UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
EFEITO ANTITROMBÓTICO DE UMA FUCANA NÃO ANTICOAGULANTE EXTRAÍDA DA ALGA SPATOGLOSSUM SCHRÖEDERI
EDJANE MARIA DE AZEVEDO BARROSO
Natal/RN 2008
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
EFEITO ANTITROMBÓTICO DE UMA FUCANA NÃO ANTICOAGULANTE EXTRAÍDA DA ALGA SPATOGLOSSUM SCHRÖEDERI
EDJANE MARIA DE AZEVEDO BARROSO
Natal/RN 2008
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
EFEITO ANTITROMBÓTICO DE UMA FUCANA NÃO ANTICOAGULANTE EXTRAÍDA DA ALGA SPATOGLOSSUM SCHRÖEDERI
EDJANE MARIA DE AZEVEDO BARROSO
Dissertação apresentada à Universidade Federal do Rio Grande do Norte para a obtenção do título de Mestre em Ciências da Saúde pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde.
Orientador: Prof. Dr. Hugo Alexandre de Oliveira Rocha
Natal/RN 2008
CATALOGAÇÃO NA FONTE
Edjane Maria de Azevedo Barroso B277 Barroso, Edjane Maria de Azevedo.
Efeito antitrombótico de uma fucana não anticoagulante extraída da alga Spatoglossum Schröederi / Edjane Maria de Azevedo Barroso. __ Natal-RN, 2008.
24 p. : il.
Orientador: Prof. Dr. Hugo Alexandre de Oliveira Rocha.
Dissertação (Mestrado) – Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde. Centro de Ciências da Saúde. Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
1. Fucana - Dissertação. 2. Polissacarídeos Sulfatados - Dissertação 3. Alga Marron - Dissertação. 4. Spatoglossum Schröederi - Dissertação. I. Rocha, Hugo Alexandre de Oliveira. II. Título.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
Coordenador do Programa de Pós-graduação: Prof. Dr. Aldo da Cunha Medeiros
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
EFEITO ANTITROMBÓTICO DE UMA FUCANA NÃO ANTICOAGULANTE EXTRAÍDA DA ALGA SPATOGLOSSUM SCHRÖEDERI
EDJANE MARIA DE AZEVEDO BARROSO
Presidente da Banca (orientador): Prof. Dr. Hugo Alexandre de Oliveira Rocha (UFRN)
BANCA EXAMINADORA
Profa. Dra. Laura Marina Pinotti (UFES)
Profa. Dra. Valéria Soraya de Farias Sales (UFRN)
Prof. Dr. Geraldo Barroso Cavalcanti Junior (Suplente – UFRN)
v
Dedico aos meus pais, César (in memorian) e Eunice. Aos meus filhos Álison Wagner e Allan Mark. Ao meu esposo Mário Barroso.
vi
Dedico esta obra:
Ao Prof. Hugo Alexandre, um pesquisador nato, um exemplo de que se pode fazer pesquisa com ética e respeito, mostrando através de sua simplicidade, do seu carinho e experiência que sabe cativar a tudo e a todos e dessa forma além de mestre se tornou um amigo admirável.
vii
AGRADECIMENTOS
A Deus, por ter me dando força e energia para seguir sempre em frente mesmo diante das dificuldades.
A Universidade Federal do Rio Grande do Norte por fornecer as condições necessárias para realização desse trabalho;
Ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do Norte pela oportunidade de cursar o mesmo.
Ao professor e meu orientador Dr. Hugo Alexandre, pela confiança, credibilidade e paciência para a conclusão desse trabalho e, principalmente, por sua amizade durante esses anos.
Aos professores e funcionários do Departamento de Bioquímica e do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde, pelo ótimo convívio e pelos conhecimentos passados.
A Danielli Lopes e Patrícia, secretarias do PPGCSA, pelo carinho e atenção ao longo desse período.
As amigas e farmacêuticas Cynthia e Patrícia, pela amizade e apoio durante as minhas ausências ao trabalho.
A amiga e farmacêutica Luana Cristina pela amizade e apresentação ao Prof. Hugo Alexandre.
Aos amigos antigos e novos do BIOPOL, Ivan, Eduardo, Ana Karinne, Diego, Leonardo, Leandro, Jailma, Dayanne, Sara, Mariana, Gabriel, Sayonara, Nayssandra, Rafael, Ruth, Nednaldo, Ranieri, e Cynthia pela convivência, amizade, apoio e participação direta e indireta na realização deste trabalho.
