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A FORMAÇÃO DO CAPITAL SOCIAL EM SANTA CRUZ DO SUL/RS A PARTIR DOS PADRÕES MORFOLÓGICOS DE ORGANIZAÇÃO ESPACIAL

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A FORMAÇÃO DO CAPITAL SOCIAL EM SANTA CRUZ DO SUL/RS 

A PARTIR DOS PADRÕES MORFOLÓGICOS DE 

ORGANIZAÇÃO ESPACIAL

 

André de Souza Silva 1  Robriane Lara 2 

Resumo 

Investigar  de  que  modo  se  estruturam  os  diferentes  níveis  de  organização  sócio­  espacial  na  cidade  de  Santa  Cruz  do  Sul  ­RS  é  o  escopo  desta  pesquisa.  Neste  sentido,  assume­se  que  a  configuração  espacial  urbana  condicione  parte  do  comportamento  social  devido  à  autonomia  do  ambiente  construído  em  relação  às  inúmeras  influências  do  meio  e  constância  ao  longo  do  tempo.  Fundamentos  conceituais  e  teóricos  inerentes  à  Sintaxe  Espacial  (Hillier  e  Hanson,  1984)  são  utilizados  para  modelar,  mensurar  e  simular  o  sistema  de  espaços  públicos  da  cidade  e  sua  relação  com  a  solidariedade  orgânica  e  mecânica  postulada  por  Durkheim  (1973).  Os  resultados  alcançados  indicam  a  existência  de  inter­relação  entre  a  estrutura  espacial  urbana  e  o  modo  como  as  pessoas  se  apropriam  conjuntamente  dos  espaços  públicos.  A  possibilidade  de  capturar  a  essência  da  organização sócio­espacial, bem como as abordagens e contribuições de diferentes  áreas  do  conhecimento,  é  ainda  uma  questão  em  aberto  para  a  construção  do  conceito  de  Capital  Social.  Deste  modo,  faz­se  necessário  suscitar  novos  questionamentos  sobre  a  possibilidade  do  Capital  Social  ter  uma  abordagem  mais  sistêmica  e  adotar  conceitos  multidisciplinares,  sobretudo  as  contribuições  dos  estudos configuracionais urbanos. 

Arquiteto e Urbanista (UNISINOS), Doutorando e Mestre em Planejamento Urbano e Regional (PROPUR/UFRGS); Professor  do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões (URI­Santiago).  Universidade Federal  do Rio Grande  do Sul  – UFRGS.  Programa de Pós­Graduação  em Planejamento Urbano  e Regional  –  PROPUR  Rua Sarmento Leite, 320 – 5º andar – sala 510 – Centro – CEP 90050­170 – Porto Alegre – RS.  E­mail: andre_architecture@yahoo.com.br  2  Arquiteta e Urbanista (UNISINOS); Mestranda em Desenvolvimento Regional (PPGDR/UNISC).  Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC.  Programa de Pós­Graduação em Desenvolvimento Regional – Mestrado e Doutorado.  Av. Independência, 2293 – Bairro Universitário – CEP 96815­900 – Santa Cruz do Sul – RS.  E­mail: robrianelara@yahoo.com.br

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1.  A  inter­relação  da  lógica  social  do  espaço  e  a  formação  do 

Capital Social: fundamentação conceitual e teórica 

Propõe­se um recorte específico do estudo dos padrões de organização social tão­  somente  por  meio  da  análise  da  configuração  espacial  urbana,  centrando­se  nos  fundamentos  conceituais  e  teóricos  inerentes  à  Sintaxe  Espacial  em  consonância  com  a  formação  do  Capital  Social  na  cidade  de  Santa  Cruz  do  Sul,  tomada  como  estudo de caso. Isto significa que o enfoque adotado irá demonstrar em que medida  a  integração  sócio­espacial,  entendida  como  a  base  física  da  formação  do  Capital  Social,  pode  ser influenciada  direta  ou indiretamente  pela  configuração  espacial  da  forma  urbana.  Cabe  salientar  que  o  modo  pelo qual  o enfoque  conceitual  e  teórico  pode  vir a  contribuir para  responder  a  questão  proposta  é  uma  decorrência  natural  da escolha do instrumental metodológico. Neste sentido, será abordado detidamente  o  fenômeno  urbano  da  formação  do  Capital  Social  sob  o  ponto  de  vista  configuracional, não se propondo a incursões sobre outros condicionantes (culturais,  econômicos etc) que também têm seu peso junto à problemática. 

