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MESTRADO EM DIREITO DAS RELAÇÕES SOCIAIS São Paulo

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Academic year: 2018

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Gizela Maria Bodi

O Trabalho Informal Perante o Sistema de Previdência Social, à

Luz da Teoria Comunicacional do Direito

MESTRADO EM DIREITO DAS RELAÇÕES SOCIAIS

(2)

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Gizela Maria Bodi

O Trabalho Informal Perante o Sistema de Previdência Social, à

Luz da Teoria Comunicacional do Direito

MESTRADO EM DIREITO DAS RELAÇÕES SOCIAIS

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de mestre em Direito das Relações Sociais, sob a orientação do Prof. Dr. Miguel Horvath Júnior.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço aos meus pais, Janos e Lucia, pelo apoio, dedicação e incentivo ao longo do curso de mestrado. Ao Huno, pelas inúmeras contribuições no desenvolvimento e na revisão do texto desta pesquisa.

Ao meu irmão Guilherme, pela ajuda, em especial, com as traduções.

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RESUMO

BODI, Gizela Maria. O Trabalho Informal Perante o Sistema de Previdência Social, à Luz da Teoria Comunicacional do Direito: São Paulo – SP, Programa de Pós-Graduação em Direito das Relações Sociais, 2011.

A presente pesquisa tem por escopo a análise do trabalho informal, tão presente no cenário brasileiro atual, frente o sistema de previdência social em vigor, partindo-se da concepção comunicacional do Direito. Com efeito, a informalidade das relações de trabalho revela-se um dos principais desafios para os Estados Contemporâneos, notadamente na esfera previdenciária, em que o desempenho de atividade remunerada, por si só, é insuficiente à filiação e consequente proteção social dos integrantes dessa categoria. Considerando-se que o trabalho informal, em linhas gerais, corresponde à atividade desenvolvida à margem da regulamentação legal, foi eleito como método de estudo o exame lógico-sistemático do tema, partindo-se da premissa de que o Direito é um sistema comunicacional, somente se operacionalizando através da linguagem verbal escrita, tal como proposto por Paulo de Barros Carvalho. Assim, pautando-se na ideia de autopoiese do Direito, segundo a qual este cria a sua própria realidade, distinta e mais restrita que a social, busca-se analisar de forma crítica se há, efetivamente, interação dialógica entre os sistemas previdenciário e o social, o que repercute, em última análise, na incidência das normas jurídicas previdenciárias, especialmente a de filiação. Com base em tais premissas, após examinado o regime diferenciado dos segurados baixa renda e o especial dos microempreendedores individuais (MEI) - mecanismos recentes de inclusão previdenciária -, serão formuladas propostas de superação da informalidade, no âmbito jurídico, o que leva em conta não apenas a alteração dos meios de prova da atividade remunerada, mas também eventual reformulação estrutural do sistema de previdência social que, hoje, é voltado à proteção do trabalhador, com base no risco de contingência social da atividade desenvolvida. Tal circunstância leva, ainda, à reflexão sobre a necessidade de um novo pacto social no país.

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ABSTRACT

BODI, Gizela Maria. The Informal Work in the Social Security System, from the viewpoint of the Communicational Theory of Law: Sao Paulo - SP, Graduate Program in Law of Social Relations, 2011.

This research has the scope of analyzing the informal work, very common in the current Brazilian scenario, into the current social insurance system, starting from the communicative conception of law. Indeed, the informality of employment relationship proves to be a major challenge for contemporary states, notably in the social insurance sphere, in which the exercise of paid work, by itself, is insufficient to the membership and to the consequent social protection of the members from this category. Considering that the informal work corresponds to the activity performed outside of the statutory rule, the chosen method of study was the logical and systematic examination, starting from the premise that the law is a system of communication, operationalized through verbal written language, as proposed by Paulo de Barros Carvalho. Thus, based on the idea of autopoiesis of law, in which law creates its own reality, separated and more restrictive than social reality, we seek to examine critically whether there is indeed dialogical interaction between the social insurance system and the social one, which echoes on the incidence of social insurance laws, especially the membership rule. Based on these premises, after examining the differential systems of low-income insured and the individual “microentrepreneurs” – recent mechanisms of social insurance inclusion – we will set out proposals to overcoming informality in the legal framework, considering not only a change on the evidence paradigm of gainful activity, but also an structural reformulation of the social insurance system, which is caused today on formal worker protection, based on the contingency risk of the activity. This circumstance leads also to reflection on the need of a new social pact in the country.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 10

CAPÍTULO 1 - DIREITO COMO SISTEMA COMUNICACIONAL ... 14

1.1. Questão introdutória ... 15

1.2. Direito como sistema autopoiético ... 17

1.3. Direito e realidade ... 21

1.4. Semiologia, texto legal e norma jurídica ... 23

1.5. Semiótica, incidência e fato jurídico ... 25

1.6. Teoria das provas e formalidade ... 32

CAPÍTULO 2 - INFORMALIDADE DAS RELAÇÕES DE TRABALHO - HISTÓRICO ... 35

2.1. Evolução histórica do trabalho e da proteção social ... 36

2.1.1. Idade medieval, feudalismo e estado absolutista ... 36

2.1.2. Idade moderna, estado mínimo e liberalismo ... 38

2.1.3. Era contemporânea, estado de bem estar social, socialismo e início da proteção social no Brasil ... 41

2.1.4. Crise do estado intervencionista, neoliberalismo e globalização... 51

2.1.5. Considerações finais ... 63

2.2. Trabalho Informal como Fenômeno Interdisciplinar ... 66

2.2.1. Trabalho informal para as ciências sociais ... 67

(8)

CAPÍTULO 3 - TRABALHO INFORMAL PERANTE O SISTEMA DE DIREITO

PREVIDENCIÁRIO ... 79

3.1. Delimitação temática ... 80

3.2. Trabalho informal como evento para o sistema de previdência social ... 83

CAPÍTULO 4 - O LUGAR LÓGICO DO TRABALHADOR INFORMAL NO SISTEMA DE SEGURIDADE SOCIAL ... 93

4.1. Assistência social ... 96

4.2. Previdência social ... 98

4.2.1. Teoria das classes e o trabalhador informal como segurado obrigatório da previdência social ... 102

4.3. Trabalho informal e exclusão sistêmica ... 107

CAPÍTULO 5 - MECANISMOS DE INCLUSÃO PREVIDENCIÁRIA DO TRABALHADOR INFORMAL ... 110

5.1. Institutos Implementados ... 112

5.1.1. Sistema diferenciado de inclusão previdenciária dos segurados baixa renda ... 112

5.1.2. Regime especial dos microempreendedores individuais (MEI) ... 115

5.2. Mecanismos Metodologicamente Válidos de Inclusão ... 117

CONCLUSÃO ... 125

(9)

INTRODUÇÃO

No tema da efetividade dos direitos sociais, o trabalho informal apresenta-se como um dos maiores desafios da atualidade.

Fenômeno complexo, cuja conformação atual remete à globalização da economia mundial ocorrida entre as décadas de 1970 e 1980, o trabalho informal é questão que interessa às mais variadas áreas do saber, dentre as quais a Filosofia, a Sociologia, a Economia, as Ciências Políticas e o Direito.

