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Tecidos musculoesqueléticos e pele de origem humana: aspectos éticos e legais da produção científica no Brasil

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Academic year: 2021

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os de pesquisa

humana: aspectos é cos e legais da produção

cien fi ca no Brasil

Fernanda Mombrini Piga 1, Maria Carolina Mar ns Mussi 2, Adriana dos Santos Caetano 3, Arsênio Sales Peres 4, Sílvia Helena de

Carvalho Sales Peres 5

Resumo

Este trabalho realizou análise crí ca acerca dos padrões é cos e jurídicos de trabalhos envolvendo casos clíni-cos e pesquisas que u lizaram enxertos de órgãos ou tecidos musculoesquelé clíni-cos e cutâneos publicados em revistas nacionais e internacionais, incluindo ainda dissertações e teses de universidades brasileiras. Foram u lizadas três bases de dados de 2000 até 2010: SciELO, Medline e Bireme. Concluiu-se que muitas vezes os princípios bioé cos e as normas jurídicas não foram adotados quanto à aquisição, a u lização e o descarte de tecidos musculoesquelé cos e cutâneos u lizados em estudos cien fi cos, demonstrando a necessidade de se evidenciar normas é cas e legais para aqueles profi ssionais que u lizarão esse po de material.

Palavras-chave: Bioé ca. Leis. Transplante homólogo.

Resumen

Tejidos musculoesquelé cos y piel de origen humano: aspectos é cos y legales de la producción cien fi ca en Brasil

Este trabajo realizó el análisis crí co de los estándares é cos y jurídicos de trabajos que involucren casos clíni-cos e inves gaciones que u lizaron injertos de órganos o tejidos musculoesquelé clíni-cos y cutáneos publicados en revistas nacionales e internacionales, incluyendo también disertaciones y tesis de universidades brasi-leñas. Se u lizaron tres bases de datos desde el año 2000 hasta el 2010: SciELO, MEDLINE y BIREME. Se con-cluye que a menudo los principios de la bioé ca y las normas jurídicas no se han adoptado en la adquisición, uso y eliminación de los tejidos musculoesquelé cos y cutáneos u lizados en los estudios cien fi cos, lo que demuestra la necesidad de evidenciar las normas é cas y legales para aquellos profesionales que u lizarán ese po de materiales.

Palabras-clave: Bioé ca. Leyes. Transplante homólogo.

Abstract

Musculoskeletal ssues and human skin: ethical and legal aspects of the scien fi c produc on in Brazil

This study performed a cri cal analysis about the ethical and legal standards of papers published in na onal and interna onal journals involving clinical cases and research regarding musculoskeletal and cutaneous or-gans or ssue gra s, also including disserta ons and thesis of Brazilian Universi es. Three databases from 2000 to 2010 were used, which are SciELO, MEDLINE and BIREME. It was concluded that in many cases Bio-ethics principles and legal criteria were not adopted regarding acquisi on, u liza on and disposal of muscu-loskeletal and cutaneous ssues used in scien fi c trials, thus demonstra ng the need of highligh ng ethical and legal standards for those professionals who use this type of material.

Key words: Bioethics. Laws. Homologous transplanta on.

1. Doutorando fernanda.mbp@hotmail.com 2. Doutorando carol.mussi@usp.br 3. Mestre drycca_caetano@hotmail.com 4. Doutor

arsenio@usp.br 5. Doutora shcperes@usp.br – Faculdade de Odontologia de Bauru da Universidade de São Paulo (FOB-USP), São Paulo/ SP, Brasil.

Correspondência

Fernanda Mombrini Piga – Av. Professor Lineu Prestes, 2.227 Cidade Universitária CEP 05508-000. São Paulo/SP, Brasil. Declaram não haver confl ito de interesse.

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Observa-se atualmente na área de engenharia de tecidos a busca da maior efi ciência de materiais e enxertos por meio de novas tecnologias, com a fi -nalidade de contribuir para a saúde individual e o aumento da expecta va e da qualidade de vida da população ¹.

