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O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS

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Academic year: 2019

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LUCIANA ESTEVAM BARONE BUENO

O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS

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CENTRO DE ARTES

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARTES VISUAIS

LUCIANA ESTEVAM BARONE BUENO

O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS

Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós–Graduação em Artes Visuais, Linha de Pesquisa em História, Teoria e Crítica da Arte; do Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina.

Orientadora: Profa. Dra. Sandra Makowiecky

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O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS

Esta dissertação de mestrado em História, Teoria e Crítica da Arte foi considerada _______________ pelo Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais do Centro de Artes da Universidade do Estado de Santa Catarina.

BANCA EXAMINADORA

Orientador:

Profa. Dra. Sandra Makowiecky UDESC-SC

Avaliador:

Profa. Dra. Rosângela Cherem UDESC-SC

Avaliador Externo:

Prof. Dr. Artur Freitas FAP-PR

Avaliador Suplente:

Profa. Dra. Sandra Ramalho e Oliveira UDESC-SC

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Aos meus pais, Antonio e Maria Gabriela, pessoas fundamentais em minha vida, que me ensinaram a não desistir, por mais difícil que seja uma situação, com fé e coragem iremos vencer.

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AGRADECIMENTOS

Tudo nesta vida é construído a partir de várias pessoas, umas com funções

mais destacadas, outras menos, mas, como num espetáculo teatral, cada papel é

fundamental. Esta dissertação só pôde ser concluída a partir da colaboração de muita

gente, muitas foram as palavras de conforto, força, carinho, compreensão. Muitas foram

as idéias, livros emprestados, galhos quebrados no trabalho.

Primeiramente, quero agradecer a Deus, pela oportunidade de realizar este

desejo de conseguir entrar, freqüentar e concluir o mestrado. Quero agradecer ao

Marcio, meu esposo, pela força, pela ajuda, pela paciência e pela função de pãe em minha falta. Ao meu filho Davi, por ter perdoado minha ausência e pelas vezes que

deixei de brincar, de contar histórias..., aos meus pais e à minha irmã Sônia que sempre

me deram total apoio a cada passo dado, obrigada também pelas orações.

Agradeço aos amigos, Lizete, Giovana, Gilmar e Dulcirene, vocês foram

mais que amigos, foram maravilhosos.

Agradeço ao pequeno Daniel, por ter chegado durante o mestrado e ter

aliviado meus pensamentos, me dado momentos de paz, abrandado meus anseios,

mesmo aumentando meu trabalho. A todos vocês, muito obrigada, de todo o coração e

meu amor eterno.

Agradeço, com especial carinho, às amizades adquiridas durante a

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muito obrigada, não apenas pelo incentivo e por ter acreditado em mim, mas também

pelo profissionalismo, dedicação e amizade que conduziram nossas orientações.

Agradeço pelas trocas de idéias, e aos professores pelos conhecimentos

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Nossos sonhos só serão realizados quando a nossa fé ultrapassar a nossa ousadia.

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(Mestrado em Artes Visuais, Linha de Pesquisa em História, Teoria e Crítica da Arte) – Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais (PPGAV) do Centro de Artes (CEART) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), Florianópolis, S.C.

RESUMO

Ao inventar o passado a cidade constrói o futuro, suas particularidades arquitetônicas são caracterizadas pelo passado que é possível de se enxergar. Este trabalho teve como pretensão buscar na cidade de Curitiba um passado que deixou vestígios no presente. No século XIX inicia-se no Paraná uma preocupação por parte de alguns intelectuais em relação à identidade cultural do Estado. Na década de 20, um grupo de pessoas incomodadas ainda pelo fato do Estado do Paraná não possuir em si traços regionais, idealizam o Movimento Paranista, destacando, entre outros, o escritor Romário Martins e os artistas plásticos Lange de Morretes e João Turin. Uma das características do discurso dos idealizadores do Paranismo era de integrar todos os indivíduos que adotassem o Paraná como sua terra, sendo eles paranaenses, brasileiros ou imigrantes. O Movimento foi divulgado na cidade de Curitiba com a intenção de atingir a todo Estado do Paraná através de lendas, artigos publicados e principalmente por meio das Artes Visuais, que foram seu principal veículo de exposição. Ícones e estilizações foram espalhados por toda cidade de Curitiba, chegando a ser reconhecido entre seus criadores como o “estilo paranista”, com a intenção de convencer a toda população de que, a partir daquele momento, imagens do pinheiro, da pinha e do pinhão eram efetivamente os símbolos do Paraná. Posteriormente também a gralha-azul, remontando à mesma, uma possível preservação dos pinheiros. Apesar do movimento paranista se restringir à Curitiba, os paranaenses ainda hoje em geral reconhecem os símbolos paranistas, apesar de desconhecerem sua história. Esta aceitação da população paranaense, em especial a curitibana, é fortalecida também graças a algumas atitudes posteriores ao Paranismo que acabaram perpetuando as idéias do mesmo; podemos citar os incentivos às leis e à cultura por parte de governantes e representantes do Estado e de colaboradores em relação ao resgate da tradição e simbologia paranaense. Porém é inegável que o agente principal da permanência dos símbolos paranistas foi mesmo a produção artística que se gerou durante as décadas de 20 e 30, bem como a produção gerada após o movimento, propiciando um Neo-paranismo; este e suas idéias e alternativas diferenciadas, proporcionaram aos símbolos paranaenses resoluções inovadoras que, provavelmente, jamais foram imaginadas por seus primeiros idealizadores.

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ABSTRACT

In inventing the past, city constructs future, its architectonical particularities are characterized by the past that is possible to see. This work had as pretension to search, in the city of Curitiba, a past that left vestiges in the present. In the 19th century, some

intellectuals from Paraná start to worry about the State’s cultural identity. In the 20’s, a group of uncomfortable people yet by the fact that the state of Paraná did not have regional traces itself, they idealize the Paranista Movement, highlighting, among others, the writer Romário Martins and the plastic artists Lange de Morretes and João Turin. One of the Paranismo idealizers’ speech’s characteristics was to integrate all individuals who adopted Paraná as their own land, no matter if they were paranaenses, Brazilians or immigrants. The Movement was divulged in the city of Curitiba, intending to reach all state of Paraná, through legends, published articles and mainly through Visual Arts, which were their main exposure vehicle. Icons and stylization were spread all over the city of Curitiba, even being recognized among its creators as the “paranista style”, intending to convince all population that from that time on, images of the pine tree, the pine and the pine fruit were effectively Paraná’s symbols. Later on, also the blue crow as a possible preservation of the pine trees. Despite the paranista movement to be restricted to Curitiba, paranaenses usually still today recognize paranistas’ symbols, despite the fact that they did not know its history. This acceptance of the paranaense population, specially the curitibana, is strengthened also due some attitudes posterior the Paranismo which perpetuated its ideas, being able to cite the law and culture’s inducements from the government and State’s representatives and collaborators in relation tradition’s rescue and paranaense symbology. However it is undeniable that the main agent of the paranistas symbols’ permanence was the artistic production generated after the movement, allowing a Neo-paranismo, this, with alternative and differentiated ideas, allowed paranaenses symbols innovative resolutions that, probably, were never imagined by their first idealizers.

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LISTA DE IMAGENS

Imagem 01 - Pinheiros– A Romário Martins - Artur Nísio...42

Imagem 02 - O baile das raças - Hermann Schiefelbein (1933)...50

Imagem 03 - Lavando Roupa - Alfredo Andersen (s.d.)...57

Imagem 04 - A Queimada [Lavadeiras] - Alfredo Andersen (s.d.)...58

Imagem 05 - Túmulo de André de Barros - João Turin.....60

Imagem 06 - Baixo relevo “Caridade” - João Turin (1923)...60

Imagem 07 – Foto de João Guelfi, João Turin e Zaco Paraná...63

Imagem 08 - O SemeadorZaco Paraná (1923)...68

Imagem 09 - Ilustração Paranaense ano II nº. 01, Janeiro de 1928...70

Imagem 10 - Ilustração Paranaense ano II, nº. 05 / maio de 1928...70

Imagens 11, 12, 13, 14 e 15 - Estilizações de Lange de Morretes....………..74

Imagem 16 - Depois da Tormenta - Frederico Lange de Morretes (1930)...75

Imagem 17- Rei SolitárioFrederico Lange de Morretes (1953)...78

Imagem 18 - Paisagem com Pinheiro - Frederico Lange de Morretes (1929)...79

Imagem 19 - A Natureza - Frederico Lange de Morretes (s/d.)...80

Imagem 20 - Alma da Floresta - Frederico Lange de Morretes (1927-1930)...81

Imagem 21 - Auto Retrato ParanistaJoão Turin (década de 20)...84

Imagem 22 - Ânfora ParanaenseJoão Turin...86

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Imagem 25 - Capitel Paranaense IIJoão Turin...87