Inicialmente concebida como situação transitória e ligada à classe dos socialmente excluídos, a informalidade hoje revela-se consolidada perante o universo social, com poucas perspectivas de retrocesso, ao menos em curto ou médio prazo, inobstante os resultados positivos verificados no cenário brasileiro durante a primeira década do século XXI.1

Com efeito, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no ano de 2003, o Brasil possuía 62,5% (sessenta e dois e meio por cento) da população ativa entre dezenove e cinquenta e nove anos de idade socialmente protegida, ao passo que 37,5% (trinta e sete e meio por cento), apresentavam-se sem qualquer tipo de amparo social.2

Outro estudo realizado pelo mesmo órgão, concluiu que o país possuía, no mesmo ano de 2003, 10.525.954 (dez milhões quinhentas e vinte e cinco mil novecentas e cinquenta e quatro) pequenas empresas não agrícolas, das quais 98% (noventa e oito por cento) integravam o setor informal e ocupavam 13.860.868 (treze milhões oitocentas e sessenta mil oitocentas e

1 De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no ano de 2003 a informalidade

correspondia a 20% (vinte por cento) do Produto Bruto Interno (PIB) brasileiro, percentagem que no ano de 2010 correspondeu a 18,4% (dezoito inteiros e quatro décimos) do PIB nacional. CAVALCANTI, Fernando. Economia

informal representa 18,3% do PIB do Brasil. Disponível em:

<http://veja.abril.com.br/noticia/economia/economia-informal-representa-18-3-do-pib-do-brasil>. Último acesso em 20 de fevereiro de 2011.

2 SCHWARZER, Helmut. Panorama da proteção previdenciária e os desafios da ampliação da cobertura no

Brasil. Disponível em:

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sessenta e oito pessoas) pessoas. Ainda, 88% (oitenta e oito por cento) das empresas do setor informal pertenciam a trabalhadores por conta própria, dos quais 12% (doze por cento) eram pequenos empregadores, 95% (noventa e cinco por cento) tinham um único proprietário, e 80% (oitenta por cento) somente uma pessoa ocupada.3

Na Europa, a situação não é diferente. De acordo com relatório divulgado em outubro de 2007 pela Comissão Europeia,4 25% (vinte e cinco por cento) da população ativa da União vivia na informalidade. Dentre os vinte e sete Estados-Membros, a situação mais alarmante diz respeito à Bulgária (com 35% - trinta e cinco por cento – do PIB na informalidade); à Grécia (mais de 20% - vinte por cento – do PIB na informalidade); à Romênia (entre 17% - dezessete por cento - e 21% - vinte e um por cento - do PIB na informalidade); à Lituânia (18,9% - dezoito inteiros e nove décimos por cento – do PIB na informalidade); à Hungria e à Letônia (ambos com 18% - dezoito por cento - do PIB na informalidade).

Assim, se em um primeiro momento o mercado informal compunha a realidade de países em desenvolvimento e, nesses, correspondia à ocupação das pessoas sem qualificação técnica ou profissional, atualmente atinge em larga escala também os países desenvolvidos, sendo integrado por uma heterogeneidade de trabalhadores, que vão desde aqueles sem qualquer nível de instrução, até os que possuem formação superior e especializada.

Ademais, não raras vezes a informalidade é concebida como causa e efeito da pobreza e da miséria, posto ser um dos principais fatores de exclusão social. Por essa razão, além de se revelar tema de crucial importância para o direito previdenciário, integra, juntamente com o trabalho infantil e escravo, o rol de prioridades dos programas desenvolvidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).

Nesse sentido, tendo em vista que o trabalho informal corresponde à atividade desempenhada à margem da regulamentação legal, foi eleito como método de estudo o exame lógico-sistemático do tema, com base em regras e preceitos estruturais dos sistemas de seguridade e de previdência social em vigor, além dos objetivos e fundamentos da Ordem

3 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Brasil tem mais de 10 milhões de Empresas na

informalidade - A economia informal gerou, em 2003, R$ 17,6 bilhões de receita e ocupou um quarto dos

trabalhadores não-agrícolas do País. Disponível em:

<http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=366&id_pagina=1&titulo=B rasil-tem-mais-de-10-milhoes-de--Empresas-na-informalidade>. Último acesso em 01 de novembro de 2010. Último acesso em 01 de novembro de 2010.

4 Últimas notícias UOL. Mercado de trabalho informal envolve 25% dos europeus. Disponível em: <http://

(11)

Social e da República Federativa do Brasil. Através da doutrina previdenciária pátria e estrangeira, bem como do direito posto, no que diz respeito às fontes de pesquisa, busca-se questionar a efetividade do sistema de previdência social, diante da expansão do mercado informal de trabalho.

Para tanto, parte-se da concepção do Direito como um sistema comunicacional, tal como proposto por Paulo de Barros Carvalho. Enfatizando-se que o Direito cria, através das regras sintáticas que lhe são próprias, uma realidade distinta e mais restrita que a social, será analisado criticamente se há, de fato, interação dialógica - ou autopoiese -, entre os sistemas previdenciário e social atuais.

Ademais, pontuando-se que a incidência normativa não ocorre de forma automática e infalível, dependendo, antes, de uma mente humana que realize as operações de subsunção e imputação, através da representação do fato social na linguagem da facticidade jurídica, será contrastada a inexistência de representação do trabalho informal em linguagem competente, frente à necessidade de formalização mínima do fato social, para que seja possível a sua regulamentação pelo Direito; limitação que se constata até mesmo na esfera dos direitos sociais.

Desta feita, serão explicitados no primeiro capítulo os principais aspectos da teoria comunicacional defendida por Paulo de Barros Carvalho, a fim de melhor evidenciar o corte epistemológico realizado no objeto de estudo.

No segundo capítulo, procura-se ressaltar a relação entre os mecanismos de proteção social e a organização das relações de trabalho, com a forma de Estado e a ideologia político-econômica adotada, o que se faz mediante digressão histórica que remete ao fim do feudalismo. Nesse mesmo capítulo, atentando-se à relevância do estudo interdisciplinar, serão elucidadas algumas das causas socioeconômicas do trabalho informal apontadas pelas Ciências Econômicas e Sociais, ramos que mais intensamente se relacionam com o Direito.

(12)

No quarto capítulo, procura-se esclarecer sob o ponto de vista lógico-sistemático, a qual dos subsistemas de seguridade social atualmente em vigor o trabalhador informal, na hipótese de inclusão, melhor se enquadraria. Esse exame se revela necessário, na medida em que não raras vezes é sugerida como forma de superação da informalidade pelo Direito, a tutela do informal perante o subsistema de assistência social ou, no que diz respeito à previdência social, qualificando-o como segurado facultativo.

Por fim, no quinto capítulo, feito o exame dos dois mais recentes mecanismos de inclusão previdenciária do trabalhador informal introduzidos no ordenamento jurídico positivado, quais sejam, o regime diferenciado dos segurados baixa renda e o regime simplificado dos microempreendedores individuais (MEI), serão tecidas as considerações finais sobre o tema, tendo em vista, como já mencionado, a interação dialógica que se pressupõe entre os sistemas previdenciário e social, bem como sua repercussão na incidência normativa das regras de direito previdenciário.

(13)

CAPÍTULO 1

-DIREITO COMO SISTEMA COMUNICACIONAL

O trabalho informal é fenômeno complexo, cuja causa não pode ser atribuída a um só evento. Questões econômicas, políticas, ideológicas, sociais, filosóficas, dentre outras, são em igual medida responsáveis pela ausência de proteção social desta parcela de trabalhadores, o que repercute negativamente na sua qualidade de vida e no crescimento do país.

Acerca dessa complexidade, pontua Adolfo Furtado5 que o setor informal revela-se não só um conceito em busca de uma teoria, mas também um conceito sem definição.

