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ISSQN sobre a sociedade simples limitada: possibilidade de cobrança conforme os §1º E §3º do art. 9º do Decreto Lei 406/68

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I

Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito

ISSQN SOBRE A SOCIEDADE SIMPLES

LIMITADA: POSSIBILIDADE DE COBRANÇA

CONFORME OS §1º E §3º DO ART. 9º DO

DECRETO LEI 406/68

Autor: Iuri Telles Fernandes

Orientador: Prof. Dr. Marcos Aurélio P.

Valadão

(2)

IURI TELLES FERNANDES

ISSQN SOBRE A SOCIEDADE SIMPLES LIMITADA: POSSIBILIDADE DE COBRANÇA CONFORME OS § 1º E

§ 3º DO ART. 9º DO DECRETO-LEI 406/68

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito

da Universidade Católica de Brasília, como requisito para a obtenção do Título de Mestre em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Marcos A. P. Valadão

(3)

7,5cm

Ficha elaborada pela Biblioteca Pós-Graduação da UCB

F363i Fernandes, Iuri Telles Fernandes.

ISSQN sobre a sociedade simples limitada: possibilidade de cobrança conforme os §1º E §3º do art. 9º do Decreto Lei 406/68. / Iuri Telles Fernandes – 2014.

113 f.; 30 cm

Dissertação (Mestrado) – Universidade Católica de Brasília, 2014. Orientação: Prof. Dr. Marcos Aurélio P. Valadão

1. Direito. 2. Imposto sobre serviços. 3. Sociedade simples limitada. 4. Responsabilidade. 5. Tributação. I. Valadão, Marcos Aurélio P. Valadão, orient. II. Título.

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Dissertação de autoria de IURI TLLES FERNANDES, intitulada “ISSQN SOBRE A SOCIEDADE SIMPLES LIMITADA: POSSIBILIDADE DE COBRANÇA CONFORME OS § 1º E § 3º DO ART. 9º DO DL 406/68”, apresentada como requisito para obtenção do grau de Mestre em Direito da Universidade Católica de Brasília, em 18/12/2014, definida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

__________________________________

Prof. Dr. Marcos Aurélio P. Valadão Orientador

PPG Strictu Sensu Curso (UCB)

__________________________________

Prof. Dr. Antônio de Moura Borges PPG Strictu Sensu Curso (UCB)

__________________________________

Prof. Dr. Othon de Azevedo Lopes Examinador Externo (UnB)

(5)
(6)

AGRADECIMENTO

A Deus, o grande autor e viabilizador deste curso desde quando eu ainda nem sabia que iria fazê-lo. Só nós dois entendemos quantas coisas tiveram que ser feitas até que essa oportunidade – e responsabilidade – me fosse dada. Sem palavras para agradecê-lo por tudo, hoje olhando para trás consigo não somente perceber algumas de suas intervenções como compreender porque muitas coisas aconteceram.

A Gilda Maria Nogueira Telles, que não deve estar se aguentando, se eu ainda bem a conheço; João Lopes Telles, grande referência, Rebeca Magali Nogueira Telles, Diego Telles Fernandes, João Rodrigo Silva Telles, Robson, Rudson, Ranier e Ricardo Nogueira Telles, Roberto Maradona e Jorge Laborda.

Ao presente especial Hadassah Laís Santana, pelo que nestas mais de cem páginas não caberia escrever.

A Ana Luiza Fernandes Mendes, a seu pai Joaquim e a Faculdade Unyahna de Barreiras por ter tornado esta empreitada real. A Faculdade Dom Pedro II de Barreiras por ter abraçado o projeto, a Coordenadora do curso de direito Nislane Roque, a D. Terezinha e ao apoio dado pelos Professores desta instituição, bem como a Raíza Ferreira.

A Márcia Nogueira, Sarah Tarsila e toda a família Nogueira por todo o apoio, vocês são muito especiais e foi muito bom cada momento com vocês.

Ao Prof. Orientador Dr. Marcos Valadão por todo o suporte, conhecimento, palavras e incentivos, todo o quanto foi determinante para a confecção deste trabalho.

Aos Professores do mestrado, Dr. Marcos Valadão, Dra. Liziane Meira, Dr. Moura Borges e Dr. Eduardo Sabo, muitíssimo obrigado por tudo.

(7)

Great minds discuss ideas, average minds discuss events, small minds discuss people.

(8)

RESUMO

Referência: FERNANDES, Iuri Telles. ISSQN sobre a Sociedade Simples

Limitada: Possibilidade de Cobrança conforme os § 1º e § 3º do Art. 9º do Decreto-Lei 406/68. 2014. 113 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Universidade Católica de Brasília, Brasília, 2014.

O presente estudo objetiva analisar a possibilidade de incidência do Imposto Municipal sobre Serviços de Qualquer Natureza na forma privilegiada prevista pelo § 1º e § 3º do Decreto-lei nº 406/1968 às sociedades não empresárias constituídas sob a espécie limitada. Enquanto o ordenamento civil determina os critérios para a aferição da empresarialidade de uma dada atividade econômica, e determina também que as sociedades se constituam em uma das espécies previstas no ordenamento, é plenamente possível a uma sociedade simples constituir-se na espécie limitada sem perder sua natureza não empresarial. Ocorre que, o STJ vem entendendo que ao referido tipo de sociedade deve ser negado o gozo do benefício tributário que, ao determinar base de cálculo excepcional, minora a incidência do imposto aos contribuintes societários, prestadores de alguns serviços de natureza e responsabilidade pessoal. Estudando o direito societário brasileiro, bem como o imposto sobre serviços, especialmente o benefício de tributação diferenciada às sociedades não empresariais de prestadores, busca-se responder se a limitação das cotas sociais junto à sociedade simples tem o condão de afastar a responsabilidade pessoal do prestador pelo serviço e de tornar empresária a atividade social, como entende a Corte Uniformizadora.

(9)

ABSTRACT

This study aims to examine the possibility of incidence of the Municipal Tax Services of any kind in the privileged as provided for in § 1 and § 3 of Decree-Law No. 406/1968 on non- business corporations incorporated under the limited species. While the civil rules determines the criteria for the measurement of entrepreneurship of an economic activity, and also obliges companies to establish themselves as one of the possible species, it is fully possible for a single company to establish itself in the limited species without losing its non-business nature. What happens is that the STJ Court has understood that the kind of society that should be denied the enjoyment of the tax benefit that, in determining exceptional tax base, lessens the incidence of tax on corporate taxpayers, providers of some of nature and personal responsibility services. Studying the Brazilian corporate law and tax services, especially the benefit of differential taxation on non- business partnerships providers , it is seeked to respond to the limitation of social quotas by the simple society has the power to exclude the personal responsibility of the service’s provider and make the social activity a business, as the Court considers standardizing.

(10)

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 SOCIEDADES ... 15

2.1 ORIGEM E HISTÓRICO ... 15

2.2 DIREITO SOCIETÁRIO BRASILEIRO ... 19

2.3 SOCIEDADE SIMPLES ... 27

2.3.1 Sociedade Simples Limitada ... 36

3 ISSQN ... 43

3.1 HISTÓRICO DO ISSQN ... 48

3.2 O DECRETO LEI Nº 408/68 ... 52

3.2.1 O art. 9º, § 1º e § 3º do DL 406/68 ... 54

3.3 LEI COMPLEMENTAR Nº 116/2003 ... 67

3.3.1 Regra Matriz de Incidência do ISS ... 71

4 O ART. 9º, §1º E §3º DO DL 406/68 E AS SOCIEDADES SIMPLES LIMITADAS ... 78

4.1 A MATÉRIA NOS TRIBUNAIS SUPERIORES ... 78

4.1.1 Vigência dos §§ 1º e 3º do art. 9º do DL 406/68 ... 78

4.1.2 Inovações ao instituto do § 3º ... 86

4.1.3 O entendimento do STJ sobre a matéria ... 91

4.2 POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO... 94

5 CONCLUSÕES ... 106

(11)

1 INTRODUÇÃO

Com a entrada em vigor do novo código civil de 2002, passou a vigorar no direito brasileiro a divisão conceitual entre as sociedades para a realização de atividade econômica de forma não empresária – sociedades simples -, ou para a realização de atividade econômica organizada: com finalidade de lucro mediante o emprego de elementos de empresarialidade – sociedades empresárias.