Imagem 26 – “Ilustração Paranaense” – Janeiro de 1928...88

Imagem 27 - Capitel Grego da Ordem Jônica...89

Imagem 28 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin (1928)...92

Imagem 29 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin (1928 - detalhe)...92

Imagem 30 - Salão Paranaense - Projeto de João Turin (1928 - detalhe)...93

Imagem 31 - Casa Ateliê - Modelo entrando no ateliê...94

Imagem 32 - Casa Ateliê...95

Imagem 33- Fachada da casa do Dr. Bernard Leinig - João Turin (1928)...96

Imagem 34 - Casa do Dr. Bernardo Leinig (outro ângulo) - João Turin (1928)...96

Imagem 35 - Estudo para Chafariz Paranaense – João Turin (década de 20)...98

Imagem 36 - Revista “Ilustração Paranaense” - ano II nº10 e 11- out/nov 1928...99

Imagem 37 - Homem Vitruviano - Leonardo da Vinci.....99

Imagem 38 – círculos - esquema Luciana Barone...101

Imagem 39 – triângulos – esquema Luciana Barone...101

Imagens 40, 41 e 42 - Moda Paranaense – João Turin (década de 20)...101

Imagem 43 - Acessórios para Moda Paranaense – João Turin (década de 20)...102

Imagens 44 e 45 - Sombrinha Paranaense – João Turin (década de 20)...103

Imagem 46 – Logomarca criada por Poty Lazzaroto...109

Imagem 47 - 300 gralhas para Curitiba - Rogério Dias...110

Imagem 48 - Rosácea do pátio do Museu Alfredo Andersen...113

Imagem 49 - Praça Osório, desenho de Lange de Morretes ao redor do relógio...114

Imagem 50 - Rosácea da Praça Osório...114

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Imagem 53 - Praça Dr. João Cândido. Calçada externa com motivo paranista....……116

Imagens 54 – Tapete Paranista – Bússola...117

Imagem 55 - Tapete Paranista –Rosácea...……….117

Imagem 56 - Tapete com motivos inspirados na obra de Lange de Morretes...118

Imagens 57 e 58 - Memorial de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais - Maria Inês Di Bella (1993)...119

Imagem 59 - Túmulo da Família Stenghel...121

Imagem 60 e 61 - Túmulo da Família Stenghel...122

Imagem 62 e 63 - Centro Cultural Solar do Barão...122

Imagem 64 - Champagnat Shopping...124

Imagem 65 - Fachada principal do Champagnat Shopping...125

Imagem 66 - Calçada de entrada do Champagnat Shopping...125

Imagens 67 e 68 - Painéis da entrada do Champagnat Shopping...126

Imagens 69 e 70 - Decoração do Champagnat Shopping...127

Imagens 71 e 72 - Peças da mobília do Champagnat Shopping...127

Imagens 73 e 74 - Peças da mobília do Champagnat Shopping...128

Imagem 75 - Memorial Cidade de Curitiba - Escadaria em forma de Pinheiro ...129

Imagem 76 - Memorial Cidade de Curitiba. Rio de Pinhões...130

Imagem 77- Urna Paranista. Arca dos 300 Anos...131

Imagens 78, 79 e 80 - Bijuterias criadas pela designer Suelli Zavvadinack...132

Imagens 81, 82 e 83- Bijuterias criadas pela designer Suelli Zavvadinack. ...133

Imagens 84 e 85 - Troféu “Prêmio João Turin” - Valdir Francisco...134

Imagem 86 - Cartaz de divulgação da Exposição “Resgate Icongráfico/Paranismo”...135

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Imagem 89 - Cafés - Lirdi Jorge.....138

Imagem 90 - Série: Paraná-Pinheiros-Pinhões (1982) - Lirdi Jorge...138

Imagem 91- Série: Paraná-Pinheiros-Pinhões (1982) - Lirdi Jorge...138

Imagem 92 - A Gralha Azul Escondida... (1982) - Lirdi Jorge...138

Imagem 93 - Vamos ajudar a gralha - Lirdi Jorge...138

Imagem 94 - Estudo para Instalação - Sérgio Monteiro de Almeida...140

Imagem 95 – Instalação - Sérgio Monteiro de Almeida...140

Imagem 96 - Instalação - Sérgio Monteiro de Almeida...142

Imagem 97 - Álbum de gravuras - Sérgio Monteiro de Almeida...143

Imagem 98 -Intervenção urbana / performance - Sérgio Monteiro de Almeida...143

Imagem 99 - Papel impresso com pedras da rua XV- Sérgio Monteiro de Almeida..144

Imagem 100 - Monumento ao Primeiro Centenário do Paraná - Napoleon Potyguara Lazzarotto ...147

Imagem 101 -O Paraná (1987) - Poty Lazzarotto....148

Imagem 102 - Curitiba e sua gente - Poty Lazzarotto....150

Imagem 103 - Curitiba e sua gente - Poty Lazzarotto....150

Imagem 104 - O Alimento - Ida Hannemann de Campos...152

Imagem 105 Pesquisa I - Ida Hannemann de Campos...153

Imagem 106 - Mural da Praça do Asilo São Vicente de Paula - Ida Hannemann de Campos...153

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...15

CAPÍTULO I - A CIDADE DE CURITIBA E O PARANISMO......20

1.1 O Paranismo...25

1.2 O Vocábulo...27

1.3 O Centro Paranista...29

1.4 Os Imigrantes...33

1.5 O Simbolismo e o Paranismo....35

1.6 O Pinheiro, a Pinha e o Pinhão...41

1.7 A Inserção de um Novo Símbolo – A Gralha Azul...44

CAPÍTULO II: O PARANISMO E AS ARTES VISUAIS...48

2.1 O Paranismo e o Modernismo Paulista...51

2.2 As Escolas de Mariano de Lima e Alfredo Andersen...54

2.3 Os Artistas Plásticos e as produções paranistas das décadas de 20 e 30...59

2.4 João Ghelfi – um Semeador...63

2.5 Zaco Paraná e O Semeador...65

2.6 Lange de Morretes...71

2.6.1 Lange de Morretes – A busca por um método...73

2.6.2 Lange de Morretes e a Pintura...76

2.7 João Turin...82

2.7.1 João Turin e as propostas de arquitetura e decoração...85

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CAPÍTULO III – O PARANISMO VISUALMENTE PRESENTE APÓS AS

DÉCADAS DE 20 E 30...105

3.1 Curitiba e o Incentivo à Cultura e à Tradição...107

3.2 As Calçadas Curitibanas e as Idéias de Lange...112

3.2.1 As Idéias de Lange de Morretes além das calçadas...117

3.3 A Arquitetura em Curitiba e os Vestígios de Turin...120

3.3.1 Paranismo Além das Idéias de Turin...123

3.3.2 João Turin presente nos Acessórios e na Moda...132

3.4 Os artistas, as exposições e a simbologia paranista após a década de 80...134

3.4.1 Sérgio Monteiro de Almeida - um paranista dos anos 90...139

3.4.2 Napoleon Potyguara Lazzarotto e os painéis com símbolos paranistas...145

3.4.3 Ida Hannemann de Campos - uma eterna paranista...151

CONSIDERAÇÕES FINAIS...155

REFERÊNCIAS...167

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa pretendeu abordar o momento em que intelectuais curitibanos denominados “paranistas” empenharam-se, estimulados pelo fato do Estado não possuir traços próprios regionais específicos, em inventar uma tradição para o Paraná , idealizando o Movimento Paranista. Este, além da inserção do imigrante como componente da família paranista, teve como iniciativas principais atitudes de valorização do Estado do Paraná, onde divulgavam suas qualidades e idealizações de um Paraná melhor para o trabalho, em busca da ordem, rumo ao progresso, através da bondade e da justiça. Os projetos paranistas foram anunciados através de artigos publicados em revistas e jornais, porém a principal estratégia do Movimento Paranista para atingir o “imaginário-popular” foi utilizar-se das artes visuais, propondo uma alfabetização visual não formal, ou seja, não escolar. Estilizações, decorações e ícones foram alastrados por toda cidade de Curitiba, capital do Estado, com a intenção de convencer toda população de que, a partir daquele momento, imagens do pinheiro, da pinha e do pinhão eram efetivamente os símbolos do Paraná.