Embora  se  pretenda  examinar  a  dimensão  físico­espacial  urbana  da  formação  de  padrões  de  organização  espacial,  faz­se  necessário  um  breve  apanhado  sobre  o  conceito de Capital Social adotado entre diferentes autores. De acordo com Baquero  (2003)  a  noção  de  Capital  Social  ainda  não  é  um  conceito  unânime,  há  mais  divergências  do  que  consensos  em  relação  ao  papel  que  o  Capital  Social  tem  (ou  não) no fortalecimento democrático. Níveis elevados de Capital Social geram normas  de  cooperação  e  confiança,  reduzem  os  custos  de  transação  e  atenuam  a  intensidade  de  conflitos.  Putnam  (1997)  ressalta  que  pesquisas  empíricas  têm  confirmado  que  as  normas  e  redes  de  engajamento  cívico  (Capital  Social)  podem  melhorar  a  educação,  diminuir  a  pobreza,  controlar  o  crime,  propiciar  o  desenvolvimento  econômico,  promover  melhores  governos  e  até  reduzir  os  índices  de  mortalidade. Em estudo sobre a democracia italiana, Putnam (1996) apresentou  que a qualidade da governança é determinada pelo nível de Capital Social dentro de  uma região. Na mesma linha de análise, Fukuyama (1995) sustenta que a habilidade  de  cooperar  socialmente  depende  de  hábitos,  tradições  e  normas  anteriores,  as  quais  servem  para  estruturar  o  mercado.  Para  esses  autores  é  mais  provável  que  uma  economia  de  mercado  tenha  sucesso  em  virtude  dos  estoques  de  Capital  Social.  Se  esse  Capital  Social  á  abundante,  então  tanto  o  mercado  como  a

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democracia  prosperarão  e  o  mercado  pode,  de  fato,  incidir  no  desenvolvimento  de  uma  sociabilidade  que  reforça  as  instituições  democráticas.  Para  Coleman  (1990)  Capital  Social  é  gerado  como  um  corolário  de  envolvimento  dos  indivívuos  em  atividades que exigem sociabilidade. Os laços sociais e as normas podem ajudar as  pessoas  a  se  tornar  mais  educadas,  encontrar  empregos  e  acumular  capital.  Com  isto Coleman reconhece, através de seus estudos, a importância dos laços sociais e  culturais. 

Partindo do princípio de que cada sociedade requer diferentes tipos de coesão social, 

Durkheim  (1973)  distinguiu  dois  princípios  de  solidariedade  social:  a  solidariedade 

orgânica,  baseada  na  interdependência  por  diferenças  sociais  de  um  grupo;  e  a  solidariedade  mecânica,  baseada  na  integração  por  semelhanças  sociais  de  um 

grupo. A solidariedade orgânica requer um espaço integrado e denso, enquanto que 

a solidariedade mecânica requer um espaço segregado e disperso. Durkheim (1973),  em  sentido  estrito,  localizou  a  causa  das  diferentes  variáveis  de  solidariedades  no  espaço,  i.  e.,  a  dependência  recíproca  dos  vínculos  sociais.  Em  síntese,  o  espaço  estabelece  modos  de  solidariedade  social  e  estes  são  em  troca  um  produto  da  estrutura da sociedade. 

Com base nos estudos de Durkheim (1973), Hillier e Hanson (1984) sustentam que 

cada sociedade possui grupos espaciais de pessoas que vivem e se locomovem em 

grande proximidade umas com as outras, e grupos transespaciais cujo agrupamento 

de pessoas não depende da proximidade espacial, embora possa coincidir com um 

grupo  espacial.  Hillier  e  Hanson  (1984:  26­52)  consideram  que  as  sociedades  se  organizam  em  espaços  com  um  maior  ou  menor  grau  de  agregação  e  separação,  gerando  padrões  de  movimentos  e  encontros.  Estes  espaços  são  compostos  pelo  ambiente construído urbano, no qual cada parcela da sociedade assume um padrão  reconhecível de organização espacial. 