Exegese teleológica destes gêneros societários aponta a intenção da norma em distinguir a figura jurídica do empresário, da proposta daquele ator de mercado que, embora exerça atividade econômica, não esteja revestido de estrutura e organização. Ilustra o ordenamento entender que, em que pese a existência de semelhanças – como o exercício de atividade econômica com finalidade lucrativa -, é necessário diferenciar-se os institutos em algumas situações, entendendo a norma que a forma organizada do exercício da atividade se apresenta como característica distinta – e resulta em resultados práticos distintos - daquelas atividades exercidas sem estrutura empresarial.

Assim, determina a norma que apenas a análise da atividade econômica exercida pela sociedade seja apta a determinar o enquadramento desta como simples ou empresária, e não qualquer outro critério. Desta forma, apenas as sociedades que conjugam todos os elementos da empresarialidade, especialmente a organização, pode ser cabalmente caracterizada como sociedade empresária – ou simples, no caso de ausência de um dos elementos -, sendo inclusive neste sentido as determinações do art. 966 e 982 do código civil.

(12)

Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.

[...]

Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de

empresário sujeito a registro; e, simples, as demais.1

Paralelo a tais construções teóricas, emerge em matéria tributária o Decreto Lei nº 406/68 que, mesmo após ter tido alguns de seus dispositivos revogados pela Lei Complementar nº 116/03 - esta que passou a ser a referência normativa em nível nacional para a regulamentação do ISSQN: Imposto Municipal Sobre a Prestação de Serviços de Qualquer Natureza -, ainda assim permanece emanando importantes contornos regulatórios da referida espécie tributária, em especial sua cobrança diferenciada prevista nos parágrafos 1º e 3º de seu art. 9º para alguns serviços específicos, em situações determinadas.

Aduzem os referidos dispositivos, inverbis, que:

Art. 9º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.

§ 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.

§ 3º Quando os serviços a que se referem os itens 1, 4, 8, 25, 52, 88, 89, 90, 91 e 92 da lista anexa forem prestados por sociedades, estas ficarão sujeitas ao imposto na forma do § 1º, calculado em relação a cada profissional habilitado, sócio, empregado ou não, que preste serviços em nome da sociedade, embora assumindo

responsabilidade pessoal, nos termos da lei aplicável.2

Nestes termos, instituem os referidos parágrafos que – afora as disposições voltadas ao contribuinte individual -, para alguns serviços prestados por sociedades sob a forma de trabalho pessoal do próprio prestador, deve vigorar uma forma

1 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Brasília, DF, 10 de janeiro

de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 31 out. 2014.

2 BRASIL. Decreto-lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968. Estabelece normas gerais de direito

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diferenciada de incidência, o que deve ser obedecido pelos entes municipais. Desta forma, prevê o Decreto Lei nº 406/1968 que, quando uma dada sociedade prestar serviços de responsabilidade pessoal do próprio prestador, será possível a cobrança do ISSQN de forma mais branda, não tendo como base de cálculo o preço total do serviço, mas alguma outra que leve em consideração o número de pessoas que preste serviço em nome da sociedade.

Em princípio, exegese literal ratificada por alguns setores da doutrina conduz ao entendimento de que este mencionado requisito do trabalho pessoal sob responsabilidade pessoal do prestador do serviço, para legitimar a cobrança especial do tributo, refere-se à responsabilidade da pessoa do prestador junto ao órgão de classe que regulamenta sua prestação. Assim, arrolou o próprio § 3º do art. 9º Decreto Lei nº 406/68 e sua lista anexa os serviços que, uma vez prestados no âmbito de uma sociedade - mediante trabalho pessoal do prestador - gozariam em princípio da diferenciação tributária, oriunda do art. 9º, § 1º e § 3º do referido diploma normativo.

Afora as discussões sobre a pertinência dos entendimentos jurisprudenciais que adicionaram ainda outros requisitos não previstos pela lei para a incidência do referido benefício tributário, restou clara a aplicação da diferenciação prevista no art. 9º, § 1º e § 3º do Decreto Lei nº 406/68 aos profissionais pessoalmente responsáveis pela prestação de serviços contemplados pelo § 3º, que se associem em sociedades uniprofissionais do gênero simples – uniões econômicas, porém não empresárias. Ao que tudo parece indicar, foi justamente para tais agentes econômicos que o legislador criou o dispositivo, de forma não somente a aplicar os princípios constitucionais tributários da isonomia – material – e da capacidade contributiva, mas também para viabilizar e estimular economicamente a prestação de tais serviços socialmente tão relevantes, por diversas razões.

(14)

incidência do ISS de forma diferenciada. Tal entendimento, à priori, contraria até os próprios referidos art. 966 e 982 do código civil, ao eleger outro critério para a aferição da empresarialidade que não a análise dos elementos com que é exercida a atividade social.

Fundamenta-se a jurisprudência dominante que – sediada no Superior Tribunal de Justiça -, uma vez que a sociedade simples se constitui na forma de simples limitada, esta limitação da responsabilidade dos sócios com relação às obrigações civis da entidade e com relação aos direitos reais dos sócios sobre o capital social, termina por, consequentemente, afastar o caráter de pessoalidade da prestação do serviço. Para esta corrente, mesmo o serviço sendo prestado pelo trabalho pessoal e de responsabilidade do prestador em uma sociedade não empresária, e estando o serviço contemplado enquanto destinatário da cobrança diferenciada conforme o § 3º e a lista anexa do Decreto Lei nº 406/68 – e da LC 116/03 -, sua responsabilidade pessoal estaria afastada pela limitação dos sócios com relação às quotas sociais, afetando o requisito da pessoalidade do trabalho exercido.

Depreende-se assim que, para os adeptos deste entendimento, o principal critério que caracteriza a responsabilidade pessoal dos prestadores não é a responsabilidade destes junto aos órgãos que regulamentam a prestação do serviço, legalmente imposta, mas sim o fato da sociedade que abriga a prestação do serviço ter limitada a responsabilidade dos sócios sobre seu capital. Já para a corrente dominante na doutrina, o principal critério para a observância da responsabilidade pessoal do serviço é a sua regulamentação aos órgãos competentes, até porque esta responsabilidade tem origem legal, sendo indiferente se o prestador deste dado serviço regulado é sócio limitado ou ilimitado da sociedade que, em nome desta, presta o serviço: a lei, portanto, se imporia sobre a vontade das partes.

(15)

Em meio a esta controvérsia, o presente estudo analisa a possibilidade de aplicação da cobrança diferenciada do ISSQN sobre os serviços contemplados pelo Decreto Lei nº 406/68, prestados pessoalmente pelos membros de sociedades simples – não empresária – com limitação de quotas. Assim, analisa o trabalho se os vigentes institutos trazidos pelos §§ 1º e 3º do DL 406/68 se aplicam às sociedades simples, quando os prestadores que atuam em nome da sociedade o fazem mediante o exercício de trabalho pessoal, mesmo estando esta sociedade simples registrada sob a espécie limitada.

Em termos metodológicos, parte-se do seguinte problema de pesquisa: é a tributação diferenciada para sociedades de prestadores de serviços prevista nos §§ 1º e 3º do DL 406/68 aplicável às sociedades simples que cumpriram todos os requisitos para tanto, mas que se constituíram sob a espécie limitada? Parte-se da hipótese de que deve viger a regra trazida pelo ordenamento para a aferição da empresarialidade, qual seja a análise dos elementos constantes da forma de exercício da atividade social, e não sua forma de registro junto aos órgãos de controle.