O fato de ser paranaense e de morar quase que minha vida toda no interior do Estado me estimulou a estudar este assunto que nunca me foi apresentado nas escolas públicas onde estudei. Ouvi sobre “Paranismo” pela primeira vez quando, já formada na faculdade, participei de um simpósio na capital1. Descobri então que existia um movimento que se declarava paranaense e mantinha-se restrito a Curitiba, pelas obras públicas que compunham a mesma. Porém, mesmo sem acessar o interior paranaense, o Paranismo se faz presente em todo Estado, pois os paranaenses em geral reconhecem seus símbolos e desconhecem sua história. Eu mesma cresci reconhecendo os símbolos paranaenses como verdadeiros representantes do meu Estado.

1 Simpósio: Cultura e Arte Educação para Cidadania. Paranismo 70 anos. Centro Juvenil de Artes

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Assim, a partir de uma curiosidade em saber mais sobre este assunto, comecei um estudo em torno do Movimento Paranista. Minha leitura inicial foi a obra de Luis Fernando Lopes Pereira, “Paranismo: O Paraná Inventado; cultura e imaginário no Paraná da I República”. O autor aponta em seu trabalho as particularidades existentes no Estado do Paraná principalmente em relação ao republicanismo anticlerical e positivista, destacando a participação do Movimento Paranista na tentativa de forjar a identidade regional para um Estado que era considerado apenas uma parcela de terra sem fronteiras definidas, cuja população heterogênea não possuía quaisquer características em comum. Pereira faz uma relação do recurso utilizado pelos paranistas - ou seja, as artes visuais - para construção da identidade regional, com a obra de José Murilo de Carvalho “A formação das almas”, onde o autor apresenta as artes plásticas como fonte de construção para o imaginário republicano, e o mesmo afirma que a população brasileira não teve participação direta na construção da república, ela assistiu à proclamação.

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de História “Paranismo: Arte, Ideologia e Relações Sociais no Paraná. 1853 – 1953”, faz uma abordagem mais ampla sobre os artistas no Paraná, dentre eles os paranistas e as lutas de origem adventícia para colaborar na consolidação simbólica do Estado, porém as obras paranistas apresentadas são poucas, tendo em vista que a leitura destas imagens não faz parte do foco da pesquisa, as obras são exibidas de maneira que se possa reforçar o conteúdo do texto, limitando-se ainda nos trabalhos realizados até a década de 1950, ou seja, sem relação com obras atualmente produzidas dentro desta temática.

Assim sendo, minha intenção inicial de estudar a persistência das formas paranistas, tendo por base o repertório mais denso em termos de memória, identidade, sociologia, filosofia, entre outros aspectos, foi modificada a partir da revisão bibliográfica, em que percebi notória falta de repertório imagético sobre o Paranismo mais concentrado. A dificuldade encontrada acabou por redirecionar esta pesquisa, que se voltou mais para o registro das obras, tendo como pretensão desta forma apresentar um trabalho que viesse servir para estudantes de arte, historiadores e demais estudiosos que desejem entender um pouco mais sobre a relação entre Paranismo e Artes Visuais.

Desta maneira fui recolhendo fragmentos e atuando como detetive de modo que pudesse refazer um percurso imagético e assim elaborar um estudo que pudesse se tornar também mais uma referência para o estudo das Artes Visuais e o Paranismo. Desta forma o trabalho acabou se diferindo dos demais estudos referentes ao Paranismo, pois a maior preocupação foi em apresentar um repertório visual produzido, a partir da simbologia paranista, iniciando-se nas décadas de 20 e 30, passando pelos anos 90, onde houve um considerável resgate da temática, e ainda buscando na atualidade a reverberação da potência das imagens construídas pelos Paranistas, tornando-se desta maneira um estudo inédito no Estado do Paraná.

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ausência de seus idealizadores, porém com soluções plásticas bem diferenciadas. Assim sendo, temos como objetivo neste trabalho: investigar de que maneira inicialmente o Paranismo foi estruturado por seus idealizadores, assim como entender seus objetivos e seus meios de divulgação; analisar as diferentes manifestações visuais utilizadas pelo Movimento Paranista a fim de difundir seus ideais; questionar a busca pelo moderno paranista em contraposição às vanguardas do mesmo período e da mesma maneira; investigar em que se inspiravam as obras paranistas; avaliar as ressonâncias no imaginário-popular bem como a permanência icônica paranista no decorrer histórico da Arte Paranaense; pesquisar a permanência da iconologia paranista que possivelmente ainda exista em trabalhos de artistas atuais.

Para o desenvolvimento desta pesquisa, que se insere na linha de pesquisa em Teoria e História das Artes Visuais, inicialmente foi feito o levantamento do material bibliográfico considerando como fontes primárias o “Manifesto Paranista”, os “Periódicos Paranistas”, “Revista Ilustração Paranaense”, obras de Romário Martins e Luis Fernando Lopes Pereira. Em seguida foi direcionada a pesquisa na produção artística paranista, que se desenvolveu nas diversas manifestações visuais como: a pintura, a escultura, o desenho, a gravura, a arquitetura, a decoração. Diante destas propostas de fontes, foram selecionadas as imagens e o discurso dentro da linguagem visual. De acordo com a leitura que realizei, esta pesquisa pode ser classificada da seguinte forma: qualitativa, exploratória, bibliográfica e documental.

Cabe questionar que apesar do Paranismo estar visualmente circunscrito em Curitiba pelas obras públicas, por que os paranaenses em geral reconhecem a pinha, o pinheiro e o pinhão como seus símbolos? Quais seriam as permanências do Paranismo e seus símbolos e desdobramentos nas percepções modernas e contemporâneas da arte paranaense no que tange o fenômeno desta iconologia?

Dentro deste pensamento o trabalho desenvolveu-se em torno de duas hipóteses: 1 - O paranismo é uma invenção para forjar uma identidade; 2 - A utilização de obras visuais como veículo de divulgação do movimento foi o motivo pelo qual o movimento teve sua sustentação.

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entender quais foram seus principais objetivos, seus ideais e principais meios de divulgação.

O Segundo capítulo trata do Paranismo e a utilização das Artes Visuais como efetivação do mesmo, bem como seus principais divulgadores, os artistas plásticos João Ghelfi, Zaco Paraná, Langue de Morretes e João Turin. Neste capítulo pretendemos questionar quais foram as manifestações artísticas utilizadas pelos artistas para divulgarem o Paranismo, e quais os recursos plásticos, ou seja, de que maneira os elementos símbolos do Paraná foram inseridos nas obras visuais.

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CAPÍTULO I

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Sandra Pesavento, ao falar sobre a cidade, afirma que a mesma é sensibilidade, é produção de imagens:

[...] é expressão de utopias, desejos e medos [...] é, sobretudo, materialidade erigida pelo homem, é ação humana sobre a natureza. [...] é, pois sociabilidade: comporta atores e relações sociais, personagens, grupos, classes, práticas de interação e de oposição. Marcas que registram uma ação social de domínio e transformação, no tempo, de um espaço natural (PESAVENTO, 2002, p. 24).

Para a autora a cidade é analisada pelo presente, mesmo a cidade do passado, ela está em constante renovação no hoje, seja no pensamento individual ou coletivo, ou ainda através dos contos históricos que as gerações reconstroem do passado.

É, ainda, nesta medida, que uma cidade inventa seu passado, construindo um mito de origens, descobre pais ancestrais, elege seus heróis fundadores, identifica um patrimônio, cataloga monumentos, transforma espaços em lugares com significados. Mais do que isso, tal processo imaginário de invenção da cidade é capaz de construir utopias, regressivas ou progressivas, através das quais a urbs sonha a si mesma (PESAVENTO, 2002, p. 25).

Assim sendo, a cidade constrói o futuro ao inventar o passado, e o tempo está sempre relacionado ao espaço, é impossível separar os dois. A cidade se “dá a ver” por suas particularidades e materialidade arquitetônica, e se “dá a ler” pelo passado que é possível de se enxergar, passado que faz parte de outras cidades e se faz presente na cidade atual. Esta relação entre espaço e tempo oferecida ao olhar pela cidade propõe ainda uma cidade imaginária, que existe no pensamento, que é produzida pela memória e pela história, que reconstrói uma ausência, que visualiza o tempo e o espaço. Neste processo imaginário de construção de espaço-tempo, na invenção de um passado e de um futuro, a cidade está sempre a explicar o seu presente. A cidade, desta maneira, sugere uma definição de seu [...] “modo de ser, uma cara e um espírito, um corpo e uma alma, que possibilitam reconhecimento e fornecem aos homens uma sensação de pertencimento e de identificação com a sua cidade (PESAVENTO, 2002, p. 25).

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com intelectuais curitibanos, em plenos anos 20, reunidos em confeitarias, principalmente no café Belas Artes na época no centro da Rua XV - entre as ruas Barão do Rio Branco e Monsenhor Celso1 - para pensar sobre a inexistência de traços por meio de lendas, tradições e vultos históricos regionais no Paraná.

