Sajjad, Farooq, Anwar, Khurshid , & Bukhari, 2011).

Antes das práticas é necessário preparação e ter alguns pontos em consideração, principalmente sobre a ecologia da espécie em questão (Del-Claro, 2004). Um ponto muito importante é a necessidade de assegurar a segurança dos animais, da equipa e dos visitantes. Os materiais utilizados têm de ser adequados para não inferir danos físicos nos animais, não provocarem destabilização na estrutura hierárquica em animais que estão em grupos sociais e para não causar poluição visual quando estão expostos no recinto a que o público tem acesso. Neste último aspeto as atividades de educação podem ter grande influência, pois permitem o esclarecimento destas práticas e o prestamento de uma maior informação aos visitantes sobre os comportamentos que os animais expressariam na natureza e da sua importância. (Powell, 1995). Em muitos casos os recursos financeiros

(26)

10

também são um fator limitante, por isso é necessário averiguar a disponibilidade e o tipo de materiais.

O enriquecimento ambiental é dividido em cinco categorias: enriquecimento físico, social, alimentar, ocupacional e sensorial (Bloomsmith, Brent, & Schapiro, 1991). O enriquecimento físico está relacionado com o tamanho do recinto e os meios físicos que o compõe. O enriquecimento social pode obter-se com a presença de conespecíficos ou outros indivíduos através de contato direto ou indireto. A falta de interações sociais, está muitas vezes associada a problemas que causam stresse crónico nos animais, principalmente em felinos, levando a agressividade e a comportamentos estereotipados. Os felinos são espécies solitárias, exceto a P. leo e F. catus, que apesar de poderem ter sobreposição território, apenas que se encontram na época reprodutiva e no período em que os juvenis estão com as progenitoras. Em cativeiro o que se observa é a disposição das espécies por casais e assim permanecem juntos, na maioria, durante toda a vida, algo completamente antagónico do que aconteceria na natureza. Em casos como centros de reabilitação devido à falta de recursos, os animais também acabam por ser agrupados por espécies, como o observado na Associação. O enriquecimento alimentar está relacionado quanto ao tipo e quanto à forma como o alimento é apresentado. O enriquecimento ocupacional inclui estímulos que desafiem o animal a nível psicológico e/ou físico. O enriquecimento sensorial inclui a estimulação dos sentidos (visão, audição, paladar, olfato e tato). Neste último, recentemente têm-se introduzido, em muitos zoos, a utilização feromonas, com especial interesse de diminuir o stresse, algo que tem sido extrapolado do que já é em muito usado em animais de companhia como no gato doméstico ( Martínez-Macipe, Lafont-Lecuelle, Manteca, Pageat, & Cozzi, 2015; Amat, Camps , & Manteca, 2015; Dehnhard, 2011).

Para além desta classificação quanto ao tipo de enriquecimento, este pode dividir-se em naturalista ou não-naturalista de acordo com o género de itens utilizados, se têm um aspeto mais natural ou mais artificial, onde se praticam abordagens para a criação de um ambiente semelhante ao que se encontraria nos seus habitats e a criação de engenhos que permitam o reforço positivo como recompensa aos animais, que geralmente é através do uso de comida (Young, 2003).

Uma vez determinadas as práticas de enriquecimento a implementar, é importante confirmar se o efeito surtido é benéfico ou não, ou mesmo se é prejudicial. Como tal, é necessário avaliar os resultados. Essa avaliação tem de ser iniciada antes, durante e depois da implementação do enriquecimento ( Cipreste, Azevedo, & Young, 2010; Del-Claro, 2004). A observação e interpretação do comportamento tende a ser subjetiva e como tal são

(27)

11

necessários indicadores mesuráveis para eliminar esta subjetividade (Manteca & Salas, 2015; Fraser, Weary, Pajor, & Milligan, 1997). Para tal, são usadas ferramentas de avaliação comportamental, etogramas, ou outras medidas como o a mensuração dos níveis hormonais de cortisol, mensuração do ganho de massa muscular e peso e acompanhamento da longevidade dos animais (Stanton, Sullivan, & Fazio, J.M., 2015; Ganswindt, et al., 2012; Plowman & Park, 2010; Palme, Rettenbacher, Touma, El-Bahr, & Möstl, 2005; Del-Claro, 2004). A elaboração de etogramas é uma ferramenta muito utilizada em etologia/estudo do comportamento animal. Consiste em representações tabulares da qualificação e quantificação dos comportamentos exibidos por uma espécie, compondo uma lista dos atos comportamentais, acompanhada da descrição desses atos quando for o caso, sendo esta lista devidamente quantificada (Del-Claro, 2004).