Muitos dos biomateriais u lizados no Brasil ainda são importados, de alto custo para o Estado ou para os próprios pacientes e, portanto, de acesso restrito a pequena parte da população, cujas neces-sidades crescentes podem ser melhor supridas com o desenvolvimento tecnológico que venha generali-zar a u lização de enxertos – os odontológicos em especial – e facilitar seu uso em geral, respeitando- se os pressupostos da bioé ca principialista: benefi

-cência, não malefi -cência, jus ça e autonomia ².

Breve panorama

No Brasil, prevalece o uso de biomateriais ad-vindos de animais. Tal fato decorre, principalmente, da categórica proibição pela Cons tuição brasilei-ra de comercialização e u lização de materiais de procedência humana. A Lei 9.434/97 3, que dispõe

sobre doações de órgãos e procedimentos, veta qualquer comercialização de órgãos ou tecidos de origem humana no país, prevendo sanções penais e administra vas 4.

Esta lei foi regulamentada pelo Decreto 2.268/97 5, que dispõe sobre a remoção de órgãos,

tecidos e partes do corpo humano para fi ns de transplante e tratamento. Este decreto criou o Sis-tema Nacional de Transplantes (SNT) do Ministério da Saúde, com as funções de coordenar, norma zar e fi scalizar todos os transplantes ocorridos no país. A par r de 2002, o SNT credenciou os bancos de tecidos autorizados a coletar, processar, armazenar e distribuir órgãos, tecidos e substâncias humanas para fi ns de transplante, pesquisa e tratamento 1,2.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (An-visa) considerou necessário garan r a qualidade dos processos de triagem, re rada, avaliação, processa-mento, armazenaprocessa-mento, transporte e disponibili-zação, nos padrões técnicos e de qualidade que a complexidade do procedimento requer dos tecidos musculoesquelé cos e tecidos cutâneos de proce-dência humana e seus derivados, a serem u lizados em procedimentos terapêu cos em humanos. Para tal, regulamentou o funcionamento de bancos de tecidos musculoesquelé cos e de bancos de pele de origem humana, por meio de resolução da Diretoria Colegiada – RDC 220/06 6.

Esta resolução determinou o prazo de seis me-ses para adaptação dos bancos de pele e musculo-esquelé cos existentes à nova regulamentação. Em janeiro de 2007, exis am apenas seis bancos de os-sos autorizados: um em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul; dois na capital paulista; um em Marília, inte-rior daquele estado; um na cidade do Rio de Janeiro e um em Curi ba. Ainda não havia bancos de pele autorizados pela Coordenação-Geral do Sistema Nacional de Transplantes

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CGSNT) 4.

Entende-se por banco de tecidos musculoesquelé cos (BTME) o serviço que, com instalações -sicas, equipamentos e recursos humanos e técnicas adequadas, tenha como atribuições a realização de triagem clínica, laboratorial e sorológica dos doa-dores de tecido, re rada, iden fi cação, transporte para o banco, processamento, armazenamento e disponibilização de ossos, tecidos moles (car la-gens, fáscias, serosas, tecido muscular, ligamentos e tendões) e seus derivados, de procedência humana, para fi ns terapêu cos, pesquisa e ensino 6.

O banco de pele (BP) é o serviço que, com instalações sicas, equipamentos e recursos huma-nos e técnicas adequadas, tenha como atribuições a realização de triagem clínica, laboratorial e soroló-gica dos doadores de tecido, re rada, iden fi cação, transporte para o banco, processamento, armaze-namento e disponibilização de tecido cutâneo e seus derivados, de procedência humana, para fi ns terapêu cos, pesquisa e ensino 6.

Para fi ns de pesquisa e ensino, os BTME e os BP poderão disponibilizar tecidos considerados im-próprios para o uso terapêu co, bem como aque-les considerados próprios, desde que priorizadas as demandas com fi nalidade terapêu ca. Os tecidos e seus derivados somente poderão ser disponibiliza-dos para objetos de pesquisa previamente aprova-dos por comitê de é ca em pesquisa 6.