Assim, entende-se previamente pela possibilidade de aplicação da tributação diferenciada do ISS às sociedades simples limitadas. Desta forma, estar-se-á privilegiando a interpretação teleológica, histórica e sistemática dos referidos dispositivos – e do ordenamento -, especialmente levando em consideração os serviços arrolados como destinatários do tratamento diferenciado.

Com o presente estudo, busca-se subsidiar não somente a resolução de uma controvérsia, mas especialmente o aperfeiçoamento da norma, especialmente quando a tese que antecipadamente se crê equivocada é aquela que atualmente vigora na jurisprudência da Corte Uniformizadora, ou seja, justamente na instituição competente para a pacificação dos conflitos atinentes á matéria. Busca-se, assim, oferecer soluções para tal relação cível e tributária, de forma a ser a norma um instrumento de desenvolvimento social e econômico ao viabilizar direito já consagrado a tais classes de contribuintes, face à tamanha importância de se observar os princípios constitucionais tributários e do ambiente institucional para as relações econômicas do dia-a-dia.

(16)

principais contornos no direito brasileiro contemporâneo. Nesta ocasião, far-se-á uma distinção entre os gêneros societários simples e empresarial, culminando na análise da possibilidade de uma sociedade simples constituir-se sob a espécie limitada sem descaracterizar a natureza de sua atividade.

No segundo capítulo, far-se-á um estudo sobre o tipo tributário do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza. Nesta oportunidade, busca-se desde a origem mundial da espécie até seus atuais contornos no ordenamento jurídico tributário do Brasil, quando então se passa a analisar especificamente os vigentes institutos jurídicos trazidos pelos §§ 1º e 3º do art. 9º do DL 406/68, mormente buscando compreender do que se tratam e qual a proposta que os referidos dispositivos trazem para o ordenamento pátrio.

No terceiro capítulo, foca-se o estudo mesclando-se as matérias discutidas nos dois capítulos anteriores, com especial atenção para as inovações normativas trazidas pela atividade jurisdicional. Assim, estudam-se os principais entendimentos consolidados nos tribunais superiores pertinentes ao mérito cá em estudo, especialmente o vigente entendimento do STJ pela não incidência do benefício tributário às sociedades simples que, em que pese cumprirem todos os requisitos para tanto, constituem-se na espécie limitada.

(17)

2 SOCIEDADES

De forma a culminar na compreensão do instituto jurídico da sociedade simples limitada, para o objetivo de discutir a possibilidade de cobrança do ISSQN incidente sobre sua atividade, conforme determinado pelos parágrafos 1º e 3º do art. 9º do Decreto Lei 406/68, entende-se necessário uma análise sobre as sociedades de uma forma mais ampla. Partindo do estudo da criação e da evolução histórica das sociedades, contemplam-se seus primeiros e últimos contornos no direito brasileiro, assim ofertando-se ao leitor todo o subsídio para a posterior análise do objeto tributário em voga, se incidente ou não sobre o específico instituto jurídico da sociedade simples limitada.

2.1 ORIGEM E HISTÓRICO

Em que pese a moderna divisão entre sociedades empresárias e sociedades não empresárias – estas também chamadas sociedades simples enquanto gênero, conforme se abordará adiante -, fato é que a ideia de sociedade tem origem bem primitiva: na própria noção de humanidade. Entendida como a propriedade e os esforços comuns para socialização de resultados e riscos, tal prática foi inerente à condição do homem na história e esteve presente em todas as aglomerações humanas originárias. Sobre esta gênese das sociedades aduz Bruno Silva que:

A sociedade também surgiu junto com o homem, que é um ser social por excelência. Podemos dizer que a propriedade surgiu historicamente de uma forma societária, pois a propriedade coletiva está na base de todas as sociedades humanas. A comunidade familiar ou tribal foi encontrada pelos historiadores em todos os

povos, com características quase idênticas.3

Ainda nesta discussão de origem comum entre humanidade e a ideia de sociedade, contribuiu Frederich Engels:

A primeira forma de propriedade é a propriedade tribal. Ela corresponde à fase não desenvolvida da produção, em que um povo

3 SILVA, Bruno Mattos e. Direito da Empresa. Teoria da Empresa e Direito Societário. São Paulo:

(18)

se alimenta da caça e da pesca, da criação de gado ou, no máximo, da agricultura [...]. Nesta fase, a divisão do trabalho está ainda pouco desenvolvida e se limita a uma maior extensão da divisão natural no seio da família.4

Desta forma, teve origem a ideia de sociedade na própria forma de organização e evolução da espécie humana, contudo as sociedades não decorriam de contrato, e assim só ganharam o contorno de instituto jurídico bem mais tarde na história quando da época das trocas. A esta altura da trajetória humana, a iniciativa de socializar obrigações e direitos para o exercício de atividade econômica comercial contribuiu para a evolução e difusão da ideia de sociedade, tendo esta ganhado ainda mais contornos no objetivo de regular a relação entre comerciantes que se associavam para a prática de sua atividade econômica.

Assim, é fato que tanto a noção jurídica de sociedade quanto a de empresa que se tem hoje têm na ideia de comércio principal referência, sendo aquelas ideias resultantes da evolução da atividade comercial ao longo da história5, prática esta

que encontra registro desde os tempos e povos mais remotos como os egípcios antigos, fenícios, babilônicos, gregos helenísticos, romanos e bárbaros. Registre-se, inclusive, que a robustez e evolução do direito societário ocorreram bem antes da regulamentação de outros direitos que hoje são tidos como fundamentais, estes só reconhecidos e institucionalizados anos depois ao longo da história da humanidade6.

Sobre o comércio em particular - enquanto atividade ensejadora da atividade

empresarial e do instituto jurídico societário – afirma Marlon Tomazette7 ter o

vocábulo sua origem no latim: commutatio mercium, cujo significado é troca de

mercadorias.

Conforme Rafael Borges, é o comércio “o ramo da atividade que tem por

objeto a aproximação de produtores e consumidores, para a realização ou facilitação

de trocas8”. E ainda na caracterização desta relação entre a evolução do instituto jurídico societário e o comércio desde a antiguidade, Platão, em sua obra A República, faz uma descrição desta atividade, aduzindo, em síntese, que:

4 ENGELS, Frederich. A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. 2ª Ed. São

Paulo: Global, 1985, p. 91.

5 SILVA, Bruno Mattos e, op. cit., p. 5.

6 SILVA, Bruno Mattos e. ibidem, p. 5 e 6.

7 TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Teoria Geral e Direito Societário, vol. 1.

São Paulo: Atlas, 2009.

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[...] pelo fato dos indivíduos não conseguirem saciar todas as suas necessidades, se viram obrigados a aproximarem-se uns dos outros com o intuito de trocar os excedentes de seus trabalhos. Tal aproximação acarreta a vida em grupo e posteriormente a

sociedade.9

Isso, por sua vez, reforça a máxima de que o homem é um ser social e, portanto, sua necessidade de se agrupar, de viver uns com os outros o levou a buscar alternativas para a convivência com o grupo, começando com a troca de mercadorias, o escambo. E foi justamente no âmbito desta interdependência que surgiu desde os tempos mais remotos a necessidade de regulamentar como seriam feitas associações entre pessoas para a atividade econômica, “[...] evoluindo para a economia de mercado e o uso da moeda, em sistema similar ao utilizado até hoje”.10

Na idade média, período marcado pelo declínio do modelo feudal, a ascensão da burguesia e a expansão das cidades observou a saída dos camponeses das áreas rurais - êxodo rural - e também o revigoramento das atividades comerciais com a abertura de vias na Europa. O feudalismo com suas características de fisiocracia e aristocracia havia imposto significativo declínio à atividade comercial, contudo a atividade se manteve e contribuiu para significativas mudanças da sociedade europeia à época:

Essa mudança foi provocada pela crise do sistema feudal, resultado da subutilização dos recursos do solo, da baixa produtividade do trabalho servil, aliadas ao aumento da pressão exercida pelos senhores feudais sobre a população. Em função da citada crise, houve uma grande migração que envolveu, dentre outros, os mercadores ambulantes, que viajavam em grupos e conseguiram um capital inicial, que permitiu a estabilização de uma segunda geração de mercadores nas cidades, desenvolvendo um novo modo de

produção.11

E é justamente neste contexto que começam a surgir as corporações de mercadores, mecanismo utilizado para reunião e agrupamento dos comerciantes que, mesmo sendo ricos, não eram nobres. Tais agrupamentos buscavam justamente favorecer a atividade comercial, socializando custos e prejuízos com o intuito de ampliar as vantagens econômicas com a atividade, semelhante à ideia de sociedade hoje. Assim, com o seu fortalecimento e a consequente decadência do

9 PLATÃO apud MARTINS, FRANCISCO. Títulos de Crédito. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 21.

10 idem.