Diante do exposto acima, se verifica o quanto a base da teoria da Sintaxe Espacial  possui  convergência  com  os  fundamentos  de  Capital  Social.  Isto  porque,  seja  qual  for  o  meio  de  formação  de  Capital  Social,  desde  as  relações  familiares,  trabalho,  atividades  culturais,  associações  comunitárias  etc,  este  depende,  mesmo  que  indiretamente,  de  relações  físicas  espaciais  para  ocorrer.  Como  a  sociedade  necessita  de  um  suporte  espacial  para  existir,  a  forma  construída  urbana  pode  ser  um  dos  condicionantes  que  tende  a  influenciar  a  aglomeração  de  pessoas  em

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determinadas  áreas  da  cidade,  a  concentração  de  atividades  e  a  continuidade  de  usos  dos  espaços,  em  última  instância,  a  formação  do  Capital  Social  propriamente  dito. 

É  uma  ilusão  imaginar  que  a  sociedade  exista  abstratamente,  uma  vez  que  as  relações  sociais  são  espaciais.  A  sociedade  é  o  próprio  espaço,  ou  seja,  parte  integrante  da  cidade.  Não  há  uma  estratificação  social  e  outra  físico­espacial.  Um  dos  efeitos  da  organização  espacial  é  a  formação  do  Capital  Social.  Isto  significa  que  o  ambiente  construído  é  um  processo  cumulativo  cultural  que  ao  longo  dos  tempos, revela a história e os costumes da sociedade em que nele está inserida.  O  Capital  Social  está  diretamente  relacionado  com  a  experiência  urbana  voltada  à  prática  da  urbanidade,  que  envolve  aspectos  diversos  da  vida  social,  tais  como  a  maneira de se comportar e relacionar em público. O Capital Social gerado no espaço  urbano se estrutura a partir de códigos diversos, muitos dos quais são formais (leis,  regulamentos)  enquanto  outros  são  informais,  mas  não  menos  importantes.  A  urbanidade é responsável pela formação, manutenção e enriquecimento contínuo de  diversos  códigos  sociais  e  pode,  dessa  maneira,  constituir­se  em  instrumento  de  educação social, de progresso civilizatório. Considerando que o Capital Social pode  ser heterogêneo e diversificado, a urbanidade (vida pública) nas cidades serve como  modo  de  reconhecimento  dessa  variedade,  de  conscientização  a  respeito  de  diferenças sociais e desenvolvimento de tolerâncias (KRAFTA, 2006). 

Dos  estudos  da  espacialização  e  forma  do  ambiente  construído  urbano  (configuração espacial e morfologia urbana), Hillier e Hanson (1984) desenvolveram  os  conceitos  da  Sintaxe  Espacial  a  fim  de  possibilitar  estudos das relações  espaço  versus sociedade. Os estudos consideram a existência de uma lógica social definida  e  fortemente  vinculada  à  morfologia  urbana.  Este  aspecto  subentende  a  formação  de Capital Social, uma vez que a configuração espacial urbana possui relação com  unidades  de  vizinhança.  Moradores  de  uma  mesma  unidade  de  vizinhança  na  cidade  tendem  a  compartilhar  semelhantes  modos  de  vida,  conjunto  de  hábitos,  memórias coletivas, marcos referenciais e coesão social com forte caráter identitário.  Parte  desses  elementos  são  vinculados  à  cidade  enquanto  forma  física  e  lugar  da  coletivização arraigados ao Capital Social. 

A Sintaxe Espacial foi concebida para representar as malhas urbanas através de um  conjunto  sucessivo  de  espaços,  sendo  possível  reduzir  a  complexidade  de  sua

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configuração  a  uma  característica  básica  ­  sua  dimensão  linear.  Sintaxe  Espacial  define a malha urbana como um sistema de linhas que une origens e destinos, onde  o movimento pode acontecer de todas as origens a todos os destinos. O movimento  ao  longo  destas  linhas  compõe  a  rede  que  será  determinada  substancialmente  por  medidas  sintáticas,  tais  como  integração  global,  integração  local  com  limitação  de  profundidade,  conectividade,  controle,  inteligibilidade,  profundidade,  força  do  núcleo  de  integração,  dentre  outras.  Em  relação  ao  conceito  de  acessibilidade,  Hillier  e 

Hanson (1984) substituem a medida métrica pela topológica 3 e adotam o conceito de 

linha  axial  para  a  descrição  dos  espaços  públicos.  As linhas  axiais 4 ,  utilizadas  para 

calcular  a  integração  do  sistema,  podem  ser  definidas  como  a  maior  extensão 

possível  em  linha  reta  entre  espaços  convexos 5 .  Entende­se  como  espaços 

convexos, a relação de irrestrita visibilidade e domínio dentro do próprio espaço. Isto  significa que todos os espaços podem ser vistos de qualquer outra parte do espaço,  independentemente de onde a pessoa esteja localizada. A decomposição da rede de  percursos  em  linhas  axiais  é  representada  pelo  mapa  axial,  o  qual  consiste  no  conjunto  do  menor  número  das  maiores  linhas  retas  capazes  de  cobrir  todos  os  espaços convexos do sistema. 