Inobstante o caráter multidisciplinar do tema, qualquer que seja o enfoque dado, a conclusão a que se chega, em última análise, é a de que a informalidade das relações de trabalho leva ao desamparo jurídico da pessoa ocupada, notadamente nas esferas trabalhista e previdenciária.

Essa questão mostra-se ainda mais desafiadora ao se considerar o Direito como um sistema comunicacional, cuja operacionalização somente ocorre através da linguagem verbal escrita, exigindo-se, portanto, que o fato social esteja representado em linguagem competente a fim de possibilitar a incidência da norma.

Assim, uma das principais dificuldades a se enfrentar no âmbito jurídico, consiste em conciliar um fato social que em sua essência é desenvolvido à margem da lei, à forma de regulamentação exercida pelo Direito, em que a formalização mínima do evento, segundo as regras próprias do sistema, é indispensável.

Outra contradição, decorre da circunstância de que o trabalhador informal no exercício de suas atividades, realiza todos os núcleos da hipótese de incidência das normas desencadeadoras das relações jurídicas de custeio e de benefícios, o que todavia, é insuficiente à sua filiação ao sistema de previdência social.

5 Economia informal e trabalho informal: duas faces da mesma moeda? Brasília: Câmara dos Deputados,

(14)

Importante mencionar que a exigência de formalização do fato social em linguagem competente, segundo a teoria das provas, aplica-se plenamente à esfera dos direitos sociais, na medida em que constituem espécie de relação jurídica entre o cidadão e o Estado.

Diferentemente do que ocorre com os direitos privados, admite-se com maior amplitude a modulação da eficácia jurídica da norma para momento anterior ao da incidência, isto é, quando o fato social efetivamente se verifica no mundo fenomênico; a sua formalização, no entanto, é imprescindível.

Nesse sentido, a fim de melhor esclarecer se os sistemas de seguridade e de previdência social atuais garantem de maneira eficaz a proteção social dos trabalhadores no contexto da informalidade, parte-se do pressuposto de que o Direito é um sistema comunicacional, tal como proposto por Paulo de Barros Carvalho.

Dessa forma, serão delineados a seguir os principais aspectos da doutrina defendida por esse eminente jurista, com especial enfoque nos conceitos de sistema jurídico e de incidência normativa, a fim de melhor evidenciar o corte epistemológico realizado no objeto específico de estudo.

1.1. Questão introdutória

No início do século XX, estudiosos dos mais variados ramos do saber, sob intensa influência dos avanços científicos – como é o caso da Teoria da Relatividade -, tecnológicos e mesmo da evolução cultural experimentada pela sociedade ocidental à época, passaram a despender maior atenção à linguagem como instrumento do conhecimento.

Assim, baseando-se nas discussões trazidas em especial pela Filosofia, áreas como a Física, a Matemática, a Biologia, a Química, a Sociologia e mesmo o Direito, começam a analisar o seu objeto específico de estudo, partindo de duas premissas básicas e inovadoras.

(15)

Esse postulado representou verdadeiro divisor de águas no universo científico, posto que desbancou o mito da verdade unívoca e absoluta, ao mesmo tempo em que atribuiu especial relevância à figura do observador, que passa a influenciar no fenômeno analisado. De um mesmo fato, portanto, levando-se em consideração o contexto em que se insere o fenômeno estudado, conjugado à subjetividade do observador – como ideologia, repertório e objetivos -, diversas conclusões ou pontos de vista podem ser formulados.

O segundo pressuposto verificado nesse período, consiste na necessidade de elaboração de uma linguagem científica própria, distinta daquela adotada no meio social, com vistas à redução de ambiguidades e à precisão linguística. Assim, só haveria que se falar em Ciência onde houvesse rigor linguístico.6

Tendo em vista que o veículo de manifestação do Direito por excelência é a linguagem verbal,7 a influência exercida por esse novo movimento científico foi notória. Áreas como a Filosofia da Linguagem Ordinária, o Neopositivismo Lógico, a Semiologia, a Linguística e a Semiótica, contribuíram sensivelmente para o estudo jurídico, levando à reformulação de postulados básicos, que vão desde a elaboração do texto legal, até a construção da norma jurídica, além do estudo do fenômeno da incidência e da concepção do Direito como um sistema autopoiético.

Desta feita, pensar o Direito à luz da Teoria da Linguagem implica concebê-lo como um “sistema comunicacional”, uma vez que o universo jurídico apenas se operacionaliza através da linguagem verbal escrita.8

A par disso, relevante assinalar a distinção entre língua e linguagem que, no mais das vezes, são empregados como termos sinônimos.

Observa Lúcia Santaella9 que o traço distintivo entre esses dois conceitos, ao contrário do que possa parecer ao leigo, não é o fato de a língua ser forma verbal de comunicação e linguagem modalidade não-verbal, mas sim a abrangência de uma e outra.

6 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. 2ª edição. São Paulo: Noeses, 2008, p.

121.

7 Na medida em que tem como unidade a palavra.

8 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. 2ª edição. São Paulo: Noeses, 2008, p.

162.

(16)

Para a autora, língua10 é o conjunto de códigos alfabético-simbólico que utilizamos para a comunicação; refere-se, portanto, ao que vulgarmente se entende por idioma.

Nesse mesmo sentido, interessante ressaltar a definição trazida por Roland Barthes11 que, sob o ponto de vista da Semiologia e remontando ao contratualismo rousseauniano, sustenta que língua é um sistema de valores contratuais eleitos e aceitos por uma comunidade como válido.

Linguagem, por seu turno, refere-se a toda e qualquer“forma social de comunicação e significação”12 como, por exemplo, os gestos, os sinais, os sons, as palavras, o sistema de comunicação dos surdos-mudos, dentre outros. Evidente, destarte, tratar-se de fenômeno mais abrangente que o anterior.

Diante disso, é possível dizer-se que a linguagem cuja unidade é a palavra, seja ela oral ou escrita, é denominada verbal. Daí atuar o Direito através da linguagem verbal escrita: tem por unidade a palavra, veiculada na forma escrita.

Ainda, por se tratar o Direito de instrumento de regulação das relações interpessoais, cujo fim é a pacificação social, interessante destacar que seu desempenho ocorre por meio de linguagem de sobrenível: com base na linguagem utilizada no meio social e empregando como veículo a língua portuguesa, no caso do Brasil, o universo jurídico, através de regras (sintaxe) que lhes são próprias, cria uma espécie distinta de linguagem, prescritiva de conduta, que não se confunde com a social, a econômica, a filosófica, a política, dentre outras.

Por essa razão, não parece acertado dizer-se que o Direito possui uma língua, mas sim linguagem, mais abrangente e específica, como a seguir se explanará.

1.2. Direito como sistema autopoiético

Tendo em vista que o Direito é constituído por normas jurídicas voltadas tanto à regulamentação de condutas, quanto à organização do seu próprio funcionamento, as quais se

10 SANTAELLA, Lúcia. O que é semiótica. Primeira edição. São Paulo: Brasiliense, 1983, p. 11.

(17)

destinam à realização de um mesmo objetivo, qual seja, a pacificação do convívio social, é possível dizer que se trata de um autêntico sistema.

Sobre essa questão, esclarece Paulo de Barros Carvalho:13

“Assim sendo, as normas jurídicas formam um sistema, na medida em que se

relacionam de várias maneiras, segundo um princípio unificador. Trata-se do direito posto, que aparece no mundo integrado numa camada de linguagem prescritiva. Produto do homem para disciplinar a convivência social, o direito pertence à relação ôntica dos objetos culturais, dirigindo-se, finalisticamente, ao

campo material das condutas intersubjetivas.”

