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ENUNCIAÇÃO E DIFERENÇA EM TEXTOS PRODUZIDOS POR ALUNOS DO ENSINO MÉDIO

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Academic year: 2021

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ENUNCIAÇÃO E DIFERENÇA EM TEXTOS PRODUZIDOS POR ALUNOS DO ENSINO MÉDIO

Juliana Batista RODRIGUES (G-UEL)

ABSTRACT: By means of French Discourse Analysis, our aim is to check marks of exclusion of other subjects in statements written in school composttions. We propose to study the discoursive resources by which means is produced in text statements.

KEYWORDS: Discourse Analysis; exclusion; teaching; dissertation

0. Introdução

Este trabalho faz parte do projeto de pesquisa: “A construção da Diferença pelo Discurso: procedimentos enunciativos de exclusão”, que se desenvolve na Universidade Estadual de Londrina, sob a coordenação do prof. Luiz Carlos Fernandes. O projeto tem como um de seus objetivos principais contribuir com novas propostas para os estudos textuais inerentes a áreas diferenciadas como as da crítica lingüística, discursiva e literária, integrando, de forma efetiva, os mecanismos de produção dos sentidos, que caracterizam a exclusão, veiculados por diferentes modalidades de discurso.

Os vários gêneros discursivos estudados no projeto como: publicitário, jurídico, jornalístico, pedagógica, musical e humorístico representam alguns dos que mais freqüentemente são utilizados na comunicação diária, no trabalho, na escola e nos meios de comunicação em geral. A descoberta das peculiaridades da expressão ideológica de cada uma delas poderá trazer contribuições para os estudos de crítica e interpretação textuais.

Neste trabalho, daremos ênfase ao gênero pedagógico, analisando textos escolares, já que o projeto também visa a contribuir com reflexões sobre as práticas pedagógicas de ensino e de leitura e produção de textos que a escola brasileira realiza atualmente. Para isso, consideramos a importância do ato de leitura, o processo cognitivo que o envolve, e a associação da produção de textos à questão da autoria. A noção de autoria leva-nos ao autor, posto que este trabalha no intradiscurso, enquanto que o sujeito do discurso está na dimensão do interdiscurso, sendo que inter e intradiscurso não podem ser concebidos separadamente (Pêcheux, 1997).

Como a Análise Francesa do Discurso acredita que um discurso sempre cita e é influenciado por outros, analisaremos nas redações as vozes que estão presentes nesse discurso, mesmo existindo uma ilusão de liberdade discursiva do sujeito aluno, ressaltando que este finge que o discurso é dele para esconder o discurso do Outro a que, invariavelmente, faz referência.

1. Perspectiva Teórica

A Análise do Discurso de linha francesa (AD) tem uma proposta interdisciplinar que une a Lingüística, a História e a Psicanálise. Seu objeto de estudo, o discurso, segundo Foucault, é atravessado, não pela unidade do sujeito, mas pela sua dispersão. Portanto, o sujeito não é senhor de seu discurso e sim, descentralizado.

A AD tem como meta refletir sobre os processos discursivos inscritos em relações ideológicas. Seus conceitos nucleares são os de discurso e ideologia. Maingueneau (1997) ressalta que

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o discurso é uma dispersão de textos cujo modo de inscrição histórica permite defini-los como um espaço de regularidades enunciativas.

O discurso deve ser remetido às grandes unidades históricas que os enunciados constituem, ou seja, à formação discursiva a que se refere. Estas constituem espécies de operadores de coesão semântica e representa um sistema comum de restrições que pode investir-se nos universos textuais (Cardoso, 1999). A formação discursiva constitui a pluralidade de textos de um determinado grupo, em que um discurso é atravessado por vários.

Um fator relevante levado em conta pela AD são as condições de produção. Estas têm correspondência nas circunstâncias da enunciação, a seu contexto imediato, considerando-se o contexto sócio -histórico e ideológico (Orlandi, 2003).