As  propriedades  configuracionais  do  espaço  urbano  são  descritas  a  partir  de  duas  dimensões  básicas:  a  organização  global  (axialidade)  e  a  organização  local 

(convexidade).  A  organização  global  está  mais  relacionada  com  a  presença  e  o 

movimento  natural  de  pessoas  estranhas  ao  sistema  como  um  todo,  enquanto  a 

organização  local  está  mais  relacionada  com  a  apropriação  e  concentração  de  pessoas  familiarizadas  com  partes  do  sistema.  Examinando  de  que  modo  a  integração  é  distribuída  ao  longo  da  malha  urbana  em  níveis  globais  e  locais,  se  pode ter a noção de como as cidades com diferentes configurações de espaço geram  o  que  Hillier (1997)  chamou  de  Campos  de  Encontros, i.  e.,  padrões  de  movimento 

criam possibilidades de interação social, de trocas, e de vida comunitária (HILLIER et 

al,  1993;  HILLIER,  1997;  PEPONIS  et  al,  1997).  Conseqüentemente,  espaços 

urbanos  de  qualquer  cidade  são  vistos  como  instrumentos  que  potencializam  as 

relações sociais (HILLIER, 1997 apud DAWSON, 2003: 37.4). 

3  Medida que independe de relações métricas e/ou geométricas.  4  Axialidade é a máxima extensão do espaço urbano de uso público numa dimensão; refere­se a extensibilidade global máxima  das linhas do sistema, i. e., até que ponto alguns lugares podem ser correlacionados para formar um espaço unificado.  5  Convexidade é a máxima extensão do espaço urbano de uso público em duas dimensões; refere­se a extensibilidade local a  todos os pontos que podem conformar um lugar unificado.

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Em princípio, qualquer experiência urbana subentende uma experiência em potencial  de formação de Capital Social. Assim sendo, morar, trafegar, comprar, trabalhar, são  experiências  urbanas  de  forte  cunho  social.  A  experiência  de  apreciar  a  paisagem  enquanto trafega, ver pessoas enquanto compra etc, depende fundamentalmente da  forma  do  ambiente  construído  da  cidade,  que  pode,  então,  ser  avaliada  desde  o  ponto de vista da formação do Capital Social como Campos de Encontro (KRAFTA,  2006). 

2.  Construção  do  mapa  axial  e  aferição  das  medidas  sintáticas:  o 

método adotado 

No que tange à análise da configuração espacial da cidade, foi utilizada a técnica de  Sintaxe  Espacial,  particularmente  útil  em  termos  de  comparações  dos  diferentes  espaços  que  compõem  o  sistema  de  ruas  da  cidade.  A  análise  das  principais  medidas  sintáticas  a  partir  do  mapa  axial  da  cidade  possibilitou  compor  um  quadro  atual no que diz respeito às formas de apropriações e relações sociais, assim como,  inferir sobre as tendências de organização e apropriação espacial. 

Com base no mapa digitalizado de todas as ruas da cidade, foram traçadas as linhas  axiais,  de  modo  que  representassem  a  estrutura  contínua  destes  espaços  abertos.  As  linhas  axiais  foram  interrompidas  a  cada  deflexão,  i.  e.,  a  cada  mudança  de  direção  entre  espaços  convexos.  O  mapa  axial  foi  então  rodado  no  modelo 

computacional Axman 6 . Ressalte­se que o algoritmo 7 matemático processou mais de 