Estas ferramentas além de avaliarem o efeito que está a decorrer com enriquecimento, permitem avaliar o bem-estar dos animais. Para essa avaliação do bem-estar usam-se indicadores mensuráveis que podem ser divididos baseados no ambiente ou nos animais. No indicador baseado no ambiente incluiu o tipo e forma das instalações, qualidade e quantidade do alimento fornecido, temperatura e os que são baseados em animais são os descritos anteriormente (Manteca & Salas, 2015).

Quando estamos a avaliar o bem-estar, avaliando o comportamento, por vezes deparamo-nos com um série de comportamentos anómalos que refletem as más condições a que os animais estão sujeitos. Enquanto respostas ao stresse agudo podem ser consideradas adaptativas, o stresse crónico leva a alterações a longo prazo, que se manifestam muitas vezes em comportamentos anormais. Nos zoos, estes problemas crónicos podem dever-se a: Iluminação artificial, restrição de movimentos, sons incomodativos, recolhas pequenas, odores estranhos, à proximidade com humanos, temperaturas desconfortáveis, poucos locais de alimentação, substratos desconfortáveis e uma má elaboração dos grupos nos recintos ( Morgan & Tromborg, 2007). Talvez a maior fonte de stresse seja o fato de os animais não terem qualquer tipo de controlo no meio envolvente, ou seja, não terem opções de escolha em relação ao meio ambiente (Sambrook & Buchanan-Smith, 1997). Os comportamentos estereotipados são um dos indicadores mais comuns de problemas de bem-estar em animais de zoo. O comportamento estereotipado é definido como um comportamento repetitivo e este pode ser um comportamento invariante sem imediata função aparente ou um comportamento causado por tentativas repetidas para se adaptar ao ambiente ou por uma disfunção no sistema nervoso central. Contudo tem sido sugerido que alguns comportamentos podem facilitar a adaptação a um ambiente inadequado, pois tais comportamentos podem levar a uma diminuição dos níveis de cortisol a longo termo

(28)

12

(Manteca & Salas, 2015; Gusset, 2005; Dantzer , 1991). carnívoros, onde se incluem os felinos, um dos comportamentos estereotipados mais observados são os de locomoção, onde se inclui o pacing (definição - Anexo 1), que pode ser explicado pelo fato de em estado selvagem percorrerem grandes distâncias. Este comportamento é um indicador muito utilizado para perceber o nível de bem-estar em jardins zoológicos, uma vez que este comportamento pode resultar na redução (Manteca & Salas, 2015).

1.2. Descrição das atividades desenvolvidas

O mês de estágio realizado no jardim zoológico da Maia permitiu o desenvolvimento e implementação de algumas atividades de enriquecimento ambiental. Foi realizado em diversas espécies de felinos, primatas e no urso pardo (Ursus arctos). Estas atividades foram desenvolvidas a pedido do Dr. Nuno Alvura com o objetivo de implementar estratégias já conhecidas para melhorar o bem-estar e não necessariamente com o intuito de implementar novas ideias e fazer um estudo para averiguar a sua eficácia. Estudo que não seria possível, pelo tempo de permanência no local ter sido diminuto para um estudo deste tipo. Os principais enriquecimentos estabelecidos foram o alimentar e sensorial (mais precisamente o olfatório) que muitas vezes podem parecer semelhantes e relacionados (Clark & King, 2008). Este capítulo tem o propósito de descrever as atividades realizadas nos felinos que foram as espécies de maior alvo de intervenção, reportando os comportamentos observados segundo Stanton, 2015, (ANEXO 1). Na coleção do zoo, as atividades foram realizadas com as espécies P. leo, P. tigris, P. pardus e Lynx lynx.

O zoo contém três tigres, um macho de pelagem branca, Ankur e duas fêmeas, a Jasmim e a Asha. As suas rotinas consistiam, como na maioria dos felinos da coleção do zoo, na permanência na recolha desde o fecho até abertura ao público e da alimentação no final do dia, exceto ao domingo, que era o dia estabelecido para jejum. Mas ao contrário dos outros animas, as fêmeas e o macho eram soltos no recinto em dias alternados para evitar situações de agressão. O enriquecimento alimentar foi realizado com a introdução de melancias e melões congelados contendo carne no seu interior, prática já anteriormente realizada e com resultados positivos. (Pereira , 2015). Na fruta foram realizados buracos profundos de forma a introduzir pedaços de carne (carne de bovino) e depois eram congeladas de um dia para o outro. Estas atividades eram realizadas consoante a disponibilidade de fruta que chegava ao zoo (em que muitas vezes era prestado auxilio para a separação dos bens alimentares que chegavam diariamente ao local). Foram colocadas nos dias em que as fêmeas estavam no recinto exterior. Quando saíram ambas se deslocaram à fruta, que despertou mais atenção na Asha (fêmea mais nova), algo verificado

(29)