São reconhecidas, hoje, duas situações para a doação de órgãos no Brasil: a de doadores vivos, familiar de até 4o grau de parentesco, e a de órgãos

ou tecidos de doador falecido, determinada pela vontade de familiares de até 2o grau de parentesco,

mediante termo de autorização de doação 1.

A doação de órgãos como rins, coração e córneas é muito divulgada pela mídia, mas pouco se sabe da demanda igualmente grande pela doa-ção de tecidos musculoesquelé cos e cutâneos. O desconhecimento a nge também os profi ssionais da medicina, que ignoram a metodologia u lizada para a re rada de tais órgãos e tecidos ou não con-seguem explicar que o procedimento não altera a

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aparência do corpo – uma preocupação habitual dos familiares 2.

A u lização de materiais de origem humana para a realização de transplantes e enxertos é reco-nhecidamente um diferencial benéfi co em relação aos autoenxertos, haja vista a redução no tempo de cirurgia e anestesia, a redução de perda sanguínea e de possíveis complicações locais como lesão vascular e nervosa, hematoma e dor, muito embora também se reconheça a possibilidade de transmissão de doen-ças, reações imunológicas aos enxertos e altas taxas de infecção, sem contar a discussão que envolve tais ar cios terapêu cos 4. A busca de padrões

técni-cos e de qualidade que a complexidade do método requer é fundamental para a u lização de tecidos e órgãos humanos em concordância com os princípios bioé cos da benefi cência e não malefi cência 7.

O respeito à vida humana exige refl exão é ca refi nada sobre o agir profi ssional, diante do avanço cien fi co e tecnológico e das novas descobertas bio-médicas. Em situação que pessoas, como entes vul-neráveis que são, possam vir a se tornar vulneradas em meio a um conjunto de novidades, recorre-se à bioé ca, orientando os profi ssionais a agir com res-peito à cidadania e aos direitos humanos, tanto na recuperação como na promoção da saúde ². Visando a segurança e a proteção do paciente, levanta- se a discussão sobre a u lização dos biomateriais me-diante a necessidade de garan r tecidos musculo-esquelé cos e tecidos cutâneos de procedência hu-mana e que seus derivados sejam triados, re rados, avaliados, processados, armazenados, transporta-dos e disponibilizatransporta-dos a par r de uma polí ca de vigilância sanitária adequada 7.

Assim, o obje vo do presente trabalho é apre-sentar a análise crí ca dos padrões é cos e jurídi-cos encontrados em ar gos publicados em revistas nacionais e internacionais ou dissertações e teses de pós-graduandos em quatro universidades bra-sileiras, sobre casos clínicos e pesquisas ocorridas no país, nos quais se u lizaram enxertos de pele ou musculoesquelé co.

Método

A pesquisa se baseou em revisão crí ca rea-lizada por levantamento em três bases de dados: Biblioteca Cien fi ca Eletrônica em Linha (SciELO), Literatura Internacional em Ciências da Saúde (Medline) e Biblioteca Regional de Medicina (Bireme), abrangendo o período de 2000 a 2010. Os descritores u -lizados na busca foram: “seres humanos” (human)

and “aloenxerto de músculo” (muscle allogra ); “seres humanos” (human) and “enxerto homólogo de músculo” (homologous muscle gra ); “trans-plante de músculo” and “seres humanos”; “seres humanos” (human) and “aloenxerto de pele” (skin allogra ); “seres humanos” (human) and “enxerto homólogo de pele” (homologous skin gra ); “se-res humanos” (human) and “aloenxerto de ossos” (bone allogra ) e “seres humanos” (human) and “enxerto homólogo de ossos” (homologous bone gra ).

A busca também incluiu bibliotecas digitais de teses e de dissertações das seguintes universidades: Universidade de São Paulo (USP), Universidade Es-tadual de Campinas (Unicamp), Universidade Esta-dual Paulista (Unesp) e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS). A busca foi feita com a fi nali-dade de diminuir o viés da revisão crí ca, posto que nem todas as teses são publicadas em periódicos. Os mesmos termos descritos para os ar gos foram u lizados para essa busca.

