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STF reconhece possibilidade de usucapião de imóvel em condomínio vertical

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Informação

Nº. 524 01 de setembro de 2020 Confederação Nacional das Instituições Financeiras

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A Informação CNF examina decisões do Executivo, do Congresso e do Judiciário relevantes para as instituições financeiras, de modo a esclarecer e aprofundar matérias publicadas pela imprensa.

STF reconhece possibilidade de usucapião de imóvel em condomínio

vertical

RESUMO: O Supremo Tribunal Federal (STF) deu parcial provimento, por unanimidade de votos, ao Recurso Extraordinário (RE) 305.416, proveniente do Tribunal do Rio Grande do Sul (TJRS)

e de relatoria do Ministro Marco Aurélio. No recurso, pessoa física pleiteava a reforma de acórdão

do TJRS que negou provimento à apelação e confirmou sentença do juízo de primeiro grau por entender que o instituto da usucapião, previsto no artigo 183 da Constituição Federal (CF/88), não se aplicava aos casos de condomínio vertical (edilício), mas tão somente aos condomínios horizontais e loteamentos clandestinos. Ao dar parcial provimento ao recurso, o ministro relator consignou que não conhecia o direito em si da recorrente, mas determinou que o tribunal de origem não coloque óbice à apreciação da matéria ante a possibilidade de aplicação da usucapião, prevista no artigo 183 da CF/88, aos imóveis localizados em condomínios verticais. O ministro foi seguido à unanimidade. O Ministro Celso de Mello não votou em razão de licença médica.

PRIORIDADE: Média

URGÊNCIA: Média

AÇÃO ESPERADA: Acompanhamento das discussões do tema no STF e avaliação dos impactos da ação no setor financeiro e na sociedade.

Delineamento do tema

A usucapião é uma das formas de aquisição de alguns direitos reais prevista na Constituição Federal (CF/88) e no Código Civil (CC). Por meio desse instituto, a pessoa pode se tornar proprietária de um imóvel por ter passado certo tempo na posse mansa e pacífica daquele bem. Para que alguém consiga consolidar a propriedade em seu nome é necessário que cumpra vários requisitos elencados, tanto na CF/88, como na legislação infraconstitucional.

Na legislação pátria estão previstos a usucapião rural e a urbana, cada uma com regras específicas para sua aquisição. A rural, por exemplo, está prevista no artigo 191 da CF/88 e exige que o possuidor do bem exerça a posse durante cinco anos ininterruptos, em área não superior a cinquenta hectares, em zona rural, sem oposição, tornando a terra produtiva e tendo nela sua moradia. A usucapião urbana, por sua vez, está prevista no artigo 183 da CF/88. Dentre várias exigências, a legislação dispõe que qualquer pessoa pode adquirir a propriedade do bem imóvel se possuir área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptos e sem oposição. A Constituição ainda exige que para a efetivação do direito o possuidor não poderá ser proprietário de outro imóvel rural ou urbano.

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Nº. 524 01 de setembro de 2020 Confederação Nacional das Instituições Financeiras

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A Informação CNF examina decisões do Executivo, do Congresso e do Judiciário relevantes para as instituições financeiras, de modo a esclarecer e aprofundar matérias publicadas pela imprensa.

A CF/88 quando tratou sobre as modalidades e requisitos do instituto da usucapião não especificou os tipos de imóveis urbanos que poderiam ser objeto da ação, como por exemplo, os imóveis situados em condomínios verticais. Por essa razão, diversos questionamentos começaram a surgir na justiça brasileira para solucionar esse problema.

Em 2006, o STF recebeu Recurso Extraordinário (RE), proveniente do estado do Rio Grande do Sul, em que uma das partes, possuidora de um apartamento em condomínio edilício, desejava adquirir o bem por meio da usucapião. Na origem, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) negou provimento ao recurso por entender que o artigo 183 da Constituição Federal se destina apenas a loteamentos clandestinos e condomínios horizontais.

