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Anais V CIPSI - Congresso Internacional de Psicologia Psicologia: de onde viemos, para onde vamos? Universidade Estadual de Maringá ISSN X

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Academic year: 2021

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A EXPERIÊNCIA VIVENCIAL DOS PACIENTES COM INSUFICIÊNCIA RENAL CRÔNICA APÓS O DIAGNÓSTICO DA DOENÇA

Maria Angélica Rossetto Sandra Mara Amaral de Lima Marlene Marchi de Sousa Josefina Daniel Piccino Este estudo foi desenvolvido na área da Psicologia, no Curso de Especialização em Psicologia Clínica Fenomenológico-Existencial ministrado na Universidade Sagrado Coração/SP em parceria com a Sociedade de Psicologia Humanista Existencial (SOBRAPHE/SP).

A escolha por esse tema surgiu da motivação das pesquisadoras por conhecer com mais profundidade a experiência vivencial dos pacientes com diagnóstico de insuficiência renal crônica e a sua relação com esta realidade. Através das experiências clínica e hospitalar com pacientes renais, as pesquisadoras foram convocadas por questionamentos relativos às vivências dos pacientes a partir do momento da descoberta da doença renal e início do tratamento específico: a modalidade em hemodiálise.

Segundo Smeltzer e Bare (2002), a insuficiência renal ocorre quando os rins são incapazes de remover os produtos de degradação metabólica do corpo ou de realizar as funções reguladoras. Quando, por algum problema, o rim deixa de filtrar o sangue, ocorre a insuficiência renal que é caracterizada pelo aumento da ureia no sangue ou azotemia.

Machado (1999) afirma que, embora existam hoje modernas técnicas que possibilitam ao paciente maior liberdade, a doença renal, por ela mesma impõe uma nova concepção de vida.

Após o diagnóstico da doença e início do tratamento, obrigatoriamente as experiências existenciais passam por reajustes, a faticidade cotidiana se modifica. Pela própria exigência do tratamento, a vida de cada paciente prosseguirá de forma diferente da até então vivida.

Neste estudo, nossas questões dizem respeito à forma como as novas experiências se dão.

Certamente uma nova rotina fará parte da vida do paciente renal após o diagnóstico da doença, rotina que, entendemos, consiste em formas de o paciente ser e se vincular -

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faticidade - com o quê lhe acontece. De acordo com Heidegger (1927 apud Piccino, 2010) existência consiste na “vida do homem em sua faticidade, em sua historicidade”.

Nosso interesse fundamental é pelo fenômeno mais essencial presente em cada uma das novas vivências. Consideramos que esse aspecto consiste no diferencial de nossa pesquisa em relação às realizadas até então. Procuramos então, neste trabalho, compreender fenomenologicamente como se dá a lida cotidiana (existência) do paciente em tratamento por hemodiálise, sua relação com ele mesmo, com seu corpo, com as outras pessoas, com as

“coisas” do mundo inclusive com o dia da hemodiálise, aparelhagem, etc.

Ao buscar apreender as vivências desses pacientes e as questões relacionadas com elas, podemos ampliar o entendimento sobre como é viver esta cotidianidade em todos seus aspectos fundamentais, sobre a natureza das limitações, perspectivas futuras, concepções, sentimentos, objetivos, projetos, etc., do paciente.

A “teoria” que iluminou as análises foi a compreensão heideggeriana da existência humana. Heidegger (apud Giles, 1989) insiste em que o ser-aí não é apenas uma coisa no mundo; é um ser no mundo, pois as características peculiares do ser-aí nos dizem algo de grande importância sobre a natureza do próprio ser, algo que nunca apreenderemos mediante as ciências naturais ou a cosmologia. Giles (1989), sobre o significado de fenomenologia, salienta o fazer ver a partir de si mesmo aquilo que se manifesta, tal como a partir de si mesmo se manifesta efetivamente. Para ele, este é o sentido formal que se dá ao nome fenomenologia, ou seja, não outra coisa que a máxima: “voltar às próprias coisas”. Em dado momento do procedimento, utilizamos o método proposto por Amedeo Giorgi (1985) para levantamento das unidades de significado dos depoimentos e posterior análise existencial.