(20)

sistema feudal, essas corporações de mercadores foram, aos poucos, ganhando poder político e militar, e passam a construir centros comerciais estratégicos.

Essa fase histórica é chamada pelos estudiosos de sistema subjetivo, pois é nesse período que surge o direito comercial, todavia com caráter subjetivista, corporativo e consuetudinário, estendido apenas aos membros das corporações. De acordo com Joaquim Pereira:

[...] como o direito comum da época não apresentava regramento capaz de regular as relações comerciais de forma satisfatória. Assim, os comerciantes se viram compelidos a organizarem-se e criarem uma estrutura jurídica interna nas corporações, onde o direito era aplicado pelos juízes consulares, que eram eleitos em assembleias

cerradas para os membros das corporações mercantis.12

Desta forma, com a evolução da atividade comercial e seu protagonismo enquanto atividade econômica social – em oposição à agricultura -, o direito das corporações evolui e deixa de ser restrito aos seus membros, passando a alcançar a todos aqueles que lidavam de alguma forma com o comércio, passando-se então da fase subjetivista para se ter um caráter objetivo do direito comercial.

Conforme explica Joaquim Pereira, “a abertura do direito das corporações aos demais cidadãos foi vista pela população em geral com bons olhos, visto que o direito outorgado pelo Estado era precário e com sérias tendências usurpadoras13”.

Nessa nova fase, vigora o sistema objetivo, também chamado pelos estudiosos de teoria dos atos do comércio. Segundo Rubens Requião:

[...] passou-se do sistema subjetivo ao objetivo, valendo-se da ficção segundo a qual deve reputar-se comerciante qualquer pessoa que atue em juízo por motivo comercial. Essa ficção favoreceu a extensão do direito especial dos comerciantes a todos os atos do comércio, fosse quem fosse seu autor, do mesmo modo que hoje a ficção atribui, por ordem do legislador, o caráter de ato de comércio àquele que verdadeiramente não o tem, serve para estender os benefícios da lei mercantil aos institutos que não pertencem ao

comércio.14

Com essa concepção, não somente a noção de sociedade como também a própria ideia de comércio consolidou o ramo comercial das ciências jurídicas, atualmente nominado direito empresarial, definido conforme Fábio Coelho como

12 PEREIRA, Joaquim. Direito de Empresas. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 30.

13 ibidem, p. 31.

(21)

aquele ramo do direito que estuda:

[...] os meios socialmente estruturados de superação dos conflitos de interesses envolvendo empresários ou relacionados às empresas que exploram. As leis e a forma pela qual são interpretadas pela jurisprudência e doutrina, os valores prestigiados pela sociedade, bem assim o funcionamento dos aparatos estatal e paraestatal, na superação desses conflitos de interesses. A denominação desde ramo do direito (“comercial”) explica-se por razões históricas [...]; por tradição, pode-se dizer. Outras designações têm sido empregadas na identificação desta área do saber jurídico (por exemplo: direito empresarial, mercantil, dos negócios, etc.), mas nenhuma ainda substituiu por completo a tradicional. Assim, embora seu objeto não se limite à disciplina jurídica do comércio, Direito Comercial tem sido o nome que identifica – nos currículos de graduação e pós-graduação em Direito, nos livros e cursos, no Brasil e em muitos outros países – o ramo jurídico voltado às questões próprias dos empresários ou das empresas; à maneira como se estrutura a produção e negociação dos

bens e serviços de que todos precisamos para viver.15

E foi esta concepção societária objetivista, debruçada sobre um ramo próprio das ciências jurídicas para a solução de controvérsias comerciais, que povoou a América junto com o mercantilismo colonial europeu e assim cá se desenvolveu, consolidando-se com o Código Comercial brasileiro de 1850. Nesta oportunidade, não somente institutos comerciais foram formalizados em sede legal no Brasil, mas também sofreram adaptações para vigorar conforme a necessidade mercantil da sociedade da época, inaugurando o direito societário brasileiro, que será analisado em separado no tópico que se segue.

2.2 DIREITO SOCIETÁRIO BRASILEIRO

No Brasil, conforme referido, o Código Comercial de 1850 foi elaborado a partir dessa concepção objetivista, tendo no conceito de atos de comércio o elemento fulcral para aquelas atividades que estariam sob a égide do direito comercial, diferenciando-se assim aquelas outras condutas que deveriam ser regulamentadas por legislações diversas. Neste contexto, diferenciavam-se as sociedades que praticavam atos de comércio – confirme regulamento 737 - daquelas cuja existência servia para finalidade diversa16, contudo mantendo-se a origem do

direito societário atrelada à gênese do direito comercial, enquanto ramo que

15 COELHO, Fábio Ulhôa. Manual de Direito Comercial. 29ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 04 e

05.

(22)

regulamenta a atividade econômica, precipuamente a atividade hoje definida como empresária.

Um século mais tarde, a teoria dos atos do comércio é substituída pela Teoria da Empresa, de origem italiana. Os motivos para que isso acontecesse foi a falta de parâmetros científicos para se definir as atividades econômicas comerciais frente à diversificação social de produtos, serviços, procedimentos e a falta de atividades importantes na lista dos atos comerciais.

Antes mesmo de sua formalização no direito positivo, a Teoria da Empresa já estava consagrada na doutrina e na jurisprudência do direito brasileiro, tendo sido a base teórica para a resolução de diversos conflitos empíricos pelos tribunais pátrios. Até que, em 2002, com a edição do novo Código Civil, consolidou-se como a teoria dominante e hoje divide todos os tipos de sociedades existentes em dois grupos: empresárias e, por exclusão, não empresárias. Aduz o Código Civil que:

Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de

empresário sujeito a registro; e, simples, as demais.17

Antes, porém, de maior detalhamento das sociedades empresárias e não empresárias, é necessário primeiramente trazer o conceito legal de sociedade, assim “celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados”.18 É neste contexto que se diferencia a sociedade

das associações19, quando estas são uniões entre duas ou mais pessoas com bens

ou esforços para atender a uma determinada finalidade com objetivos não

econômicos20, enquanto que aquela possui a finalidade econômica como sua maior

característica.21

Feita tal conceituação e necessária distinção entre sociedades e associações, e considerando que hodiernamente é a Teoria da Empresa a referência conceitual do ordenamento civil brasileiro – assim caracterizando-se as sociedades simples por

17 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Estabelece o Código Civil. Brasília, DF, 10 de

janeiro de 2002. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm. Acesso em: 31 out. 2014.

18 Ibidem, art. 982.

19 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil. Contratos em Espécie. 14ª Ed. Volume 3. São Paulo:

Atlas, 2014, p. 635.

20 SILVA, Bruno Mattos. Op. cit., p. 174.

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exclusão -, faz-se imperioso trazer o conceito de empresário quando no intuito de aclarar sobre o direito societário brasileiro, este previsto no artigo 966 do novo Código Civil de 2002, que afirma que: “considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.