13

em práticas anteriores (Pereira , 2015). A Jasmim rapidamente se desinteressou e continuou a explorar (definição- Anexo 1) o recinto, já a Asha continuou a brincar com uma das frutas e levou-a para a água onde permaneceu até já não restar mais nada, saltando (definição- Anexo 1) para dentro e fora de água, mordendo e lambendo a fruta e comendo a carne (definições- Anexo 1). No sensorial, foram usados sacos de sarapilheira misturados com carne pendurados num tronco em posição vertical que estava no centro recinto. O interesse por este objeto não foi manifestado exatamente da mesma maneira como o comportamento manifestado com fruta e neste caso a quem despertou mais interesse foi ao macho. Inicialmente, ao sair da recolha não se dirigiu diretamente ao saco, mas sim realizou a sua rotina de patrulha (definição- Anexo 1) e demarcação do território. Quando se deparou com o saco, cheirou-o e tentou removê-lo do tronco elevando-se no ar, mordendo e arranhando o saco (definições- Anexo 1). Assim que destruído, perdeu o interesse. Contudo, em um dos dias coincidiu com a limpeza da piscina deste recinto. O período de limpeza era de manhã antes da abertura ao público. O Ankur, apenas cheirou o saco e logo se deslocou para a piscina ainda vazia, onde se deitou e começou a lamber (definição- Anexo 1) as “paredes” da piscina, comportamento comum segundo a descrição dos tratadores. Neste caso, para estudos futuros, este tipo de alterações na rotina dos animais tem de ser tido em conta para a avaliação e interpretação dos resultados que se obtenham.

a)

c) b)

Figura 5- a) Tigre Asha a exibir comportamento de brincadeira na piscina com a fruta contendo

carne no seu interior b) Tigre Jasmim exibir comportamento de brincadeira com a fruta contendo carne no seu interior.

(30)

14

O uso de fruta com carne também foi instituído nos leões, no macho e fêmea adultos, Voitila e Ana e nos leopardos, também um casal adulto. Nos leões, quando saíram da recolha o primeiro comportamento que apresentaram foi fossar, tocar nos narizes e cheirar o ar, (definições - Anexo 1), comportamentos observados sempre que os animais eram soltos. Depois, o macho dirigiu-se ao objeto cheirando-o e depois dirigiu-se para outro ponto do recinto onde permaneceu deitado. Já a Ana, primeiro cheirou a fruta e de imediato começou a brincar (definição- Anexo 1). No entanto, o resultado não foi positivo, o recinto apresenta um desnível e como a fruta foi colocado no nível de cima, com a manipulação do objeto, este rebolou até uma das paredes do recinto, com a perseguição e os problemas neurológicos apresentados pelo animal que justificavam a fraca visão, a Ana acabou por tocar na cerca elétrica, fugindo de imediato e a partir daí evitou (definição- Anexo 1) o objeto o resto do dia. Claramente o animal demostrou interesse pelo objeto, mas esta prática foi um bom exemplo de como tudo tem de ser planeado para não causar problemas, como medo e dor nos animais. Talvez se o animal tivesse boa visão não teria acontecido, ou teria na mesma com o curiosidade que demostrou. Este é um bom exemplo para que no futuro, se tenha em conta o local onde se coloca objetos que rebolem. A meu ver este tipo de enriquecimento é benéfico, mas colocaria num outro ponto do recinto, onde não há o desnível acentuado, para não promover o deslocamento rápido do objeto e situações que causem dor e medo nos animais. Nos leopardos também foi praticado este tipo de enriquecimento, mas os animais mostraram pouco interesse, cheiraram a fruta e rapidamente a deixaram de parte. Estes exemplares exibiam algum comportamento de

pacing, principalmente a fêmea quando os tratadores entravam na recolha para

a) b) c)

Figura 6- a) e b) Tigre Ankur exibindo comportamento de morder o saco de sarapilheira

com carne no seu interior e c) exibindo comportamento de lamber nas paredes da piscina.

(31)

15

alimentação, segundo estes. Nestes animais não tive a oportunidade de implementar outros tipos de enriquecimento nem com mais frequência.

