Complexo Rio Madeira: dilemas e desafios para a governança ambiental

Complexo Rio Madeira:

dilemas e desafios para a governança ambiental

Universidade Católica de Brasilia Terças Ambientais

Brasilia, 10 de novembro de 2009

Brent Millikan

Organização da apresentação

• Conceitos de governança

• Perfil do empreendimento

• Contextualização em politicas públicas

• Características do planejamento e execução

inicial das hidreletricas do Madeira

– Licenciamento ambiental – Arranjos Financeiros

• Reações da sociedade civil e do Ministério

Público

• Impactos e conflitos socioambientais

• Considerações Finais

Conceitos de Governança

• Segundo a Comissão sobre a Governança Global (1996), a

governança pode ser definida como "a totalidade das diversas maneiras pelas quais os indivíduos e as instituições, públicas e privadas, administram seus problemas comuns. É um processo

contínuo pelo qual é possível harmonizar interesses conflitantes ou diferentes, e realizar ações cooperativas".

• ...."denominamos governança democrática os padrões de interação entre instituições governamentais, agentes do mercado e atores

sociais que realizam a coordenação e, simultaneamente, promovam ações de inclusão social, assegurem e ampliem a maior participação social nos processos decisórios em matéria de políticas públicas. Tal padrões de interação entre governo e sociedade se expressam em canais ou arenas, institucionalizados ou não, de intermediação entre instituições governamentais e atores sociais." (Santos Junior,

Azevedo e Ribeiro, Democracia e Gestão Local: A experiência dos

LOCALIZAÇÃO DOS APROVEITAMENTOS NOS RIOS MADEIRA, MAMORÉ E BENI E DAS HIDROVIAS

COMPLEXO DO RIO MADEIRA

Fonte: Furnas/Odebrecht UHE Cachuera Esperanza UHE Cachoeira Ribeirão UHE Jirau UHE Santo Antônio Rodovia do Pacífico

Caracteristicas do Complexo Madeira

• Empreendimento proposto por Odebrecht e Furnas, inserido posteriormente no PAC e IIRSA

• Duas primeiras hidreletricas: UHE Santo Antônio (3.150 MW ) e UHE Jirau (3.300 MW)

• Proposta de mais duas hidreletricas: binacional (Guajará-Mirim) e Cachuela Esperanza (Bolivia)

• Áreas previstas para reservatórios: 271 Km2 (UHE Santo Antonio) and 258 km2 (UHE Jirau)

• Utilização de turbinas bulbo em região de planície

• Previsão inicial de eclusas para expandir a hidrovia do Madeira: Guaporé/Mamoré/Beni/Madre de Dios

• Linha de transimisão de 2,450 km entre Porto Velho e Araraquara (SP)

Leilão Santo Antonio: Dezembro de 2007

Leilão Jirau: Maio 2008

SANTO ANTÔNIO - RESERVATÓRIO

JIRAU - RESERVATÓRIO

FOTO NO PERÍODO DE SECA

River Transportation of Commodities

DIRETRIZES ENERGÉTICAS PARA A

HIDRELETRICIDADE NO BRASIL

! Considerar o aproveitamento de cerca de 180 GW até

2030 (do total de 260 GW do potencial hidrelétrico

nacional) com prioridade para as Usinas Hidrelétricas da Amazônia, dos rios Madeira, Xingu e Tapajós. O

Programa Hidrelétrico no período 2005/2030 seria de cerca de 100 GW.

! Reavaliar os 80 GW (do total de 260 GW do potencial hidrelétrico nacional) que atualmente apresentam

restrições ambientais (áreas indígenas, reservas

florestais, parques nacionais, etc), não considerados até 2030.