Importante ainda afirmar que, em que pese a referência teórica empresarial no direito societário brasileiro, não traz o código o conceito de empresa propriamente dita, mas sim o de empresário para fins de caracterização das sociedades pela forma com que sua atividade é exercida. Assim, todas as sociedades que se enquadrarem nessa nova conceituação de empresário, inclusive as prestadoras de serviços, serão consideradas sociedades empresarias, independentemente de seu objeto, conforme já estava previamente delineado pela Lei nº 8.934/94, que já permitia a inscrição de qualquer empresa no registro publico de empresas mercantis, sem vinculação a seu ramo de atuação.

Com essa nova concepção, o novo código acabou com a clássica divisão das sociedades em civis e comerciais, que tinha como elemento diferenciado o gênero de atividade, e transformou a tradicional figura do comerciante, caracterizado pela prática habitual dos antigos atos de comércio, na moderna imagem do empresário, responsável pela organização da atividade econômica com finalidade lucrativa.

A dualidade, porém, continua existindo, agora representada pela sociedade empresaria e pela sociedade simples, esta diferenciada da outra porque não desenvolve atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços. Neste contexto, convêm destacar os elementos que, ocorrendo em concomitância, conceituam a atividade empresária, facilitando a identificação das sociedades simples quando quaisquer destes elementos seguintes faltarem a uma dada sociedade, especialmente o elemento da organização. Salvo quando especificamente indicado, a análise dos elementos seguintes partiram da leitura doutrinária de Fábio Coelho.22

Profissionalismo – Segundo a referida doutrina, a ideia de profissionalismo está sedimentada à consideração de três ordens: a primeira ligada à habitualidade, não se considerando profissional quem exerce atividade econômica de forma esporádica, aquele que, por exemplo, estiver apenas fazendo um teste ou suprindo

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necessidades econômicas temporárias. A segunda ideia de profissionalismo está ligada à pessoalidade da produção, não se considerando atividade empresária aquela que se realiza sem o arregimento de empregados.

Neste quesito, pela necessidade de mão-de-obra alheia para a caracterização do profissionalismo e, consequentemente, da caracterização da atividade empresária, contribui José Borba:

O empresário apoia-se em uma organização, que poderá ser de pequena monta ou de grande expressão, mas que, em qualquer caso, compreenderá a articulação de trabalho alheio e de meios materiais.23

Neste mesmo sentido tem se posicionado o Superior Tribunal de Justiça: 24

Alfredo Rocco salienta a importância da organização do trabalho realizada pelo empresário e adverte que a empresa somente pode ser caracterizada quando a produção é obtida mediante o trabalho de outrem, a ser recrutado, fiscalizado, dirigido e retribuído exclusivamente para a produção de bens e serviços (cf. Princípios de Direito Comercial. São Paulo: Saraiva, 1931).

Destaque-se, contudo, que a presença de empregados em pequena escala, por si só, não caracteriza o caráter empresarial da atividade quando o suposto empresário – o proprietário do negócio – continua laborando na atividade fim do negócio, ou seja, presta diretamente e pessoalmente o serviço, sendo o empregado um mero auxiliar em atividade meio ou um ajudante e subalterno na atividade fim, conforme se verá adiante.

Ademais, a terceira e mais relevante ideia segundo a doutrina de Fábio Coelho para a caracterização do profissionalismo – este que é apenas um dos elementos caracterizadores da atividade empresarial – é o monopólio ou o domínio das informações. Segundo esta faceta do elemento profissionalismo, deve o empresário conhecer todas as informações relativas aos produtos que oferta, devendo informa-las a consumidores e usuários, diferentemente do empregado que, muitas vezes, detém conhecimento apenas de uma parcela do processo produtivo, o que é tradicionalmente conhecido como alienação.

23 BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 8ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 13.

24 STJ, Segunda Turma, REsp nº 594.927/RS, Rel. Min. FRANCIULLI NETTO, j. em 04/03/2004, DJ

(25)

Atividade – Segundo este elemento, conforme a doutrina majoritária, a empresa é, no fundo, uma sequência de atos cíclicos, com vistas a transformar insumos para uma dada finalidade, que pode ser econômica – no caso das empresas - ou não. Desta forma, é empresária todo encadeamento de fatos para um objetivo predeterminado.

Econômica – Segundo Fábio Coelho, é econômica a atividade destinada à produção para o mercado que “busca gerar lucro para quem a explora25”, ou seja, um acréscimo de valor econômico do bem gerado com relação aos bens adquiridos para a sua produção. Neste contexto, destaca o próprio Autor que “no capitalismo, nenhuma atividade econômica se mantém sem lucratividade e, por isso, o valor [...] deve superar o das despesas26”, este que é importante elemento caracterizador da empresa, contudo, não o único ou o preponderante com relação aos demais elementos, face, inclusive, à possibilidade legal de existência de sociedades não empresárias mesmo obtendo receita maior que despesas.

Neste contexto, contudo, admite o referido Autor a possibilidade lucrativa de atividades não empresárias, conforme determina a lei. Ressalta também Fábio Coelho, nesta proposta de análise eclética da importância do lucro para a caracterização da atividade, a possibilidade do lucro não ser uma finalidade, mas sim um meio, um instrumento para alcançar outros objetivos, a exemplo de instituições religiosas que têm o lucro como meio para a difusão de valores e, desta forma, não são sociedades empresárias.

De igual forma, fala Bruno Silva27 na atividade econômica ser potencialmente

geradora de lucro, uma vez que uma empresa que opera obtendo prejuízo – um negócio mal planejado ou uma empresa estatal utilizada como instrumento de política pública - não deixa de ostentar seu caráter empresarial pelo fato de sua receita estar abaixo de seus custos. Assim, por óbvio que o lucro é um importante elemento para a caracterização de uma atividade como empresária, contudo, prevê a lei que este não é o único elemento e nem prepondera sobre os demais, sendo inclusive majoritário na doutrina o reconhecimento igualitário dos outros elementos legais neste árduo exercício.

25 COELHO, Fábio Ulhôa. Manual..., p. 13.

26 idem

(26)

Organizada – É organizada a atividade quando conjuga o empresário quatro fatores de produção, a saber: capital, mão-de-obra, insumos e tecnologia. Não é empresário quem exerce atividade econômica sem a contratação de nenhum funcionário, sem a aquisição regular de insumos ou sem dispor de certa estrutura fundamental à execução da atividade. Destaque-se neste ponto que a tecnologia não precisa ser moderna ou avançada, mas tão somente um saber inerente e necessário à viabilização racional da atividade.

Contudo, a melhor contribuição neste ponto vem de Bruno Silva28, quando

entende empresária aquela atividade em que o proprietário do negócio ocupa-se de organizar a produção, de buscar a melhor forma de conjugação dos esforços segundo a racionalidade econômica, para a maximização dos resultados da atividade. Neste contexto, não seria empresária para o referido Autor aquelas atividades em que, mesmo dispondo de alguma equalização racional entre capital, trabalho, tecnologia e insumos – como toda atividade dispõe, empresária ou não –, o proprietário ocupe-se principalmente da produção do bem ou da prestação do serviço, e não da organização de fatores.

Tais situações ocorrem, geralmente, quando, mesmo dispondo de capital, funcionários, tecnologia e insumos, o elemento principal da atividade encontra-se no trabalho pessoal do proprietário do negócio, não sendo o capital expressivo o suficiente para demandar significativa organização, não ocorrendo relevante número de empregados que demande gestão por órgão ou pessoa especializada nem se valendo de tecnologia que se coloque como elemento principal da atividade em preponderância à pessoalidade do proprietário, mesmo quando no âmbito de uma sociedade de proprietários.

Desta forma, segundo Bruno Silva:

É errado dizer que “a exploração profissional, individual, direta,

habitual e com fins lucrativos de uma atividade econômica será, necessariamente, uma atividade empresarial”, pois alguém que aplica apenas o seu trabalho para a produção de bens ou serviços realiza atividade econômica, mas não realiza a atividade econômica de

forma organizada.29

(27)

Produção ou Circulação – Enquanto produção caracteriza-se a fabricação de mercadorias ou a prestação de serviços, que difere da circulação quando estes bens não são produzidos pelo empresário, mas tão somente por eles circulado no comércio, seja este atacadista ou varejista. Já a circulação de serviços, consubstancia-se na intermediação da prestação de serviços, a exemplo de uma agência de turismo que não hospeda, não transporta, mas viabiliza um pacote do qual o cliente se valerá de todos estes serviços que outras empresas – ou não – produzem.