1615 linhas axiais, sendo que o cálculo deste número de matrizes de acessibilidade 8 

somente foi possível com o auxílio computacional. O emprego do mapa axial como  recurso  auxiliar  de  expressão  gráfica  da  estrutura  espacial  da  cidade  determinou  uma  facilidade  operacional  para  fins  de  comparações.  Esse  método  simplificou  a  complexa  rede  de  espaços  contínuos  da  cidade  em  partes  que  pudessem  ser  analisadas.  A análise sintática do mapa axial produziu dois tipos de resultados: dados numéricos  dos parâmetros relacionais entre espaços, e dados gráficos na forma de  mapas de  6  Modelo de análise da configuração espacial da malha urbana desenvolvido na Bartlett School of Architecture and Planning ­  University College London.  7  Um algoritmo é um método preciso de cálculo ou avaliação quantitativa, cuja aplicação conduz a resultados e soluções exatas  (CHADWICK, 1973: 178; NOVAES, 1982: 19).  8  Acessibilidade foi medida calculando os caminhos mais curtos em termos do menor número de mudanças de direção.

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linhas com gradação de cores conforme seus valores de integração. Graficamente a  estratégia  mais  informativa  foi  observar  no  mapa  axial  a  distribuição  dos  espaços,  desde o espectro vermelho (linhas na cor preta) para os mais integrados, até o azul  (linhas na cor cinza claro) para os menos integrados. Isso permitiu formar um quadro  visual  de  como  a  integração  se  distribui  no  sistema  espacial  da  cidade  por  inteiro 

(HILLIER et al, 1993). 

Cumpridos os procedimentos anteriores e após os esclarecimentos de ordem geral,  procede­se agora à descrição e efetiva análise da configuração espacial urbana da  cidade de Santa Cruz do Sul e sua relação com a formação do Capital Social. 

3.  Análise  Sintática  da  estrutura  espacial  urbana  de  Santa  Cruz  do 

Sul e os padrões de organização sócio­espacial: resultados obtidos 

A  organização  global  de  sistemas  espaciais –  domínio  do  visitante  – estrutura­se  a  partir  da  maior  ou  menor  facilidade  em  linha  reta  de  se  unir  as  partes  (espaços  convexos)  do  sistema.  Deste  modo  aumentam­se  as  probabilidades dos  encontros,  tanto  a  partir  das  relações  dos  moradores  entre  si,  quanto  entre  os  moradores  e  visitantes  ao  sistema  espacial  considerado  (RIGATTI,  1993:  89­92).  Verificou­se,  pela  gradação  de  cores  das  linhas,  que  o  mapa  de  Integração  Global  possui  uma  maior  intensidade  no  centro  geométrico  do  sistema  da  cidade,  tendendo  a  níveis  mais baixos de integração à medida que se aproxima da periferia, principalmente em  relação aos quadrantes sudeste, sudoeste e nordeste (mapa 1).

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MAPA  1:  Mapa  de  Integração  Global de  todo  o  sistema  de  Santa  Cruz  do  Sul, 

com  valores  de  integração  de  0,3650  até  1,0972  (Fonte:  obtido  no  software 

Axman; original SILVA, 2004: 119) 

Os valores da medida de integração encontrados variam de 0,3650 até 1,0972, com  integração  média  de  0,7009,  o  que  denota  um  sistema  relativamente  integrado  globalmente,  que  tende  a  favorecer  a  co­presença  das  diferentes  categorias  de  pessoas independentemente do grau de conhecimento espacial das diferentes áreas 

que  compõem  o  sistema.  Verificou­se  então  a  força  do  núcleo  de  integração 9 das 

1615  linhas  axiais  da  cidade  a  qual  corresponde  aos  10%  dos  espaços  mais  integrados,  i.  e.,  162  linhas,  cujo  valor  da  medida  encontrada  é  de  1,3738.  Ao  se 

Comparando­se este valor com os valores de outros trabalhos (por exemplo, LOUREIRO et al, 1995: 23 e 27) se verifica que  a  força  do  núcleo  de  integração  sintática  de  Santa  Cruz  do  Sul  apresenta  uma  razoável  diferenciação  entre  a  média  de  Integração Global da cidade (0,7009) e a média do núcleo de integração (0,9629).

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comparar a força do núcleo de integração (1,3738), assim como, a média das linhas  que compõem o núcleo de integração (0,9629) com a média de Integração Global da  cidade  (0,7009)  se  percebe  claramente  que  o  núcleo  de  integração  reforça  as  características  de  hierarquia  na  Integração  Global,  i.  e.,  acentua  os  aspectos  relacionais com outras áreas da cidade (mapa 2). 