Na coleção também se encontram três linces euroasiáticos. Um macho adulto exposto ao público e duas fêmeas juvenis que se encontravam em quarentena. Foi nas fêmeas que foi realizado o enriquecimento sensorial. Para estas foram utilizadas bolas de palha contendo no seu interior fezes de cabra anãs (Capra hircus) e de zebras da planície (Equus quagga) e uma bola de voleibol rebolada também em fezes de cabra. A bola de voleibol foi possível de introduzir porque os animais não se encontravam expostos ao público, com os outros não obtive autorização para tal. As bolas de palha foram colocadas em suspensão no teto da recolha e no chão. As duas fêmeas demostraram o mesmo tipo de comportamentos e intensidade, inspiraram o ar, manipularam o objeto, brincaram, lamberam, rebolaram de costas (definições- Anexo 1) sobre o material espalhado no chão, já destruído. Nestes animais quando era oferecido o alimento, de imediato se caminhavam na sua direção e levam-no para um sítio mais recôndito para se alimentarem. Este comportamento não foi o observado, quando o alimento foi fornecido depois de algum tempo a brincarem, estes ignoram-no, continuando a manifestar interesse pelos objetos, mesmo com eles já desfeitos. Com a bola os comportamentos observados foram muito similares. Estas estratégias deram um resultado bastante satisfatório e uma vez que eles se encontram num espaço ainda menor. A bola de voleibol foi introduzida depois das de palha e optei por só colocar fezes de cabra, uma vez que foi com estas que manifestaram mais interação, o que pode ser explicado por ser esta espécie uma presa natural e as zebras nem sequer coabitam no mesmo território que estes felinos (Kaiser & Schulz, 2013; Schmidt K. , 2008).

Figura 7- Leoa Ana a manipular uma melancia contendo com carne no

(32)

16

O enriquecimento sensorial com palha também foi implementado nos leões, com fezes de cabra e de zebra. Quando saíram da recolha foi observado a interação entre o macho e a fêmea como descrito anteriormente. Não mostraram interesse sobre as fezes de cabra, o que pode ser explicado pela proximidade com o recinto destes animais que permite estímulos olfatórios, auditivos e visuais constantes e/ou pelo fato pelas zebras serem uma presa natural (Wells, 2009). O macho foi o primeiro a intercetar a bola, cheiro-a, lambeu (definições- Anexo 1) e logo perdeu o interesse. A fêmea interagiu com a bola despois do macho a deixar. Cheirou-a, exibiu o reflexo de flehmen (definição - Anexo 1) e mordeu a bola e arranhou até a desfazer. Uma vez desfeita caminhou em direção ao macho e permaneceu junto deste apresentando comportamento de tocar no nariz, grooming e fossar (definições - Anexo 1).

b)

a) b) c)

Figura 8 - a) Lince com bola de palha suspensa no teto b) Lince com bola de palha depois de

(33)

17 1.3. Discussão

Uma das implementações que quis realizar foi a utilização de urina das cabras anãs e das zebras da planície e sangue congelado, mas não tive essa oportunidade. Também gostaria de ter implementado enriquecimento com as fezes dos herbívoros nos tigres, mas não foi possível. Uma outra sugestão, também não realizável, foi a colocação de presas vivas como peixes nos tigres, uma vez que possuíam piscina. Em relação aos materiais disponíveis estes acabavam por se limitar aos alimentos doados, aos materiais biológicos de presas naturais que se encontravam no zoo e a materiais que conseguíamos obter em casa. Com mais tempo gostaria de realizar mais estratégias de enriquecimento nos leopardos, pois foi o grupo com o qual tive menos contato e que na minha opinião merecia mais atenção, uma vez que aparentavam ser os espécimes com menor bem-estar. Nesta espécie além do enriquecimento alimentar, olhando ao que aprendi, abordaria a possibilidade de implementar um enriquecimento físico e desenvolver mais o enriquecimento sensorial utilizando feromonas e/ou talvez mais plausível, o uso de canela e catnip, uma vez que está descrito um efeito prolongado na redução do pacing e promovem comportamentos naturais, que seria mais fácil o acesso e menos oneroso (Resende, et al., 2011; Wells & Egli, 2004). Em relação às respostas do tipo catnip (erva-dos-gatos), estas foram inicialmente descritas por Todd em 1962 como a resposta do gato doméstico (que pode ser constituída por quatro fases: 1º cheirar, 2º lamber/mastigar, 3º esfregar o queixo e bochechas e 4º rodar a cabeça e esfregar o corpo; estando estes comportamentos frequentemente relacionados com comportamento sexual) à planta Nepeta cataria e atualmente estende-se a muitas outras espécies de plantas como do género Actidina e já foi reportado em espécies das subfamílias

Pantherinae e Feliniea (Bol & et al, 2017; Todd, 1962). Durante as atividades foi sugerido

Figura 9- Leoa Ana interagindo com bola de palha contendo

(34)

18

pela equipa do zoo a utilização de folhas de kiwi (Actinidia deliciosa) pelos resultados relatados no gato doméstico (Zhao, et al., 2006). Acho este ponto relevante, pois segundo a bibliografia existem diversas espécies botânicas que contêm substancias reconhecidas pelo desencadeamento destas respostas e penso que será interessante averiguar o efeito destas nas diferentes espécies de felinos pelos resultados benéficos que podem promovem, por ser um enriquecimento do tipo naturalista e pelo fácil acesso ao este tipo de recursos. De uma forma global, gostaria de ter implementado as estratégias utilizadas em todos os animais averiguando as melhores táticas para cada indivíduo. Outra estratégia que gostaria de abordar seria a implementação destas atividades ao amanhecer e anoitecer, uma vez que são os períodos de maior atividade destas espécies, mas não era exequível com as regras de funcionamento do zoo (Macdonald & Loveridge, 2010).