Interessante notar que, segundo o autor, a qualidade de sistema pode ser atribuída tanto ao direito positivo, como à própria Ciência do Direito, esta, entendida como espécie de metalinguagem cujo objeto consiste no estudo das normas jurídicas integrantes do ordenamento vigente.14 Por essa razão, pode a ideia de sistema revelar-se, também, um método de estudo.

De acordo com a teoria comunicacional, para que uma determinada organização possa ser qualificada como sistema, necessária é a presença de uma função e de uma estrutura próprias. De acordo com Fabiana Del Padre Tomé, cujo estudo partiu da teoria defendida por Niklas Luhmann, função corresponde a toda atividade ou ação voltada ao atendimento do objetivo do sistema que, no caso do Direito, refere-se à “estabilização das expectativas normativas”. 15

A estrutura, por sua vez, é a maneira pela qual a função do sistema é atingida, o que pressupõe a existência de um código e de um programa específicos. Na esfera do Direito, o código empregado adota uma estrutura binária, em que as condutas regulamentadas podem ser qualificadas como lícitas ou ilícitas. Já o programa, refere-se ao modo pelo qual a conduta humana poderá ser juridicamente qualificada através do código.16

De se destacar que estando o Direito em constante relação com o universo social, é possível dizer, ainda, que se trata de um sistema autopoiético.

13 Direito tributário, linguagem e método. 2ª edição. São Paulo: Noeses, 2008, pp. 213 e 214.

14 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. 2ª edição. São Paulo: Noeses, 2008,

pp. 212 e 213.

15 Teoria morfológica, sintática e semântica da prova e sua pragmática no processo administrativo

tributário federal. Tese de Doutorado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2005, p. 61.

16 TOMÉ, Fabiana Del Padre. Teoria morfológica, sintática e semântica da prova e sua pragmática no

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A expressão “autopoiese”, originariamente empregada na esfera da Biologia, refere-se à circunstância de que o sistema possui abertura apenas parcial ao meio em que se insere, e com o qual interage.

Assim, a organização interna do sistema é fechada, o que lhe assegura autonomia e independência, razão pela qual as informações vindas do ambiente, se internalizadas, devem ser processadas de acordo com a estrutura que lhe é própria. Através disso, portanto, o sistema altera e é alterado pelo meio.

Acerca dessa clausura organizacional, conclui Clarice Von Oertzen Araujo:17

“Toda a captação dos fatos sociais é filtrada pelos ordenamentos jurídicos

mediante a instituição de procedimentos que condicionam a validade da produção de outras normas no fluxo contínuo da concreção normativa. Os procedimentos estabelecidos para a expansão da malha normativa constituem uma clausura operacional, na medida em que implicam uma seleção e posterior

„tradução‟ dos fatos sociais para o interior do ordenamento jurídico, de forma

organizada. Não a totalidade do contexto social que será traduzida para o interior da ordem jurídica, mas apenas os aspectos selecionados pelos conceitos

normativos.”

Ademais, pontua Fabiana Del Padre Tomé18 que um sistema autopoiético caracteriza-se pela auto-referencialidade, o que lhe garante a capacidade de autogeração. É dizer, o sistema deve necessariamente possuir regras que tratem de sua própria estrutura, para que seja possível atualizar-se, criar-se e evoluir juntamente com o meio.

Sobre essa temática, aduz Clarice Von Oertzen Araújo que:19

“A retroalimentação pode ser positiva ou negativa, conforme a natureza da sua contribuição para a estabilidade das relações no interior do sistema. Se a informação trazida provocar mudanças, a retroalimentação será positiva pois demandará que ele procure atingir um novo equilíbrio homeostático. Se a informação já é conhecida e não provoca mudanças, então a retroalimentação é negativa e contribui para a estabilidade das relações já existentes. Um forte exemplo de retroalimentação, que ocorre geralmente no sentido positivo supra, é a introdução no sistema de novas valorações parciais autônomas, o que acompanha a evolução das sociedades em geral e são consequências naturais do aumento de complexidade das novas relações decorrentes do surgimento de fatos construtivos ou modificativos do sistema.”

17 Incidência jurídica: teoria e crítica. Tese de livre docência. Universidade de São Paulo, 2008, pp. 52 e 53. 18 Teoria morfológica, sintática e semântica da prova e sua pragmática no processo administrativo

tributário federal. Tese de Doutorado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2005, p. 63.

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Aplicando-se esse conceito à esfera do Direito, constata-se que, de fato, constitui-se um sistema autopoiético, posto que influencia e é influenciado pelo universo social em que se insere. Ou, em termos linguísticos, é possível dizer que o sistema de Direito se relaciona com o meio em que se insere, através de interação dialógica.20

Atente-se que, consoante o ponderado por Paulo de Barros Carvalho, o sistema jurídico pode ser considerado uma espécie de categoria lógica, o que exige seja erigido com base em elementos isentos de ambiguidades e contradições, como forma de ser prontamente compreendido e aplicado por seu destinatário.21

A esse mesmo respeito elucida Lourival Vilanova:22

“Quando se toma um sistema de proposições referentes a um determinado universo-de-objetos, se o sistema é científico, deve ele apresentar: i) critérios que permitam decidir se uma dada proposição pertence ou não ao sistema; ii) coerência interna, isto é, compatibilidade entre os elementos proposicionais integrantes do sistema; iii) completude – o sistema contem uma proposição ou a contraditória (...).”

Segundo Fabiana Del Padre Tomé,23 destarte, cabe ao Direito, através de seus códigos e programas, realizar a filtragem e a imunização das influências contraditórias do ambiente sobre o sistema jurídico.

Note-se que um sistema contraditório em si mesmo, torna-se obsoleto, ou redundante, o que, no âmbito jurídico revela sua ineficácia perante o meio social.

Observe-se, por derradeiro, que o Direito como um todo, e cada uma de suas áreas, podem ser concebidos como um sistema, razão pela qual tudo o quanto acima pontuado, acerca

20 Sobre a dialogia do Direito, pontua Clarice Von Oertzen Araujo: “Reconhecer o caráter dialógico do direito

positivo implica inicialmente uma questão de natureza metodológica. Estamos abordando o ordenamento jurídico positivo em sua condição de linguagem, sobretudo em sua condição de texto prescritivo.

(...)

Um discurso normativo assim concebido é imperativo e prescritivo, na media em que exige a participação do destinatário, proibindo-o de ignorar a comunicação. Mas o direito será também um discurso dialógico ao estabelecer as mútuas relações entre orador e ouvinte. O ponto de vista é relacional, e não há mais um único sujeito, mas vozes sociais que interagem na composição do discurso.

A dinâmica dialógica concebida por Mikhail Bakhtin envolve o conceito de compreensão e pressupõe aspectos controversos e complementares das mensagens trocadas entre os sujeitos envolvidos na enunciação, bem como uma atitude responsiva ativa do enunciador e do enunciatário.” in Incidência jurídica: teoria e crítica. Tese de livre docência. Universidade de São Paulo, 2008, pp. 70 e 71.

21 Direito tributário, linguagem e método. 2ª edição. São Paulo: Noeses, 2008, pp. 212 e 213. 22 Estruturas lógicas e o sistema de direito positivo. São Paulo: Noeses, 2005, p. 173.

23 Teoria morfológica, sintática e semântica da prova e sua pragmática no processo administrativo

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do fechamento parcial para o ambiente, e organização lógica de seus elementos, aplica-se a cada um dos subsistemas, inclusive os de previdência e seguridade social, como mais adiante será explicitado.

1.3. Direito e realidade

O “Giro Linguístico”, movimento cultural com origem no início do século XX, significou, de forma bastante sucinta, a passagem da “filosofia da consciência” para a “filosofia da linguagem”.