A cidade de Curitiba nos traz uma descrição de um passado que por vezes precisamos reconhecer através das entrelinhas. Isso nos é apresentado por meio do visual, um visual que nos é tão comum que em muitas ocasiões nos passa despercebido. É atravessadamente pelo olhar da memória que se faz possível enxergar algo que já aconteceu, a presença daquilo que não existe mais, mesmo que pela ausência da matéria. Portanto, ao caminhar pelas avenidas de Curitiba, ao depararmos com uma determinada obra pública, ou com os petit pavês que compõem várias calçadas, é possível reconhecer além da matéria que nos é apresentada pela visão, a presença de algo que não está presente no presente.

Fundada em 1693, Curitiba conta hoje com uma população de um milhão e oitocentos mil habitantes, portanto um grande centro. É apontada como uma cidade de bons negócios, de ser bem planejada, de possuir um sistema de transporte coletivo integrado e ser considerada uma cidade poli-cultural, tendo como exemplo o Bosque do Alemão, o Memorial Ucraniano, O Memorial Polonês, O Bosque de Portugal e tantos outros.

Apesar de trazer uma fachada reconhecida nacionalmente como uma cidade “moderna”, com seus edifícios pós-modernos e seus “bi-articulados”, Curitiba, também possui seu Centro Histórico É possível também reconhecer nele a arquitetura de variados estilos dos séculos XVIII e XIX, Luso-brasileiro, Eclético e Art Déco. Muitos deles tombados, hoje restaurados e adaptados, em sua maioria para o desempenho de funções culturais, como a Casa Vermelha e a Casa Romário Martins. No Largo Coronel Enéas (Largo da Ordem) se encontra a Igreja mais antiga da cidade, construída em 1737, a igreja da Ordem Terceira de São Francisco das Chagas.

Além desta aura de cidade modelo, Curitiba é ornamentada por seus pinhões e pinheiros. A cidade carrega em suas ruas e praças a construção de uma identidade que não existia, uma apropriação de símbolos que não eram seus. Curitiba, bem como o

1 Informação sobre a localização, extraída do Artigo: Catedrais de Cultura e de Arame em Curitiba: Mito e Metáfora. DeCarmen Lúcia Fornari Diez - Professora da UFPR e doutoranda pela UNIMEP. Geraldo Balduíno Horn - Professor da UFPR e doutorando pela USP. Disponível em:

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Estado do Paraná, na opinião de seus intelectuais comprometidos com a tradição e pensamentos históricos, não possuía um mito, uma lenda, algo concreto que pudesse reforçar suas raízes. Podemos identificar isso nas palavras de Brasil Pinheiro Machado, em uma publicação no ano de 1930, num dos “Instantâneos Paranaenses” – “A Ordem” – onde afirma: O Paraná é um estado típico desses que não tem um traço que faça deles alguma coisa notável [...] (MACHADO, 1930 p.09). A inexistência de traços regionais foi apontada pelos intelectuais como resquícios de descaso do regime monárquico com o Estado. Era preciso, então, criar uma tradição para este Estado, era preciso forjar uma historiografia, o que Hobsbawm chamou de Invenção das Tradições:

Por tradição inventada entende-se um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras tácita ou abertamente aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da repetição o que implica automaticamente, uma continuidade em relação ao passado. Alias, sempre que possível, tenta-se estabelecer continuidade com um passado histórico apropriado (HOBSBAWM, 1984, p.09).

Hobsbawm, ao falar de uma necessidade de continuidade de um passado histórico, está se referindo à construção exercida pelos americanos, porém esta construção pode ser percebida nos paranaenses quando determinados a edificar uma história regional no Paraná. Este passado era reforçado com alicerces políticos, ou seja, a história era embasada em documentos oficiais, determinando assim que o melhor presente seria um presente que revivesse o passado, e este passado era, portanto, exaltado com heróis e personagens históricos, levando exemplos gloriosos a toda população.

Com isso podemos pensar alguns referenciais na cidade de Curitiba levando em consideração o espaço e o tempo com auxílio da Memória e também da História, analisando que tanto uma como a outra possam representar de forma imaginária ou não o passado que nos é pertinente.

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e Memória, a incumbência de tornar presente a ausência que possa existir no tempo. Esta presença da ausência se faz através do pensamento, e este pode proporcionar o retorno de algo que esteve guardado no passado.

Aristóteles define a História como “narrativa do que aconteceu”, portanto, se para nós a memória é o retorno de algo do passado, podemos pensar então que a História, bem como a Memória, são as citações presentes de alguma coisa que passou.

Porém, Paul Ricoeur apresenta entre elas algumas diferenças, como podemos observar nas palavras de Pesavento: [...] a História estabelece para como o passado um pacto de verdade: ela quer chegar até aquela realidade do acontecido, pelo que persegue esta meta pela utilização de várias provas documentais que, testadas e cruzadas em correspondência, lhe assegurem uma margem de veracidade à narrativa (PESAVENTO, 2002, p. 26). Contudo, desta forma o historiador perde a experiência da vivência, a ele, ao historiador, lhe é negado as alegrias da memória feliz, que, segundo Ricoeur, seria regozijar-se com a “identificação e o reconhecimento da lembrança”.

E, no entanto, nada temos de melhor que a memória para garantir que algo ocorreu antes de formarmos sua lembrança. A própria historiografia, digamo-lo desde já, não conseguirá remover a convicção, sempre criticada e sempre reafirmada, de que o referente último da memória continua sendo o passado, independentemente do que possa significar a preteridade do passado (RICOEUR, 2007, p. 27).

Cabe então à História conferir um determinado acontecimento através de um trabalho incansável de veracidade através de provas concretas, não podendo reportar a experiência vivida no passado, fato que se pode difundir através da memória. A memória poderá ainda fazer uso da imaginação para apresentar algo que não aconteceu, ou seja, um momento fantasioso, almejado, ilusório, construído.

Além desta memória que nos é apresentada através da construção e que relembra um passado existente no espaço, podemos ainda identificar em Curitiba a memória social. Esta se apresenta edificada historicamente e trata-se de um produto de um pensamento comum, de um trabalho feito em grupo, onde indivíduos se amparam no exercício do lembrar, recordam e narram histórias de outros momentos. Para Pesavento, ao estabelecer didaticamente a apreensão do passado, a memória social:

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em conjunto, seja pela fixação e sistematização da memória narrativa, difundida pela escola, pelo texto literário ou histórico ou ainda pela mídia, a memória social sacraliza as evocações, como que oficializando o passado e delimitando, no espaço da cidade, os lugares de ancoragem das lembranças no tempo (PESAVENTO, 2002, p. 28).

A autora completa ainda, citando Aldo Rossi, que identifica a memória coletiva em uma associação entre o imaginário e o espaço social, onde o espaço urbano não pode ser pensado sem o tempo, e a cidade não pode ser refletida dissociada do espaço construído. A cidade em que pensamos é, portanto, uma construção gerada a partir de pedaços de memória que se exteriorizam por imagens, sendo ainda a cidade a própria memória coletiva do homem (PESAVENTO 2002, p. 28).

A memória coletiva, bem como a memória individual, estão ligadas afetivamente e relacionadas a partir de vivências tanto individuais como coletivas. Curitiba ainda pode ser observada através de sua memória cívica. A memória cívica está intimamente ligada ao patrimônio, ao poder político, onde alguns valores são destacados e outros desconsiderados, podemos observar claramente nos monumentos erguidos com finalidades bem definidas, ou ainda através das comemorações relacionadas à emancipação política, sempre visando reforçar uma identidade.

Esta busca pela identidade cultural foi o ponto forte das reflexões que levaram a intelectualidade curitibana a criar o Paranismo, movimento este que tinha dentre suas principais finalidades forjar a identidade paranaense. O Movimento Paranista foi resultado de um processo de formulação de uma imagem do Paraná posteriormente à sua emancipação política, ocorrida em 1853.

1.1 O Paranismo

Apesar de ter sido conseqüência de uma preocupação com a identidade paranaense a partir do século XIX, a terminologia “Paranismo” foi definida oficialmente apenas em 1927 por Romário Martins.