De um modo geral, em relação ao tipo de práticas realizadas acho que tiveram resultados positivos, embora não tenha conseguido avaliar de uma forma mais concreta e cientifica os efeitos causados e os momentos de observação correspondiam ao primeiro contato que os animais tinham com os objetos. Como o objetivo era implementar ideias anteriormente já desempenhas ou sugeridas pela equipa, reforço que foi uma atividade positiva para os animais alvo, uma vez que como passam muito tempo inativos em cativeiro estas práticas permitiram estarem mais ativos ( Wells & Egli, 2004). Também a implementação, principalmente, de enriquecimentos alimentares por si só foi benéfica, uma vez que é considerado o mais importante dos enriquecimentos (Hoy, Murray, & Tribe, 2010). Depois do estágio na Associação, com a oportunidade que tive em aprender mais sobre estudos etológicos com a espécie lobo-guará, a abordagem que desempenharia seria diferente, mas continuaria dependente da duração do período em que lá estive e dos materiais que disponha, da disponibilidade dos tratadores, da compatibilidade das minhas ideias com a exposição ao público e regras internas do zoo. Em relação à disponibilidade dos tratadores, apercebi-me que este era um importante fator e foi o que mais impôs limitações as minhas ações. Ações que que podiam ser desempenhadas por eles também e que não podia realizar sozinha, por isso independentemente da minha presença, envolveriam muito do seu tempo, algo tão importante e que constatei nas fontes bibliográficas que este fator se estende a muitos outros locais sendo identificado como o fator limitante maior na implementação de enriquecimento ambiental (Hoy, Murray, & Tribe, 2010). De uma forma geral, as restrições sujeitas e os aspetos negativos deram-me uma forma de reconhecer os tipos de erros que se podem acometer e uma melhor perspetiva sobre o assunto e abordagens futuras para estas práticas.

(35)

19 Capítulo 2. Doseamento hormonal não invasivo

2.1. Introdução

Na área da conservação de animais selvagens o sucesso está dependente do êxito que os indivíduos apresentam ao lidar com o seu ambiente, sobrevivem e se reproduzem. Na avaliação deste êxito, o doseamento hormonal destaca-se como uma ferramenta para obter informação para o conhecimento básico da fisiologia animal. As técnicas não invasivas têm surgido na área da vida selvagem pelas inúmeras vantagens que apresentam e pela informação obtida a nível reprodutivo, atividade metabólica, saúde e bem-estar permitindo definir ações a nível de conservação. Assim sendo, a compreensão dos processos endócrinos da função reprodutiva e da atividade adrenal é uma chave para o sucesso do maneio das populações, tanto in-situ como ex-situ (Micheletti, Brown, & Walker, 2014; Ganswindt, et al., 2012; Bechert, 2012).

O desenvolvimento metodologias moleculares através de técnicas não invasivas possibilitou a ampliação das suas aplicações na medicina veterinária: permitindo novos métodos de diagnóstico, estudos genéticos, do perfil metabólico, endócrino e nutricional e o desenvolvimento de metodologias analíticas permitiram a expansão nas aplicações na área dos animais selvagens (Bechert, 2012; Brown, 2006). As técnicas não invasivas caracterizam-se por processos que não envolvem a imobilização física e/ou química dos animais e onde são utilizadas amostras biológicas como pelo, penas, saliva, material regurgitado, pele, urina e fezes ao contrário de métodos invasivos que se baseiam muitas vezes na recolha de sangue nos indivíduos e onde é necessária a contenção destes. A escolha da amostra biológica deve ter por base a exequibilidade da recolha da amostra, o tipo de informação requerida, as diferenças do metabolismo e excreção que ocorrem nas espécies e a metodologia analítica disponível (Hodges, Brown, & Heistermann, 2010). É devido à exequibilidade das amostras que os métodos não invasivos sobressaem sobre os métodos invasivos quando implementados em animais selvagens. Por exemplo, num estudo onde se realize uma monitorização endócrina é necessária uma análise longitudinal (ao longo do tempo) que implica contenções e sedações repetidas por longos períodos de tempo, o que é impraticável em muitas situações e adicionalmente também há estudos onde se verificou que os fármacos usados na contenção química podiam influenciar a secreção de hormonas esteroides (Brown & Royal, 2000; Lawson, 1985; Free, Jaffe , & Cheng, 1980). A recolha torna-se ainda mais complexa quando tem de ser realizada in-situ, sendo logisticamente difícil e ainda mais perigosa para o animal e para a equipa. A recaptura