MAPA 2: Núcleo de integração da cidade de Santa Cruz do Sul, com valores de 

0,8278 até 1,0972 (Fonte: obtido no softwareAxman; original SILVA, 2004: 124) 

A  organização  local  de  sistemas  espaciais  estrutura­se  fundamentalmente  nas  porções do espaço de uso público (espaço convexo). Estes espaços são delimitados  pela  configuração  das  barreiras  (edificações,  muros,  cercas,  taludes  etc)  conformadoras  do  conjunto  do  espaço  público  a  partir  do  qual  se  pode  identificar

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partes  (espaços  convexos)  do  sistema  espacial  (RIGATTI,  1993:  89­92).  A  medida  local  carrega  a  noção  de  fixação,  pois  se  refere  ao  domínio  dos  espaços  por  seus  moradores. A diferenciação de distribuição sintática observada em relação às linhas  da cidade, sob o ponto de vista da organização local, padroniza as áreas limítrofes  localizadas  nos  quadrantes  norte  e  sul.  Isso  implica  numa  menor  diferenciação  de  orientação  espacial,  que  tende  a  privilegiar  os  deslocamentos  dos  moradores  nas  áreas mais afastadas do núcleo de integração. Cabe destacar que esta condição de  segregação sintática observada indica uma precondição de formação de áreas intra­  urbanas, além de estabelecer uma boa relação de vizinhança entre estas e o próprio  núcleo  de  integração  da  cidade.  Em  contrapartida,  o  quadrante  nordeste  nas  proximidades do núcleo de integração é uma área relativamente integrada, ocupada  em  boa  parte  por  estratos  sociais  de  mais  alta  renda,  moradores  dos  bairros  Higienópolis, Verena, Santo Inácio e Jardim Europa. 

A  forma  do  núcleo  de  integração  se  aproxima  à  de  uma  malha  ortogonal  com  algumas poucas deformações, cuja característica mais marcante é a distributividade  das  linhas  mais  integradas,  tanto  no  sentido  norte/sul  quanto  leste/oeste.  A  malha  ortogonal  pouco  deformada  do  núcleo  de  integração  denota  uma  estrutura  global  forte, na qual se verifica a máxima integração interna em oposição à mínima em seu  entorno. Ao ser circunscrito um círculo no conjunto de linhas que compõem o núcleo  de  integração,  se  verifica  que  muitas  das  principais  linhas  estão  contidas  dentro  desta  figura  geométrica.  Como  a  figura  de  um  círculo  é  a  forma  geométrica  mais  econômica  na  relação  área  e  perímetro  (maior  área  no  menor  perímetro  possível)  isto  significa  que  o  núcleo  de  integração  possibilita  alcançar  o  maior  número  de  espaços na menor distância topológica possível. Neste caso, a delimitação física do  núcleo  de  integração  tende  a  diferenciá­lo  das  demais  áreas  do  sistema,  fortalecendo sua distinção como área central. Interessante observar que em grande  parte, as linhas do núcleo de integração da cidade coincidem com a noção de área  central,  tanto  em  relação  ao  senso  comum  das  pessoas,  quanto  em  relação  ao  zoneamento feito pelo Plano Diretor da cidade. 

Num  primeiro  momento  os  dados  do  mapa  axial  permitiram  uma  análise  global  do  sistema  da  cidade  e  de  seu  núcleo  de  integração.  Entretanto,  faz­se  necessária  a  descrição  local  do  sistema  vinculada  à  análise  global.  As  propriedades  locais  são  estabelecidas  basicamente  pela  medida  de  Conectividade  e  Controle.  A  medida  de

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Conectividade  refere­se  à  soma  da  quantidade  de  linhas  conectadas  diretamente  a  uma  outra  linha,  segundo  as  descrições  (linhas,  espaços  convexos,  trechos,  arcos)  utilizadas  para  determinar  os  espaços  públicos  e  privados.  A  medida  de  Controle  expressa o grau de escolha que cada linha representa para seu vizinho imediato, ou  o grau de dependência de acesso de um espaço em relação aos outros espaços do  sistema.  Ou  seja,  correspondente  às  possibilidades  dos  espaços  serem  escolhidos  como  parte  de  um  percurso  preferencial,  considerando  todas  as  possibilidades  de  deslocamento de um espaço para todos os demais. 