Eclusas de Tucurui R$ 1,5 bi Plataforma Multimodal de Marabá R$ 76

mi

Derroc. Drag. e Sinaliz. R$140 mi Projeto Eclusa de Estreito R$8 mi

Eclusas de B. Esperança R$52 mi Eclusa de Lageado R$ 800 mi

Dragagem do Jacaré R$ 4 mi Projeto Eclusa de São Simão Projeto Eclusa de Cach.Rio Verde

Projeto Eclusa de Itumbiara Derrocagem do Guaíra R$ 16 mi Projeto Tapajós T Pires R$ 20 mi

Ações em

Desenvolvimento

Dragagem S. Francisco

Dragagem do Jacui

Porto de Sta Vitória do Palmar R$ 5 mi Sinalização lagoa Mirim

Diretrizes anunciadas no inicio do Governo Lula sobre grandes obras de infra-estrutura na Amazônia (PAS, PPCDAM)

• Inserção do planejamento de obras de

infra-estrutura em estratégias de desenvolvimento territorial sustentável;

• Análise de custos e benefícios sociais, econômicos

e ambientais (públicos e privados) e alternativas

• Consideração de medidas preventivas, mitigadoras

e compensatórias na contabilidade de obras;

• Aprimoramento de mecanismos de participação

social, desde o inicio do processo;

• Prioridade para investimentos em sub-regiões

consolidadas ou em processo de consolidação vs. novas frentes de ocupação.

Contextualização em Politicas Publicas

• Fracasso do Plano Amazônia Sustentável (PAS) como iniciativa estratégica para nortear politicias públicas,

sobretudo no sentido de conciliar crescimento econômico com inclusão social e sustentabilidade ambiental, com fortalecimento da governança

• Retirada do componente “Infra-estrutura Sustentável” do Plano de Ação para Prevenção e Controle do

Desmatamento na Amazônia Legal - PPCDAM em março de 2005

• Visão convencional do PAC: Amazônia como fonte de

energia e matérias primas para o crescimento econômico nacional; corredores para exportação de commodities

(soja, pecuária, madeira, minério, etc) com baixo valor agregado;

Contextualização em Politicas Publicas

• Fragilidades no planejamento setorial de energia (PNE, PDEE) em termos de análise de custo beneficio social, econômico e ambiental de alternativas (geração,

transmissão, conservação, eficiência);

• Forte influência de empreiteiras e interesses político-eleitorais; viés para grandes hidreletricas

• Desarticulação entre politicas públicas: infra-estrutura (energia, transportes), agro negocio e mineração vs. desenvolvimento territorial, meio ambiente, mudanças climáticas

• Fragilidades na implementação de politicas de gestão de bacias hidrográficas em nivel nacional e internacional

Características do Processo de

Licenciamento Ambiental

• Discordâncias entre equipe técnica do IBAMA e

empreendedores (Furnas, Odebrecht) sobre Termos de Referência do EIA de Santo Antônio e Jirau: área de influência direta e indireta: abordagem da bacia

hidrográfica;

• Retirada de eclusas/ hidrovia e das linhas de transmissão do EIA de Santo Antônio e Jirau

• Na versão final dos TdRs, IBAMA permite que

empreendedor decida sobre a área de influência e

impactos cumulativos com outras obras no decorrer da elaboração do EIA;

• EIA realizado pela Leme Engenharia (subsidiaria da Tractebel Engenharia, do grupo GDF Suez)

Características do Processo de

Licenciamento Ambiental

• Diversos questionamentos sobre qualidade do EIA

• Consultas publicas: polêmicas, restritas a município de Porto Velho (novembro de 2006)

• Ministério Público Estadual contrata pareceres de especialistas para analisar o EIA (com recursos da Odebrecht) que identificam diversas falhas

• Técnicos da FUNAI manifestam preocupações sobre insuficiências no EIA em relação a povos indígenas (2006)

• Em março de 2007, equipe técnica da DILIC/IBAMA emite parecer, identificando diversas lacunas que persistem no EIA (sedimentos, peixes, mercúrio, saúde pública, povos indígenas) concluindo pela inviabilidade ambiental do

Características do Processo de

Licenciamento Ambiental

• Coordenador da DILIC acata parcialmente parecer

técnico, solicitando estudos complementares e parecer jurídico sobre abordagem de impactos na Bolivia

• Março – julho de 2007: Aumento de pressões políticas sobre IBAMA e FUNAI para conceder LP; reclamações do Lula que “jogaram bagre no colo do Presidente”;