(36)

20

desse animal para monitorização longitudinal é, portanto, impraticável (Micheletti, Brown, & Walker, 2014). Assim as metodologias não invasivas minimizam o stresse provocado nos animais e permitem a colheita de amostras sequenciais durante longos períodos de tempo, possibilitando estes estudos (Schwarzenberger, 2007; Brown, 2006; Graham L. , Schwarzenberger, Möstl, & Galama, 2001). Outra vantagem é que a quantidade das amostras recolhidas geralmente é bastante superior à necessária para análise podendo ser a mesma amostra analisada várias vezes e/ou utilizada para diferentes estudos. Além disso, em muitas situações as amostras permitem avaliações, sobre a concentração real de hormonas endócrinas no momento da recolha, horas, dias ou mesmo anos após a colheita ao invés das amostras de sangue cujas concentrações podem estar alteradas. Como tal, o uso de técnicas não invasivas tem inúmeras vantagens sendo por isso uma mais-valia no estudo de animais selvagens (Micheletti, Brown, & Walker, 2014; Ganswindt, et al., 2012). Embora a colheita de sangue seja geralmente considerada uma técnica invasiva, podemos recolher sangue de uma forma menos invasiva ou mesmo chamar-lhe não invasiva através do uso de artrópodes. Estas técnicas foram descritas pela primeira vez por Von Helversen e colegas, em 1986, onde demostraram que o sangue recolhido através de artrópodes da família Reduviidae poderia fornecer informações dos hospedeiros a nível endócrino, imunológico e possibilitar análises bioquímicas (Kersey & Dehnhard, 2014; Helversen, Vollet, & Nflfiez, 1986). Desta forma foram desenvolvidos vários estudos permitindo o uso de artrópodes para recolha de sangue não só em animais de laboratório como em animais selvagens em cativeiro e na natureza (Puente, et al., 2015; Habicher , Feldmann, Kolter , & Nogge, 2013) Assim, é possível analisar sangue de uma forma menos invasiva e este método revela-se menos indutor de stresse nos animais quando comparado com os métodos convencionais de recolha de sangue, evitando a contenção química dos animais ( Voigt, et al., 2013; Voigt, Peschel, Wibbelt, & Frõlich, 2006; Voigt, et al., 2004). Muitos têm sido os estudos conduzidos a nível da conservação, e através deste método se tem obtido informações a nível genético, estudos das populações, doenças parasitológicas, identificação de espécies ameaçadas e distribuição de agentes infecciosos. (Puente, et al., 2015; Calvignac-Spencer, et al., 2013; Schaub, Lawrenz, & Stadler, 2012). A utilização destes artrópodes tem como desvantagem o número de animais necessários, o fato de as refeições demorarem vários minutos e por vezes serem necessárias várias picadas o que pode incomodar o animal. Relativamente ao desconforto provocado no hospedeiro, a família

Reduviidae demostra ser a que provoca menos incomodo e são os insetos hematófagos

(37)

21

O tipo de informação requerida também influência o tipo de amostras em conjunto com a viabilidade da recolha. O pelo e penas são usados em estudos genéticos, distribuição das populações, relação das espécies com o habitat e com fatores ambientais e sobre estado nutricional ( Davenport, Tiefenbacher, Lutz, Novak, & Meyer, 2006; Apps, McLellan, & Woods, 2004; Hogan, Cooke, Burridge, & Norman, 2008). A pele também pode ser usada em estudos genéticos e sobre o bem-estar, e na sua recolha podem se utilizar dardos especiais para biopsia (Bechert, 2012). A saliva pode ser usada na área forense, podendo identificar predadores (Williams, Blejwas, & Johnson, 2003). Já a urina e fezes podem fornecer algumas das informações que as amostras anteriores não possibilitam e têm-se revelado bastante úteis a nível da endocrinologia (Scwartz & Monfort, 2008; Hausknecht, Gula, & Pirga, 2007).