Com a edição da obra Tractatus logico-philosophicus, de autoria do filósofo alemão Ludwig Wittgenstein, reconheceu-se que o objeto do conhecimento não são os dados da realidade em si, mas sim as proposições que os descrevem, as quais efetivamente se sujeitam à valoração binária verdadeiras ou falsas.

É dizer: a linguagem passa a ser concebida não mais como mero mecanismo de compreensão e descrição da realidade, mas sim como a própria realidade, antecedendo ao próprio objeto a que se relaciona.

A esse respeito afirma Wittgenstein na proposição 5.6 do Tractatus logico-philosophicus que: “os limites de minha linguagem denotam os limites do meu mundo”.24

Dentre as frentes que decorreram desse movimento, destacam-se o Neopositivismo Lógico e a Filosofia da Linguagem Ordinária, que se ocupam, respectivamente, da linguagem científica e da natural - ordinariamente utilizada por uma comunidade.

Para o Neopositivismo Lógico,25 a linguagem é o instrumento do saber científico, só se podendo falar em discurso científico nos textos em que houver precisão linguística, mediante redução de ambiguidades e construção de uma linguagem própria, distinta da natural.

Já a Filosofia da Linguagem Ordinária propõe que apenas ingressa no plano do que denominamos realidade, aquilo que pode ser expresso em linguagem. Passa-se a questionar,

24 WITTGENSTEIN, Ludwig. Tractatus logico-philosophicus. Tradução de José Artur Giannotti. São Paulo:

Nacional, 1968, p. 111.

25 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. 2ª edição. São Paulo: Noeses, 2008,

(21)

portanto, o caráter unívoco e absoluto da verdade, admitindo-se que cada indivíduo possa criar a sua realidade, com base em suas impressões pessoais.

A esse respeito, pondera Gustavo Bernardo que:26

“Aquilo que nos vem por meio dos sentidos e que chamamos „realidade‟ é dado

bruto, que se torna real apenas no contexto da língua, única criadora de realidade. No entanto, como as línguas, plurais, divergem na sua estrutura, divergem também as realidades criadas por elas.”

O Direito, ramo da Ciência que é, não deixou de sofrer as influências trazidas por este movimento, especialmente porque, como anteriormente pontuado, ele apenas se manifesta através da linguagem verbal e escrita.

Sobre o tema, sustenta Tercio Sampaio Ferraz Júnior27 que: “A realidade, o mundo real, não é um dado, mas uma articulação lingüística, mais ou menos uniforme num contexto existencial. (...) A realidade nada mais é do que um sistema articulado de símbolos num contexto existencial”.

Assim, conquanto baseado em linguagem natural,28 o Direito possui linguagem técnica própria que, artificialmente elaborada, cria a sua realidade, distinta da social. Por essa razão, não deve existir, como de fato não há, coincidência entre a realidade social e aquela criada pelo Direito com base nos textos legais, uma vez que esta última é mais restrita.

A esse respeito, esclarece Paulo de Barros Carvalho29 que:

“Ora, como toda a linguagem é redutora do mundo sobre o qual incide, a

sobrelinguagem do direito positivo vem separar, no domínio do real-social, o setor juridicizado do setor não juridicizado. Vem desenhar, enfim, o território da

facticidade jurídica.”

Ainda, no universo do Direito, cada um dos ramos que o integram, dada a sistemática peculiar no tratamento conferido ao objeto da regulação, criam realidades distintas que, embora devam se harmonizar com o sistema jurídico como um todo, não se confundem entre si.

Para Paulo de Barros Carvalho30:

26 Prefácio ao livro de Vilém Flusser. Língua e realidade. 2ª edição. São Paulo: Annablume, 2004, pp. 12 e 13. 27 Introdução ao estudo do direito. 3ª edição. São Paulo: Atlas, 2001, p. 274.

28 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São

Paulo: Saraiva, 2008, p. 13.

(22)

“(...) texto se restringe ao plano dos enunciados enquanto suportes de significações, de caráter eminentemente físico, expresso na seqüência material do eixo sintagmático. Mas não há texto sem contexto, pois a compreensão da mensagem pressupõe necessariamente uma série de associações que poderíamos referir como lingüísticas e extralingüísticas.

Logo, de se concluir que cada contexto cria a sua realidade. Prova disso é a distinção entre os conceitos de trabalhador para o direito previdenciário e aquele adotado pelo direito do trabalho. Ou ainda a definição de família no âmbito previdenciário e aquela eleita pelo direito civil.

Feitas essas considerações iniciais acerca da distinção entre a realidade social e a do Direito, bem como da relevância da linguagem no estudo jurídico, será feito o exame do texto e da norma jurídica, para que só então possa ser enfrentada a questão da incidência jurídica.

1.4. Semiologia, texto legal e norma jurídica

A Semiologia é a área da Teoria da Linguagem que se ocupa do estudo da linguagem verbal, nas suas modalidades oral e escrita. Atua preponderantemente no nível semântico de análise do fenômeno, ou seja, no âmbito da relação entre o objeto e a sua representação através da palavra escrita, bem como da extração de significações. Um de seus principais expoentes foi Ferdinand de Saussure.

A mais relevante contribuição desse movimento para o Direito reside no estudo da elaboração do texto legal e da construção da norma jurídica.

No que tange à elaboração do enunciado legal, a análise semiológica revela-se útil na medida em que o texto positivado é o resultado do processo pelo qual o legislador, com base em linguagem técnica e prescritiva de conduta,31 elabora a representação de fatos sociais tidos como relevantes para o Direito, segundo prévio juízo de valor, com vistas à harmonização do convívio social.

30 Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 18.

31 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São

(23)

Ao mesmo tempo, o texto legal é o alicerce material do processo de interpretação, permitindo ao exegeta elaborar significações que resultam da associação entre a combinação de signos, e os significados que essa conjugação denota.

Sobre o tema, elucida Paulo de Barros Carvalho32 que: “O texto é o ponto de partida para a formação das significações e, ao mesmo tempo, para a referência aos entes significados, perfazendo aquela estrutura triádica ou trilateral que é própria das unidades sígnicas.”

Prossegue o autor, esclarecendo que:33

“Emprego aqui a voz „enunciado‟ como o produto da atividade psicofísica de

enunciação. Apresenta-se como um conjunto de fonemas ou de grafemas que, obedecendo a regras gramaticais de determinado idioma, consubstancia a mensagem expedida pelo sujeito emissor para ser recebida pelo destinatário, no contexto da

comunicação. Outrossim, „oração‟, „sentença‟ e „asserção‟ podem servir-lhe de

equivalentes nominais, mas o vocábulo „proposição‟ convém seja tomado com a carga semântica de conteúdo significativo que o enunciado, sentença, oração ou asserção

exprimem.”

Logo, o papel da Semiologia, como instrumento de construção do maior número possível de significações acerca de um mesmo dado, é patente.

Vale ressaltar, por derradeiro, que também a diversidade de ramos do Direito pode ser identificada sob o ponto de vista semântico,34 posto que é a natureza do fato social eleito pelo legislador como relevante para o Direito que define a natureza jurídica da norma elaborada.

Nessa linha de entendimento, é possível dizer que o direito previdenciário, compreendido como o ramo que tem por objeto a Seguridade Social, situa-se semanticamente na esfera dos acontecimentos sociais que, em razão da ocorrência de um risco socialmente relevante, ocasionam necessidades ensejadoras de proteção pelo Estado (contingência), nas áreas da Saúde, Assistência e Previdência Social.

