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A RESPONSABILIDADE CIVIL NOS CONTRATOS DE FRANQUIA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

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A RESPONSABILIDADE CIVIL NOS CONTRATOS DE FRANQUIA NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Autor: Nehemias Domingos De Melo1

Sumario: 1. Introdução. 2. Histórico do contrato de franquia. 3. Características do contrato

de franquia. 4. Espécies de franquia. 5. Responsabilidade objetiva no Código de Defesa do Consumidor. 6. Da responsabilidade pelo acidente de consumo. 7. Dos responsáveis pelo dever indenizatório (7.1 Fornecedor real; 7.2 Fornecedor aparente; 7.3 Fornecedor presumido; 7.4 O comerciante). 8. A solidariedade entre todos os participantes da cadeia de produção e distribuição. 9. Conclusão. 10. Bibliografia.

1. Introdução

“Franchise”, em inglês, provém do verbo francês “franchir” que significa libertar ou

liberar, dar imunidade a alguém originalmente proibido de praticar certos atos. Daí o termo “franchisage”, correspondente ao privilégio que se concedia na Idade Média a cidades e súditos. Tem a compreensão de um privilégio concedido a uma pessoa ou a um grupo de pessoas. Juridicamente significa um direito concedito a alguém.2

1 Advogado em São Paulo, palestrante e conferencista. Professor de Direito Civil, Processual Civil e Direitos Difusos

nos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito na Universidade Paulista (UNIP). Professor convidado nos cursos de Pós-Graduação em Direito na Universidade Metropolitanas Unidas (FMU), Escola Superior da Advocacia (ESA), Escola Paulista de Direito (EPD), Complexo Jurídico Damásio de Jesus,Faculdade de Direito de SBCampo, Instituo Jamil Sales (Belém) e de diversos outros cursos de Pós-Graduação. É Doutor em Direito Civil, Mestre em Direitos Difusos e Coletivos, Pós-Graduado em Direito Civil, Direito Processual Civil e Direitos do Consumidor. Tem atuação destacada na Ordem dos Advogados Seccional de São Paulo (OAB/SP) onde, além de palestrante, já ocupou os cargos membro da Comissão de Defesa do Consumidor; Assessor da Comissão de Seleção e Inscrição; Comissão da Criança e do Adolescente; e, Examinador da Comissão de Exame da Ordem. É membro do Conselho Editorial da Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil (Ed.IOB – São Paulo) e também foi do Conselho Editorial da extinta Revista Magister de Direito Empresarial, Concorrencial e do Consumidor (ed. Magister – Porto Alegre). Autor de 18 livros jurídicos publicados pelas Editoras Saraiva, Atlas, Juarez de Oliveira e Rumo Legal e, dentre os quais, cabe destacar que o seu livro “Dano moral – problemática: do cabimento à fixação do quantum”, foi adotada pela The University of Texas School of Law (Austin,Texas/USA) e encontra-se disponível na Tarlton Law Library, como referência bibliográfica indicada para o estudo do “dano moral” no Brasil.

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De maneira bem objetiva Carlos Roberto Gonçalves define a franquia como sendo um contrato pelo qual um comerciante detentor de uma marca ou produto (franqueador) concede, mediante remuneração, o seu uso para outra pessoa (franqueado) e lhes presta serviços de organização empresarial.3

Marzorati define a “La franquicia comercial es un sistema de distribución utilizado por empresas legalmente independientes y con una organización vertical cooperativa, basada en una relación contractual permanente”.4

Thompson ha definido “El contrato de franquicia es aquel en el cual una organización, el franquiciante, que ha desarrollado un método o una fórmula para la fabricación y/o venta de un producto o servicio, extiende a otras firmas, los franquiciados, el derecho de proseguir con tal negocio sujeto a ciertos controles y restricciones. En casi todos los casos, el franquiciado opera bajo el nombre del franquiciante como marca o nombre comercial”.5