Pêcheux define as Condições de Produção do discurso (1969) a partir de normas que os interlocutores estabelecem entre si e dos lugares determinados que ocupam na estrutura de uma formação social. No processo discursivo, funciona uma série de formações imaginárias que indicam os lugares que os interlocutores conferem a si mesmos e ao outro.

A opção quanto ao que o sujeito pode/deve ou não dizer é determinada pelo lugar que ocupa no interior de uma formação ideológica à qual está submetido seu discurso, de modo que esse jogo de imagens vai se constituindo à medida em que se constitui o próprio discurso.

O interdiscurso é um dos pontos principais que fundam a construção teórica da AD. Aprofundando o conceito de interdiscurso, Maingueneau (1997), especifica outros três termos complementares: os de universo discursivo, campo discursivo e espaço discursivo. Por universo discursivo, o autor entende “um conjunto de formações discursivas de todos os tipos que coexistem, ou melhor, interagem em uma conjuntura. Este conjunto é finito, mas irrepresentável, jamais concebível em sua totalidade pela AD.” (Maingueneau, 1997, p.116).

O campo discursivo é definido por Maingueneau (1997, p.116), como “um conjunto de formações discursivas que se encontram em relação de concorrência, em sentido amplo, e se delimitam, pois, por uma posição enunciativa em uma dada região”. Esse conjunto de formações discursivas possui unidades de uma mesma formação social, que, no entanto, diferem em seu desempenho, o que faz com que estabeleçam uma relação polêmica, de aliança ou de aparen te neutralidade. É no interior do campo discursivo que se constitui um discurso. Já o espaço discursivo delimita, para Maingueneau (1997,p.117), “um subconjunto do campo discursivo, ligando pelo menos duas formações discursivas que, supõe-se, mantêm relações privilegiadas, cruciais para a compreensão dos discursos considerados.”. Essa delimitação é feita pelo analista, tendo em vista seus objetivos de pesquisa.

Essas três noções conferem ao interdiscurso um caráter histórico, pois os recortes e as relações estabelecidas pelo analista são regulados pelos limites do campo discursivo. Maingueneau proclama ainda o primado do interdiscurso sobre o discurso, sem, com isso, inscrever a AD em um terreno desregrado, mas, ao contrário, postula a existência de uma rede de regularidade semântica que especifica um discurso mediante as relações do mesmo com o seu Outro. Entende -se por “Outro” um sujeito discursivo com o qual um certo discurso se constitui em uma relação aberta, embora regrada. Assim, “a interdiscursividade se organiza a partir da exploração sistemática das possibilidades do núcleo semântico de cada formação discursiva que compõe o campo discursivo”.(Mussalim, 2004, p.90).

A partir da noção de interdiscursividade, pode-se observar a relação memória e discurso. Toda produção discursiva faz circular formulações já enunciadas; desse modo, a noção de memória discursiva, para a AD, diz respeito à existência histórica do enunciado no interior de práticas discursivas reguladas por aparelhos ideológicos. O interdiscurso pode ser entendido como um conjunto de já -ditos (e esquecidos) que sustentam a possibilidade de todo dizer. Opondo-se intuitivamente a ele, teremos o que é formulado em um momento dado, em condições dadas, e que pode ser chamado de intradiscurso.

A intertextualização é a relação de um texto com outro pré-existente. Pode ser de maneira explícita: citação; ou implícita: alusão, paródia, ironia. Do ponto de vista discursivo,

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Maingeneau (1997) considera a intertextualidade o tipo de citação que uma formação discursiva legitima por sua própria conta; sendo que as maneiras de citar, as ocasiões em que é permitido citar ou é preciso citar, o grau de exatidão exigido, variam de época para época e de discurso para discurso.(Cardoso, 1999)

2. Análise do Corpus

O corpus selecionado para esta pesquisa é formado de textos produzidos por alunos da 8ª série do ensino médio. Trata-se da proposta de redação contida na unidade 4 do livro didático Linguagem: criação e interação, de 8ª série, cujas autoras são Cássia Ga rcia de Souza e Márcia Paganini Cavéquia, publicado pela Editora Scipione.