Os estudos realizados utilizando urina e fezes tornaram-se populares como uma forma de monitorização da função endócrina de vários mamíferos e aves (Keay , Singh, & Gaunt, 2006; Scwarzenberger, Mostl, & Palme, 1996). A nível da função reprodutiva, nas fêmeas as principais hormonas monitorizadas são a progesterona e estrogénio e nos machos a principal hormona é a testosterona. A mensuração destas hormonas permite compreender o ciclo éstrico e a sazonalidade, idade da maturação sexual, relacionar com a agressividade, comportamento sexual, dominância, etc. A nível da função adrenal as principais hormonas estudadas são o cortisol e corticosterona através das quais podemos obter informação sobe o stresse crónico, comportamento, relacionar stresse com disfunções reprodutivas, identificação da dor, relações de dominância, presença de predadores, etc. (Schmidt, et al., 2008; Franz, 2007; Graham L. , 2006). A recolha da urina em cativeiro pode ser obtida em pavimentos de betão e no habitat natural pode ser recolhida na neve ou areia, não sendo tão acessível como as fezes e em animais em cativeiro que vivam em grupo (Touma & Palme, 2005). Nos finais dos anos 80 a mensuração hormonal nas fezes desenvolveu-se para a caracterização reprodutiva em muitas espécies, domesticas e selvagens, e na década de 90, iniciou-se o doseamento de glucocorticoides para estudos de bem-estar e maneio de populações selvagens (Monfort, 2003). A monitorização hormonal fecal revelou-se muito útil na compreensão do mecanismo endócrino na família Felidae, uma vez que as hormonas esteroides são excretadas quase exclusivamente nas fezes na forma conjugada, aproximadamente 86% (Palme, Rettenbacher, Touma, El-Bahr, & Möstl, 2005). O uso de fezes também tem uma outra grande vantagem sobre os métodos invasivos relativamente ao doseamento de glucocorticoides. O processo de captura dos animais para recolha de sangue com o objetivo da determinação de glucocorticoides é por si só indutora de stresse e portanto influenciador dos níveis de glucocorticoides, podendo mascarar completamente os

(38)

22

valores basais, o que não acontece com os níveis medidos nas fezes. Contudo, o amortecimento de picos curtos de secreção hormonal pode também ser uma desvantagem se forem utilizadas amostras fecais para monitorizar estas alterações de curto prazo (Wielebnowski & Watters, 2007; Brown, 2006; Palme, Rettenbacher, Touma, El-Bahr, & Möstl, 2005; Brown, 1994). A flutuação diurna dos glucocorticoides e da testosterona é menos acentuada nas fezes que no sangue ou urina em algumas espécies (Hodges, Brown, & Heistermann, 2010; Franz, 2007). Para além destas informações, em que basta uma pequena quantidade da amostra recolhida, podemos simultaneamente obter informação sobre doenças virais, parasitas gastrointestinais, dieta e pode ser aplicada em situações forenses como a saliva (por exemplo, em áreas onde se suspeita a predação de gado) (Scwartz & Monfort, 2008; Schwarzenberger, 2007). A recolha de fezes em cativeiro é simples, mas em animais alojados em grupos há necessidade de diferenciar os seus excrementos quando é necessário conhecer a qual indivíduo corresponde cada amostra e para tal pode-se marcar o alimento utilizando por exemplo corantes alimentares, sementes como milho, etc. (Wielebnowski & Watters, 2007). A recolha de fezes in-situ é mais difícil, mas neste campo Sam Wasser tem conduzido estudos para o uso de cães com a finalidade de localizarem e identificarem amostras fecais individuais de animais in-situ (Wasser, et al., 2004). Quando se recolhe este tipo de amostras é necessário ter em atenção variáveis, como a origem da amostra, a frequência de defecação, o estado das amostras, o clima e a etologia da espécie (Wielebnowski & Watters, 2007). A utilização destas amostras em felinos selvagens tem aumentado, uma vez que são um grupo de difícil maneio, pelo perigo e limitações vinculadas à contenção física e química, descritas anteriormente. A informação proporcionada pelas fezes tem permitido caracterizar o ciclo reprodutivo de muitas espécies ameaçadas, sendo muitos estudos realizados em espécies Brasileiras (Kinoshita , et al., 2011 ; Adania C. , 2009; Paz, et al., 2007; Viau, Felippe, & Oliveira, 2005; Swanson & Brown, 2004; Morais, et al., 2002; Moreira, 2001; Morais , Moreira, & Moraes, 1996).

Para mensuração de hormonas esteroides os métodos analíticos mais utilizados são os imunoensaios competitivos, sendo os mais usados os radioimunoensaio (RIE) ou o enzimaimunoensaio (EIE) (Hodges, Brown, & Heistermann, 2010). Os princípios em que se baseiam para obter uma mensuração são similares. O RIE é um método usado desde 1960 por rotina e muito preciso, mas utiliza materiais radioativos sendo necessário licenças para a sua utilização e requer materiais dispendiosos (Thorel & Larson, 1978). Com a necessidade de desenvolver tecnologias mais rentáveis e com o desenvolvimento de programas de responsabilidade ambiental foram desenvolvidos outros métodos, como o EIE, a quimiluminescência e a espetrometria de massa. Os EIEs têm ganho mais popularidade,

(39)