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Sumário
Dedicatória... v
Agradecimentos ... vii
Lista de Abreviaturas e Siglas ... ix
Resumo ... x
1 INTRODUÇÃO ... 1
2 REVISÃO DA LITERATURA ... 5
3 ANEXAÇÃO DO ARTIGO ... 10
4 COMENTÁRIOS, CRÍTICAS E CONCLUSÕES ... 17
5 REFERÊNCIAS ... 19 Abstract
ix
Lista de abreviaturas e siglas
μg micrograma
g grama
APTT tempo de tromboplastina parcial ativado
Da daltons
HC-II cofator II da heparina
Hep heparina kDa quilodaltons
TFPI inibidor da via do fator tecidual (“tissue factor pathway inhibitor“)
U.I unidade internacional
v/v volume/volume
x
RESUMO
Fucanas é um termo utilizado para denominar a família de polissacarídeos
sulfatados que apresentam em sua constituição α-L-fucose sulfatada. A alga marrom
Spatoglossum schröederi da família Dictyotaceae, apresenta três heterofucanas
denominadas de fucana A, B, e C. A fucana A (21kDa) é composta por um núcleo
central formado por ácido glucurônico, β 1→3 ligado, substituídos em C4 por L-fucoses
α (1→3) ligados. A fucose ainda é substituída no C4 por grupos sulfatos e no C2 por
cadeias de β (1→4) xilose. Esta fucana não apresentou atividade anticoagulante entre
0,1 e 100μg/mL e nenhuma atividade hemorrágica entre 50 e 800μg /mL. Os testes antitrombótico “in vivo” mostraram que a fucana A não apresentou atividade nas
concentrações (0,2 a 20μg/g) testadas 1 hora após a administração do polissacarídeo.
No entanto, quando a fucana A foi administrada endovenosamente, 24h antes da ligadura da veia cava, observou-se um efeito dose-dependente, alcançando a sua
saturação em torno de 20μg/g de massa do animal. Além disso, o efeito se mostrou
tempo-dependente, atingindo saturação em 16h após a administração da fucana. Em todas as vias em que foi administratada (SC, IM, IP, e IV), a fucana A demonstrou ação antitrombótica. Exceção apenas para a via oral. A importância dos resultados obtidos foi o fato da fucana A estimular a síntese de um heparam sulfato com características antitrombótica semelhante à heparina pelas células endoteliais. Esta descoberta levou a hipótese de que a atividade antitrombótica da fucana A está relacionada com o aumento na produção deste heparam sulfato. Devido as suas características e por ser um composto praticamente desprovido de atividade anticoagulante e hemorrágico sugere-se que a fucana A possa vir a ser um agente antitrombótico “in vivo”. A realização deste estudo teve caráter multidisciplinar, envolvendo pesquisadores da Bioquímica, Morfologia, Hematologia, Botânica e Veterinária. Este aspecto preencheu os requisitos da multidisciplinaridade do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde.
1 INTRODUÇÃO
As principais causas de mortes nos Estados Unidos estão relacionadas às doenças do coração e dos vasos sanguíneos, e estão intimamente ligadas as
ocorrências de trombose (1) . Este fato também ocorre nos demais paises ocidentais,
onde a incidência de mortes devido às doenças cardiovasculares em 2003 ocupou o primeiro lugar em ordem de classificação de óbitos, seguido por aqueles causados por
neoplasias malignas e doenças cerebrovasculares, respectivamente (2).
Este elevado número de óbitos poderia ser muito maior, se não tivesse ocorrido a introdução de agentes antitrombóticos, particularmente a heparina, polissacarídeo sulfatado extraído de intestino de suínos e pulmões bovinos, que ocorreu na década de
40 do século vinte, e posteriormente de seus derivados, esses na década de 90 (1).
A heparina é atualmente um dos principais fármacos utilizados como anticoagulantes e antitrombóticos, entretanto esse polissacarídeo pode provocar várias
reações adversas, dentre elas, hemorragia e trombocitopenia (3). Portanto, a limitação
do uso irrestrito da heparina tem estimulado a busca de outros polissacarídeos com ação antitrombótica, mas que não apresentem os mesmos efeitos colaterais da heparina (4).