Os critérios de inclusão foram: a realização da pesquisa no Brasil; realização no período com-preendido pelo estudo e u lização de pele e/ou te-cidos musculoesquelé cos de origem humana em relato de casos clínicos e pesquisas. Os critérios de exclusão foram a u lização de modelos experimen-tais u lizando animais; pesquisas realizadas fora do Brasil e enxertos u lizando biomateriais comer-cializados.

Na seleção inicial dos estudos foram avaliados os tulos (n=249) e os resumos (n=95), iden fi cados de forma independente e cega, obedecendo rigoro-samente aos critérios de inclusão e exclusão defi ni-dos no protocolo da presente pesquisa. Quando o

tulo e o resumo não eram elucida vos, buscou-se o trabalho completo (n=40), para impedir a exclusão de estudos importantes à revisão crí ca.

Após o delineamento da seleção dos estudos a serem avaliados, es pularam-se os critérios para avaliação dos aspectos é cos e legais acerca da pes-quisa que u lizou enxerto homólogo de pele, mús-culo e osso. Os aspectos é cos avaliados abrange-ram os princípios de benefi cência, não malefi cência e autonomia, além da aprovação da pesquisa por um comitê de é ca. Os aspectos jurídicos analisados foram relacionados à estocagem do material pelo pesquisador ou clínico, à distribuição do material, aos requisitos para aquisição do material e ao des-carte do mesmo. Essas avaliações foram baseadas em portaria do Ministério da Saúde 8, resoluções da

Anvisa 6, e do Conselho Nacional de Saúde 9, cujo

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Resultados

O total resultante da busca, conforme as pala-vras-chave u lizadas, foi de 249 estudos, sendo 217 ar gos encontrados nas bases de dados e 32 teses e dissertações. Dentre os ar gos publicados em revistas nacionais e internacionais sobre estudos realizados no Brasil, 101 foram encontrados na SciELO, 100 na Medline e 17 na Bireme. O termo mais u lizado para transplante dos tecidos pesquisados no presente estu-do entre indivíduos da mesma espécie foi homólogo para o português e allogra para o inglês.

Dentre os 217 ar gos analisados, 21 sa sfazem os critérios de inclusão e exclusão. Das 32 teses e dis-sertações analisadas, quatro sa sfi zeram os critérios de seleção para inclusão na amostra e não haviam sido publicadas em periódicos. Relacionando os estu-dos selecionaestu-dos aos princípios bioé cos inicialmente propostos, encontrou-se que 92% respeitaram a be-nefi cência, 80% a não malefi cência, 8% a autonomia e 27,27% relataram ter sido aprovados por comitê de é ca. O comitê de é ca foi analisado sob dois aspec-tos: um per nente ao aspecto é co da pesquisa e ou-tro, ao cumprimento das normas jurídicas para aquisi-ção de material humano.

Em analogia aos critérios jurídicos, notou-se que 56% não relataram os cuidados com a estocagem dos tecidos u lizados, 32% descreveram esses cuida-dos respeitando as normas padronizadas e 12% não respeitaram tais normas. A análise da estocagem foi pautada na Portaria 1.686/GM 8, levando em

conside-ração o tempo entre a aquisição do material e a sua u lização.

A análise da aquisição dos tecidos de pele e mus-culoesquelé cos mostrou que 48% não especifi caram de onde adquiriram o tecido humano u lizado em suas pesquisas ou relatos de casos clínicos, 32% adquiriram os tecidos de bancos de pele e musculoesquelé cos autorizados e 20% fi zeram a aquisição desses tecidos em outros locais, como, por exemplo, o Serviço de Ve-rifi cação de Óbitos, sobras de cirurgia de hospitais, en-tre outros. Desses tecidos adquiridos de outros locais, 80% desrespeitaram a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde 9, haja vista que não relataram o

uso do consen mento livre e esclarecido. O descarte ou a reu lização dos tecidos musculoesquelé cos e pele não foram relatados em 88% dos estudos analisa-dos e 16% referiram ter u lizado todo o tecido.

Uma das pesquisas u lizou aloenxerto de pele como subs tuto dérmico e avaliou, mediante compro-vação histológica, a evolução clínica do caso, desres-peitando, desse modo, a RDC/Anvisa 220/06 6.