Do Recurso Extraordinário (RE) 305.416

Trata-se de recurso interposto por pessoa física contra uma instituição financeira, em que se pleitea o reconhecimento da aquisição originária de uma propriedade imóvel em condomínio vertical, por meio da usucapião. Na origem, o TJRS negou provimento ao recurso da parte autora e extinguiu o processo por entender que o artigo 183, da Constituição Federal, destina-se apenas a loteamentos clandestinos e condomínios horizontais.

Na origem, a recorrente propôs ação de usucapião, lastreada no art. 183 da CF/88, postulando a declaração de domínio em relação ao apartamento situado na cidade de Porto Alegre/RS, com área real global de 126,12m², sob a alegação de ter a posse do imóvel com animus domini. Dito imóvel foi objeto de financiamento, contraído no Sistema Financeiro da Habitação (SFH) pelo ex-companheiro da recorrente. Diante do inadimplemento das prestações do mútuo, o Banco Bradesco, na qualidade de agente financeiro do SFH, iniciou os procedimentos para alienação extrajudicial do apartamento. Em decorrência desse fato, a autora ajuizou ação cautelar para impedir a venda do bem e no outro processo, buscava-se o reconhecimento da propriedade em razão da usucapião, alegando já residir no imóvel há mais de quinze anos, pois lá permaneceu após o fim do relacionamento afetivo.

Na petição ao juízo de origem, a recorrente afirmou que era pessoa pobre, com 63 anos, ainda trabalhando para o sustento de seus familiares. Ademais de que possui o imóvel com ânimo de dona, no qual reside com sua família, ininterruptamente e sem oposição alguma, há mais de 15 (quinze) anos, não sendo proprietária de outro imóvel, urbano ou rural. Argumentou que reúne todos os requisitos previstos no art. 183 da CF /88 para obter o domínio do bem, mormente por ter pago os tributos e encargos sobre ele incidentes e tê-lo defendido por meio da ação cautelar contra o Banco Bradesco S.A.

A sentença julgou conjuntamente os processos e extinguiu ambas as ações (cautelar e de usucapião), sem julgamento do mérito, revogando a liminar deferida, aos fundamentos de, na ação cautelar, por ausência de legitimidade da autora, uma vez que o mútuo envolvendo o apartamento em questão fora firmado por terceira pessoa. Na questão da ação de usucapião, argumentou pela impossibilidade jurídica do pedido, pois a pretensão de usucapir não encontraria guarida no art. 183 da CF/88, tendo em vista tratar-se de unidade

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autônoma de edifício, que não estaria abrangida pelo elemento político-social emanado da norma constitucional, criada para os necessitados, e não para possuidores de extensos apartamentos.

Interposta apelação, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS) manteve a sentença, ao fundamento de que o dispositivo constitucional que instituiu a usucapião especial urbana (CF, art. 183) destina-se somente a lotes, e não a unidades de um edifício. Além disso, a aplicação do prazo reduzido, previsto no preceito, permitiria a aquisição, via usucapião, de imóveis amplos e luxuosos, subvertendo institutos do direito civil.

A autora interpôs recurso extraordinário, onde sustenta que o julgado ofendeu o art. 183 da CF/88. Argumentou que preenche todos os requisitos exigidos por tal artigo para aquisição do imóvel por meio da usucapião especial. Invocou também precedente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), no qual se admitiu a usucapião urbano especial de apartamento construído na área urbana, sob o fundamento de que a CF/88 possibilitou essa modalidade de aquisição da propriedade não só em relação a terreno, mas, principalmente, para imóvel construído, desde que atendidos os requisitos constitucionais, pois, para que haja uma moradia, imprescindível que exista uma construção no terreno.

Em contrarrazões, o Banco Bradesco (recorrido), em preliminar, sustentou a falta de prequestionamento da matéria recursal e a incidência dos óbices das Súmulas 282 e 356 do STF. No mérito, alegou que o recorrente jamais manteve posse mansa e pacífica, já que o imóvel tratava-se de financiamento habitacional, com constituição de cédula hipotecária, em que o agente financeiro estava sempre notificando o mutuário a efetuar o pagamento das prestações inadimplidas, culminado com a distribuição da execução extrajudicial, regida pelo Decreto-Lei 70 /66. A posse do recorrente não poderia ser considerada com a finalidade de usucapir, considerando-se que o imóvel estava vinculado a cédula de crédito imobiliário, regido pela Lei 4.380/64.