O comando da proposta pede um parágrafo dissertativo e oferece o seguinte cartum como apoio:

O mesmo contém uma cena em que crianças estão deixando as brincadeiras para assis tir à televisão. Desse modo, o aluno terá de elaborar um parágrafo desfavorável ao ato de ver televisão para estar de acordo com a atividade sugerida.

Devido à grande influência da intertextualização para nossa abordagem, faremos um breve comentário sobre os dois textos principais contidos na unidade em questão que serviram de apoio para os textos produzidos pelos alunos. Nesta unidade, há uma sincronia entre elementos gráfico-visuais e verbais relacionados à temática da televisão, de modo a privilegiar, na maioria dos casos, conforme constatamos, aspectos pejorativos.

Um dos textos (vide anexo -1-) tem como título Médicos advertem: TV faz mal. Trata-se de um artigo jornalístico transcrito do periódico Folha de São Paulo. Como o título já diz, esse texto fa la sobre os malefícios causados pela TV. Um outro texto (vide anexo -2-) que o livro didático traz é uma crônica de Rubem Braga com o título Ela tem alma de pombo. Nele, são também abordados alguns aspectos positivos do veículo televisivo, apesar dos negativos serem a maioria.

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Nossa análise pôde constatar a influência dos textos de apoio veiculados através do livro didático e do professor nos parágrafos analisados, pois, dos 14 textos produzidos, 12 citavam apenas os aspectos negativos da TV. Alguns até, muitas vezes, estão parafraseando os dois textos principais da unidade. Para exemplificar, faremos uma comparação entre trechos dos textos de apoio contidos no livro didático e trechos das redações produzidas pelos alunos.

Texto 1

Texto de apoio: “As pessoas que assistem a muita TV estão sendo tratadas como viciadas”.

Texto dos alunos: “A televisão hoje em dia virou um vício na vida das pessoas, a qual elas não conseguem ficar sem assistir...”

“Mas não ficar em frente da TV onde ela escolhe seu caráter de “telemaníaco” ou “televiciado”.” “... se as mães evitassem que seus filhos, quando pequenos assistissem muita TV, depois de uma certa idade eles não teriam que sustentar esse vício”.

Texto de apoio: “John Nelson, da associação Médica dos EUA, acrescenta que a televisão é responsável também por um aumento da violência na sociedade norte-americana”.

Texto dos alunos: “A TV passa coisas que criança não deveria ver tipo um filme de tiro”. Texto de apoio: “... essas crianças assistem em média a 22 horas de TV por semana...” Texto dos alunos: “As crianças ficam em frente da TV 22 horas por semana”.

Texto de apoio: “O mais indicado, talvez, seja fazer como se recomenda nos anúncios de bebidas alcoólicas, ou seja, ‘consumir com moderação’.”

Texto dos alunos: “Eu sei que não posso lhe proibir de assistir à TV, mas posso lhe dar um simples conselho: ‘ Consuma com moderação, a sua televisão’.”.

Texto 2

Texto de apoio: “Também acho que a televisão paralisa a criança numa cadeira mais do que o desejável”.

Texto dos alunos: “ ... até as crianças que são bagunceiras, na hora do desenho, elas sossegam”. Texto de apoio: “Sete horas da noite era hora de uma pessoa acabar de jantar, dar uma volta pela praça para depois pegar uma sessão das 8 no cinema. Agora todo mundo fica em casa vendo uma novela, depois outra novela”.

Texto dos alunos: “As crianças não têm mais a mesma educação que as crianças de antigamente tinham”.

Nos dois textos, em que foi citado um aspecto positivo da televisão, esse procedimento foi feito de maneira sutil: “Às vezes a televisão nos traz coisas boas e ruins, mas também nos rouba a atenção que poderíamos estar utilizando numa coisa mais criativa, divertida ou educativa”. Mesmo neste caso, pode-se identificar uma exclusão, pois o enunciador afirma que a TV rouba a atenção e este verbo: roubar tem sentido de tirar sem o consentimento, de forçar uma pessoa a fazer algo que na verdade não quer. Ao afirmar que ao invés de assistir à TV poderíamos estar nos ocupando com coisas mais criativas, divertidas e educativas, o enunciador transmite a idéia de que a TV não possui significativamente estas características.