Discussão

Existem normas jurídicas e protocolos para a u lização de transplantes, específi cos para cada po de órgão a ser doado, aceitos universalmente; con-tudo, muitos juristas discutem as leis e fazem consi-derações importantes. Dentre elas, destacam-se al-guns valores que devem ser preservados: a vida, de-vendo o doador ser minuciosamente resguardado; e a dignidade do cadáver, pois este não é um objeto e, apesar de estar sujeito à decomposição, deve ser cercado de respeito, pois con nua representando a qualidade humana da pessoa 10.

A confi rmação do termo de consen mento assinado pelo paciente dependerá da pessoa ter conhecimento acerca do que será realizado na pes-quisa – como no caso de doação em vida. O sujeito não deve estar exposto à situação de pressão, de-vendo voluntariar-se de maneira livre e esclarecida. Nos casos de pacientes que ainda não a ngiram a maioridade ou que não possuem condições de com-preender a situação, a assinatura não dispõe de vali-dade legal. Nesses casos, há a necessivali-dade de auto-rização do representante legal 11.

As leis possuem como obje vo preservar a vida humana, devendo-se recorrer à u lização do trans-plante como conduta terapêu ca quando não hou-ver outro tratamento cabível, sendo claro, no caso de doação em vida, que esta não deverá e não pode-rá causar prejuízo evidente ao doador 10. Rocha 12 e

França 13 ques onaram a doação em órgãos de

pa-cientes vivos, enfa zando a importância de um maior interesse da sociedade em relação aos transplantes de órgãos de cadáver. No Brasil, a pessoa não pode u lizar seu corpo como um objeto seu; e a lei con-dena o comércio de órgãos. A doação deve ocorrer de forma espontânea, desde que não u lizada como fonte de rendimentos 10.

Os bancos de pele, com suas inovações, favo-receram um avanço na u lização de materiais bio-lógicos quando comparados aos tempos passados. A procura por tratamentos com custos menores proporcionou no Brasil a abertura de novos estabe-lecimentos, não fi cando somente na dependência dos materiais biológicos importados 1. Os bancos de

pele são regidos por normas que devem ser respei-tadas pelas pessoas que u lizam tecidos específi cos e próprios para enxertos, sendo necessário escla-recer em trabalhos e em pesquisas o local onde se obteve tais materiais – contudo, muitos ar gos ava-liados no presente trabalho não respeitaram esse critério 6.

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Entre os princípios bioé cos mais invocados aparecem a autonomia, a benefi cência, a não male-fi cência e a jus ça, defendidos por diversos autores e importantes do ponto de vista é co para que de-terminadas pesquisas possam ser consideradas ade-quadas e os direitos dos sujeitos da pesquisa possam ser resguardados 14,15. Existem princípios e leis que

implicam em favorecer direitos e cuidados para os indivíduos envolvidos em pesquisas, poupando-os dos riscos que porventura possam ocorrer, vez que qualquer ato realizado deve ser rever do em bene -cio dos pacientes 16.

Os pesquisadores devem tratar o indivíduo como ser humano e não como objeto, não somente favorecendo seus interesses próprios, mas colabo-rando para o bem-estar daqueles que se dispõem a fazer um tratamento. De acordo com Monte 17, não

se deve deixar de benefi ciar pelo risco de vir a judicar, mas sim evitar tomar como absoluta a pre-dominância do prejudicar sobre o benefi ciar. Ante determinadas circunstâncias, deve-se tomar provi-dências para evitar que as pessoas que irão receber transplantes de material biológico de bancos de pele e tecidos musculoesquelé cos não sofram nenhuma malefi cência.