Bens e Serviços – Por fim, no tocante à conceituação de atividade econômica empresária no âmbito do ordenamento jurídico brasileiro, destaca-se que a atividade empresária tem como objetivo a criação de novo produto – bem -, durável ou não durável, ou a prestação de algum benefício a outrem, este instantaneamente consumido quando desta prestação – serviço. E assim discutidos os elementos que, quando conjugados, caracterizam uma dada atividade econômica como empresária, passa-se a discutir ainda neste propósito de análise do direito societário brasileiro outras pertinentes nuances para a compreensão deste tópico.

Insta frisar, desde já, que as sociedades podem ser divididas em personificadas ou despersonificadas. Personificadas, são aquelas que possuem personalidade jurídica própria, distinta da de seus sócios, tendo, portanto, seus atos constitutivos devidamente registrados nos órgãos competentes – geralmente Cartório de Registro de Pessoa Jurídica ou Junta Comercial do respectivo estado – geralmente sendo titulares de um CNPJ.

Já as sociedades despersonificadas são aquelas que formalmente não possuem personalidade jurídica isolada, ou seja, existem na prática, todavia, os atos são juridicamente praticados em nome de um ou mais de seus sócios, sendo resultado de um contrato entre as partes que compõem a sociedade, sem ter este instrumento sido registrado em nenhum órgão competente. Nestes casos despersonalizados, formaliza o art. 981 do Código Civil sua existência e regula as obrigações e direitos sociais recíprocos – especialmente acerca da partilha de resultados -, regulando a contribuição de bens e serviços de cada sócio para o exercício conjunto de atividade. Conforme artigo 981 do Código Civil de 2002:

(28)

para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.

E ainda no estudo do direito societário brasileiro, destaca-se que, quanto à responsabilidade dos sócios com relação às cotas sociais, o novo Código Civil relaciona três possíveis formas de sociedades despersonificadas, a saber: i) Sociedade em comum; ii) Sociedade em Conta de Participação (C/P) e Sociedades Irregulares e de fato, estas sem previsão legal específica contudo admitida sua existência pelo ordenamento. Já quanto às sociedades personificadas, prevê o Código Civil sete possíveis espécies de constituição societária, a saber: i) Sociedade Simples (S/S); ii) Sociedade em Nome Coletivo (N/C); iii) Sociedade em Comandita Simples (C/S); iv) Sociedade Limitada (Ltda.); v) Sociedade Anônima (S/A); vi) Sociedade em Comandita por Ações (C/A) e viii) Sociedades Cooperativas (S/C).

Já quanto ao regime de constituição no direito societário brasileiro, determina o novo Código Civil a existência de duas categorias: as sociedades contratuais e as sociedades institucionais. Enquanto contratuais, entende-se, sinteticamente, aquelas sociedades cujos atos constitutivos são o contrato social, como as sociedades em nome coletivo, as sociedades em comandita simples e as sociedades limitadas. Já as institucionais são aquelas cujo ato regulamentar é o estatuto social, podendo inclusive ser dissolvidas pela vontade da maioria dos sócios – ao contrário das contratuais -, além de ostentar outras causas dissolutórias que lhes são exclusivas como a intervenção e a liquidação extrajudicial.30

Por derradeiro, neste tópico, no especial atinente às principais classificações das sociedades, emerge a possibilidade de enquadramento quanto às condições de alienação da participação societária, classificando-se as sociedades em sociedades de pessoas e sociedades de capitais. Como sociedade de pessoas, figuram aquelas sociedades em que o sócio tem direito de vetar o ingresso de estranhos no quadro associativo, e as sociedades de capitais são aquelas em que vigora o princípio da livre circulabilidade da participação societária, não sendo objeto de veto dos sócios

presentes o ingresso de membro societário estranho à união31, sendo que as

sociedades institucionais são sempre de capital e as contratuais podem abarcar as duas modalidades32.

30 COELHO, Fábio Ulhôa. Manual..., p. 120.

(29)

Em síntese, em meio a seus elementos constitutivos e suas diversas formas de classificação, emerge a noção de que a teoria da empresa adotada como referência no direito societário brasileiro não aboliu a bipartição no interior do direito privado, materializada na antiga dicotomia entre o cível e o comercial, mas apenas a aperfeiçoou para a dinâmica econômica e social dos novos tempos, migrando-a dos referenciais atos de comércio para a noção de empresarialidade33.

Neste contexto de manutenção de uma dicotomia - hoje evoluída para empresarial e não empresarial - e após as digressões feitas sobre o direito societário brasileiro que tem como referência as sociedades empresárias, passar-se-á no tópico seguinte, em separado, às discussões sobre conceito, classificação e natureza jurídica das sociedades excluídas da característica empresarial, a exceção societária do direito brasileiro: as sociedades simples; culminando na analise da estrutura societária alvo deste trabalho.

2.3 SOCIEDADE SIMPLES

A terminologia sociedade simples no direito brasileiro possui duplo significado, podendo ser tanto um gênero societário, referindo àquelas sociedades não empresárias, como também uma nova espécie societária introduzida pelo atual Código Civil de 2002, conforme se verá adiante. Enquanto gênero, sociedade simples é um tipo de sociedade em que não se verifica a organização de fatores produtivos, mas sim em meio para o emprego de trabalho não organizado para o exercício de atividade econômica, desempenhado por cada um dos sócios sem

conexão maior destes com os demais.34

No Código Civil de 2002, encontra-se sua instituição por exclusão, por sua excepcionalidade com relação à teoria da empresa, que coloca a sociedade empresária como referência para o direito societário brasileiro. Aduz o art. 982 que:

Art. 982. Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.

Não bastasse sua previsão excludente lastreada no referido artigo, o mencionado diploma vai além e arrola – não taxativamente – no parágrafo único do

33 ibidem, p. 15.

(30)

art. 966 algumas atividades que, mesmo exercidas sob a égide societária serão, via de regra, não empresárias: simples. Trata-se de atividades que, pela natureza intelectual que ocupa a pessoa de cada sócio que presta o serviço, retira da sociedade o elemento da organização para sua caracterização como empresa. Conforme o referido dispositivo:

Parágrafo único. Não se considera empresário quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de empresa.

Desta forma, toda e qualquer atividade intelectual, artística, científica e literária comumente exercida sob o manto societário já é, de pronto, consideradas pela lei civil como não empresária, caracterizando-se, portanto, em sociedades simples. Conforme leciona Fábio Coelho:

Não se considera empresário, por força do parágrafo único do art. 966 do CC, o exercente de profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, mesmo que contrate empregados para auxiliá-lo em seu trabalho. Estes profissionais exploram, portanto, atividades econômicas civis, não sujeitas ao Direito Comercial. Entre eles se encontram os profissionais liberais (advogado, médico, dentista, arquiteto, etc.), os escritores e artistas de qualquer

expressão (plásticos, músicos, atores etc.).35

Contudo, importante deixar claro que as sociedades simples não estão adstritas ao exercício de atividades intelectuais e artísticas, conforme previsto no parágrafo único do art. 966. O caráter simples de uma sociedade decorre tão somente da ausência de seu caráter empresarial (exclusão à teoria da empresa), o que geralmente decorre da ausência do elemento organização (atividade econômica

organizada) para que a atividade se enquadre como empresária, independente do tipo de atividade que é exercido pela sociedade. Assim, o rol do referido dispositivo é meramente exemplificativo, uma vez que outras sociedades que exercem atividades diferentes das citadas no parágrafo podem, pela forma com que exercem a atividade – sem organização -, serem enquadradas como sociedades simples. Conforme leciona Bruno Silva:

Embora seja comum que a sociedade simples se dedique a atividades intelectuais, é correto dizer que “a sociedade de natureza