É um contrato que oferece vantagens par ambas as partes tendo em vista que é feita uma associação entre o franqueado que dispõe de recurso, mas não tem os conhecimento técnicos necessários para o sucesso do empreendimento, que pode se estabelecer desde logo, negociando produtos ou serviços já conhecidos e aceitos pelo mercado consumidor, enquanto o franqueador pode expandir sua rede de oferta de seus produtos ou serviços, sem as despesas e riscos inerente à implantação de filiais.6

2. Histórico do contrato de franquia

La Franquicia comercial, como vinculo entre dos particulares, tuvo su inicio en el siglo XIX en los Estados Unidos de Norteamérica, en el año 1850 aproximadamente, cuando la compañía SINGER & CO, crea una novedosa forma de distribución y venta, que continua hasta nuestros días, para sus maquinas de coser, producto base de dicha empresa.7

3 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, p. 698.

4 ETCHEVERRY, Raúl Aníbal, posgrado UBA Unidad IV, “El derecho laboral y su problemática referida a la

empresa”, jul. 2013.

5 ETCHEVERRY, Raúl Aníbal, posgrado UBA Unidad IV, “El derecho laboral y su problemática referida a la

empresa”, jul. 2013.

6 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, p. 698.

7 ETCHEVERRY, Raúl Aníbal, posgrado UBA Unidad IV, “El derecho laboral y su problemática referida a la

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Naquela oportunidade e pretendendo ampliar sua participação no mercado varejista, a Singer outorgou franquias a pequenos comerciantes que passaram a comercializar seus produtos em lojas arcando com as despesas e os riscos do negócio. A iniciativa teve tanto sucesso que já no final do século XIX a General Motors e a Coca-Cola seguiram os mesmos procedimentos.

O sucesso desse tipo de contrato foi imediato e depois se expandiu para outras atividades, atingindo seu ápice com a rede MacDonald’s que em meados do século XX, precisamente no ano de 1955, como meio para expandir seu sistema de serviços de comidas rápidas. Importatne lembrar que Ray Kroc McDonald abre o primeiro restaurante da rede com o nome da família McDonald, em Dês Plaines, Illinois. Só para se ter uma idéia do sucesso dessa empreitada basta dizer que a McDonald's Corporation é a maior cadeia mundial de restaurantes de fast food de hambúrguer, servindo cerca de 68 milhões de clientes por dia, em 119 países, através de 37 mil pontos de venda.8

No Brasil o instituto da franquia está em franco desenvolvimento e encontra-se regulado pela Lei nº 13.966/19, aplicando-se também as regras do Código Civil e do Código de Defesa do Consumidor.

3. Características do contrato de franquia

Nesse tipo de contrato atuam duas figuras jurídicas distintas: o franqueador, que detém a marca e conhece o sistema de comercialização do produto ou serviço; e, o franqueado que se filia ao empreendimento mediante uma remuneração inicial, mais uma percentagem periódica sobre os lucros obtidos e, arcando com os custos e despesas da instalação, ficando autorizado a comercializar os produtos ou serviços e utilizar a marca.9

O franqueador estabelece o modo pelo qual o franqueado deverá instalar e fornecer o seu produto ou serviço e lhe presta orientação e asistência técnica de maneira contínua, pelo prazo e duração do contrato.

La franquicia es un contrato de carácter distributivo, un típico y moderno contrato de la distribución comercial. Tiene fuertes rasgos “cooperativos o colaborativos” y en la mayoría de los casos constituye un “contrato complejo”, que abarca una pluralidad de contratos muchas veces

8 Informe obtido no site <https://pt.wikipedia.org/wiki/McDonald%27s>, acesso em 17/6/2020.

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celebrados por separado para la consecución de un resultado negocial único,10 tendo características de outros contratos, cabendo destacar os seguintes aspectos:

a) Contrato de engineering, pelo qual o franqueador planeja e orienta a montagem do estabelecimento franqueado;

b) Contrato de management, relativo ao treinamento dos funcionários e à estruturação da administração do negócio;

c) Contrato de marketing, pertinente às técnicas de colocação dos produtos ou serviços juntos aos consumidores.

Assim podemos afirmar que o elemento marcante nesse tipo de contrato é a autorização de nome e marca que uma empresa cede a outra com a prestação de serviços, mediante a remuneração convencionada.