32 Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 17. 33 Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 22.

34 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São

(24)

1.5. Semiótica, incidência e fato jurídico

Como terceiro ramo da Teoria da Linguagem a ser examinado nesta pesquisa, a Semiótica consiste no estudo de toda e qualquer forma de linguagem, ou dos fenômenos da representação, motivo por que é também conhecida como a “ciência dos signos”.35 Seus

principais representantes são Charles Sanders Peirce e Charles Morris.

Embora também se ocupe dos níveis sintático e semântico de análise, traz como diferencial o estudo pragmático do fenômeno, na medida em que, ademais de inserir a figura do

interpretante na relação entre o objeto e a sua representação pelo signo36 (relação triádica), busca avaliar o liame entre os signos e o seu intérprete.37

Signo é a “unidade e o objeto da semiótica”, relacionando objetos a significados. Interpretante, por sua vez, é “um processo relacional (cognitivo) consubstanciado na idéia gerada pela associação entre o objeto e o signo”;38 trata-se, portanto, de um signo “melhor

desenvolvido”39, referindo-se à significação que se extrai da associação com outros signos e o

objeto.

Desta forma, não é apenas a diversidade semântica das palavras que permite a criação de distintas normas jurídicas a partir de um mesmo texto legal, conforme sustentado pela Semiologia. Segundo a Semiótica, aspectos subjetivos do exegeta – ou intérprete –, tais como o repertório,40 a ideologia, as intenções, o contexto em que se situa, dentre outros, também influenciam nas possíveis significações a serem construídas.

35 ARAUJO, Clarice Von Oertzen. Curso de especialização em direito tributário: estudos analíticos em

homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 335.

36 ARAUJO, Clarice Von Oertzen. Curso de especialização em direito tributário: estudos analíticos em

homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 335.

37 Segundo Clarice Von Oertzen Araujo: “Na terminologia adotada por Morris a pragmática seria o aspecto

semiótico em que são considerados a origem, o uso e os efeitos dos signos; dimensão em que se verifica a relação dos signos com seus intérpretes ou aquilo que os signos expressam.

(...)

O Direito trabalha com as concepções pragmáticas da verdade, na medida em que a linguagem jurídica deve revelar-se útil e eficaz para a solução dos conflitos intersubjetivos.” Incidência jurídica: teoria e crítica. Tese de Livre Docência. Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2008, p. 182 e 185.

38 ARAUJO, Clarice Von Oertzen. Curso de especialização em direito tributário: estudos analíticos em

homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 337.

39 ARAUJO, Clarice Von Oertzen. Incidência jurídica: teoria e crítica. Tese de Livre Docência. Faculdade de

Direito da Universidade de São Paulo, 2008, p. 117.

40 Sobre o conceito de repertório, elucida Clarice Von Oertzen Araujo: “O conceito de repertório é importante

(25)

Ainda, atenta a Semiótica para o fato de que a realidade em si - ou objeto - comporta mais de uma interpretação.

Isso porque, diferentemente da concepção trazida pela ciência clássica, segundo a qual a realidade apresenta-se como um dado absoluto e unívoco,41 sob o ponto de vista semiótico esta revela-se como um poliedro, já que permeada por ambiguidades e imprecisões, apresentando inúmeras e distintas facetas. Nesse sentido, inclusive, afirma-se que o conceito da verdade absoluta é superado, para a Semiótica, pela ideia de relatividade e plurivocidade, além do falibilismo.42

Como exemplo dessa complexidade, é possível citar a morte de uma pessoa, o que acarreta impacto: social, pela perda de um membro da família, de um amigo ou de um colega de trabalho; biológico, representando o fim do ciclo da vida; psicológico, pela dor da perda de um ente querido; religioso, para os que creem na continuidade após a morte; político, refletindo em aspectos como expectativa e qualidade de vida, além das condições sanitárias e de segurança pública de um país; jurídico, desencadeando consequências de natureza civil, tributária, trabalhista, previdenciária, dentre outros. O mesmo é possível dizer, com relação ao trabalho informal, cujas facetas apresentadas, como já anteriormente ressaltado, são inúmeras.

Nota-se que o trabalho do operador do Direito consiste em interpretar não só o enunciado legal, mas também o fenômeno social regulado pela lei, ressaltando-se que ambos comportam uma série ilimitada de significações. E a combinação dessa diversidade de interpretações é o que acarreta a existência de conflitos de interesse e, no âmbito processual, de lide; é, destarte, um dos fundamentos e a razão de ser do Direito.

de experiências – as quais, no universo jurídico, ficam registradas pela jurisprudência.” Semiótica do direito. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 48.

41 Para Edgar Morin: “A ciência clássica constitui-se sobre os três pilares da certeza, que são a ordem, a

separabilidade e a lógica. eram, para ela, fundamentos absolutos. A ordem do universo, como em Descartes ou Newton, era o produto da perfeição divina. Com Laplace, a hipótese de Deus é afastada: a ordem funciona sozinha, é „autoconsolidada‟. Esta idéia de determinismo absoluto foi, também ela, objeto de uma crença quase religiosa entre os cientistas, que se esqueceram que isto era completamente impossível de demonstrar.” A sociedade em busca de valores – para fugir à alternativa entre o cepticismo e o dogmatismo. Lisboa: Instituto Piaget, 1998, p. 240.

42 Sobre o falibilismo, pontua Lúcia Santaella: “Segundo Peirce, não sendo as leis da natureza absolutas, mas

(26)

A interação entre o universo social e as regras de direito positivo, ainda, é o que assegura ao ordenamento jurídico, como já mencionado, o status de sistema autopoiético, na medida em que altera e é alterado pelas relações sociais, evoluindo de acordo com as mudanças de comportamento e de valores ao longo do tempo, em uma determinada comunidade, respeitada a clausura organizacional - ou abertura semântica e fechamento sintático -, do sistema.

Por esta razão, esclarece Clarice Von Oertzen Araujo que: “a aplicação da semiótica contribui para que se atualize e contextualize o desempenho do ordenamento jurídico”.43

Sobre essa temática da interação entre a realidade social e a do Direito, ressalte-se que, ademais de permitir a constante evolução do ordenamento jurídico, é o que assegura, sob o ponto de vista da pragmática, a efetividade da norma jurídica.

Com efeito, não basta ao Direito a edição de normas jurídicas válidas – segundo as regras estruturais de organização -, se estas não cumprirem com sua principal finalidade: regular as condutas intersubjetivas no universo social.

Desta feita, uma norma jurídica que não atinja esse que é o principal propósito do Direito, seja porque não se ajusta ao que efetivamente ocorre na realidade social, seja porque não mais corresponde aos valores tidos como relevantes a uma comunidade, em determinado contexto espaço-temporal, revela-se ineficaz.

O que em termos pragmáticos implica em ineficácia da norma, sob o ponto de vista sistêmico acarreta o estancamento da autopoiese, uma vez que não mais há interação dialógica entre a realidade social e a jurídica.

Assim, cabe ao sistema jurídico, respeitadas suas regras organizacionais, alterar a forma de regulação da realidade social, sob pena de ruína do próprio sistema que, em termos cibernéticos cairá no que se denomina redundância.

Outro ponto de extrema importância no estudo semiótico do Direito reside no campo da incidência da norma jurídica e da constituição do fato jurídico, aspectos que em muito se relacionam à informalidade do trabalho perante a previdência social.