Desenvolvemos este trabalho na Instituição Hospitalar da Faculdade de Medicina de Botucatu/SP (UNESP) na Clínica Médica na área de Nefrologia. Contamos com seis pacientes colaboradores com insuficiência renal crônica particularizando a modalidade de tratamento hemodialítico, sendo cinco do sexo masculino e um do sexo feminino. Todos os pacientes realizavam o tratamento com uma frequência de três vezes por semana e com duração mínima de 3 horas e meia cada sessão. A idade dos pacientes variou entre 30 a 80 anos, quanto ao tempo de realização do tratamento, variou entre três semanas e cinco anos.

Todos os pacientes, depois de informados quanto aos objetivos da pesquisa e aceitando

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participar da mesma, consentiram livremente através do preenchimento do termo de consentimento. Foi utilizado como instrumento para a coleta de dados uma pergunta norteadora: Como é seu dia a dia após o diagnóstico da insuficiência renal e início do tratamento em hemodiálise?, que após ter sido respondida (gravada e transcrita na sua íntegra) serviu para a análise fenomenológica dos dados obtidos.

Através da realização deste estudo, foi possível apreender que os pacientes portadores de insuficiência renal crônica passam a vivenciar, após o diagnóstico da doença e início do tratamento em hemodiálise, uma nova rotina diária em suas vidas. Surge a partir do momento da descoberta da doença, a necessidade de adaptação à nova rotina de vida imposta pela condição de saúde, sendo que esta experiência existencial é marcada por novos reajustes que serão essenciais para que os pacientes renais possam continuar vivendo.

Esta nova fase é marcada por inúmeras dificuldades que deverão ser enfrentadas cotidianamente pelos doentes renais. Nesse sentido, Bezerra e Santos (2008) afirmam que a nova rotina influência o dia a dia e o modo de se relacionar do paciente, seja pela dependência da máquina ou pelas idas ao médico, dificultando, dessa forma, o desempenho das suas atividades ocupacionais, o que, consequentemente, desestrutura sua vida diária. A necessidade de mudanças em suas rotinas diárias inclui o tratamento dialítico para a sobrevivência do paciente renal, além das condições próprias impostas pela deficiência renal.

Os pacientes renais passam a experimentar certas privações e restrições o que acabam por gerar nos doentes grande sofrimento. Os relatos evidenciam que experimentam a restrição de alimentos, ficam privados de ingerir certa quantidade de líquidos, e quando a modalidade de tratamento indicado é a hemodiálise ficam privados de realizar passeios prolongados por causa das exigências de frequência às sessões de hemodiálise, sentem-se, às vezes, fracos para realizarem certos exercícios físicos sem falar ainda da necessidade de muitas vezes terem que deixar o trabalho que até então realizavam diariamente.

Os resultados trouxeram a compreensão que esta nova experiência, que inclui a descoberta da doença, a submissão diária ao tratamento, as aparelhagens, a realidade hospitalar, é vivida pela maioria dos doentes renais como uma experiência transtornante em razão da exaustiva rotina diária ser limitante, permeada por privações, e cerceadora das

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perspectivas existenciais, pois a nova rotina é geradora de muito sofrimento e infelicidade na maioria dos pacientes.

O estudo possibilitou a apreensão das formas particulares dos pacientes renais vivenciarem esta cotidianidade transtornante, sendo que para Piccino (2000) transtorno é atrapalhação na ordem, ou seja, um desordenar. É uma perturbação que agita que gera um descaminho e a perda de clareza, e podendo ser maior ou menor, leve ou não, afeta o estado estabelecido dos modos de relação.

É enfatizado ainda por Piccino (2000) que qualquer transtorno seja de que tipo for e venha de onde vier “é transtorno da existência inteira” da “relação junto (com outro ente) e com (outro Dasein)... do homem”. A pessoa doente passa a experimentar uma existência transtornada sendo que toda a sua existência se encontra afetada. De acordo com Piccino (2010):

[...] temos que pensar que as experiências transtornantes, seja no nível que forem, são afetações não no corpo ou no psíquico, ou nesta ou naquela parte do corpo ou do psíquico, não do sujeito a partir de sua interioridade ou gerado pelo mundo, mas da existência, da relação do homem-mundo”. (p. 1)

Porém, a forma como cada depoente experimenta esse transtorno, revela as significações que faz de sua experiência com a doença e os desdobramentos desta em sua existência.