Como ensina Caio Mário, são dois os elementos do franchising. O primeiro é a licença de utilização de marca, de nome, e até de insígnia do franqueador. O segundo, a prestação de serviços de organização e métodos de venda, padronização de materiais, e até de uniforme de pessoa externo.11

Sua natureza jurídica, portanto pode ser definida como um contrato bilateral, pois contém obrigações recíporcas, sendo também oneroso. É consensual, pois depende exclusivamente da vontade das partes. É comutativo, tendo em vista apresentar prestações conhecidas previamente por ambas as partes, embora possa conter alguma cláusula aleatória. É intuitu personae porque ambas as partes tem em mira realizar negócio com o outro contratante específico. É de adesão porque o franqueado, embora possa discutir algumas cláusulas, no essencial tem que se subordinar as exigências do franqueador.12

4. Espécies de franquia

Segundo Maria Helena Diniz,13 podemos identificar três modalidades distintas de franquia,

quais sejam:

10 ETCHEVERRY, Raúl Aníbal, posgrado UBA Unidad IV , “El derecho laboral y su problemática referida a la

empresa”, jul. 2013.

11 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil, p. 586. 12 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil, p. 526.

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a) Franquia industrial ou “lifreding”, muito utilizada na indústria automobilística e alimentícia (General Motors, Coca-Cola, etc), por ser um contrato em que o franqueador se obriga a auxiliar na construção de uma unidade industrial para o franqueado, cedendo o uso da marca, transmitindo sua tecnologia, exigindo segredo relativamento aos processos de frabricação e fornecendo assistência técnica. Desse modo, o franqueado fabrica e vende os produtos frabricados por ele mesmo, em sua empresa, com o auxílio do franqueador; b) Franquia de comércio ou de distribuição, que vem a ser o contrato que visa o

desenvolvimento da rede de lojas de aspectos idêntidos, sob um mesmo símbolo, aplicado na comercialização ou distribuição de artigos similares de grande consumo (lojas Bennetton, Boticário, etc). O franqueado, neste caso, vende produtos do franqueador, mantendo a sua marca, enquanto o franqueador procura sempre aperfeiçoar o método de comercialização; e,

c) Franquia de serviços, que poderá ser considerada a franquia propriamente dita, pela qual o franqueado reproduz e vende os serviços inventados pelo franqueador, e a do tipo hoteleiro, que abrange escolas, hotéis, restaurantes, lanchonetes, tendo por escopo fornecer serviços a certo segmento de clientes (Hotéis Hilton, Mac Donald’s, Pizza Hut, etc).

5. Responsabilidade civil objetiva no Código de Deefesa do Consumidor

O Código Brasileiro de Defesa do Consumidor (Lei n° 8.078/90) adotou a responsabilidade objetiva como fundamento para a reparação de danos decorrentes dos acidentes de consumo (arts. 12 a 14), embasado na teoria do risco da atividade profissional como forma de socializar os riscos e de garantir a efetiva reparação dos danos causados ao consumidor. Por essa teoria, “quem introduz um risco novo na vida social deve arcar com eventuais conseqüências danosas a outrem, em toda a sua integralidade”.14

Desta forma, podemos afirmar que a lei consumerista deu uma guinada de 180 graus no ordenamento jurídico vigente à época de sua promulgação tendo em vista que até o seu “advento não havia legislação eficiente para enfrentar a problemática dos acidentes de consumo e proteger os consumidores”, tendo em vista que os “riscos de consumo corriam por

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conta do consumidor, porquanto o fornecedor só respondia no caso de dolo ou culpa, cuja prova era praticamente impossível”.15

Pela teoria do risco da atividade ou risco proveito, ou ainda, risco do empreendimento, quem desenvolve uma atividade com fins de lucros, tem que assumir as responsabilidades decorrentes da própria atividade. A lógica se encontra no fato de que se a atividade resulta em benefícios para seu empreendedor, nada mais justo que o mesmo assuma os riscos pelos prejuízos que, eventualmente, esta atividade possa vir a causar a outrem.