(31)

simples não tem seu objeto restrito às atividades intelectuais”, pois

ela pode exercer outras atividades.36

Insta destacar, todavia, que para assim manterem-se enquadradas, tais atividades não podem enquadrar-se na exceção trazida pela segunda parte do citado dispositivo legal, ou seja, não podem constituir-se como um elemento de uma atividade exercida no bojo de uma estrutura organizacional maior, ou seja, no âmbito de uma empresa, que reúna todos os elementos para assim se caracterizar. Contribuindo com a delimitação e o alcance do instituto, leciona Fábio Coelho:

Para compreender o conceito legal, convém partir de um exemplo. Imagine o médico pediatra recém-formado, atendendo seus primeiros clientes no consultório. Já contrata pelo menos uma secretária, mas se encontra na condição geral dos profissionais intelectuais: não é empresário, mesmo que conte com o auxílio de colaboradores. Nesta fase, os pais buscam seus serviços em razão, basicamente, de sua competência como médico. Imagine, porém, que, passado o tempo, este profissional amplie seu consultório, contratando, além de mais pessoal de apoio (secretária, atendente, copeira etc.), também enfermeiros e outros médicos. Não chama mais o local de

atendimento de consultório, mas de clínica. Nesta fase de transição,

os clientes ainda procuram aqueles serviços de medicina pediátrica, em razão da confiança que depositam no trabalho daquele médico, titular da clínica. Mas a clientela se amplia e já há, entre os pacientes, quem nunca foi atendido diretamente pelo titular, nem o conhece. Numa fase seguinte, cresce mais ainda aquela unidade de serviços.

Não se chama mais clínica, e sim hospital pediátrico. Entre os muitos

funcionários, além dos médicos, enfermeiros e atendentes, há contador, advogado, nutricionista, administrador hospitalar, seguranças, motoristas e outros. Ninguém mais procura os serviços ali oferecidos em razão do trabalho pessoal do médico que os organiza. Sua individualidade se perdeu na organização empresarial. Neste momento, aquele profissional intelectual tornou-se elemento da empresa. Mesmo que continue clinicando, sua maior contribuição para a prestação dos serviços naquele hospital pediátrico é a de organizador dos fatores de produção. Foge, então, da condição geral dos profissionais intelectuais e deve ser considerado, juridicamente,

empresário.37

E ainda quanto a esta delicada tarefa de distinguir esta, algumas vezes, tênue linha entre o caráter empresarial ou não de uma dada sociedade, acrescenta Fábio Coelho sobre a relativização do elemento econômico – lucro – do conceito de empresa, privilegiando a análise que enfatiza o elemento organizacional. Note-se:

A distinção entre sociedade simples e empresária não reside, como se poderia pensar, no intuito lucrativo. Embora seja da essência de

36 SILVA, Bruno Mattos e. op. cit., p. 322 e 323.

(32)

qualquer sociedade empresária a persecução de lucros – inexiste pessoa jurídica dessa categoria com fins filantrópicos ou pios -, este é um critério insuficiente para destaca-la da sociedade simples. Isto porque também há sociedades não empresárias com escopo lucrativo, tais as sociedades de advogados, as rurais sem registro na junta etc. O que irá, de verdade, caracterizar a pessoa jurídica de direito privado não-estatal como sociedade simples ou empresária será o modo de explorar seu objeto. O objeto social explorado sem empresarialidade (isto é, sem profissionalmente organizar os fatores de produção) confere à sociedade o caráter de simples, enquanto a exploração empresarial do objeto social caracterizará a sociedade como empresária. [...] Por critério de identificação da sociedade empresária elegeu, pois, o direito o modo de exploração do objeto social.38

Em outra de suas obras, resume doutrinariamente o referido Autor a ideia de sociedade simples:

São, desse modo, simples quaisquer sociedades que não exploram sua atividade econômica de forma empresarial. Os que comercializam ou prestam serviços sem precisarem, em razão da reduzida dimensão econômica da atividade, organizar uma empresa – quer dizer, gastam pouco para iniciar um negócio, contratam um ou outro empregado, dispensam o uso de tecnologias especiais etc. -, se reunidos em sociedade, constituem uma da categoria simples. Como não são alcançados pela parte afirmativa da definição legal de empresários, a sociedade que contratam não é empresária. De outro lado, as sociedades de profissionais liberais, artesãos e artistas integram a categoria das simples, mesmo que contem com a colaboração de auxiliares. Por se encontrarem ao alcance da parte negativa da definição legal de empresários, a sociedade deles não

pode ser classificada como empresária.39

Nesta mesma linha, leciona Sílvio Venosa, aduzindo que:

A expressão sociedade civil, ou sociedade simples na nova

denominação, deve ficar reservada às atividades típicas de profissões liberais ou prestação de serviços técnicos, como as sociedades de advogados, médicos, engenheiros, arquitetos, contabilistas, corretores, despachantes etc. Ainda que essa sociedade venha a

praticar atos de comércio, tal não desvirtuará sua natureza.40

Já para Bruno Silva, sem discordar dos outros mencionados Autores com relação à ausência do elemento organização da sociedade simples, esta é a

sociedade que realiza a atividade com predominância do trabalho dos sócios.41

Desta forma, entende o referido Autor que, se os sócios laboram habitual e

38 COELHO, Fábio Ulhôa. Manual..., p. 110 e 111.

39 COELHO, Fábio Ulhôa. Curso de Direito Civil. Contratos. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 466.

40 VENOSA, Sílvio de Salvo. op. cit., p. 635 e 636.

(33)

preponderantemente na atividade, não estariam assim organizando a atividade, estando, portanto, ausente o requisito da organização para a caracterização da atividade social como empresarial. Mais adiante, o referido Autor acrescenta que:

O traço marcante de uma sociedade simples é a prevalência do

elemento pessoal no exercício da atividade econômica. Em outras

palavras, na sociedade simples são os sócios que trabalham diretamente na atividade econômica, sem maiores auxílios de empregados e sem a existência de um significativo complexo de bens (estabelecimento). [...] a característica da atividade empresária é, justamente, uma predominância, por parte do empresário, da

atividade de organização dos fatores de produção e não do elemento

trabalho pessoal do empresário. Na sociedade simples existe o oposto: predominância do trabalho pessoal dos sócios. Imagine-se, por exemplo, dois médicos que, em regime de sociedade, com contrato registrado, trabalham em um consultório, com apenas uma secretária, três mesas, duas linhas telefônicas e nenhum aparelho cirúrgico: essa é a sociedade simples. Eles exercitam conjuntamente uma atividade econômica, em nome da pessoa jurídica, têm intuito de

lucro, mas não têm uma estrutura empresarial, não sendo a atividade

realizada de forma organizada [...]. Existirá sociedade simples na

hipótese em que “os drs. João X, Manoel Y e Pedro K, médicos, reuniram-se para prestarem serviços típicos de suas qualificações profissionais, mediante contrato particular no qual definiram, além de suas qualificações, a denominação, o objeto, a sede, prazo, capital da ‘sociedade’, contribuição de cada um ao capital, em moeda corrente, indicaram o administrador, poderes, atribuição de cada sócio nos lucros e nas perdas, e a registraram nos termos do art. 998 do Código Civil Brasileiro vigente”. [...] A despeito da personalidade que marca a relação entre os sócios na sociedade simples, é expressa a possibilidade legal de que a sociedade tenha pessoas físicas ou jurídicas como sócias (art. 997, I, do novo Código Civil). A sociedade simples pode ter alguns bens empregados na sua atividade econômica. Porém, esses bens não são proporcionalmente muito importantes ou relevantes, pois o mais importante é, justamente, a atividade pessoal dos sócios que realizam diretamente a atividade-fim da sociedade. Por isso há acertada manifestação da doutrina no sentido de que “o complexo de bens da sociedade simples, mesmo quando organizado para o exercício da atividade, não constitui um estabelecimento empresarial”, exatamente para assinalar que apenas nas sociedades empresárias o complexo de bens (estabelecimento) tem grande magnitude e importância, bem como apenas se aplicam aos bens da sociedade empresária as regras contidas no novo Código Civil a respeito de estabelecimento (arts. 1.142 a 1.149). Portanto, a sociedade simples é uma pessoa jurídica de direito

privado que exerce atividade econômica sem estrutura empresária.42

Contudo, quanto à economicidade da atividade social, vale ressaltar que mesma razão da constituição de uma sociedade simples é o de toda e qualquer sociedade, qual seja, otimizar a produção e obter maiores ganhos no exercício da