Com o objetivo de se descobrir novos compostos com atividade anticoagulante, as algas marinhas tem se apresentado como ótimas opções devido essas serem ricas
em polissacarídeos sulfatados, além de serem recursos naturais renováveis (5-8). Há
três classes de algas marinhas, as marrons (Phaeophyceas), as verdes (Chlorophyceas) e as vermelhas (Rodhophyceas). As algas marrons, classe em que está incluída a alga deste estudo, sintetizam as fucanas (homo e heterofucanas) que
2
sulfatada (9). O crescente interesse por esses compostos é devido eles apresentarem
características estruturais e efeitos semelhantes à heparina.
A atividade anticoagulante relacionada a polissacarídeos de algas foi
inicialmente descrita por Chargafft(10) na década de 30 e o efeito anticoagulante “in
vitro” de frações purificadas da alga marrom Fucus vesiculosus foi publicada em 1957
(11).
A ação das fucanas como anticoagulante ocorre principalmente por sua ação potencializadora dos anticoagulantes naturais cofator II da heparina e, principalmente, da antitrombina, esta ação estaria diretamente relacionada com o seu grau de
sulfatação e massa molecular(12). Contudo, há fucanas anticoagulantes que agem por
outros mecanismos, como por exemplo: estimular a liberação do Inibidor do fator
tecidual (TFPI) (13) ou a síntese de um heparam sulfato antitrombótico por células
endoteliais (9, 14), fato observado também para a heparina e compostos antitrombóticos
sem atividade anticoagulante (15-18).
Dados do nosso grupo mostraram que a alga Spatoglossum schröederi sintetiza três diferentes heterofucanas, que foram denominadas de fucanas A, B e C. A fucana A
corresponde a cerca de 80% do total das fucanas sintetizadas pela alga (9) , ela é
composta por um núcleo central β (1→3) ácido glucurônico contendo oligossacarídeos
substituintes em C4 por L-fucoses α (1→3) sulfatadas. A fucose ainda é substituída no
C4 por grupos sulfatos e no C2 por cadeias de β (1→4) xilose (9) .
Nesse trabalho mostramos que essa fucana não possui atividade anticoagulante
“in vitro” (0,1 a 100μg/mL) nem atividade hemorrágica (50 a 800μg/mL) “in vivo”. Bem
como não inibiu a agregação plaquetária. Contudo, testes antitrombóticos “in vivo” demonstraram que essa fucana apresenta atividade antitrombótica tempo e dose
3
dependente, chegando ao máximo após 16h da administração e com 20μg /g de
animal.
Um dado importante demonstrado nesse trabalho para esta fucana, foi o fato de que ela foi capaz de estimular a síntese de um heparam sulfato com características antitrombótica por células endoteliais. Esta descoberta nos levou a propor a hipótese de que a atividade antitrombótica da fucana A está relacionada com a sua capacidade de estimular o aumento da produção deste heparam sulfato.
As análises estatísticas dos grupos foram realizadas através da análise de variância (ANOVA) e as diferenças dos grupos foi realizada posteriormente pelo teste de Turkey.
Os resultados parciais deste trabalho foram apresentados na forma de painel no “3RD International Symposium in Biochemistry of Macromolecules and Biotechnology - SBBq” realizado em Natal/RN no período de 6 a 8 de dezembro de 2006.
Finalmente, os resultados obtidos foram publicados em um artigo científico, intitulado: A non anticoagulant heterofucan has antithrombotic activity in vivo, aceito em março de 2008 pela Planta Medica, a International Journal of Natural Products and Medicinal Plant Research.
O desenvolvimento deste estudo proporcionou a mestranda à oportunidade de interagir com diversos ramos da pesquisa científica tais como Bioquímica, Morfologia, Hematologia, Botânica, Veterinária, o que deu um caráter interdisciplinar ao trabalho. Houve ainda a oportunidade de a mestranda criar laços científicos com o Depto. de Bioquímica da Universidade Federal de São Paulo, quando da colaboração que ocorreu durante os experimentos com cultura de células, bem como com o Depto. de Biologia Celular da Universidade Federal do Paraná, devido às análises de microscopia eletrônica.
4
Como projeto para o futuro, planejamos continuar com os estudos na mesma linha de pesquisa, em um futuro doutorado.