A adoção da teoria do risco da atividade ou risco proveito funda-se, portanto, na premissa de que as perdas decorrentes do dever de indenizar serão compensadas com os lucros obtidos na atividade negocial do agente causador do dano. É a chamada justiça distributiva que pressupõe repartir os riscos da atividade de consumo, entre todos os participantes da sociedade de consumo, seja através da política de preços ou dos seguros sociais.

É importante destacar que o risco de que nos fala o Código de Defesa do Consumidor (art. 12 e 14, caput, in fine), está intimamente ligado ao dever jurídico de respeitar a integridade física, psíquica e patrimonial do consumidor. Violado este dever jurídico, nascerá para o lesado o direito à indenização e, para o detentor da atividade, o dever de indenizar em razão de sua atividade. Nestas circunstâncias, não se discute a existência de culpa do agente, bastando à vítima demonstrar a ocorrência do dano e o nexo de causalidade, para fazer nascer o dever indenizatório, porquanto, trata-se de responsabilidade objetiva.

Devemos também abstrair qualquer idéia de anormalidade do ato danoso, uma vez que a obrigação ressarcitória irá decorrer não da ilegalidade da atividade, mas dos danos que ela, mesmo regularmente desenvolvida, venha a causar a outrem. O que a lei procura assegurar é que haja uma integral indenização, de tal sorte que aquele que, tendo sofrido um dano por defeito na realização de determinada atividade, possa ter assegurado o direito à indenização.

Assim, a atividade poderá ser potencialmente perigosa ou não, mesmo lícita, mas causadora de dano. Nestas circunstâncias, o importante é considerar que, se a atividade normalmente desenvolvida foi a causa do dano, obrigará o seu explorador a indenizar a vítima, independentemente da existência de culpa, somente se isentando de tal dever, se provar a ocorrência das eximentes expressamente prevista no Código consumerista.

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A responsabilidade objetiva do fornecedor pelo fato do produto ou do serviço é um imperativo do Código de Defesa do Consumidor (caput do art. 12 e 14). Porém essa responsabilidade é mitigada, quer dizer, não é integral, em razão da possibilidade do fornecedor isentar-se do dever de indenizar se provar a ocorrência de uma das excludentes expressamente previstas no estatuto consumerista, quais sejam: a não colocação do produto ou serviço no mercado; ou, que mesmo tendo colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; e, por fim, a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro (art. 12, § 3° e art. 14, § 3°).

Cabe ainda observar que a relação entre fraqueado e franqueador não se submete à relação de consumo tendo em vista que, neste caso, não há um fornecedor de um lado e um consumidor do outro. A Lei n° 13.966 de 26/12/2019 procurou deixar claro que não caracteriza relação de consumo ou vínculo empregatício a relação entre o franqueador e o franqueado ou com seus empregados, ainda que durante o período de treinamento. Importante que a lei tenha feito essa ressalva porque isso dá mais segurança jurídica aos envolvidos nesse tipo de contrato.

6. Da responsabilidade pelo acidente de consumo

O “fato de produto” deve ser entendido como “a repercussão externa do defeito do produto, ocasionando dano na esfera de interesses juridicamente protegido do consumidor, ou seja, é a causa objetiva do dano causado ao consumidor em virtude de defeito de produto, também chamado de acidente de consumo”.16 Quer dizer, para caracterizar o fato de produto

(acidente de consumo) é necessário que o produto defeituoso ocasione dano físico ou psíquico ao consumidor ou utente, pois se esse defeito apenas frustrar as expectativas de uso, por impróprios ou inadequados, estaremos diante do vício de produto cujos prejuízos, mais das vezes, serão exclusivamente de ordem material.

Além disso, o Código de Defesa do Consumidor considera defeituoso o produto que não oferecer a segurança legitimamente dele esperada, considerando-se a sua apresentação, o uso e riscos razoavelmente dele esperado e a época em que foi colocado no mercado (art. 12, § 1°, I a III).