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influentes. A situação financeira difícil de sua família foi o fato agravante para que Romário não adquirisse o conhecimento acadêmico, um dado que seria fundamental para uma possível dificuldade de seu ingresso na elite econômica, tendo em vista que, para nossa cultura, tornar-se bacharel seria um fato imprescindível. Contudo, Romário, ao se dedicar à literatura, à política e às realizações cívicas, fez com que o círculo das elites educadas lhe abrisse as portas. Em 1896, inicia a história literária paranaense partindo da emancipação política, em que citamos suas principais obras: “História do Paraná”, “Terra e Gente do Paraná”, “Quantos Somos e Quem Somos”, “Dados para a História e a Estatística do Povoamento do Paraná”, “Eu Penso que...”. Romário foi autor de vários manifestos paranistas e sua imensa simpatia pela cultura indígena lhe inspirara a escrever muitos poemas em defesa desta causa, tendo com exemplo o mito do Guairacá. Também faz uma notável atuação na redação da “Revista do Clube Curitibano”. Segundo Camargo, esta revista proporcionará a Romário o contato com os formuladores dos pontos de vista “culturais” das elites paranaenses (CAMARGO, 2007, p. 15).

Romário Martins foi o primeiro secretário do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, atuou como diretor do Museu Paranaense e, na política, foi deputado estadual de 1904 a 1928. Esta versatilidade entre a literatura, as artes plásticas e a política lhe propiciou uma ligação importante entre os membros das mesmas e, conseqüentemente, uma posição socialmente privilegiada.

Para o historiador, professor, poeta e museólogo David Carneiro2, Romário Martins:

[...] foi o campeão pelo lado do Paraná da campanha intelectual de defesa histórica do Paraná quanto ao contestado. Foi ele que teve argumentações, ele escreveu um livro Se eu fosse advogado do Paraná o que eu diria porque ele conhecia muito bem o problema histórico, de maneira que ele era a pessoa indicada para fazer este movimento interno (CARNEIRO, s.n.t).

Segundo Carneiro, o Paranismo se tratou de um movimento interno, pois seria uma reação ao fato do Paraná ter contribuído na guerra do Paraguai ter sido elemento forte na defesa da emancipação dos escravos e defensor da república na Lapa, e mesmo assim Santa Catarina havia recebido os benefícios na conquista de territórios. Romário

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sentia dentro de si todas estas reações e extravasou com o Paranismo (CARNEIRO, s.n.t). Portanto o Paranismo, conforme Carneiro, se tratou de um movimento profundo, foi um resultado de razões essencialmente históricas; une-se ao fato do Paraná ter se emancipado tardiamente, pois a capitania de Paranaguá em Curitiba não tinha condições para ser capitania e as manifestações de conquistas para o Estado, em sua maioria, frustradas. Para ele, ainda teria a questão com Santa Catarina, e esta questão é um fracasso para o Paraná como reivindicação de seus direitos. Então teria que explodir em outra feição. E esta feição justamente a Paranista, que quer dizer criarem-se elementos artísticos, intelectuais internos aqui no Paraná (CARNEIRO, s.n.t).

1.2 O Vocábulo

No depoimento de David Carneiro temos a afirmação de que Romário Martins tenha sido o criador da palavra paranismo, porém este termo já foi motivo de várias discussões. A cronista Araci Martins, investigando sobre a origem da palavra paranismo, questiona no jornal “O Dia”, em maio de 1946, se a denominação partiu realmente de Romário Martins ou de Domingos Nascimento:

Conta ela que, num encontro com Jeff, Hilário Rodrigues e Pike-Pake, naquela redação, esses conhecidos personagens do nosso “set” de escritores divergiram sobre a questão proposta, isto é, sobre “quem

inventou a palavra, se Romário Martins ou Domingos Nascimento. E transcreve, a respeito, o seguinte “nheengato” entre eles: - “Quem

inventou essa palavra foi Romário Martins”, disse Jeff, taxativamente. – “Nego!”, contestou Hilário, que é conhecedor de coisas antigas de nossa terra. “A autoria dessa invenção cabe a Domingos Nascimento”. E Pike-Pake sentenciou, dizendo que o substantivo

paranista fora lançado, em 1906, por Domingos Nascimento, com a significação de “natural do Paraná”, tomado de amor erangé pelo seu Estado, por cujo progresso, prestígio e integridade envida todos os esforços. – “É então um paladino que se bate pelo Paraná?”, pergunta Araci. – “Isso mesmo”. – Uma espécie de jacobino destas plagas?” – “Mais ou menos (MARTINS, 1948).

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Quem introduziu esse vocábulo entre nós foi Domingos Nascimento, 1906, ao regressar de uma viagem ao norte do Estado, onde notara que ninguém nos chamava de paranaenses e sim paranistas. A palavra nascera ali espontaneamente. A população de nossas terras setentrião, era na sua quase unanimidade, constituída de paulistas, e estes, por natural aproximação com o nome dado aos naturais do seu Estado, designavam os paranaenses de paranistas (MARTINS, Apud PEREIRA, 1998, p.78).

Devemos levar em consideração o fato do termo ter aparecido em 1906 em referência àquele que ama o Estado do Paraná, sendo este natural do mesmo. Segundo Luis Fernando Pereira, o termo refere-se:

[...] aquele tomado de amor pelo Estado. Com a mesma significação o termo volta a aparecer em um conto de Waldomiro Silveira intitulado

Desespero de Amor, que encerra o livro Os Caboclos do mesmo autor, publicado em 1915, onde o mesmo aparece em um trecho em que o personagem Chico Só tentava conter um animal (burro) de Guarapuava quando foi aconselhado por seu companheiro que afirmou Não é por desfazer na sua destreza, seo Chico, mas contanto que este burro paranista vai dar trabalho, ao final o autor acrescenta a definição de paranista: o natural do Estado do Paraná (PEREIRA, 1998, p. 78).

Podemos constatar, portanto, que o vocábulo paranista, bem como paranismo, já era utilizado em diferentes épocas e sua definição seria para o indivíduo nascido no Paraná e que por este Estado guardava grande afeição.

Comungando de forma analógica com o termo paulista, o termo paranismo foi adotado não só pela sonoridade, mas também, segundo Romário Martins, pelo sufixo ista que propunha significação de cultor de alguma coisa. O termo não estava, para Martins, relacionado ao nativismo, com a identificação de local de nascimento e sim no cultivo de amor ao Paraná, possibilitando assim um leque maior, abarcando a participação de todos, incluindo os imigrantes, na construção do Estado do Paraná com uma identidade cultural, não permitindo ainda nenhuma possibilidade de xenofobia. Para reforçar este pensamento, Romário Martins publicou um artigo explicando a significação do termo Paranista:

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liberal, praticou a bondade, iluminou um cérebro, evitou uma injustiça, educou um sentimento, reformou um perverso, escreveu um livro, plantou uma árvore (MARTINS, 1946, p. 91).

Portanto, o conceito de “paranismo” para Romário Martins, estava ligado a uma implicação moral, onde não poderiam se adequar à condição de “paranistas” os maus, os injustos, os preguiçosos ou perversos, mesmo que estes pudessem ser eventualmente paranaenses por nascimento ou por adoção3.

Romário Martins determina ainda que o paranaense do futuro, portanto o paranista, deixe suas marcas no Estado, ou seja, no novo Estado que está sendo construído. Pois Romário afirma ainda que paranismo é o espírito novo, de enlace e exaltação, idealizador de um Paraná maior e melhor pelo trabalho, pela ordem, pelo progresso, pela bondade, pela justiça, pela cultura, pela civilização (MARTINS, 1946, p. 91).

1.3 O Centro Paranista

Em 1927, Romário Martins, retomando o termo paranismo depois de 21 anos, faz uma nova definição para o mesmo, ou seja, o que em 1906 era relacionado ao nativismo, agora ultrapassa esta idéia de “natural do Estado do Paraná” e ganha uma conotação social, filosófica, existencial. O líder do Movimento Paranista funda oficialmente neste ano o Centro Paranista, determinando assim a efetiva data para o início do paranismo. Vale lembrar que a preocupação com a tradição e a identidade paranaense precedia a esta data e já estava presente nas discussões dos intelectuais paranaenses, como vimos anteriormente.

O Centro Paranista recebe a função de promover e estimular todas as iniciativas úteis ao progresso e à civilização do Estado do Paraná, função esta delimitada no Programa Geral do Centro Paranista e divulgada em seu primeiro artigo4. O Centro vem

contribuir para a reafirmação da idéia “paranista: amigo do Paraná”, servindo de estímulo a núcleos de estudo, dentre eles, a Sociedade de Agricultura do Paraná e

3 Frase escrita a partir de uma anotação feita pelo Professor Artur Freitas em banca de qualificação no dia 08 de dezembro de 2008, Florianópolis.

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Instituto Histórico e Geográfico do Paraná. Um Conselho Superior Paranista foi formado, onde os 21 membros deveriam apreciar as propostas para possíveis adesões de novos componentes. Para se tornar um novo membro, o candidato deveria se justificar ou esta justificativa poderia ser feita por um dos membros do conselho, desde que suprisse com as exigências determinadas no Programa do Centro Paranista, a proposta de adesão deveria ser justificada pelo candidato ou por membro do Conselho, com razões que demonstrem se tratar de pessoas que hajam prestado serviço de relevante utilidade ao progresso e à civilização paranaense, em qualquer ordem de realização5.