Através do método proposto por este trabalho que foi entender o homem a partir da compreensão heideggeriana de existência humana, pudemos notar que o homem quando privado de sua saúde passar a sofrer uma interferência cuja natureza é um ataque à possibilidade da continuidade com... como até então, e apresenta a experiência da possibilidade da privação fundamental: a privação de ser, ou seja, da possibilidade de não ser mais. (Piccino 2000). Pode-se compreender através deste estudo que a pessoa doente por não dispor livremente e nem normalmente de todas as possibilidades de relação que poderia manter com o mundo (Boss, 1975, p. 19 apud Forghieri, 1993, p. 53), por encontra-se restrito de suas possibilidades de pode-ser, enfrenta afetações em suas estruturas fundamentais, pois, sua relação consigo e com o mundo se encontra consideravelmente restringida.

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Partindo da proposta inicial deste estudo que teve como intuito entender o homem a partir da compreensão heideggeriana acaba por tornar claro que os existências do Dasein, enquanto ser vivente diferenciados dos demais entes, pois para Piccino (2000) Dasein é estar já na lida cotidiana lançado na tarefa de ser, e sempre em conformidade com o que se apresenta e vem ao encontro, revela-se perturbado já que se encontra privado de sua condição de ser-saudável. Os doentes renais são afetados em toda a sua totalidade e não apenas em sua condição física de saúde, pois, como compreendido a afetação ocorre em toda a dimensão do homem, é afetação de sua existência de sua relação homem-mundo.

O objetivo deste estudo foi atingido, pois o método fenomenológico utilizado possibilitou que as pesquisadoras buscassem no próprio fenômeno, que emerge essencialmente no ente pesquisado, e na sua vivência “natural”, sua cotidianidade, sua rotina diária, aquilo que lhe era mais puro e genuíno: a significação para sua existência a partir do momento da descoberta de sua doença renal e início do tratamento.

Partindo desta legitimidade foi possível apreender de forma particular as significações e seus desdobramentos na existência de cada entrevistado o que possibilitou uma grande contribuição para as pesquisadoras enquanto profissionais da saúde, impulsionando para a reflexão dos modos particulares de cada ente significar sua vida, devendo ser estas respeitadas e tidas como orientadoras para a intervenção que acaba por se tornar essencialmente construída a cada encontro e com cada homem, pois a própria metodologia utilizada cumpre esta exigência: apreender a verdadeira significação que cada ser humano dá para sua existência. Este estudo nos ensina que cada homem deve ser pensado a partir dele próprio, ou seja, cada homem e revelador do que apenas cada homem é.

Referências

Bezerra, K. V.; & Santos, J. L. F. (2008, agosto). O cotidiano de pessoas com insuficiência renal crônica em tratamento hemodialítico. Rev. Latino-Am. Enfermagem, Ribeirão Preto. Recuperado em 26 de abril, 2011, da SciELO (Scientific Eletrocnic Library On line): www.scielo.br

Forghieri, Y. C. (1993). Psicologia Fenomenológica. Fundamentos, Método e Pesquisas. São Paulo: Pioneira.

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Giles, T. R. (1989). História do existencialismo e da fenomenologia. São Paulo:

EPU.

Giorgi, A. (1985). A Sketch of Psychological Phenomenological Method.

Phenomenology and Psychological Research. Pittsburg: Duquesne University Press.

Machado, D. J. B. et al. (1999). Peritonite esclerosante e encapsulante secundária à diálise peritoneal ambulatorial contínua. Jornal Brasileiro de Nefrologia. Recuperado em 20 de outubro, 2010, da SciELO (Scientific Eletrocnic Library On line): www.scielo.br

Piccino, J. D. (Org.). (2010). Aspectos da Ontologia da Facticidade de Martin Heidegger. Bauru, SP.

Piccino, J. D. (2000). Interpretação dos Estados-Limites à luz da Ontologia Heideggeriana. Resumos do V Congresso Brasileiro De Psicopatologia Fundamental.

Campinas - SP.

Smeltzer, S. Z., & Bare, B. G. (2002). Tratado de enfermagem médico-cirúrgica (9a ed.). Rio de Janeiro.

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