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Assim, o produto poderá ser considerado defeituoso se houver falhas na sua apresentação, incluindo-se rótulo, bula e publicidade, que deverão ser claras e ostensivas, em linguagem acessível, devendo informar para quais usos se recomenda o produto, quais os riscos que podem advir do mesmo, os cuidados que devem ser tomados no manuseio e uso, além das instruções quanto ao uso e fruição do produto.

Alguns produtos são naturalmente perigosos e, às vezes, esse perigo é inerente ao mesmo sob pena de frustrar a legítima expectativa e satisfação do consumidor. Uma faca de cozinha, por exemplo, é naturalmente perigosa e frustrará a expectativa de uso se ela não se prestar a cortar os alimentos. Nestas circunstâncias, o fato do consumidor cortar acidentalmente a mão no manuseio desta faca, tal fato não ensejará para o fornecedor nenhum dever indenizatório, pois o risco de corte é próprio do produto, sendo aquilo que a doutrina chama de “risco inerente”. Diferentemente se o consumidor ao utilizar a faca venha a se ferir em face de um defeito no cabo da mesma, que se desprendeu ao ser manuseado, pois aí estaremos diante de um risco não previsível sendo aquilo que se pode chamar de “risco adquirido”.

Advirta-se ainda, que o produto não pode ser considerado defeituoso se eventualmente outro modelo mais novo, bem desenvolvido e de melhor qualidade, venha a ser introduzido no mercado (art. 12, § 2°). Justifica-se tal previsão, pois se assim não fosse, o Código seria um grande obstáculo ao desenvolvimento e ao progresso, tendo em vista que a indústria, comércio e a prestação de serviços restariam estagnados, pois ninguém iria correr riscos de desenvolver novos produtos e serviços, sabendo que poderia ser responsabilizado pelos modelos antigos anteriormente comercializados.

Rememore-se por oportuno que, a responsabilidade do fornecedor pelo fato do produto (acidentes de consumo) é objetiva, logo independente de culpa, a teor do que, expressamente, dispõe o Código de Defesa do Consumidor tendo em vista que o fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos (art. 12, caput).

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Ademais, o consumidor tem direito à reparação integral do dano (art. 6°, VI), sendo certo que nas indenizações por fato de produto o consumidor lesado poderá ser indenizado por danos morais em razão dos dissabores e sofrimento eventualmente suportados em face do acidente de consumo, como também poderá se ver ressarcido dos danos materiais decorrentes do mesmo fato (danos emergentes e lucros cessantes) e, eventualmente, dano estético se do acidente restou cicatrizes, deformidade ou aleijão.

7. Dos responsáveis pelo dever indenizatório

Conforme já mencionado, o Código Brasileiro de Defesa do Consumidor elenca como responsáveis pelo dever indenizatório, nos casos de acidentes de consumo, o fabricante, o produtor, o construtor (nacional ou estrangeiro), e o importador que respondem, independentemente da existência de culpa (responsabilidade objetiva), pela reparação dos danos, eventualmente causados aos consumidores (art. 12, caput).

Além destes, que podemos chamar de responsáveis diretos, o Código consumerista também prevê a responsabilidade do comerciante, que podemos chamar de responsabilidade supletiva ou suplementar na exata medida em que também será responsabilizado objetivamente quando: o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados; ou, o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador; ou ainda, quando não conservar adequadamente os produtos considerados perecíveis (art. 13, I, II e III).

Neste cenário, podemos identificar e classificar os responsáveis pelo dever de indenizar, em face de acidentes de consumo, da seguinte forma: fornecedor real, fornecedor aparente, fornecedor presumido e fornecedor comerciante, que serão objetos dos tópicos seguintes.

7.1 – Fornecedor real:

O fornecedor real, pela sistemática adotada pelo Código de Defesa do Consumidor, é “o fabricante, o produtor e o construtor, nacional ou estrangeiro” (art. 12, caput).