23

principalmente em trabalhos com fauna selvagem, substituindo os RIE pelas vantagens que oferecem: não são utilizados materiais radioativos, são um método muito fiável, são mais sensíveis para concentrações baixas, é um método de análise rápida e os custos associados aos materiais usados são pequenos (Johannsson, 1991; Moreira, 2001; Graham L. , Schwarzenberger, Möstl, & Galama, 2001; Ziegler & Wittwer, 2005). Os progressos neste campo têm sido notórios em animais selvagens havendo muitos estudos publicados que recorrem a este método e já há laboratórios a criar as suas próprias placas ELISA para leitura concebidas para medir metabolitos específicos de esteroides em certas espécies selvagens. Contudo há uma enorme necessidade de validar o método para cada espécie e esteroide de interesse, uma vez que o metabolismo e excreção dos esteroides variam entre espécies e género (Palme, Touma, Arias, Dominchin, & Lepschy, 2013; Ziegler & Wittwer, 2005; Palme, Rettenbacher, Touma, El-Bahr, & Möstl, 2005; Touma & Palme, 2005). Esta é uma boa metodologia e tem-se revelado universal para o perfil de metabólitos nas fezes em muitas espécies, incluindo os felinos ( Umapathy, Kumar, Kabra, & Shivaji, 2013).

A avaliação da atividade endócrina como a monitorização do stresse e hormonas sexuais através de amostras fecais, em muitas espécies como os felinos, utilizando metodologias não invasivas tem ganho atração para estudos de bem-estar (uma vez que permitem uma avaliação objetiva), etológicos e de conservação ( Johnson, et al., 2006; Palme, Rettenbacher, Touma, El-Bahr, & Möstl, 2005; Morais , Moreira, & Moraes, 1996; Wielebnowski & Watters, 2007). As atividades de enriquecimento ambiental, para além do bem-estar que podem proporcionar, podem por sua vez podem influenciar e serem importantes para o sucesso reprodutivo de muitas espécies (Schwarzenberger, 2007). O maneio reprodutivo que envolve práticas que resultam na conservação in-situ e ex-situ tem de ser bem planeado e os fatores de stresse devem ser eliminados ou evitados. Mais uma vez aqui o repertorio do comportamento e os padrões das atividades devem ser próximos ao que se observaria em estado selvagem e é importante que os animais possam expressar comportamentos naturais e a ambientação aos recintos é fundamental (Paz R. , 2012) A troca de informação sobre investigação na área da endocrinologia em vida selvagem nunca teve um lugar de partilha até 2010 quando foi criada uma plataforma para a troca de informação pela Sociedade Internacional de Endocrinologia de Vida Selvagem (ISWE). Nesse mesmo ano foi realizado um encontro no Cincinnati Zoo and Botanical Garden, e no ano seguinte no Toronto Zoo que resultou na junção de informação de mais de 12 países espalhados pelos 6 continentes com o propósito de introduzir a ISWE à comunidade científica e mostrar isto como um grupo global de conservação e investigação endocrinológica em vida selvagem (Ganswindt, et al., 2012).

Imagem

Figura 1- a) Resgate a P. concolor devido a caça ilegal b)  Estragos em viatura após acidente com P
Figura 4- Órfãos a) Myrmecophaga tridactyla, b) Callicebus personatus nigrifrons e c)  Ramphastos toco
Figura 5- a) Tigre Asha a exibir comportamento de brincadeira na piscina com a fruta contendo  carne no seu interior b) Tigre Jasmim exibir comportamento de brincadeira com a fruta contendo
Figura 6- a) e b) Tigre Ankur exibindo comportamento de morder o saco de sarapilheira  com carne no seu interior e c) exibindo comportamento de lamber nas paredes da
+7

Referências

Documentos relacionados

Durante as nictemerais, os valores do fósforo total e do fosfato total nos dois viveiros apresentaram também valores acima do recomendado pela GAA, exceto para o fosfato total na

Distribuição espectral dos sistemas de iluminação LED e do controle Observa-se na Figura 12A, a análise de componentes principais, relacionado à biometria das mudas pré-brotadas

A respeito das propostas de desregulamentação nas relações de trabalho e da seguridade social no Brasil, percebidas tanto nas defesas do Banco Mundial quanto nas

(grifos nossos). b) Em observância ao princípio da impessoalidade, a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, vez que é

De acordo com a fase processual, o Ministério Público ou o juiz podem estabelecer seja dado apoio psicossocial e até mesmo protecção por teleassistência à

Este des- locamento desde o dinheiro e do poder administrativo para a comunicação, estendido por espaços públicos mais ou menos autónomos, levará a que o pro- cesso político

In order to increase the shelf life and maintain the quality and stability of the biological compounds with antioxidant activity present in Castilla blackberry fruits, a

Assim, o Yamazumi Chart revelou-se uma mais valia na realização dos balanceamentos num ambiente Lean, oferecendo as melhores soluções e permitindo identificar as tarefas