A  Conectividade  média  para a  cidade  é de 3,9331.  Isto  significa  que  cada linha  se  une  em  média  a  outras  quatro  linhas.  No  geral,  a  cidade  apresenta  uma  certa  dispersão  na  distribuição  da  Conectividade, sendo  definidos  dois  setores:  um  setor  mais concentrado onde estão as linhas mais conectadas, que corresponde às linhas  do  núcleo  de  integração;  e  um  setor  com  linhas  pouco  conectadas,  que  abrange  praticamente todo o restante da cidade (mapa 3).

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MAPA  3:  Mapa  de  Conectividade  de  todo  o  sistema,  com  valores  de  1  até  35 

(Fonte: obtido no software Axman; original SILVA, 2004: 128) 

Em relação à medida de Controle se constatou que das 1615 linhas pertencentes ao  mapa  axial  da  cidade,  cerca  de  400  linhas  controlam  mais  de  50%  das  linhas  de  toda a cidade. Trata­se de um sistema pouco concentrado em relação à medida de  Controle,  cujos  valores  encontrados  para  a  cidade  variam  de  0,0286  até  11,8586  (mapa 4).

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MAPA  4:  Mapa  de  Controle  de  todo  o  sistema,  com  valores  de  controle  de 

0,0286 até 11,8586 (Fonte: obtido no software Axman; original SILVA, 2004: 130) 

O mapa de Controle não exibe muitas novidades em relação ao que já foi mostrado  no mapa de Conectividade, tendo em vista que a medida de Controle é diretamente  calculada  a  partir  do  número  de  conexões  de  linhas  vizinhas  e  adjacentes,  e  não  apenas as conexões da linha em si. Portanto, trata­se (Conectividade e Controle) de  medidas  fundamentalmente  recíprocas,  cuja  medida  de  Controle  apenas  possibilita  uma  noção  mais  abrangente  da  probabilidade  de  acessar  estas  linhas  a  partir  das  demais  linhas  que  compõem  o  seu  entorno  imediato.  Em  outras  palavras,  são  medidas que possibilitam entender o local com base no próprio local.

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A  análise  do  mapa  axial  da  cidade  em  relação  às  medidas  de  Conectividade  e  Controle  permite  verificar  que,  embora  o  sistema  de  linhas  da  cidade  apresente  a  medida  de  Controle  bastante  distribuída,  há algumas  linhas  axiais  bem  conectadas  ao norte e ao sul da cidade. Isto significa que o quadrante norte e principalmente o  quadrante sul são áreas potencialmente propícias à formação de novas unidades de  vizinhança  e  bairros.  Os  mapas  indicam  que  a  distribuição  do  sistema  tende  a  se  deslocar  no  sentido  do  quadrante  sul,  principalmente  ao  longo  da  Av.  Euclides  N.  Kliemann  (linha  23).  Isto  confirma  as  cogitações  a  respeito  desta  área  ser  potencialmente  a  formadora  de  novos  núcleos  urbanos  do  sistema,  pois  suas  medidas locais também possuem uma boa Integração Global. 

A  partir  da  análise  do  mapa  axial  de  toda  a  cidade  é  possível  inferir  algumas  tendências  do  sistema  relacionadas  à  formação  do  capital  social.  Áreas integradas  globalmente  costumam  ser  associadas  à  animação  urbana  gerada  pela  superposição  de  percursos  e  atividades  levadas  a  cabo  pelos  agentes  sociais  no  espaço  urbano.  Lugares  animados  e  globalmente  integrados  tendem  a  reunir  num  dado  momento  um  grande  contingente  de  pessoas  que,  para  desenvolverem  suas  atividades  normais,  utilizam­nos.  É  notória  a  preferência  que  pessoas  dispensam  aos lugares urbanos animados, tais como áreas centrais, praças, parques em virtude  de sua animação e coesão social. As atividades­fim são de consumo, de lazer, mas  a experiência urbana concomitante é alimentada pela animação (KRAFTA, 2006).  O  espaço  público  pode  ser,  e  é  continuamente,  meio  para  realização  dos  mais  variados  tipos  de  movimentos  sociais.  Comícios,  passeatas,  paradas,  desfiles,  eventos esportivos, protestos, etc são atividades de forte coesão social que ocorrem  no  cotidiano  e  se  referem  à  organização  da  sociedade  e  qualificam  a  experiência  urbana.  A  configuração  espacial  fomenta  e  reforça  redes  de  solidariedade  e  de  coesão social necessárias ao desenvolvimento da sociedade. O sistema urbano de  Santa Cruz do Sul, desde esse ponto de vista, pode ser considerado de um lado em  termos  do  ambiente  construído  que  define  um  tipo  de  espaço  onde  o  controle  da  atividade  é  prioritário.  A  forma  do  ambiente  construído  pode  tanto  ser  um  espaço  conservador,  voltado  à  reprodução  da  sociedade  segundo  padrões  estabelecidos,  quanto  se  caracterizar  pelo  inverso,  sendo  o  lugar  da  atividade  não  controlada,  da  espontaneidade e do anonimato (conforme observado anteriormente). Em condições  como estas, o surgimento de novos modos de relação social pode ocorrer tanto em

