• Nenhum resultado encontrado

O FEMINISMO HISTÓRICO A PARTIR DE SÓFOCLES (ANTÍGONA).

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O FEMINISMO HISTÓRICO A PARTIR DE SÓFOCLES (ANTÍGONA)."

Copied!
5
0
0

Texto

(1)

O FEMINISMO HISTÓRICO A PARTIR DE SÓFOCLES (ANTÍGONA).

André Pereira Ferreira1

Resumo: Propõe-se uma reflexão com base na tragédia grega Antígona, escrita por Sófocles (495 a.C. - 406 a.C.). Nesta obra, trataremos a figura de Antígona e Ismênia e seus papéis na sociedade, como representantes das posições femininas, dentro de uma leitura de resistência e da subordinação. Para sintetizar o assunto de acordo com a atualidade, são tomadas referências bibliográficas como Beauvoir (1970) e Jaeger (2013). O objetivo é fazer uma análise histórica da condição feminina do antes e do agora.

Palavras-chave: Antígona, Feminismo, Filosofia.

Introdução

Neste resumo, é válido lembrar as condições temporais em que a tragédia foi escrita, e o entorno social de Sófocles numa época extremamente machista. Trata-se de uma época em que as mulheres não tinham direito as atividades públicas como a filosofia, a política e a arte.

Na tragédia, que narra o fratricídio dos irmãos de Antígona e a recusa de Ismênia, também sua irmã, em sepultar Polinice, uma vez que havia um decreto emitido pelo rei Creonte, onde condenava qualquer um que concedesse ao “traidor” tais honrarias.

Neste contexto trágico, Antígona apresenta-se como representante da resistência contra as leis do estado, alegando não serem mais importantes que as leias dos deuses. Trata-se da posição de uma mulher iconoclasta, contra as imposições de um rei tirano e machista. Vemos aqui um exemplo de sua coragem,

(2)

quando Antígona é questionada por Creonte depois de ter burlado seu decreto de sepultar Polinice:

Creonte - E apesar disso, tiveste a audácia de desobedecer a essa determinação? Antígona – Sim, porque não foi Júpiter que a promulgou; e a Justiça, a deusa que habita com as divindades subterrâneas jamais estabeleceu tal decreto entre os humanos; nem eu creio que teu édito tenha força bastante para conferir a um mortal o poder de infringir as leis divinas, que nunca foram escritas, mas irrevogáveis; não existem a partir de ontem, ou de hoje; são eternas, sim! E ninguém sabe desde quando vigoram! – Tais decretos, eu, que não temo o poder de homem algum, posso violar sem que por isso me venham a punir os deuses! Que vou morrer, eu bem sei; é inevitável; e morreria mesmo sem a tua proclamação. E, se morrer antes do meu tempo, isso será, para mim, uma vantagem, devo dizê-lo! Quem vive, como eu, no meio de tão lutuosas desgraças, que perde com a morte? Assim, a sorte que me reservas é um mal que não se deve levar em conta, muito mais grave teria sido admitir que o filho de minha mãe jazesse sem sepultura; tudo o mais me é indiferente! Se te parece que cometi um ato de demência, talvez mais louco seja quem me acusa de loucura! (SÓFOCLES, 2005, p. 30-31)

Ismênia é o exemplo de obediência e submissão feminina. Sua “racionalidade” no cumprimento das leis, sustentavam-se na concepção que tinha de sua posição como mulher, que podemos ver neste diálogo com sua irmã, quando negou a possibilidade de auxiliar Antígona do sepultamento do irmão:

Ismênia – Convém não esquecer ainda que somos mulheres, e, como tais, não podemos lutar contra homens; e, também, que estamos submetidas a outros, mais poderosos, e que nos é forçoso obedecer a suas ordens, por muito dolorosas que nos sejam. De minha parte, pedindo a nossos mortos que me perdoem, visto que sou obrigada, obedecerei aos que estão no poder. É loucura tentar aquilo que ultrapassa nossas forças! (SÓFOCLES, 2005, p. 8-9)

(3)

Creonte – Ah! Nunca! Nunca um inimigo me será querido, mesmo após a morte. Antígona – Eu não nasci para partilhar de ódios, mas somente de amor! Creonte – Desce, pois, à sepultura! ...Visto que queres amar, ama aos que lá encontrares! Enquanto eu vivo for, nenhuma mulher me dominará! (SÓFOCLES, 2005, p. 35)

“O homem trágico de Sófocles”

O trabalho de Sófocles torna-se significativo, ao expor pela primeira vez a mulher como ser humano, de semelhante dignidade que o homem. Antígona, assim como Electra, Dejanira, Jocasta e Crisótemis são personagens que simbolizam o surgimento da mulher enquanto tal, na busca pelo ideal de humanidade.