Segundo Pereira, o Programa ponderava sobre oito teses consideradas essenciais para o progresso do Paraná, sobre o meio físico e vital, meio econômico, social, especialmente educativo e intelectual e meio cívico e moral, o autor afirma ainda que estes pontos fundamentais eram os mesmos definidos por Romário para o Centro de Defesa do Patrimônio Cultural do Estado alguns anos depois (PEREIRA, 1998, p. 84).

O referido Centro chegou a emitir uma mensagem assinada por Romário Martins ao Dr. Affonso Camargo, na época presidente do Paraná. Na distinta mensagem o presidente foi chamado de “Illustre Paranista” e no conteúdo constava: Não queremos a adhesão dos incapazes nem dos egoístas. Elles são os entraves do progresso e da civilização (MARTINS, 1927.p.1).

Romário afirmava que para se tornar sócio era necessário desempenhar o compromisso de trabalhar em prol da ordem e progresso, da justiça e ir à busca das intenções do movimento, entre as quais uma seria firmar uma identidade para o Estado do Paraná. Em suas palavras, a mesma mensagem prossegue: Quem não tiver pelo Paraná uma sincera afeição e não for capaz de um esforço pelo seu progresso, não deve se alistar entre os sócios do Centro Paranista (MARTINS, 1927, p. 1).

Para Pereira, o citado presidente não se enquadrava totalmente dentro das exigências para ser apontado como “Illustre Paranista”, e o mesmo foi ainda brindado com outra obra, a Conferência Paranista escrita em 19 de dezembro 1928 (data do aniversário da Emancipação Política do Paraná) por Affonso Guimarães Correia. Esta obra poderia, segundo Pereira, até ter a intenção de elevar o Paraná, porém, acaba apenas enaltecendo ao presidente e aos seus programas de governo. Na Conferência Paranista encontra-se ainda a “Oração Paranista”, que veremos a seguir:

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FAÇAMOS TODOS OS DIAS A ORAÇÃO PARANISTA Gigante adormecido!

- As serras, as chapadas, os campos, as matas do PARANÁ! Ondas de calôr; rajadas de frio!

Oh! Riqueza incomparável da fauna paranaense!!! Chanaan que nos torna envaidecidos, PARANÁ! Gemmas admiráveis do Tybagy!!!

do peixe!!! carvão de pedra!!! Sete-Quedas!

Saltos de Santa Maria do Iguassú!!! Oh! PARANÁ

incomprehendido nas victorias econômicas do amanhã! Polycultura! – O PÃO NOSSO DE CADA DIA –

- recolhido o grão de ao pé da casa; trazido ou do secco ou do banhado o arroz fumegante em nossas mesas, mas, dalli, do nosso alqueire de chão! Centeio, cevada num quartel de emfrente!...

Em Ponta Grossa as ruínas de Villa Velha! Na Serra o Véo da Noiva, o Marumby da Serra! Lindas sem igual nossas praias, Ilha do Mel! Bregetuba!

Para as bandas de Guaratuba! E a tranqüilidade de Guarakessaba!

Havera porventura, mais dadivosos mares de que os mares do PARANÁ! Que abundância, que variedade de pescados!!!

...galhos estralejam cobertos pelo vermelho brilhante, - gottas muito grandes de sangue, da rubiácea preciosa. Nevadas paranaenses,

- sendal suisso,

- as maçãs em flocos de ouro branco enriquecem o patrimônio explorado;

- é a malvácea, o algodão, oriundo das zonas equatoreares, as cápsulas rompidas esperando a colheita em cargas fortes!

Palmeiras em leque e coqueiros em affagos soberbos com specimens de musáceas, como um despudor que alegra, vemos fructificando numa leira unica as ameixas do Canadá, azeitonas Delvas de Sevilha, os Kakis do Japão, maçãs norte americanas, nêsperas d´Itália, - numa palissada ao lado, finas, succulentas uvas da França.

Tudo assim, na TERRA DAS MARAVILHAS, neste PARANÁ, das moças bonitas, das mulheres mais lindas do mundo!!!

É o despertar de GOLIAS! (CORREIA, 1928. p. 33-34).

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Outra fonte de divulgação de pensamentos e ideais paranistas foi a revista “Illustração Paranaense”, que circulou entre 1927 e 19306. Dirigida pelo fotógrafo e cineasta João Batista Groff, esta revista foi considerada muito importante para o Movimento Paranista, pois teve como objetivo principal divulgar todo o processo de desenvolvimento urbano de Curitiba e suas atividades culturais, incluindo os símbolos do Paraná eleitos pelos paranistas. A atuação da revista “Ilustração Paranaense” dentro do Movimento Paranista foi tão significativa que o período de “vida ativa” determinado ao Movimento foi exatamente durante a circulação da mesma, segundo Camargo: Embora o Paranismo, em sentido estrito, não possa, em nosso entendimento, ser estendido além dos esforços de Romário Martins, nos limites da existência da Ilustração Paranaense, que não resiste às mudanças políticas e, apesar do adesismo imediato à “revolução”, acaba por volta de 1931 (CAMARGO, 2007, p. 178). Desta maneira, considera-se neste trabalho o término do Movimento Paranista em torno de 1931.

Assim sendo, é comum encontrar em suas páginas, entre outros assuntos, a presença de personagens locais em homenagens ao pinheiro, bem como artigos relacionados às lendas indígenas ou textos publicados na forma de pinhão.

As idéias paranistas na revista “Illustração Paranaense” eram também expressadas através dos desenhos de João Turin e Lange de Morretes e a direção ficou por conta do fotógrafo e cineasta João Batista Groff. A capa desenhada por Turin se mantém em todos os números até 1930, em cada edição apenas as cores eram alteradas7.

Aproveitando o surto econômico positivo da exportação de café, da erva-mate, da exportação da madeira e da implantação de fábricas os paranistas acentuaram o desejo de construir uma narrativa regional que mostrasse o Estado do Paraná como um local que possuía uma tradição e uma história. Os paranistas tinham a intenção de inventar uma tradição para um Estado julgado sem características, tentando suprir o que Brasil Pinheiro Machado havia afirmado no “Instantâneo – A Ordem” sobre a ausência de traços típicos no Estado do Paraná. Este artigo de Brasil Pinheiro Machado sobre a inexistência de traços típicos no Estado do Paraná foi publicado em 1930, portanto a publicação foi posterior à fundação do Centro Paranista. Mesmo assim sendo, Pereira nos afirma que:

6 O primeiro exemplar da Revista Ilustração Paranaense se deu em novembro de 1927.

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É neste sentido que surge, em 1927, o Centro Paranista, fundado por Romário Martins, (...) deixando ainda mais evidente a vontade dos paranistas em construir um novo Paraná e igualmente tentar resolver os problemas de identidade apontados por Brasil Pinheiro Machado (PEREIRA,2000, p.140).

Brasil Pinheiro Machado foi considerado também idealizador e colaborador do paranismo, como Martins, engajado na política foi prefeito de Ponta Grossa, deputado estadual, deputado federal, presidente da Procuradoria Geral da Justiça do Paraná, vice-diretor e reitor da UFPR, juiz do Tribunal de Contas do Paraná e também interventor federal no Paraná de 25 de fevereiro de 1946 a 06 de outubro do mesmo ano. É autor de poemas publicados na “Revista Antropofagia” em 1928, e dos ensaios “Esboço de uma sinopse da História Regional do Paraná, Paraná no Centenário8. Podemos entender que

a preocupação com a identidade própria do Paraná já existia anteriormente por parte de Brasil Pinheiro Machado, no entanto publicamente isto só foi declarado em 1930.

1.4 Os Imigrantes

Uma das características do discurso dos idealizadores do Movimento Paranista (Romário Martins e Brasil Pinheiro Machado) era de integrar todos os indivíduos que adotassem o Paraná como a sua terra. Romário Martins, junto ao Instituto Histórico Geográfico, desejava agregar os migrantes e imigrantes das mais diversas partes do Brasil e do exterior, pois entendia que a Sociedade Paranaense vinha a ser a mais cosmopolita do Brasil, e, ainda, o Centro Paranista não pretendia uma aculturação dos imigrantes, mas ao contrário, contava com o aspecto heterogêneo para a construção da sociedade paranaense.