Diante da análise crí ca que envolveu o padrão é co e jurídico de casos clínicos e pesquisas em for-ma de teses ou ar gos cien fi cos publicados em re-vistas nos úl mos 10 anos, podem-se enumerar os fa-tores envolvidos na violação dos princípios bioé cos e legais por parte dos pesquisadores. Deve-se relatar que na maioria dos trabalhos avaliados os princípios da benefi cência e não malefi cência, valorizando o cuidado e a proteção do paciente em relação aos ris-cos que envolvem a u lização de tecidos cutâneos e musculoesquelé cos homólogos, bem como a preo-cupação em obter esses tecidos em locais autoriza-dos e norma zaautoriza-dos, foram iden fi caautoriza-dos de maneira sa sfatória.

Por um lado, poucas pesquisas e casos clínicos analisados mencionaram o emprego do termo de consen mento livre e esclarecido (TCLE) garan ndo a autonomia dos pacientes envolvidos nos estudos. Por outro, cerca da quarta parte dos estudos relataram que os trabalhos foram aprovados por comitês de é -ca. Porém, os trabalhos e pesquisas envolvendo seres humanos devem atender às exigências é cas e

fi cas fundamentais, dentre elas o emprego do TCLE dos indivíduos-alvo e a proteção a grupos vulneráveis e aos legalmente incapazes (autonomia). Nesse

do, a pesquisa envolvendo seres humanos deverá sempre tratá-los em sua dignidade, respeitá-los em sua autonomia e defendê- los em sua vulnerabilidade.

Outros aspectos, como fi scalização por parte dos hospitais e ins tutos médico-legais onde foram adquiridos os órgãos e tecidos musculoesquelé cos e cutâneos u lizados nos estudos, bem como o des-carte do material que não seria u lizado, também foram ponderados, haja vista que muitos autores omi ram tal informação. Muitas vezes as normas jurídicas não foram seguidas pelos pesquisadores que u lizaram esses tecidos em seus trabalhos

cos, adquirindo-os, u lizando-os e descartando-os de maneira ilegal. Deste modo, profi ssionais, pes-quisadores e ins tuições devem atuar de maneira mútua na disponibilização, manipulação e descarte de tecidos musculoesquelé cos e tecidos cutâneos de procedência humana, bem como seus derivados. Tal processo visa garan r que esses tecidos sejam triados, re rados, avaliados, processados, armaze-nados, transportados e disponibilizados dentro dos padrões técnicos e de qualidade que a complexida-de do procedimento requer, cumprindo os preceitos lícitos caracterís cos desta a vidade.

Portanto, sinalizar os pontos posi vos e vos dos trabalhos que u lizaram materiais advin-dos do corpo humano pode contribuir para maior exigência por parte das revistas e orientadores de teses, bem como maior cobrança para que todos os casos clínicos e pesquisas tenham aprovação de comitês de é ca, obedeçam aos aspectos legais de obtenção, armazenamento, descarte dos tecidos e órgãos de procedência humana e o cumprimento dos princípios bioé cos, permi ndo uma atuação de maneira mais é ca dos profi ssionais e sob as nor-mas legais.

Considerações fi nais

Após análise dos ar gos incluídos na presen-te revisão crí ca, pode-se concluir que muitas vezes os princípios bioé cos e as normas jurídicas não são adotados quando da aquisição, u lização, descarte de tecidos musculoesquelé cos e tecidos cutâneos u li-zados em estudos cien fi cos, demonstrando a neces-sidade de se evidenciar normas é cas e legais para os profi ssionais que u lizarão esse po de material.

Do mesmo modo, verifi cou-se que o expres-sivo desenvolvimento de biomateriais para u liza-ção em clínica odontológica na úl ma década tem representado poderoso instrumento terapêu co nas a vidades cirúrgicas, que, no entanto, apesar dos comprovados bene cios, exige cuidados é cos criteriosos na análise da relação risco-bene cio que cada biomaterial possa apresentar. Para isso,

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atualmente, a bioé ca principialista oferece fer-ramentas de estudo e refl exão é co-moral, a fi m de nortear a atuação profi ssional, no respeito à moral e à jus ça. De tal constatação se depreen-de, portanto, que o es mulo ao ensino, estudo e à

refl exão bioé ca revelam-se indispensáveis na clí-nica para todos os que exercem a profi ssão – que implica no cuidado às pessoas em circunstâncias especialmente vulneráveis, tanto no acesso como na busca da saúde.