• Saída do diretor da DILIC e do presidente do IBAMA

• Novo presidente da FUNAI cede a pressões do IBAMA e MME

• Julho de 2007 – novo diretor da DILIC elabora parecer conclusivo sozinho; novo Presidente do IBAMA aprova concessão da licença prévia para Santo Antônio e Jirau com 33 condicionantes, com enfoque para monitoramento

Características do Processo de

Licenciamento Ambiental

• Em 2008, consorcio liderado por Furnas e Oderbrecht

(SAESA) entrega PBA para UHE Santo Antonio baseado em condicionantes da Licença Prévia

• Problemas com PBA: como prevenir e mitigar impactos não estudados? pouco detalhamento operacional: metas,

mecanismos de execução e financiamento, arranjos institucionais (papel de Estado vs. empreendedor), cronograma

• Agosto de 2008 – Presidente do IBAMA assina a Licença de Instalação para UHE Santo Antonio, cinco dias depois de ter recebido parecer negativo de equipe tecnica,

• Novembro de 2008: Presidente do IBAMA concede “LI parcial” para Jirau (canteiro de obras, ensecadeiras) com mudança de eixo pelo ganhador do leilão (Enersus);

• “LI completa” para Jirau concedida pelo IBAMA em junho de 2009

Caracteristicas de Arranjos

Financeiros

• Aprovação de empréstimos inéditos pelo BNDES para consórcio de Santo Antônio (SAESA) e Jirau (ENERSUS), totalizando R$ 13 bilhões

• Utilização inédita de fundos públicos para financiar hidreletricas (FNO, FI-FGTS, FAT)

• Falta de transparência sobre critérios utilizados por bancos públicos (BNDES, BB, BASA, CEF), inclusive Protocolo Verde

• Falta de transparência sobre criterios utilizados pelo bancos privados, inclusive Princípios de Ecuator

• Envolvimento indireto do Banco Mundial – CT com MME’ empréstimo setorial ambiental (SEM DPL) que inclui apoio para nova política institucional do

Reações da Sociedade Civil

e Ministério Público

• Protestos de populações afetadas (MAB, Via

Campesina, entidades bolivianas e peruanas,

etc.)

• Ações legais, com enfoque para irregularidades

no processo de licenciamento ambiental e

direitos humanos (MPF/MPE,AdT, Kanindê,

COIAB, FBOMS,CEADES, etc.)

• Questionamentos sobre papel de bancos

Impactos e conflitos socioambientais

• Deslocamento de populações ribeirinhas: negociações conduzidas por consórcios de forma individualizada, sem esclarecimento de direitos; indenizações não

consideram perda de acesso ao meio ambiente como meio de sustentação (peixes, transporte, agricultura de vázea, produtos da floresta)

• Migrações para a cidade de Porto Velho e outras áreas urbanas, problemas de violência, transito, especulação fundiária, expectativas irrealistas sobre emprego.

• Morte de peixes com construção de ensecadeiras • Desmatamento e especulação fundiária

Mortandade de pelo menos 11 toneladas de Peixes ensecadeiras de Santo Antonio – dez 2008

Zoneamento Socio-Economico-Ecologico de Rondônia

Considerações Finais

• A governança ambiental de hidreletricas na Amazônia não pode ser tratada de forma isolada de seu contexto em políticas públicas

(energia, desenvolvimento regional)

• Forte influência de empreiteiras e interesses polítiico-eleitoriais no PAC e política energética, evidenciando conflitos entre interesses públicos e privados, fraca governança,

• Num contexto de vácuos de políticas públicas e fraca governança (inclusive falta de informação), grandes hidreletricas são vendidas por seus proponentes como panaceias (contra o apagão, solução para o desenvolvimento local)

• Licenciamento ambiental: confusão entre agilidade e qualidade; perda de autonomia, principio da precaução?

• Falta mecanismos efetivos de gestão de conflitos transfronteiriços; • Problemas do Madeira tendem a se reproduzir com outras grandes

obras de infra-estrutura na Amazônia (p.ex. Belo Monte, BR-319) • Necessidade de fortalecer governança ambiental no inicio de

processos de planejamento, contemplando novos instrumentos

(p.ex. AAE) de forma articulada a diálogos sobre políticas setoriais e territoriais.

fim

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