No entanto, o nobre desejo dos idealizadores paranistas foi minado e entristecido com arroubos xenófobos por parte de alguns intelectuais. A xenofobia no Movimento Paranista tem sido a causa de alguns confrontamentos acadêmicos, como, por exemplo, entre Ruy Wachowicz e Luiz Fernando Lopes Pereira. O primeiro afirma a existência da xenofobia e insiste que o Paranismo era conivente com tal situação. Segundo

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Wachowicz, o termo seria atribuído a Romário Martins e sua significação teria uma definição adversa de ádvena, uma expressão no sentido pejorativo para mencionar os estrangeiros e seus descendentes. O termo “paranismo” teria sido inventado para designar a “intellegentia” luso-brasileira [...] cultuadores das tradições paranaenses.9 Wachowicz prossegue afirmando que seria um termo nativista dos que insistiam contra a participação do estrangeiro. O segundo discorda e comprova que o movimento não era xenófobo e, ainda, tinha melhores intenções quanto aos imigrantes, comungando com as palavras de Romário Martins quando afirma que paranista é todo aquele que tem pelo Paraná uma afeição sincera (MARTINS, 1946, p. 91).

De qualquer maneira, é importante ressaltar que o Movimento Paranista, e principalmente seus idealizadores, Romário e Brasil, passaram longe de qualquer tipo de rejeição ao imigrante, pelo menos é o que podemos constatar em seus textos. Outro fator que também foi possível constatar é que estes intelectuais paranistas não fecharam os olhos para as manifestações contrárias ao imigrante. Brasil Pinheiro Machado se utilizou da expressão poética para rejeitar esse tipo de atitude na poesia “Paisagem da Minha Terra”:

O brasileiro nortista que chegava Dizia que aquilo não era Brasil Que aquilo era aldeia russa.

Que o verdadeiro Brasil estava lá no Amazonas Lá no nordeste

Lá no sertão ensolado de Canudos Onde os homens eram de bronze O ano todo era verão

E as casas todas tinham linhas curvas

Que não podia ser Brasil onde houvesse geada até meio-dia Onde em vez do caboclo meio bronze mulato

Andasse polacos fazendo barganhas de porco e plantando mandioca Onde os bandoleiros em vez de usarem roupas de couro dos cangaceiros

Usassem bombachas largas e boleadeiras e cantassem (meu Deus!) em castelhano. Só que o brasileiro do norte que chorava a desbrasilidade do sul

Não notou que quando parava o seu fordinho na estrada esburacada E apeava pra pedir água ou comprar fruta na chacrinha em frente O polaquinho

O russinho O alemãozinho O italianinho Nascido ali

Traduzia o pedido do viajante pro pai E do pai pro viajante

Numa língua igualzinha à dos caboclos De cor de bronze amulatado

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Sem regra de gramática portuguesa, graças a Deus! (MACHADO, 2001, p. 23 - 24)

No poema de Pinheiro Machado constatamos a preocupação com a importância do estrangeiro, percebemos uma necessidade de abarcar raças, descendências de países bem distintos. Percebemos também certa valorização da língua brasileira, como uma definição do caráter nacional, tendo em vista que a idéia de nação estava se apresentando numa junção de múltiplas nacionalidades.

Os imigrantes instalados em Curitiba deram sua contribuição e alteraram costumes. Cada colônia tinha sua organização e possuía suas próprias instituições, como escolas, clubes, igrejas. Posteriormente iremos detalhar um pouco mais sobre as contribuições dos artistas plásticos descendentes de imigrantes que aderiram ao Movimento Paranista, assim poderemos ter mais uma possível constatação de que o Movimento realmente abarcava todos aqueles que possuíam sincera afeição pelo Paraná e estavam dispostos a contribuir com o “problema” da inexistência destes traços regionais apontada pelos intelectuais, independentemente de sua nacionalidade.

Os Paranistas, ao buscarem no Estado do Paraná características que pudessem defini-lo como um Estado de tradição e história reforçadas, acabaram se aliando ao posicionamento de caráter simbolista, pois o Movimento Simbolista mesmo com representantes em outros Estados, no Paraná teve uma atuação singular e original.

1.5 O Simbolismo e o Paranismo

O Simbolismo foi uma tendência estética de origem francesa e comum às literaturas ocidentais durante os últimos anos do século XIX. O conteúdo formal do novo movimento literário quis comunicar o homem moderno nos seus gostos, prazeres e sensações, além de refletir as neuroses do impacto científico na sua evolução social. Portanto o simbolismo foi uma reação às estéticas literárias anteriores como: Realismo, Naturalismo e Parnasianismo, buscando redescobrir o mundo interior do homem, sede dos valores espirituais e afetivos.

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Francês está vinculada a outro poeta também francês, Baudelaire, que em 1857 exercitava a estética simbolista em “As Flores do Mal”. Para o literato Massaud Moisés, Baudelaire era a fonte praticamente de todas as linhas de força que compuseram a poesia moderna.

É que Baudelaire desmistificaria totalmente a poesia, e trouxera-a para o plano do homem, já então angustiado por uma existência sem deuses e mitos válidos. A uma poesia do divino, o que fatalmente se reduzia a bem comportada estética anterior, ele contrapõe uma poesia satânica, irreverente e cáustica, propelida por uma ânsia trágica de libertação e narcisamento (MOISÉS, 1866, p. 49).

O poeta Baudelaire também é apontado por Giulio Argan, entre outros autores, como aquele homem que esteve indisposto e ao mesmo tempo usufruidor da modernidade que o atingiu. O poeta debruçou-se sobre o caos da cidade resultante da multidão, esse tema deu origem a um dos seus mais célebres poemas, chamado “A uma passante”. Outra preocupação de Baudelaire – junto aos impressionistas – foi a respeito das influências que a arte sofreu depois da invenção da máquina fotográfica, bem como às outras maquinarias surgidas na sua época. Talvez por tudo isso Baudelaire tenha conseguido representar o Simbolismo na sua essência, ou seja, compreendeu aquele mundo aparentemente absurdo e o codificou sob o signo dessa nova corrente estética: um mergulho no inconsciente e nas sensações, atitudes que a lógica parnasiana não foi capaz de expressar e explicar.

O Simbolismo cruzou a fronteira francesa e exerceu sua influência em várias literaturas da Europa e da América. No Brasil adota-se a data de 1893 para o início do Movimento Simbolismo na figura do poeta catarinense Cruz e Souza, especificamente da publicação de “Broqueis”, poemas em verso, e “Missal”, poemas em prosa, nos moldes do figurino simbolista. No entanto, no Brasil, o Simbolismo não constitui um período literário autônomo, na verdade ele coexistiu como o Romantismo, Realismo e Parnasianismo, pois sofreu forte resistência das correntes estéticas anteriores.

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Mesmo sofrendo resistência, o movimento simbolista disseminou-se principalmente por Santa Carina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Paraná, mas seus adeptos acabavam por se encontrar isolados, pois aos poetas simbolistas não foram concedidas grandes oportunidades de manifestação em jornais ou revistas na proporção que eram ofertados aos parnasianos. Grande destaque do simbolismo foi a ação em Curitiba, a Capital Paranaense foi um centro de excelência e divulgação do Simbolismo brasileiro, como atesta Moisés:

Curitiba tornou-se grande núcleo do culto e irradiação dos ideais simbolistas. Várias revistas, congregando numerosos aficionados da “poesia nova”, foram criadas na capital paranaense: Clube Curitibano (1890), O Artista (1892), Revista Azul (1893), O Cenáculo (1895-1897), a mais importante de todas, Galáxia ((1895-1897), A Penna ((1895-1897), Jerusalém (1898), O Sapo (1898), Esphinge (1899), Pallium (1900), Breviário (1900), Turris Ebúrnea (1900), Azul (1900), Acácia (1901), Stellario (1905-1906), Victrix (1907). Como se vê, das 29 revistas inventadas por Andrade Muricy, dezesseis circulam em Curitiba. A sua volta se organizaram vários grupos e “igrejinhas” dos quais os principais representantes foram: Dario Veloso, Silveira Neto, Julio Perneta, Antonio Braga, que juntos dirigiram O Cenáculo, Jean Itiberê (João Itiberê da Cunha) e Emiliano Perneta. A tal ponto que o movimento literário em Curitiba se elevou que a primeira das figuras citadas, ardorosamente convicta das idéias em voga, empreendeu “as revivescências helênicas da Festa da Primavera, as cerimônias ritualísticas do Instituto Pitagórico que fundou em 1909”, um harmônico templo em estilo grego, “Templo das Musas”, onde presidia a atraentes e estranhas celebrações de arte e de pensamento (MOISÉS, 1966, p. 81-2).