43Incidência jurídica: teoria e crítica. Tese de Livre Docência. Faculdade de Direito da Universidade de São

(27)

Esclarece Paulo de Barros Carvalho44 que a intenção do legislador ao elaborar o texto legal, bem como a finalidade do próprio direito positivo, é fazer com que a conduta geral e abstratamente prevista no enunciado, efetivamente oriente e conduza os comportamentos sociais de uma comunidade, resultando na passagem da norma do plano do “dever-ser” (deôntico) para o mundo do “ser” (ôntico).

Tal objetivo é atingido através do denominado “processo de positivação”, consistente na criação de normas individuais e concretas que de fato regulem as condutas interpessoais, a partir do texto legal positivado. Esse processo é concretizado por meio da incidência da norma jurídica que, ademais de possibilitar a criação da norma concreta e individual, faz nascer o fato jurídico.

O termo “incidência” da norma jurídica foi inicialmente introduzido na Ciência do Direito brasileiro por Pontes de Miranda, sustentando que:45

“Para que os fatos sejam jurídicos, é preciso que regras jurídicas – isto é, normas abstratas – incidam sôbre êles, desçam e encontrem os fatos, colorindo-os, fazendo-os „jurídicos‟. Algo como a prancha da máquina de impressão, incidindo sôbre fatos que se passam no mundo, pôsto que aí os classifique

segundo discriminações conceptuais.”

Na mesma linha de entendimento de Paulo de Barros Carvalho, o eminente jurista alagoano esclarece que o universo do Direito é constituído exclusivamente pelos fatos jurídicos, os quais são o resultado da incidência da norma sobre o suporte fático,46 previsto de forma geral e abstrata na norma jurídica.47 Todavia, a operacionalização do fenômeno da incidência em si é concebida de forma totalmente distinta pelos autores.

Em análise comparativa acerca dos modelos de incidência propostos por Pontes de Miranda e Paulo de Barros Carvalho, observa Clarice Von Oertzen de Araujo48 que, o primeiro, inspirado nos postulados da física clássica, entende a incidência como um acontecimento mecânico, que ocorre de forma automática, infalível e unívoca, independentemente do

44 Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 252. 45 Tratado de direito privado, Tomo I. Rio de Janeiro: Borosoi, 1954, p. 06.

46 Terminologia utilizada por Pontes de Miranda para referir-se aos acontecimentos do universo social.

47 De se observar que para Pontes de Miranda, a norma jurídica também é o resultado da interpretação do texto

legal.

48Incidência jurídica: teoria e crítica. Tese de Livre Docência. Faculdade de Direito da Universidade de São

(28)

conhecimento dos interessados a seu respeito. Existe apenas uma única possível, correta e válida incidência normativa que, em princípio impediria a existência de conflitos de interesse.

Sob o ponto de vista ponteano, portanto, incidência e aplicação da norma são fenômenos que ocorrem em momentos distintos, dependendo da atuação humana apenas este último – a aplicação.

Ademais, se a aplicação da norma pelo operador do Direito harmonizar-se com a incidência, que é única e decorre da própria vontade da lei, será justa; caso contrário, injusta.

Paulo de Barros Carvalho,49 por seu turno, levando em consideração os fundamentos da Teoria Comunicacional e concebendo a realidade social segundo os postulados da ciência moderna, pondera que a incidência jurídica engloba duas operações distintas, quais sejam, a subsunção e a implicação, que ocorrem em momentos diversos.

A primeira, subsunção, consiste na identificação perante o universo social das qualidades ou predicados previstos na norma jurídica de forma geral e abstrata. Já a implicação refere-se ao ato de imputar, ou aplicar, o consequente normativo (prescritor) em sendo verificados na realidade social, os elementos do antecedente (descritor).

Com base nisso, afirma o autor que: “(...) não se dará a incidência se não houver um

ser humano fazendo a subsunção e promovendo a implicação que o preceito normativo determina. As normas não incidem por força própria.”50

Assim, se a incidência depende de uma pessoa humana para se concretizar, tudo o quanto anteriormente assinalado a respeito da interpretação, que é influenciada pela subjetividade do observador do evento, segundo seu repertório cultural, ideologia, valores, interesses e mesmo pelo contexto histórico-temporal em que se insere, deve ser levado em consideração.

A incidência será o resultado da impressão pessoal do aplicador do Direito a respeito tanto do texto legal (criando a norma jurídica), quanto do evento objeto da operação, o qual se apresenta como um dado complexo.

49 Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 11.

50 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São

(29)

Sobre essa questão, observa Clarice Von Oertzen Araujo51 que, através da incidência, ocorre a seleção de uma das faces do fenômeno social analisado, amparada em uma das interpretações possíveis do texto legal.

Para melhor elucidar a distinção entre os modelos de incidência em exame, propõe Paulo de Barros Carvalho como exemplo concreto, o nascimento de uma criança:52

“Pensemos num exemplo singelo: nasce uma criança. Isto é um evento. Os pais,

entretanto, contam aos vizinhos, relatam os pormenores aos amigos e escrevem aos parentes de fora para dar-lhes a notícia. Aquele evento, por força dessas manifestações de linguagem, adquiriu também as proporções de um fato, num de seus aspectos, fato social. Mas não houve o fato jurídico correspondente. A ordem jurídica, até agora ao menos, não registrou o aparecimento de uma nova pessoa, centro de imputação de direitos e de deveres. A constituição jurídica desse fato vai ocorrer quando os pais ou responsáveis comparecerem ao cartório de registro civil e prestarem declarações. (...)”

Assim, se para a concepção ponteana o tão só nascimento é suficiente para desencadear as consequências jurídicas correspondentes, configurando o registro de nascimento mera aplicação da norma, de acordo com Paulo de Barros Carvalho, somente com o assento civil é que, para a realidade do Direito, o nascimento de uma criança passa a existir, podendo, a partir de então, desencadear efeitos jurídicos.

Diante disso, de se destacar que para Pontes de Miranda o fato jurídico consiste, sem maiores digressões, na menor unidade - ou átomo - do universo jurídico, sendo o produto da tão só incidência.

Já Paulo de Barros Carvalho, em uma visão mais atual do tema, entende o fato jurídico como o enunciado linguístico resultante da incidência da norma jurídica sobre o evento, operação que depende inexoravelmente de uma mente humana para ocorrer, devendo, ainda, ser expresso em “linguagem competente” e que esteja de acordo com a teoria das provas (linguagem da facticidade jurídica).

A esse respeito, evento corresponde a todo o acontecimento concreto ocorrido no universo social: o nascimento, a morte, a celebração de um contrato, um acidente de automóveis, dentre outros. Fato, no entanto, consiste em toda a representação linguística acerca de um evento. Se essa representação basear-se na linguagem que utilizamos no dia a dia, no

51Incidência jurídica: teoria e crítica. Tese de Livre Docência. Faculdade de Direito da Universidade de São

Paulo, 2008, p. 116

(30)

contexto do convívio social, teremos como resultado um fato social. De outro norte, se o evento for expresso na linguagem do direito positivo, após a incidência normativa, o que se tem é o fato jurídico.53

Desta feita, para o autor, apenas ingressa no universo jurídico aquilo que for expresso em “linguagem competente”. Tudo o mais representado por linguagem diversa, ainda que a social, não passará de mero evento perante o Direito e, portanto, não desencadeará a produção de qualquer efeito jurídico.