5
2 REVISÃO DA LITERATURA
As doenças cardiovasculares (DCV), doença coronária e o acidente vascular cerebral são as principais causas de óbitos em todos os países do mundo constituindo,
um dos maiores problemas de saúde pública mundial (1, 2) . No Brasil, dados estatísticos
do Ministério da Saúde demonstram que cerca de 60% dos óbitos em 2004 foram atribuídos a três grupos de causas: as doenças do aparelho circulatório (31,83%), neoplasias (14,69%), e causas externas (14,21%). Quando se observa a tabela I, se
verifica que esses valores não mudaram muito nos últimos anos (19) .
Tabela I
Mortalidade proporcional por grupos de causas definidas (%). Brasil - 1991, 1998 e 2004
Grupos de causas 1991 1998 2004
Doenças infecciosas e parasitárias 5,8 6,2 5,13
Neoplasias 13,1 14,0 15,69
Doenças do aparelho circulatório 34,0 32,4 31,83
Doenças do aparelho respiratório 9,7 11,6 11,39
Afecções perinatais 5,7 4,6 3,46
Causas externas 15,1 14,9 14,21
Demais causas definidas 16,6 16,3 18,29
Total 100,0 100,0 100,0
Fonte: Ministério da Saúde/SVS - Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) (www.datasus.gov.br)
Os distúrbios vasculares podem provocar doença clínica por meio de dois mecanismos principais: o estreitamento ou obstrução total do lúmen vascular, podendo ser progressivo, no caso da aterosclerose, ou repentino através da trombose ou embolia; outro mecanismo é o enfraquecimento das paredes dos vasos sanguíneos, com sua conseqüente dilatação ou ruptura, que pode levar a hemorragia. Quando ocorre em uma grande artéria ou veia, esse evento está quase sempre associado a lesões vasculares provocados por trauma, aterosclerose, ou erosão inflamatória ou
6
A hemostasia é uma série de processos fisiológicos que efetuam importantes funções como a manutenção do sangue em um estado líquido e livre de coágulos no interior dos vasos sanguíneos, estas funções devem ser balanceadas com o objetivo de induzir a formação de um tampão hemostático rápido e localizado no local da lesão vascular (21) .
A trombose é uma disfunção patológica nos processos hemostáticos culminando com a formação de um coágulo sanguíneo (trombo) no interior de um vaso
não lesionado ou oclusão trombótica na vasculatura após pequena lesão (20, 22) .
Quando a coagulação ocorre no interior de uma veia é chamada de trombose venosa, podendo ser superficial ou profunda dependendo da localização anatômica do vaso, se superficial ou profundo. Além do que, poderá provocar inflamação e uma possível obstrução no vaso lesado de modo que o quadro clínico dependerá destes fatores. A fluidez do sangue depende do equilíbrio de fatores procoagulantes e de anticoagulantes, ambos são sintetizados pelo organismo e estão presentes no sangue, se um desequilíbrio favorecendo os fatores procoagulantes ocorrer será formado o
trombo (21) . São três as principais influências que predispõem à formação do trombo,
denominada de tríade de Virchow, que são lesão endotelial, estase venosa e
hipercoagulabilidade sanguínea (23, 24) e os fatores de risco que mais favorecem o
desenvolvimento de trombose. São: indivíduos com idade superior a 40 anos, Imobilização prolongada, câncer, grandes cirurgias, politraumatismo e insuficiência
cardíaca crônica (24) . Como opção de tratamento farmacológico deve ser utilizada os
anticoagulantes.
No grupo dos anticoagulantes a heparina é o medicamento mais firmemente
estabelecido como agente antitrombótico desde 1960 (25) . A heparina é um
7
constituído principalmente de resíduos alternados de ácido idurônico e glucosamina. A
principal característica da heparina é a capacidade de retardar a coagulação sangüínea. As preparações comerciais da heparina são extraídas de pulmão ou
mucosa intestinal de bovinos ou da mucosa intestinal de suínos (1) .
Esse composto é usado principalmente na prevenção de trombose venosa profunda, em pós-cirurgias e pós-partos, em pacientes com estado de hipercoagulopatia, ou sujeitos a trombose causada por diferentes etiologias. Entretanto, a heparina pode apresentar algumas reações adversas graves, como hemorragias e
trombocitopenia em alguns pacientes (26, 27) , além do risco existente de contaminações
virais, uma vez que é obtida de tecidos animais. Outro problema observado é o efeito hemorrágico residual da heparina, apresentado mesmo por fragmentos de heparina
que não possuem atividade anticoagulante (1) .