Ismênia não representa apenas a figura subjugada da condição de mulher, mas, trata-se ainda da figura que realça a personagem feminista de sua irmã. Inclusive Ismênia demostra seu esplendido amor por Antígona ao narrar para Creonte sua vontade de morrer junto a mesma, e lembrando que Ismênia tinha certa razão em recusar o pedido audacioso de sua irmã, dadas as condições de sua época.

A forma como Sófocles promove o encontro de Antígona com seu opositor Creonte tem mais que a intensão de causar um confronto entre gêneros, e sim, de mostrar como Antígona, uma simples mulher, é capaz de possuir um senso de justiça que vai além de um senso comum, machista e subordinado ao poder ditado pela tirania.

Segundo Sexo

(4)

“A fêmea é fêmea em virtude de certa carência de qualidades”, diz Aristóteles. “Há um princípio bom que criou a ordem, a luz e o homem, e um princípio mau que criou o caos, as trevas e a mulher”, diz Pitágoras. Estas analogias não param por aí, podendo inclusive serem encontradas na Gênese, no momento da criação da mulher, parte extraída do homem, que dá a entender a possibilidade da existência do homem sem a mulher, mas nunca, da mulher sem o homem. Ao conceber esta ideia, temos então o macho como essencial e o “Outro”, que não é essencial, ou seja, o objeto. Mas por que a mulher aceita ainda nos dias atuais a relação sujeito-objeto? Segundo Simone, se a mulher se enxerga como o inessencial que nunca retorna ao essencial, é porque não opera, ela própria, esse retorno.

A relação macho e fêmea comparada por Simone com as relações senhor e escravo, burguês e proletários não tem tamanha semelhança quanto parece, tão pouco solução, pois a divisão de sexos é sem dúvida um dado de caráter biológico e não um momento histórico como aponta as comparações. O presente envolve o passado, e no passado, toda história foi feita por homens. Vemos isso nas histórias de Eva e Pandora, nas religiões que as envolvem e no contexto cultural das sociedades que adotam tais mitologias.

[...] O que se procurou infatigavelmente provar foi que a mulher é superior, inferior ou igual ao homem. Criada depois de Adão, é evidentemente um ser secundário, dizem uns; ao contrário, dizem outros, Adão era apenas um esboço e Deus alcançou a perfeição do ser humano quando criou Eva; seu cérebro é o menor, mas é relativamente o maior; e se cristo se fez homem foi possivelmente por humildade. [...] (BEAUVOIR, 1970, p. 21)

(5)

Ao fazer uma perspectiva histórica, da Antígona de Sófocles às “antígonas” contemporâneas, que ocupam diferentes cenários sociais, que lutam por seus espaços e pela equidade de condições dignas, de diretos e justiça, lutando contra o machismo, enquanto há por aí, “ismênias” que naturalizam a cultura de submissão da mulher pelo homem, internalizando em si, concepções machistas sobre o papel da mulher na sociedade. Da mesma forma ainda há muitos “creontes”, que obscurecem a vida feminina, impondo seu ego machista como lei, inclusive maiores que as leis dos deuses.

REFERÊNCIAS

BEAUVOIR, Simone de. O Segundo Sexo, v.I, II. Tradução: Sérgio Milliet. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.

JAEGER, Werner Wilheilm. O homem trágico de Sófocles. In:_____ Paideia. 6ª edição. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2013. (p 315 – 334).

Referências

Documentos relacionados

Já na associação entre qualidade de vida geral e função sexual do grupo de pacientes com endometriose, comparando cada domínio do SF-36 com os domínios e o total de

Assim, por ter este projeto a finalidade de discutir o fenômeno formativo em Sófocles a partir das tragédias Édipo Rei e Antígona, em que o autor apontou o conflito entre

no entanto, o conflito pessoal de creonte é apenas mais um exemplo do quadro em que, no plano da acção, o dramaturgo não deixa de mostrar como as leis humanas inexoravelmente

“autarquia territorial e especial, com caráter técnico e executivo, para fins de planejamento, assessoramento e regulação urbana, viabilização de instrumentos de

Os testes de desequilíbrio de resistência DC dentro de um par e de desequilíbrio de resistência DC entre pares se tornarão uma preocupação ainda maior à medida que mais

O valor da reputação dos pseudônimos é igual a 0,8 devido aos fal- sos positivos do mecanismo auxiliar, que acabam por fazer com que a reputação mesmo dos usuários que enviam

O presente estudo tratou-se de um relato de experiência de uma Tenda do Conto realizada em Unidade Básica de Saúde da Vila de Ponta Negra em Natal/RN, configurando-se como

Larson (1992) escreveu sobre o controle social nas organizações em rede, afirmando que os modelos.. econômicos são insuficientes para explicá-las, embora os objetivos econômicos