No outro texto em que foi mencionado um aspecto positivo da TV, o enunciado nos revela uma igualdade entre o comentário positivo e o negativ o: Porém, no último período demonstra uma preocupação maior pelas “bobagens” que podem influenciar as pessoas: “A TV na mesma hora que é

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uma boa influência é uma má influência porque ela passa notícias do mundo para ficarmos informados e também passa muitas bobagens que as pessoas podem se influenciar, principalmente as crianças”. Conforme se pode perceber

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o sujeito enunciador da redação escolar também situa o seu discurso em relação ao discurso do outro, ajusta e planeja o enunciado para seu destinatário , mostrando assim, que inclui outras vozes em seu discurso. Nesta pesquisa, procurou-se averiguar o tipo de influência que os textos de apoio exercem na produção do aluno, enquanto recurso intertextual para verificar se há, de fato, uma exclusão do aspecto positivo da televisão , já que o mesmo acontece nos textos de apoio.

Um fator relevante para esta pesquisa são as condições de produção, que são as circunstâncias em que o enunciado é produzido, ou seja, das regras que o enunciador obedece para produzir o enunciado. Por se tratar de uma instituição escolar, o sujeito enunciador (aluno) preocupa-se em escrever um texto adequado, pois vai ser avaliado pelo enunciatário (professor). Os alunos percebem que o tema foi veiculado por duas autoridades: livro didático e professor, então preferem adequar seus enunciados à proposta. Pois acreditamos que adolescentes, na idade de 14 anos gostam de assistir à TV e não se preocupam tanto com os malefícios.

Também por se tratar da instituição escola, há uma tendência do indivíduo a remeter seu discurso à intelectualização. Uma vez que um dos textos de apoio contém citações de médicos, pesquisas, manifestações de entidades não governamentais, livros, estatísticas entre outras autoridades que legitimam e dão credibilida de, influenciando assim, através do interdiscurso, as escolhas discursivas dos enunciadores.

3. Conclusão

Com esta análise, foi identificada uma tendência à exclusão de outras visões sobre o mesmo tema no corpus: o lado positivo da televisão. Pôde-se co nstatar que isso ocorreu devido às influências do interdiscurso (já-dito), da intertextualização (citação de outros textos) e das condições de produção (instituição escolar). Comprovando então que há outras vozes no discurso.

RESUMO:

Com base nas propostas teóricas da Análise de Discurso de linha francesa, temos por objetivo verificar as relações de alteridade em enunciados produzidos na escola. Analisaremos também, os recursos utilizados para a produção de sentido nos enunciados -comandos relativos à atividade de redação em algumas unidades de um livro didático.

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ANEXOS: Texto 1

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARDOSO, Silvia. Discurso e ensino. B. Horizonte: Autêntica Editora, 1999.

FOUCAULT, Michel. Arqueologia do saber. Trad. Luiz Felipe Baeta Neves. 5.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997.

MANGUENEAU, Dominique. Novas tendências em Análise do Discurso. 3ed. Campinas: Pontes, 1997.

MUSSALIM, F. Análise do discurso. In: MUSSALIM, F. e BENTES. A. C. (Org.) Introdução à lingüística. São Paulo: Editora Cortez, 2001. p. 101-142.ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de Discurso. 5. ed.- Campinas, SP: Pontes, 2003

PÊCHEUX, Michel. Semântica e Discurso: uma crítica à afirmação do óbvio. Trad. Eni P. Orlandi (et al.) 3.ed. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 1997. (Título original, 1975).

SOUZA, Cássia Leslie Garcia e CAVÉQUIA, Márcia Paganini. Linguagem, criação e interação. 1. ed.- São Paulo: Saraiva, 1999.

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