Devido a esses aspectos inerentes ao uso da heparina, uma busca por compostos que possam substituí-la vem se tornando cada vez mais intensas. Nesse
contexto destacam-se os polissacarídeos sulfatados de algas marrons (28) e de algas
verdes (29) .
As algas compreendem vários grupos de seres vivos aquáticos e autotróficos e que estão inseridos no reino Protista. As macroalgas marinhas são organismos que não possuem diferenciação de tecidos e apresentam uma gama de pigmentos fotossintéticos entre eles a clorofila a, além de outros pigmentos acessórios, que são
características importantes na classificação desse grupo (30). Essas algas se dividem
em três grupos caracterizados principalmente pelos seus pigmentos acessórios e substâncias de reserva: Phaeophycea (algas marrons), Rodhophycea (algas vermelhas) e Chlorophycea (algas verdes).
8
Das algas marrons, objeto deste estudo extrai-se polissacarídeos que
apresentam α-L-fucose sulfatada na sua composição (28, 31-33) . Os polissacarídeos que
apresentam mais de 90% de α-L-fucose sulfatada na sua estrutura são chamados de
fucanas e os demais são denominados de fucoidans (28, 34) . Contudo, vários autores
empregam esses termos como sinônimos. Às vezes são empregados os termos heterofucanas e homofucanas.
As algas marrons são uma fonte abundante de novos polissacarídeos anticoagulantes. Elas têm uma variedade de homo ou heterofucanas sulfatadas com
esta atividade (5, 28) . Além da atividade anticoagulante, algumas fucanas de algas
possuem outras atividades farmacológicas importantes como: atividades antiinflamatórias, anti-adesiva, antiproliferativa, antiviral, e contraceptiva (34) . Nas algas as fucanas localizam-se principalmente na matriz mucilagenosa e por serem altamente higroscópica tem a função de protegê-la da desidratação quando essa se encontra
exposta a longos períodos de exposição solar nas marés baixas (35) . Além das algas
marrons, esses polissacarídeos sulfatados também são encontrados em equinodermos (ouriços e pepinos do mar) (36) .
A estrutura desses polímeros varia de acordo com a espécie de alga parda e às
vezes nas diferentes partes da mesma alga (37-39) . Dessa forma, cada nova fucana
extraída e purificada é um composto estruturalmente único e conseqüentemente, apresenta um potencial farmacológico e biotecnológico único.
Há poucos trabalhos sobre o mecanismo anticoagulante de homofucanas. Em geral a ação proposta é predominantemente sobre a antitrombina e sendo observado
como menor atividade sobre o cofator II da heparina (40) . Sua atividade anticoagulante
depende de seu conteúdo de sulfato e de sua massa molecular (33, 41) . Por outro lado,
9
Alguns estudos desenvolvidos por nosso grupo mostram que a alga
Spatoglossum schröederi contém três principais fucanas com mobilidades
eletroforéticas distintas (9) . Elas foram chamadas de fucana A, B e C, de acordo com
as suas migrações relativas em gel de eletroforese. As análises químicas mostraram
que a fucana A é uma xilofucuglucuronana (9) , enquanto as outras duas fucanas são
xilogalactofucanas (7) com diferentes graus de sulfatação. A fucana A corresponde à
cerca de 80% das fucanas encontrada nessa alga, enquanto as fucanas B e c
correspondem a 16 e 4% (7). Essas fucanas não possuem atividade anticoagulante.
Porém, elas são capazes de estimular a síntese de um proteoglicano de heparam
sulfato com atividade antitrombótica produzido por células endoteliais (6, 7, 9) .
Recentemente, foi demonstrado que a fucana B possui atividade antitrombótica “in
vivo” sem apresentar atividade anticoagulante “in vitro” (7). Contudo não existem
estudos com relação à ação antitrombótica das fucanas A e C de Spatoglossum
17
4 COMENTÁRIOS, CRÍTICAS E CONCLUSÕES
Em meados da década de 90, o nosso grupo adaptou uma metodologia para
extração e purificação de polissacarídeos de algas (38). Utilizando essa metodologia foi
possível extrair e purificar um polissacarídeo sulfatado da alga Spatoglossum
schroederi que foi denominado de fucana A. Análises químicas (Tabela I) confirmaram
que essa fucana A é a mesma fucana descrita por Leite (9). Esses dados atestam que a
metodologia desenvolvida pelo nosso grupo é eficaz e bastante reproduzível.