O julgamento teve início em 2006. Na época, o relator do caso, Ministro Marco Aurélio, proferiu voto para dar parcial provimento ao recurso para reconhecer não o direito propriamente dito da requerente em usucapir o imóvel, mas para afastar o impedimento ao julgamento do mérito, como anteriormente determinado pelo TJRS. O relator entendeu que o imóvel em condomínio vertical, como tratado no caso, estaria enquadrado nos requisitos do artigo 183, da CF/88. Na ocasião, o relator asseverou que tal preceito constitucional não distingue a espécie de imóvel e que os requisitos nele previstos têm por objeto viabilizar a manutenção da moradia.

O relator lembrou que, no caso concreto, a recorrente pretendia usucapir a unidade autônoma e não todo o prédio. Explicou que a propriedade não está vinculada à área global da edificação, mas somente à fração de terreno a ela correspondente, conforme escritura constante do registro de imóveis, cuja área é inferior a duzentos e cinquenta metros quadrados. Nesse ponto, o ministro citou a Lei 4.591/1964, que dispõe sobre o condomínio em edificações e incorporações imobiliárias, a Lei 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos), as quais preveem a necessidade de se averbar a individualização de cada unidade condominial. Por fim, citou a Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), que admite a usucapião de área ou edificação urbana, sem ressalvar a unidade condominial e a Lei 10.406/2002 (Código Civil), que também dispõe sobre usucapião de área urbana, sem qualquer restrição.

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A Informação CNF examina decisões do Executivo, do Congresso e do Judiciário relevantes para as instituições financeiras, de modo a esclarecer e aprofundar matérias publicadas pela imprensa.

Após o voto do relator, o Ministro Ayres Britto pediu vistas, dizendo aos pares que a questão deveria ser analisada do ponto de vista da proteção do direito à moradia.

Do julgamento do RE 305.416

No início de seu voto, o Ministro Marco Aurélio ressaltou que a única controvérsia a ser dirimida estaria ligada ao alcance do artigo 183, da Constituição Federal (CF/88), do seguinte teor:

Art. 183. Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

O ministro consignou que, de acordo com o artigo 183, tem-se como própria à usucapião de área urbana de até 250 m², utilizada para moradia individual ou da família. Para o ministro, a referência à área e à destinação do imóvel é tendente a abranger o solo e a construção existente e que é indispensável que, há cinco anos, o interessado venha utilizando o imóvel como moradia. Não possuindo outro imóvel urbano ou rural, a pessoa adquire-lhe o domínio, vedada essa aquisição àqueles que anteriormente já usucapiram outro imóvel bem como no tocante à vedação de usucapião de imóveis públicos.

Em seguida, o relator argumentou que não se deve distinguir a espécie de imóvel, se individual propriamente dito ou se situado em condomínio, no denominado condomínio horizontal. Os requisitos constitucionais estão direcionados a viabilizar a manutenção da moradia, considerando que o imóvel não ultrapasse, tanto em relação ao solo, quanto à área construída, os 250 m². Salientou que é incontroverso que o imóvel objeto do pedido inicial está situado em condomínio de apartamentos e se pretende usucapir a unidade autônoma e não todo o prédio. Explicou que é sabido que se tem, no caso, área global, área real privativa e fração alusiva ao próprio terreno onde ocorreu a edificação. O acórdão do Tribunal de Justiça revela que o prédio foi construído em terreno de 16m por 39m, desaguando em um total de 624 m². Nesse contexto, pontuou que a propriedade, a unidade condominial, no entanto, não está vinculada a essa metragem, mas à fração de terreno que corresponde a ela, conforme escritura levada ao registro de imóveis.

O ministro citou que a Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73) também versa, no artigo 168, inciso III, alínea “f”, sobre a necessidade de averbação no registro de imóvel dos contratos de compra e venda relativos ao desmembramento das unidades autônomas e, na alínea “g” do mesmo inciso, dispõe sobre a averbação da individualização atinente aos prédios condominiais. Explicou ainda que, mediante o artigo 227 dessa mesma lei, deve constar da matrícula do imóvel a respectiva especificação, indicando-se as características.