Para entender o arroubo simbolista em Curitiba é importante destacar em que contexto social, político e econômico se encontrava a intelectualidade paranaense. Nesta época, o Paraná se encontrava engajado em um republicanismo positivista e anticlerical, as críticas ao regime monárquico tomaram força após a proclamação devido às condições de abandono, fruto do descaso do Império, com a região paranaense. Então, com a Proclamação da República, o Paraná se ergueu em um republicanismo positivista radical, ou seja, esperava-se um espargir de luzes sobre as trevas da monarquia. Para os intelectuais paranaenses, a República traria o progresso, o conhecimento científico seria o comando da sociedade num ideal modernizante. Cita-se, como exemplo dessa idealização de progresso, um artigo de 10 de agosto de 1889:

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somos um povo atrazadíssimo. Não temos indústrias, não temos artes, não temos sciência. Em Política sofremos de paralizya completa. Temos apenas a política do foguetório. Deixemos os velhos partidos de lado [...] Trabalhemos pela República (REPÚBLICA, A.Coritiba, p.01 – 10 ag/1889 Apud PEREIRA, 1998, p. 26).

Em comunhão com a republicanização, surgiu no Paraná um levante anticlerical embasado na separação do Estado e da igreja. Esse posicionamento anticlerical marcou quase toda a produção literária da sociedade paranaense com o Movimento Simbolista. O anticlericalismo e positivismo foram rigorosos em Curitiba, e se expressam na linha simbolista nas figuras de Dario Veloso, Silveira Neto, Julio Perneta e Antônio Braga, estampadas nas páginas da revista “O Cenáculo”. Em 1891 Dario Veloso fez um pronunciamento no Clube Curitibano sobre a abolição da escravatura e sobre a República, segundo ele as duas grandes idéias cívicas da mocidade brasileira da época. Todo proselitismo de Dario Veloso e seus colaboradores convergiram para a mesma aura construída pela República, acreditava-se na ciência e no ensino laico que eram os elementos modernizadores, ou seja, a sociedade em oposição a uma visão mística do mundo dada pela Igreja Católica que foi sustentáculo falido do regime monárquico.

Foi num contexto de projeção econômica paranaense que emergiu o Movimento Paranista, tendo como base idéias de progresso e ciência. Em 1900 foi criado o Instituto Histórico Geográfico do Paraná, do qual o presidente era Romário Martins, líder do Movimento Paranista e um dos principais colaboradores do Movimento Simbolista Paranaense. É relevante esclarecer que o Paranismo é conseqüência direta do Simbolismo, pois o primeiro estende os ideais republicanos, positivistas e anticlericais do simbolismo curitibano no plano das artes visuais. Paranismo e simbolismo são ainda mais consoantes, pois a idéia simbolista transplantada para as artes plásticas se revelará por signos da realidade que deseja construir. O crítico e historiador de arte Giulio Argan conceitua a ressonância do Simbolismo nas artes plásticas, nas representações do mundo social e das relações culturais.

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existência transcendental ou profunda, cuja infinitude escapa à apreensão dos sentidos e a reflexão do intelecto, mas que é fenomenizada e revelada pela arte, e apenas pela arte (ARGAN, 1992, p. 83-4).

O Simbolismo, nas palavras de Argan, se difundiu além da pintura também em outras manifestações artísticas como arquitetura e decoração, característica que também iremos identificar no Paranismo. Segundo o autor não podemos delimitar a simbologia da arte, bem como sua morfologia, assim sendo, cada fato ou objeto, artificial ou natural, poderá ostentar um significado bem distinto para cada indivíduo. Industrialmente muitas técnicas podem colaborar para a realização de formas dessemelhantes ao que conhecemos tradicionalmente da morfologia, relacionando-as muitas vezes com a morfologia natural. Não explicáveis em termos analógicos com as formas naturais, atribui-se a essas formas a importância dos signos de uma essência transcendental ou intensa, em que, devido sua profundidade, muitas vezes não se permite compreensão através dos sentidos, porém por meio da arte poderá ser revelada.

O Movimento Simbolista no Paraná ocorreu devido à tendência deste movimento se ligar às aspirações construídas pela República, principalmente no que se referiu à ciência e ao ensino laico. Considerados elementos modernizantes da sociedade, a ciência e o ensino laico foram colocados como oposição a uma visão mística do mundo dada pela Igreja Católica, sendo esta uma das falências do regime monárquico, segundo os anticlericais. Para Camargo:

Preocupavam-se com questões esotéricas e doutrinas místicas e praticavam um anticlericalismo militante, corrente nas vertentes simbolistas e positivistas no Paraná e na capital federal. Formado nesse ambiente intelectual, um dos principais ativistas das lutas pela construção de uma herança tradicional local foi o jornalista e historiador Alfredo Romário Martins (CAMARGO, 2007, p. 28).

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nas relações sociais paranaenses, deixando transparecer em seus textos a inserção dos estrangeiros nos ideais paranistas, como constatamos anteriormente.

Outra atuação singular e original do simbolismo em Curitiba é em relação ao clima que pode ser comparado a algumas regiões da Europa, diferenciando-a então de outras cidades brasileiras. Segundo Marcio Oliveira:

[...] O Simbolismo, embora tendo representantes em vários estados, foi especialmente vigoroso no Paraná e, por conseguinte, é descrito como um simbolismo particular. A primeira particularidade (estendida ao próprio estado) liga-se ao clima da cidade de Curitiba, considerado frio e europeu, e ao relevo ondulado de suas montanhas, o que aproximaria os escritores locais do “clima” da matriz simbolista parisiense (OLIVEIRA, 2007, p. 3).

Bastide (1980) afirma que a particularidade do Simbolismo no Paraná bem como no Sul é extremamente relacionada ao clima bem específico e diferenciado de outros Estados brasileiros:

O Simbolismo do Paraná é também a primeira manifestação de um “Brasil diferente” contra o Brasil tropical, uma tomada de consciência literária do que o Paraná apresenta de específico, mas também de autenticamente brasileiro, contra os que querem modelar todos os brasileiros segundo um mesmo padrão: clima temperado contra sol tórrido, bruma esbranquiçada e geada, minuano gelado do Sul, contra os alísios, os pomares em flores e florestas virgens (BASTIDE, 1980, p. 212).

Assim, o Movimento Paranista se concretiza no Paraná pela consagração dos valores locais e desenvolve uma simbologia com base em elementos naturais como o pinheiro paranaense10 e o pinhão. Estes elementos são estilizados e transformados em formas de logotipos. Segundo Camargo, os elementos iconográficos regionais, marcados por uma linguagem art-déco de forte teor panfletário, foram elaborados de modo a se constituírem em estímulo à criação de um “espírito paranaense (CAMARGO, 2007. p. 15). A recorrência às artes plásticas foi, ao que parece, a grande estratégia paranista de construir, no imaginário paranaense, a idéia de progresso e ciência.

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1.6 O Pinheiro, a Pinha e o Pinhão

José Murilo de Carvalho, em seu livro “A Formação das Almas”, ao falar sobre os ideais republicanos afirma que, para operar um extravasamento de república no mundo extra-elite, seriam necessárias outras tentativas além do discurso: [...] não poderia ser feito por meio do discurso, inacessível a um público com baixo nível de educação formal. Ele teria de ser feito mediante sinais universais, de leitura mais fácil, como as imagens, as alegorias, os símbolos, os mitos (CARVALHO, 2005, p. 13-4). Assim sendo, o principal recurso do Movimento Paranista para atingir o “Imaginário-popular” foi utilizar-se das artes plásticas, propondo uma alfabetização visual não formal, ou seja, não escolar.

Os símbolos que serviram para a identificação emblemática do Paraná giraram imflamadamente em torno das imagens do pinheiro, da pinha e do pinhão. Dentre os símbolos e representações, o ideário regional foi o que produziu a aura de afeições da população às terras paranaenses, bem como a construção do tipo ideal paranista - o paranaense – que até então não se havia consolidado.

A criação simbólica exercida pelos idealizadores do movimento teve um reforço bem considerável, tendo em vista que, segundo Pereira, ao falar em pinheiro devemos remeter à Curitiba, cujo nome, derivado de curii que significa pinheiro, pinha, pinhão, acrescido do sufixo tiba que indica abundância [...] a própria significação de Curitiba possui ligação com o pinheiro, já que quer dizer “pinheiral” (PEREIRA, 1998, p. 141-2). Certamente a estrutura paranista teve um forte alicerce, se levarmos em conta o fato de seus símbolos sobreviverem até hoje nas obras de alguns artistas.

O escritor Romário Martins dedicou-se aos escritos e lendas indígenas, sendo responsabilizado inclusive pela invenção de muitas lendas onde o índio e o pinheiro eram os personagens principais. Muitas histórias e lendas sobre o Paraná foram registradas em seu livro “Paiquerê”, editado em 1940, onde possui ilustrações de Guido Viaro, Hélio Barros, De Bona e João Turin.

Imagem

Ilustração Paranaense 1928 – ano 03 - p.19

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