Referências

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fevereiro de 1997, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fi ns de transplante e tratamento e dá outras providências. 1997 [acesso nov. 2012]. Disponível: h p://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1997/D2268.htm

6. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução RDC no 220 de 27 de dezembro de 2006.

[Internet]. Dispõe sobre o regulamento técnico para o funcionamento de bancos de tecidos musculoesquelé cos e de bancos de pele de origem humana. 2006 [acesso nov. 2012]. Diponível: h p://www.anvisa.gov.br/legis/resol/2006/rdc/220_06rdc.htm

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Par cipação dos autores no ar go

Silvia Sales Peres e Arsênio Sales Peres orientaram todas as etapas do trabalho, análise dos dados e redação fi nal do ar go; Fernanda Piga e Maria Carolina e Mussi foram autoras da concepção teórica, coleta, análise preliminar dos dados e redação inicial do texto; Adriana Caetano colaborou na coleta, análise de dados e atualização da revisão de literatura, bem como na discussão dos dados e revisão crí ca do texto.

Recebido: 10.2.2012 Revisado: 3.8.2012 Aprovado: 16.11.2012

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Anexo

Portaria no 1.686/GM, de 20 de setembro de 2002:

“Estocagem de tecidos processados e liberados. Os tendões e fáscias devem ser ultracongelados a 80°C nega vos por período de no máximo 2 anos. Os me-niscos podem ser estocados a 80°C nega vos com viabilidade de no máximo 4 semanas, liofi lizado com prazo de validade de 5 anos ou a 4°C (+/- 2°) com meio de cul vo por período de 5 dias. Os tecidos os-teocondrais processados e refrigerados devem ser estocados em refrigeradores a quatro +/- 2° Celsius em prazo máximo de trinta dias (em meio que per-mita manter certa viabilidade de condrócitos). Os tecidos ósseos devem ser armazenados a tempera-tura igual ou inferior a 80°C nega vos por período máximo de 5 anos. Caso a temperatura de armaze-namento seja entre 20° e 40° C nega vos, o tempo de armazenamento deve ser de no máximo 6 meses. Quedas de temperaturas transitórias por período in-ferior a 12 horas não inviabilizam os tecidos ósseos. Os tecidos ósseos liofi lizados podem ser armazena-dos a temperatura ambiente por período de 5 anos.”

Resolução no 196, de 10 de outubro de 1996, do

Conselho Nacional de Saúde: “II.11 - Consen

men-to livre e esclarecido – anuência do sujeimen-to da pes-quisa e/ou de seu representante legal, livre de vícios (simulação, fraude ou erro), dependência, subordi-nação ou in midação, após explicação completa e pormenorizada sobre a natureza da pesquisa, seus obje vos, métodos, bene cios previstos, potenciais

riscos e o incômodo que esta possa acarretar, formu-lada em um termo de consen mento, autorizando sua par cipação voluntária na pesquisa.”

Resolução da Diretoria Colegiada – RDC no 220, de

27 de dezembro de 2006: “Art. 5° Para efeito desta

RDC, a iden fi cação, o processamento, o armaze-namento e a disponibilização para distribuição dos tecidos e seus derivados para uso alogênico são atri-buições que devem ser realizadas exclusivamente pelos BTME/BP.”

“23.2. Os tecidos somente serão disponibilizados para pesquisa com solicitação documentada do pesquisador que o u lizará, que deve apresentar documento que comprove a aprovação do projeto de pesquisa por comitê de é ca em pesquisa, e que contenha seus dados (nome completo, RG, endere-ço, telefone, vínculo acadêmico ou profi ssional), lo-cal onde será realizado o projeto, caracterís cas e quan dade do tecido solicitado, data prevista para u lização dos tecidos, e declaração do pesquisador reconhecendo a impossibilidade de uso destes teci-dos para pesquisa clínica em humanos.”

“24.4. Os tecidos distribuídos não podem ser

rear-mazenados ou des nados a uso terapêu co em ou-tro receptor, bem como ao uso em projetos de pes-quisa ou ensino, devendo ser descartados.”

Referências

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