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A Informação CNF examina decisões do Executivo, do Congresso e do Judiciário relevantes para as instituições financeiras, de modo a esclarecer e aprofundar matérias publicadas pela imprensa.

Embora não haja referência expressa à fração ideal do terreno, deve-se considerar a exigência de identificação do imóvel, com a sua devida metragem.

Consignou que o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001), ao aludir, no artigo 9º, à usucapião, revela que esse instituto é possível, considerada a área ou edificação urbana de até 250 m², sem cogitar do afastamento de unidade condominial. Para o Ministro, essa norma é harmônica com o artigo 183 da CF/88, pois não distingue se área urbana de 250 m² deve ser vertical ou horizontal, mas tão somente, dispõe que essa área deve ser utilizada como moradia individual ou da família.

Por último, o ministro citou o Código Civil, que no artigo 1.240, dispõe sobre usucapião de área urbana, sem qualquer restrição. De acordo com os artigos 1.331, § 3º, e 1.332, inciso II, a cada unidade imobiliária caberá uma fração ideal no solo e nas partes comuns, devendo tal fração constar do instrumento de instituição do condomínio. Para o relator, não haveria qualquer dúvida que se tenha a individualização do apartamento que compõe a unidade e também a fração do terreno. Passam a unidade e a fração a formar um todo que se mostraria condizente com nomenclatura “propriedade”, sendo, portanto, passível de vir a ocorrer a transferência usucapião.

Ao concluir seu voto, o ministro argumentou que imóvel em condomínio vertical é enquadrável no artigo 183 da CF/88, conferindo a esse diploma normativo a maior eficácia possível, considerando-se a grande quantidade existente do número de moradias em apartamentos. No caso concreto do recurso, o ministro explicou que a área do solo correspondente ao apartamento da recorrente é inferior ao limite de 250 m². Frisou ainda que não se pretendeu, com a ação de usucapião, usucapir a totalidade do solo em que construído o edifício, mas tão-somente a propriedade individualizada (apartamento).

Por fim, o ministro deu parcial provimento ao recurso não para reconhecer o direito, em si, da recorrente a usucapir o imóvel, mas para afastar o óbice ao julgamento do mérito do caso, uma vez que a sentença do juízo de primeiro grau, confirmada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, implicou a extinção do processo ante a impossibilidade jurídica do pedido.

Ministro Alexandre de Moraes

O Ministro Alexandre de Moraes acompanhou o relator e apresentou voto no Plenário Virtual. Pontuou que não há como pressupor que o artigo 183, ao referir-se à área urbana utilizada para sua moradia ou de sua família, queira restringir a possibilidade de aquisição do domínio pela usucapião a apenas a área do solo, e não à edificação nele construída. O objetivo da norma é assegurar moradia àquele que, não possuindo outro imóvel urbano ou rural, ali resida, por cinco anos ininterruptos, sem oposição de terceiros. Nesse contexto, considerou ser indiferente ao objetivo visado pela norma ser essa construção erigida na forma de casa ou apartamento, o que importa é que sirva de residência para o possuidor ou a sua família.

O ministro pontuou que a Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) menciona que aquele que possuir como sua, área ou edificação urbana de até 259m², por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Por esse dispositivo, demonstra-se que a proteção não se restringe somente ao solo, uma vez que não é possível a aquisição por usucapião urbana apenas da área, tendo em vista que o objetivo

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visado pela lei é a moradia. Assim, em tese, seja casa ou apartamento, desde que de domínio particular, são passíveis de apropriação mediante a usucapião, quando preenchidos pelo possuidor os demais requisitos necessários a cada modalidade de usucapião.

Por fim, o ministro pontuou que não vislumbra óbice à usucapião especial urbana de imóvel edificado, seja apartamento, seja casa, quando esteja perfeitamente identificado e localizado dentro da área do município, além de se encontrar dentro dos limites de até duzentos e cinquenta metros quadrados e preenchidos os demais requisitos do art. 183 da CF/88.