(34)

atividade econômica, mesmo que não prestada de modo empresarial. Conforme Fábio Coelho:

[...] a atividade econômica pode ser explorada por um sujeito de forma isolada ou em conjunto com outro ou outros. A conjugação dos esforços, quando assentadas em premissas racionais e feita adequadamente, permite aprimorar os serviços oferecidos, reduz custos e aumenta as oportunidades de ganho. Engenheiros trabalhando juntos podem ser contratados para obras de maior vulto e ganhar mais dinheiro; o que presta serviços individualmente não tem condições de as executar. A exploração da atividade em conjunto pode ser viabilizada por diversos contratos, um dos quais é o de

sociedade.43

Após toda esta digressão no intuito conceitual das sociedades simples enquanto gênero, faz-se necessário conceituar a sociedade simples enquanto espécie, para que seja feita a devidas distinção entre os dois institutos. Enquanto espécie, a sociedade simples teve origem no direito suíço e foi posteriormente adotada pelo direito italiano, servindo de inspiração ao novo diploma regulatório vigente no ordenamento brasileiro, consubstanciando-se em uma inovação jurídica trazida pelo novo Código Civil de 2002.

Estatuída pelos art. 997 ao art. 1.038 do referido diploma normativo, a sociedade simples enquanto espécie é um tipo societário comum, assim como a sociedade limitada, a sociedade anônima, em nome coletivo e etc. Assim, enquanto espécie societária, a sociedade simples nada mais é do que um conjunto de normas sobre instituição, gestão, dissolução, dentre outras previsões legais para as sociedades que nesta espécie se enquadram, não passando assim de uma espécie de “roupagem” jurídica para a previsibilidade dos atos societários das uniões que nelas se enquadrarem.

Comparado aos outros tipos societários, a sociedade simples é a espécie mais simplória, ou genérica, um tipo de padrão societário para quando uma sociedade não é aderente a outra espécie societária específica, como a limitada ou anônima. Tanto assim o é que as sociedades desta espécie levam o adjetivo “simples” em sua nomenclatura, bem como seu regramento serve, em regra, de norma subsidiária aplicável a todos os outros tipos societários, no que for omisso os regramentos específicos de outras espécies, conforme os art. 1.040, 1.046, 1.053 e 1.096 do novo Código Civil:

(35)

Em todo o seu regramento, prevê especificamente o código normas que regulamentam: i) o contrato social da sociedade simples, ii) os direitos e obrigações dos sócios, iii) a administração da sociedade, iv) suas relações com terceiros, v) hipóteses de resolução com relação a um dos sócios e vi) casos de dissolução da sociedade. No âmbito destas previsões, destaca Ricardo Fiuza algumas nuances regulatórias como o fato de sua constituição se dar “mediante contrato particular ou de escritura pública, que deverá conter, necessariamente, as cláusulas essenciais elencadas nos incisos I a VIII do art. 997”, essas que “definem os aspectos principais que caracterizam a sociedade, a partir da identificação e qualificação dos sócios, que poderão ser pessoas naturais ou jurídicas”.

Prossegue o Autor afirmando que na sociedade simples “admite-se que um sócio contribua, apenas, com serviços ou trabalho”, podendo ainda constituir-se conforme algumas das modalidades de sociedade empresária “como Sociedade em

Nome Coletivo; Sociedade em Comandita Simples; e Sociedade Limitada44”,

conforme redação do art. 983 do Código Civil, adiante discutido. Assim, diante desta possibilidade de adoção de e possíveis tipos societários e suas respectivas formas de responsabilidade social, traz Fábio Coelho a discussão sobre a dúplice ideia de gênero e espécie por detrás do conceito de sociedade simples, especialmente levando em conta a vedação à atipicidade societária no direito brasileiro. Aduz o referido Autor:

No direito brasileiro, ao contrário de outros, os sócios não podem contratar a constituição de uma sociedade a não ser optando por um dos formatos tipificados em lei. Não há sociedade atípica entre nós, porque a lei se preocupa em preservar os interesses de terceiros contra a limitação da responsabilidade dos sócios além das hipóteses nela previstas. Quem quer contratar sociedade no Brasil, deve

escolher um dos seguintes tipos: em nome coletivo (CC, arts. 1.039 a

1.044), em comandita simples (arts. 1.045 a 1.051), limitada (arts.

1.052 a 1.087), anônima (arts. 1.088 e 1.089 e Lei n. 6.404/76), em

comandita por ações (arts. 1.090 a 1.092), cooperativa (arts. 1.093 a

1.096 e Lei n. 5.764/71) e simples (arts. 997 a 1.038). [...] Uma

sociedade da categoria simples assume, assim, tipos societários

diversos (CC, art. 983, caput). Os contratantes de uma sociedade da

categoria simples deve escolher um de cinco possíveis tipos: simples, cooperativa, limitada, em nome coletivo ou em comandita simples (na verdade, esses dois últimos são extremamente raros, encontram-se

em franco desuso). Lembre-se que a expressão “sociedade simples

é ambígua, e pode designar tanto a categoria das sociedades não empresárias como um tipo societário particular. A sociedade que

adota o tipo simples integra sempre a categoria das simples. Em

(36)

suma, as sociedades simples, enquanto categoria, correspondem àquelas que não exploram seu objeto empresarialmente ou que

adotam a forma de cooperativa.45

Assim, de tais lições doutrinárias, depreendem-se algumas lições, primeira: as

sociedades podem ser divididas entre os gêneros empresárias ou, por exclusão,

simples, sendo estas as que exercem atividade de modo não empresário – sem organização, mediante labor do sócio e com pequeno vulto econômico - ou que se encontram na negativa trazida pelo parágrafo único do art. 966 do Código Civil. Segunda: na vedação à existência de sociedades atípicas, toda e qualquer sociedade, empresária ou simples (gênero), devem constituir-se em algum tipo societário específico (espécie), quais sejam: simples, cooperativa, limitada, em nome coletivo, em comandita simples, anônima ou em comandita por ações. Sem olvidar a vedação a algumas espécies à depender do gênero societário, sobre a qual há, inclusive, divergência doutrinária a respeito.46

E terceiro: a sociedade simples enquanto espécie é na verdade tão somente um regramento, um tipo societário mais simplório previsto no art. 997 a 1.038 do Código Civil para afastar a atipicidade societária vedada pelo ordenamento pátrio. Nestes artigos, prevê a norma a regulamentação jurídica da sociedade simples enquanto espécie, discorrendo sobre como será seu contrato social, os direitos e obrigações dos sócios, a administração da sociedade, as relações da sociedade com terceiros, a resolução da sociedade com relação a um dos sócios e as hipóteses de sua dissolução.

Assim, as sociedades que não se constituírem no formato de qualquer tipo societário existente mais elaborado – limitada, anônima, etc. -, consubstanciam-se em sociedades simples, desde que seu gênero, atividade e características não impossibilitem a caracterização nesta espécie. De igual forma, serve a espécie sociedade simples de norma subsidiária a outras espécies societárias mais “elaboradas”, naquilo em que seus regramentos específicos não alcançarem, assim constituindo-se, em regra, em normatização suplementar a outras sociedades, desde que o contrato social também não dispunha de modo diverso, pelo regramento subsidiário de outro tipo societário, quando possível. Conforme Fábio Coelho:

45 COELHO, Fábio Ulhôa. Curso..., p. 467 e 468.

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