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espaço integrados ou não, e, assim, torna­se um espaço com potencial criador, um  espaço  de  produção  da  dinâmica  social  correspondente  à  forma  do  espaço  (KRAFTA, 2006). 

Hoje, devido a Integração Global das linhas, praticamente todos os bairros da cidade  convergem para a área central ou para as suas proximidades. Como conseqüência,  o  movimento  em  direção  a  este  núcleo  de  integração  tende  a  aumentar  à  medida  que  surgem  novas  áreas  que  não  concentram  atividades  suficientes  a  ponto  de  concorrem com a área central. Deste modo, há um contínuo processo de reforço da  acessibilidade  à  área  central  devido  às  transformações  morfológicas  ocorridas  ao  longo dos anos. 

Contudo,  se  verifica  que  a  expansão  horizontal  da  cidade  está  gradativamente  gerando uma  maior fragmentação e descontinuidade espacial, assim como tende a  diminuir sensivelmente as possibilidades de contatos com a área central. Em termos  práticos,  o  arranjo  espacial  destas  áreas  mais  afastadas  e,  portanto,  mais  segregadas  do  sistema,  resulta  em  maiores  deslocamentos  das  pessoas  às  atividades das quais necessitam. Porém, quanto mais afastadas estas novas áreas  estiverem  do  núcleo  de  integração  (desde  que  mantenham  uma  boa  articulação  global) maiores serão as possibilidades de concentrarem comércios e atividades que  atendam  às  necessidades  dos  moradores,  fomentando  a  formação  de  novas  unidades de vizinhança com forte coesão social capazes de diminuir a necessidade  de  deslocamentos  diários  das  pessoas  a  grandes  distâncias.  Este  processo  de  centralização  funcional  e  morfológica  e de  formação  de  Capital  Social  se  deve  aos  condicionantes  impostos  pela  configuração  espacial  urbana,  como  já  fora  visto,  e  tende a ocorrer no quadrante sudeste da cidade ao longo das linhas mais acessíveis  vinculadas ao núcleo de integração da cidade. Deste modo, a médio e longo prazo,  a morfologia influencia a dinâmica urbana que tenderá a ocorrer não mais em função  de  um  único  centro  polarizador,  mas  em  função  da  articulação  de  vários  núcleos  funcionais  integrados  em  unidades  de  vizinhança.  Deste  modo,  a  forma  e  o  crescimento urbano possuem uma dinâmica própria que refletem os valores de toda  a sociedade.

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4. A sociabilidade da vida espacial: considerações finais 

Em  meio  a  diversas  abordagens  possíveis  deste  fenômeno  urbano,  a  partir  de  diferentes  áreas  do  saber  e,  na  medida  em  que  o  conhecimento  é  a  soma  das  contribuições  dos  diferentes  pontos  de  vista  a  respeito  de  um  mesmo  fenômeno,  esta  pesquisa  contribui  junto  às  ciências  sociais,  aplicada  na  formação  de  um  mosaico  interdisciplinar  de  análise  dos  padrões  de  organização  social  no  espaço  urbano de Santa Cruz do Sul. 

Num  momento  em  que  tantas  áreas  do  saber  discorrem  sobre  o  Capital  Social,  é  importante  também  analisar  criticamente  a  cidade  sob  o  ponto  de  vista  de  sua  configuração  espacial.  Com  isso,  se  abre  o  campo  das  alternativas  de  questionamento,  análise  e  entendimento  em  torno  da  influência  recíproca  de  cooperação  entre  sociedade  e  espaço.  Isto  significa  que  a  cidade  passa  a  ser  entendida  como  um  processo  sistemático  da  dialética  sócio­espacial  de  adequação  da forma urbana às necessidades das pessoas, que por sua vez passa a influenciar  o comportamento associativo destas.

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