Ministro Edson Fachin

Mesmo acompanhando o relator, o Ministro Edson Fachin apresentou seu voto no ambiente virtual. Para o ministro, o acolhimento da pretensão de direito à usucapião vertical, necessita apenas preencher os requisitos expressamente exigidos pelo texto constitucional, não prevalecendo obstáculos outros que não aqueles previstos na CF/88. Nesse sentido, citou obra do professor Carlos José Cordeiro, que em trabalho sobre o tema, defende que, sendo a propriedade horizontal um direito autônomo, cada unidade do condomínio horizontal poderá ser alienada separadamente e, consequentemente, poderá ser usucapida de forma isolada.

O ministro assinalou que o direito fundamental à moradia, constituindo-se como direito social multifacetado e complexo, não se limita apenas a atuação negativa estatal, qual seja, a do dever do Estado de não privar o particular, arbitrariamente, de uma habitação, mas, também, o dever do Estado de proporcionar medidas de caráter positivo, que facilitem a obtenção de uma residência. Assim, pressupõe-se como condição necessária à concretização do direito fundamental à moradia que se tenha na área urbana uma edificação com essa serventia, não se distinguindo a propriedade inserida em um condomínio edilício daquela que se constitui como edificação autônoma.

Ministro Gilmar Mendes

O Ministro Gilmar Mendes também acompanhou o relator para dar parcial provimento ao recurso. Em seu voto, consignou que o STF possui jurisprudência no sentido de não se admitir recurso extraordinário interposto com fundamento no artigo 183, da CF/88. Para o ministro, a verificação do preenchimento dos requisitos da usucapião especial urbana é de natureza infraconstitucional e pressupõe o revolvimento fático probatório. Entretanto, lembrou que no caso examinado pela Corte, a recorrente questiona decisão que entendeu pela impossibilidade da aplicação da usucapião em relação a apartamentos em condomínio vertical. Nesse ponto, argumentou que a exclusão de um tipo de propriedade das hipóteses de incidência do art. 183 da CF/88 configura violação ao texto constitucional.

O ministro lembrou que o STF tem precedente, julgado sob a ótica da repercussão geral, segundo o qual nem mesmo lei infraconstitucional pode obstar o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana, previsto no art. 183 da CF/88, mediante o estabelecimento de módulos urbanos na área em que situado o imóvel. Para o ministro, se a impossibilidade de restrição se aplica à lei, há ainda mais sentido em adotar a mesma orientação para óbices criados por decisão judicial, em confronto à literalidade do art. 183 da CF/88.

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MINISTROS DO STF

Marco Aurélio (relator)

Parcial provimento do RE

(Parcial provimento do recurso não para conhecer o direito em si da recorrente, mas para determinar que o tribunal de origem não coloque óbice à possibilidade de

usucapião em condomínio vertical).

Roberto Barroso Edson Fachin Alexandre de Moraes Dias Toffoli (Presidente)

Luiz Fux (Vice-Presidente)

Celso de Mello (não votou)

Rosa Weber Ricardo Lewandowski Gilmar Mendes Cármen Lúcia

Considerações Finais

A decisão proferida pelo STF impacta, indiscutivelmente, no ambiente de negócios do país. Ao reconhecer a possibilidade de usucapião de imóvel em condomínio vertical, a decisão pode se tornar um precedente favorável para essa aplicação em diversos outros casos que discutem idêntica problemática, em todo país. Como no caso concreto, o imóvel da recorrente é fruto de um financiamento que não foi quitado, onde a instituição financeira iria proceder aos trâmites da alienação extrajudicial. Dessa maneira, a problemática poderá ser levantada por outros tomadores de financiamento, nos processos judiciais, e poderá obstaculizar os procedimentos da recuperação das garantias de créditos inadimplidos.

A Confederação Nacional das Instituições Financeiras (CNF), no exercício das prerrogativas constitucionais, legais e regimentais que lhe são conferidas, por meio de sua Unidade Jurídica junto aos Tribunais Superiores, continua monitorando a matéria no Supremo Tribunal Federal, com vistas a oferecer subsídios a suas Associadas quanto ao julgamento de processos que afetem o setor financeiro e aos impactos que deles decorrem.

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