São responsáveis reais então, todas as pessoas, físicas ou jurídicas, que de qualquer forma participem direta ou indiretamente, do processo de criação de um produto com a sua

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subseqüente inclusão no mercado de consumo. Em síntese: São os verdadeiros responsáveis pela defeituosidade do produto.17

7.2 – Fornecedor aparente:

Fornecedor aparente, ou “quase-fornecedor”, é aquele que apõe sua marca ou sinal distintivo no produto fabricado por outrem, assumindo assim, pela teoria da aparência, a responsabilidade substitutiva pelo fato de produto.18

Veja-se que neste caso, a responsabilidade do fabricante aparente ocorrerá mesmo naqueles casos em que as circunstâncias permitam presumir que o produto foi produzido por outra pessoa e tal se justifica porque aquele que, na apresentação do produto assume a qualidade de produtor, seja por omitir o verdadeiro fabricante, seja pela aposição de seu nome ou marca, não poderá vir a ser exonerado mesmo nos casos em que indique com clareza quem efetivamente seja o responsável pela fabricação do produto.

O objetivo de tal dispositivo é facilitar a defesa dos direitos dos consumidores eventualmente lesados por produtos defeituosos, tendo em vista que não se exige da vítima que identifique quem é o fornecedor real, conformando-se a ordem jurídica com a indicação do fornecedor aparente.19 Caso típico são as franquias (franchising) que, como fruto da modernidade comercial e parcerias, implica na concessão de exploração de determinada atividade na qual o titular da marca (franqueador) autoriza e disciplina o seu uso por outro empresário (franqueado), mediante remuneração não só pelo uso da marca, como também pela exclusividade na aquisição e comercialização dos produtos daquela marca.20

7.3 – Fornecedor presumido:

Presumido é o importador dos produtos industrializados ou mesmo in natura que respondem, em nome próprio, pelos danos causados aos consumidores por eventuais defeitos de fabricação ou produção dos artigos por eles importados. Como diz Silvio Luís Ferreira da

17 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Responsabilidade civil no Código do Consumidor e a defesa do

fornecedor, p.159.

18MARINS, James. Responsabilidade da empresa pelo fato do produto, pp. 100-101.

19 ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Responsabilidade civil do fornecedor pelo fato do produto no direito brasileiro, p.

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Rocha, “é exemplo típico de ‘responsabilidade indireta’ porque ele não atua de nenhum modo no processo de fabricação dos bens importados”.21

Esta equiparação do importador a fabricante/produtor se justifica em razão da distância em que se encontra o fornecedor estrangeiro, o que dificultaria, senão inviabilizaria a defesa do consumidor vítima do acidente de consumo, em razão dos custos e dificuldade de ordem prática que encontraria para fazer valer seus direitos.

7.4 – O comerciante:

No que diz respeito à responsabilização pelo fato de produto, o comerciante é também igualmente responsabilizado objetivamente, porém o legislador consumerista ressalvou, expressamente, que essa responsabilidade somente se operará quando for impossível ou difícil a identificação do fabricante, construtor, produtor ou importador do produto ou, quando se tratar de produtos perecíveis e o comerciante não os conservar de forma adequada (CDC, art. 13).

A opção legislativa foi no sentido de considerar o comerciante também responsável objetivamente, porém, de forma condicionada (muitos falam que é subsidiária), quer dizer que ele somente será chamado a responder pelos danos aos consumidores quando se fizer presente alguma das alternativas expressamente prevista na lei consumerista (Lei n° 8.078/90, art. 13), já que, via de regra, quem deverá responder pelo acidente de consumo será o fabricante, o produtor, o construtor (nacional ou estrangeiro), e o importador.

Importante destacar que a responsabilidade do comerciante de produto anônimo (art. 13, I e II) tem uma natureza “coercitiva e sancionatória”. Coercitiva, porque meio indireto de constranger o comerciante a comunicar à vítima a identidade do fabricante, produtor ou importador do produto. Sancionatória porque, se não o fizer, sofrerá diretamente os efeitos da responsabilização pelo dano como uma sanção pelo não esclarecimento solicitado pela vítima.22

Já no tocante à responsabilidade decorrente da guarda e conservação inadequada de produtos perecíveis (art. 13, III), a previsão se assenta em duas premissas: ou o comerciante

21 ROCHA, Sílvio Luís Ferreira da. Responsabilidade civil do fornecedor pelo fato do produto no direito brasileiro, p.

80.