A fucana A não apresentou atividade anticoagulante, mesmo com a presença de grupos sulfatos ligados aos monossacarídeos. Essa ausência de atividade pode ser explicada pela presença de xiloses nos terminais não redutores, o que deve impedir a interação da fucana com componentes da coagulação sanguínea. Por outro lado, quando administrada “in vivo” essa fucana apresentou atividade antitrombótica de forma dose e tempo dependente (Fig. 1), sendo essa atividade observada quando os animais foram submetidos a fucana A por diferentes vias de administração (Tabela III). A necessidade de um intervalo de tempo para que se observe à atividade antitrombótica da fucana no animal foi indício que esse composto possuía uma atividade indireta e que provavelmente a fucana A estava estimulando a síntese de algum composto com essa atividade.
Ensaios com células endoteliais em cultura demonstraram que a fucana A era
capaz de estimular essas células a sintetizar e liberarem para o meio de cultura um heparam sulfato antitrombótico (Fig 2). Esse efeito foi dose -dependente (Fig 3). Esses dados levam a proposta de que a atividade antitrombótica da fucana A “in vivo” se dá devido a sua capacidade de estimular as células endoteliais a sintetizarem e liberarem para a luz do vaso sanguíneo um heparam sulfato antitrombótico.
18
O resultado de maior impacto desse trabalho foi demonstrar que compostos que não apresentam atividade anticoagulante “in vitro” podem apresentar atividade antitrombótica “in vivo”, o que corrobora com trabalhos anteriores do nosso grupo e que anteriormente era considerado como impossível e, portanto, tido como um dogma. Os resultados aqui descritos podem gerar uma reavaliação de várias moléculas que foram descartadas como possíveis fármacos que poderiam ser utilizados no tratamento de doenças cardiovasculares por não terem atividade anticoagulante “in vitro”. Bem como nortear novas pesquisas para a descoberta de compostos anticoagulantes.
O cronograma de atividades seguiu dentro dos padrões esperados, todas as dificuldades encontradas ao longo da realização deste trabalho foram superadas.
A realização deste estudo envolveu intercâmbio entre a UFRN, UNIFESP e UFPR, desenvolvendo uma abordagem multidisciplinar e interdisciplinar preconizada pelo programa de Pós-Graduação do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Este trabalho contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e da Pró-reitoria de Pesquisa e Pós-graduação da UFRN.
Como projeto para o futuro, planejamos continuar com os estudos na mesma linha de pesquisa, em um futuro doutorado.
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6. ABSTRACT
Fucan is a term used to denominate a family of sulfated L-fucose-rich
polysaccharides. The brown alga Spatoglossum schröederi (Dictyotaceae) has three heterofucans namely fucan A, B and C. The 21 kDa fucan A is composed of
a core of β (1-3) glucuronic acid-containing oligosaccharide of 4.5 kDa with
branches at C4 of fucose chains α (1-3) linked. The fucose is mostly substituted at
C4 with a sulfate group and at C2 with chains of β (1-4) xylose. This fucan has
neither anticoagulant (from from 0.1 to 100μg) nor hemorrhagic activities (from 50 to 800 μg/mL). The antithrombotic test in vivo showed the fucan A has no activity in any of the concentrations (from 0.2 to 20μg/g/day) tested 1h after polysaccharide administration. However, when fucan A was injected endovenously 24h before the ligature of the venae cavae, we observed a dose-dependent effect, reaching
saturation at around 20αg/g of rat weight. In addition, this effect is also
time-dependent, reaching saturation around 16h after fucan administration. In addition, regardless of administration pathway, fucan A displayed antithrombotic action. The exception was the oral pathway. Of particular importance was the finding that fucan A stimulates the synthesis of an antithrombotic heparan sulfate from endothelial cells like heparin. The hypothesis has been raised that in vivo antithrombotic activity of fucan A is related to the increased production this heparan. Taken together with the fact that the compound is practically devoid of anticoagulant and hemorrhagic activity suggests that it may be an ideal antithrombotic agent in vivo.