Ainda sobre a distinção entre fato e evento, esclarece Tercio Sampaio Ferraz Júnior54 que:

“É preciso distinguir entre fato e evento. A travessia do Rubicão por César é um evento. Todavia, „César atravessou o Rubicão‟ é um fato. Quando, pois, dizemos que „é um fato que César atravessou o Rubicão‟, conferimos realidade ao evento. „Fato‟ não é, pois, algo concreto, sensível, mas um elemento lingüístico capaz de

organizar uma situação existencial como a realidade.” Nesse mesmo sentido, pondera Fabiana Del Padre Tome:55

“(...) se uma árvore cai e forma um obstáculo à passagem por determinada rua,

mas ninguém toma conhecimento desse evento, não há, no mundo social, o fato correspondente. A partir do momento em que a comunidade fica sabendo da ocorrência de tal fenômeno, tem-se constituído o fato social, por ter sido interpretado por alguém e vertido na linguagem da comunicação social. (...) Em suma, o fato inexiste antes da interpretação. É o ser humano que, interpretando eventos ou até mesmo empregando recursos imaginativos, cria o fato, fazendo-o por meio da linguagem, entendida como o uso intersubjetivo de sinais que

tornam possível a comunicação.”

Insta salientar, por derradeiro, que embora se reconheça a infinidade de significações passíveis de construção na seara do Direito, o que em princípio denotaria a existência de inúmeros fatos jurídicos baseados em um mesmo evento, tal abrangência, dada a finalidade última do Direito, consistente em pacificar o convívio social, deve chegar a um fim.

Portanto, para que os ideários da justiça e da segurança jurídica sejam atingidos, em havendo conflito de interesses é preciso que o Direito, com base nas regras que lhe são próprias

53 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São

Paulo: Saraiva, 2008, p. 12 e 13.

54 Introdução ao estudo do direito. 2ª edição. São Paulo: Atlas, 2001, p. 274.

55 Teoria morfológica, sintática e semântica da prova e sua pragmática no processo administrativo

(31)

estabeleça a verdade, ainda que sob o ponto de vista eminentemente lógico56 como forma de solucionar a questão.

Para tanto, consoante assinalado por Fabiana Del Padre Tome,57 somente através da verificação de correspondência entre linguagens de um mesmo sistema de referência, é dizer, entre o fato e a previsão normativa, o que se afere através dos meios de prova admitidos em Direito, o processo de positivação atinge o seu fim. E neste campo reside a importância da teoria das provas para o Direito.

1.6. Teoria das provas e formalidade

Consoante o ponderado no tópico anterior, para que o Direito cumpra com a sua finalidade de orientar as relações interpessoais, viabilizando o convívio social harmônico em determinada comunidade e em um dado momento histórico, é necessária a concretização do “processo de positivação”. Neste, uma mente humana, identificando os predicados legais contidos no antecedente normativo (subsunção), aplica o previsto no consequente da norma (implicação), fazendo emergir o fato jurídico, único elemento integrante da realidade do Direito.

Para que essa operação seja realizada de forma válida, considerando-se tratar o Direito de um sistema sujeito a regras operacionais próprias (fechamento sintático), é preciso que o evento, ou suporte fático, seja vertido pelo operador do direito em “linguagem competente” e de acordo com a teoria das provas, tal como previsto no ordenamento jurídico vigente.

Assim, a constituição do fato jurídico exige que a descrição de um evento seja realizada em linguagem aceita pelo Direito como hábil para tanto, sob pena de o acontecimento permanecer na condição de evento.

Nesse sentido, elucida Paulo de Barros Carvalho58 que o nascimento de uma criança só existe para a realidade jurídica se expresso em linguagem qualificada pelo direito posto, é dizer, se providenciado o necessário registro civil; caso contrário, se não efetuado o registro ou se este

56 Teoria morfológica, sintática e semântica da prova e sua pragmática no processo administrativo

tributário federal. Tese de Doutorado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2005, p. 44.

57 Teoria morfológica, sintática e semântica da prova e sua pragmática no processo administrativo

(32)

não for elaborado nos termos da legislação registral vigente, não passará esse acontecimento de mero evento para o Direito, a respeito do qual o universo jurídico sequer tomará conhecimento.

Diante disso, é possível dizer que “linguagem competente” é aquela eleita pelo direito positivo como apta a constituir o fato jurídico; é o que permite, destarte, a criação da realidade do Direito.59

Para que se possa falar em fato jurídico é necessário que a linguagem do direito positivo, incidindo sobre a linguagem da realidade social faça emergir a linguagem da “facticidade jurídica”, a qual se apresenta como um ponto de intersecção entre a realidade social e a jurídica:60

“Assim como um evento qualquer, para tornar-se fato, exige relato em linguagem competente, qualquer acontecimento ou mesmo qualquer fato social que pretenda ingressar no reino da facticidade jurídica precisa revestir-se da linguagem própria que o direito impõe. Não é suficiente que ocorra um homicídio. Mister se faz que possamos contá-lo em linguagem jurídica, isto é, que venhamos a descrevê-lo consoante as provas em direito admitidas. Se não pudermos fazê-lo, por mais evidente que tenha sido o acontecimento, não desencadeará os efeitos

jurídicos a ele atribuídos.”

Inobstante exista, em regra, coincidência entre a realidade do Direito e a social, o que se verifica é que se o fato social não for descrito na linguagem preconizada pelo direito positivo, bem como demonstrado segundo os meios de prova inerentes, ainda que notório, não ingressará no universo do jurídico, o que por vezes pode parecer injusto no meio social.

Assim, a linguagem do direito, que é a fonte de sua maior riqueza e complexidade, encontra na teoria das provas a sua principal limitação, razão pela qual verifica-se ser o Direito uma área do conhecimento formal por natureza.

Direito é forma, seja por atuar através de representação da realidade social em linguagem competente, seja por exigir a demonstração pelos meios especificados em lei da

59 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São

Paulo: Saraiva, 2008, p. 12.

60 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência. 6ª edição. São

(33)

existência do fato social, de maneira que somente o fato provado será tido como verdadeiro, na hipótese de conflito de interesses.61

E essa limitação, como já destacado, aplica-se a todas as esferas do Direito, inclusive aos direitos sociais, em que se insere a seguridade social, cuja amplitude apenas se confere por meio da modulação de efeitos da norma jurídica para o passado. A formalização, mesmo dessa espécie de direitos, e ainda que mínima, no entanto, é indispensável à regulamentação jurídica.

61 TOME, Fabiana Del Padre. Teoria morfológica, sintática e semântica da prova e sua pragmática no

(34)

CAPÍTULO 2

-INFORMALIDADE DAS RELAÇÕES DE TRABALHO - HISTÓRICO

Direito é linguagem. E enquanto tal, busca cumprir com sua finalidade última de regular as condutas intersubjetivas, através da realização de valores inerentes a uma comunidade, em um determinado contexto histórico.

Nesse sentido, observa-se que a regulamentação conferida pelo Direito é altamente maleável, amoldando-se aos costumes, aos usos, às tradições e à ideologia em voga nos diferentes períodos da história da humanidade, e com ela evoluindo.

O mesmo é possível dizer acerca da proteção social, cuja forma, alcance e sujeitos tutelados sofreram diversas e sensíveis modificações ao longo do tempo, partindo da auto-proteção, até o atual estágio da seguridade social.

Destarte, a fim de melhor embasar o questionamento acerca dos rumos atuais da proteção social no Brasil diante da informalidade das relações de trabalho, será delineado um breve panorama histórico, que remete ao final da Idade Média, ressaltando-se o liame existente entre as relações de trabalho, as formas de Estado e a ideologia político-econômica dominante em cada estágio da proteção social no país e no mundo.

Busca-se elucidar, ainda, que, embora o trabalho informal seja figura sempre presente na realidade social, assume uma nova conformação a partir da globalização da economia mundial entre as décadas de 1970 e 1980, havendo a coexistência atual do que se denomina “velha”, “neoclássica” e “nova” informalidade.

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