22 Cf. Silvio Luis Ferreira da Rocha. Responsabilidade civil do Fornecedor pelo fato do produto no direito brasileiro,

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deverá ser instado a responder por ato próprio, quando tenha sido negligente, não conservando adequadamente o produto; ou, será responsabilizado conjuntamente já que não se pode exigir do consumidor que investigue se o produto já saiu de fábrica deteriorado. Se foi deteriorado no transporte, ou se veio a se deteriorar nas instalações do comerciante.

Verifica-se que nas hipóteses elencadas a responsabilidade do comerciante emerge como própria daí porque não se pode falar em subsidariedade, pois se assim fosse, seria necessário primeiro acionar algum dos obrigados principais (art. 12), para somente na sua impossibilidade, dirigir-se a demanda contra o comerciante, não é esse o espírito da lei.

8. A solidariedade entre todos os participantes da cadeia de produção e distribuição

A solidariedade é um dos aspectos mais importantes contemplados pelo Código de Defesa do Consumidor, significando a bem da verdade, o alargamento das possibilidades de indenização de danos aos consumidores, tendo em vista que referida a lei consignou expressamente que havendo mais de um autor da ofensa todos responderão solidariamente pela reparação do dano (art. 7°, parágrafo único).

Em termos de responsabilidade civil este aspecto e extremamente importante, pois amplia substancialmente as possibilidades de efetiva prevenção e reparação de danos, tendo em vista que a lei faculta ao consumidor lesado a opção de demandar contra qualquer um dos participantes da cadeia de produção/distribuição do produto ou serviço causador do dano.

A solidariedade passiva de forma ampla incluindo todos os participantes no evento danoso vem a ser reafirmada no art. 25 em seu parágrafo primeiro, enquanto que no parágrafo segundo o legislador incluiu como coobrigados solidários os fornecedores de peças ou componente defeituosos, eventualmente causador do dano, ainda que incorporados ao produto final adquirido pelo consumidor.

Pela importância do instituto, a solidariedade ainda vem reafirmada e outra passagens da legislação consumerista. Nesse sentido, o legislador fez prever a solidariedade de todos os fornecedores pelos vícios de produtos (art. 18 e 19), bem como a responsabilidade do fabricante, produtor, construtor e do importador pelo fato do produto (art. 12). Além disso,

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trata também da solidariedade das sociedades consorciadas (art. 28, § 3°) e do fornecedor de serviços pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos (art. 34).

Assim, na eventualidade de dano e havendo mais de um participante na cadeia de produção/distribuição do produto ou serviço causador do dano, o consumidor pode escolher a quem demandar: pode propor a ação contra o fornecedor imediato, ou contra o fornecedor mediato ou, em última análise, contra todos os que, de alguma forma, participaram da cadeia de produção e distribuição do produto no mercado de consumo, quando então formar-se-á um litisconsórcio passivo facultativo (CPC, art. 1136).23

9. Conclusão

A responsabilidade civil prevista na legislação de consumo é diferente do Código Civil e funda-se na responsabildie objetiva (sem culpa) e na solidariedade entre todos os participantes da cadeia de produção, distribuição ou comercialização de produtos ou serviços.

Dessa forma pouco importa ser franqueado ou franqueador tendo em vista que o consumidor tem a opção de demandar qualquer dos dois, ou mesmo os dois conjuntamente, em face dos danos eventualmente sofridos.

A distinção entre franqueado e franqueador, especialmente no que diz respeitos às suas obrigações, só tem importância entre eles, isto é, inter partes, de sorte que, na eventualidade de condenação de um quando a responsabilidade for do outro, caberá ação de regresso daquele que indenizou em face do verdadeiro casusador do dano.

A prevenção de danos dofranqueador em relção ao franqueado poderá ser resolvida via a obrigastoriedade de contratação de seguros de danos, o que pode ser perfeitamente possível de inserir como cláusula no contrato de franchising.

10. Bibliografia

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