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Densidade de Pan troglodites verus e veículos de sensibilidade ambiental:quatro florestas de Cantanhez, República da Guiné Bissau

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FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA AMBIENTAL

DENSIDADE DE Pan troglodytes verus

E VEÍCULOS DE SENSIBILIZAÇÃO AMBIENTAL:

QUATRO FLORESTAS DE CANTANHEZ,

REPÚBLICA DA GUINÉ-BISSAU

~

Joana Vaz de Sousa

Mestrado em Biologia da Conservação

2007

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FACULDADE DE CIÊNCIAS

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA AMBIENTAL

DENSIDADE DE Pan troglodytes verus

E VEÍCULOS DE SENSIBILIZAÇÃO AMBIENTAL:

QUATRO FLORESTAS DE CANTANHEZ,

REPÚBLICA DA GUINÉ-BISSAU

~

Dissertação orientada pela Professora Doutora Cláudia Sousa

e pelo Professor Doutor Luís Vicente

Joana Vaz de Sousa

Mestrado em Biologia da Conservação

2007

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informação necessária à elaboração deste relatório:

Zeca Dju

de Lautchande

Queba Indjai

de Caiquene

Djibi Indjai

de Caiquene

Iaia Camara

de Cadique Nalu

Braima Vieira

de Caghode

Braima Camara

de Madina

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Agradecimentos 6

Notas Preliminares 7

Introdução 8

A. Chimpanzé da África Ocidental – Pan troglodytes verus 8

B. Guiné-Bissau 11

B.1 Panorama Social e Económico 12

B.2 Evolução Sociopolítica 13

B.3 Política Ambiental 14

B.4 Caça Ilegal: Actividade de Mercado e de Subsistência 15

C. Sector de Cubucaré – Florestas de Cantanhez 16

C.1 Enquadramento Histórico e Religioso 16

C.2 Percepções da Natureza e Gestão dos Recursos 18

C.3 Sistemas de Produção Agrícola e Uso do Solo 18

C.4 Floresta Sub-húmida 20

Densidade de Pan troglodytes verus em Quatro Florestas de Cantanhez, República da Guiné-Bissau: Uma Abordagem Preliminar

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Resumo de Palavras-Chave 27

Abstract and Keywords 28

Introdução 29

Área de Estudo 30

Métodos 31

Tratamento Estatístico 34

Resultados 36

Taxa de Detecção de Ninhos e Distâncias de Avistamento 36

Estimar a Densidade Recorrendo ao Software Distance 5.0 38

Estimar a Densidade Procedendo ao Ajuste da Curva de Detectabilidade 40

Árvores e Alturas Preferidas para Construir Ninho 43

Condicionantes Inerentes aos Ninhos em Palmeira 44

Número de Repetições 45

Outras Evidências de Presença 46

(5)

Conservação dos Chimpanzés (Pan troglodytes verus).

Resumo de Palavras-Chave 53

Abstract and Keywords 54

Introdução 55

Metodologia 57

Tratamento Estatístico 59

Resultados 60

Primeira Fase: Caracterização do Estado Inicial 61

Segunda Fase: Estratégias de Comunicação: Vias, Formato e Conteúdo 69

Terceira Fase: Efeito da Sensibilização Ambiental 73

Discussão 78

Considerações Finais 81

Reflexões sobre o Processo de Conservação das Florestas de Cantanhez 81

Bibliografia 83

Anexos 90

Anexo 1. Estimar Densidade de Primatas Anexo 2. Ecoturismo

Fotografias Metodologia

Inquéritos Aplicados nas 1ª e 2ª Fases Amostragem Folheto e Cartazes

Programa Dari – Rádio Lamparan

Resumo do Número de Ninhos Encontrados

Nº de Ninhos de Chimpanzé Detectados Considerando as Distâncias de Avistamento Aplicação de Critérios para Escolher o Truncamento e o Agrupamento dos Dados Curva de Detectabilidade dos Ninhos de Chimpanzé (DISTANCE 5.0)

Valores de Densidade Estimados com o DISTANCE 5.0 Curva de Detectabilidade dos Ninhos de Chimpanzé (Ajuste)

Caixa-de-bigodes: Distâncias de Avistamento, Taxas de Detecção e Altura dos Ninhos Mapas de Distribuição dos Ninhos ao Longo dos Trilhos

Fotografias: Humanos e Não Humanos O que é que o chimpanzé come?

Desenhos dos alunos das Escolas de Verificação Ambiental Sensibilização Ambiental: Resultados dos Testes Estatísticos

91 103 105 106 107 109 111 112 113 115 116 117 118 120 124 125 126 127

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AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar agradeço ao Projecto “Distribuição das Conunidade de Chimpanzés (Pan troglodytes verus) na Região Costeira da Guiné-Bissau e a sua Relação com as Comunidades Humanas Locais” – POCI/Ant/57434/2004 que financiou e possibilitou a realização deste trabalho.

À Caia pela oportunidade, ajuda na procura das melhores soluções metodológicas, pela paciência e ânimo, pela revisão dedicada a este documento. Ao André Barata pela ajuda imprescindível na fase de teste da metodologia, pela incansável partilha de opiniões sobre os métodos e análises e pelo apoio à revisão deste documento. À Catarina Casanova pela oportunidade, preocupação e exigência constantes e por todo o apoio. Ao Joca por me ter dado a conhecer esta oportunidade, pelos comentários e sugestões que contribuíram para a elaboração deste documento. Ao Rui Sá pela em campo na fase de teste da metodologia. Ao Régulo de Cadique Nalu, Aladji Salifo Camara e ao Ansomane Sambô, por me terem tão amavelmente recebido na sua terra. O meu profundo agradecimento aos colaboradores que me acompanharam a campo diariamente: Zeca Dju e Fernando Dafá de Lautchante, Djibi Indjai e Queba Indjai de Caiquene, Braima Vieira e Mamadu Galissa de Iemberém, Iaia Camara de Cadique Nalu, Braima Camara de Madina. Em especial, ao Zeca Dju, grande conhecedor das florestas de Cantanhez, pela vontade de partilhar esse conhecimento, pela energia e brio no trabalho; ao Queba Indjai pelas várias vezes que me acompanhou aos vários matos, por ter partilhado comigo as suas opiniões, pela transparência da sua alegria; ao Saidu Kuiaté pelas aulas de crioulo, pela persistência para que o programa Dari chegasse aos ouvidos da população de Cubucaré, pela amizade e por todos os comunicados que transmitiu na rádio. Ao Sene Candê pelo apoio prestado na rádio local. À Carina do INFORMORAC pela opinião relativamente ao programa de rádio.

Aos professores Braima Galissa na Escola de Verificação Ambiental de Madina; professores Paulo, Ortiz e Joãozinho da Costa das Escola de Verificação Ambiental de Cadique Nalu e ao professor Quintino da Escola de Verificação Ambiental de Caiquene.

Ao Américo e à Sílvia pelo apoio e carinho incondicionais. Ao Patrício e à Lina pelo apoio em Bissau. Ao Hubert Lellote pelas conversas no alpendre e pela tranquilidade de avô.

Ao Luís Catarino, Viriato Cassamá e à sua equipa pelo carinho, preocupação e alegria contagiante. À Marina Temudo pelas histórias dos meandros do Cubucaré.

Ao Samba Juma, condutor compenetrado, pela sua boa disposição e vontade de comunicar. Ao Domingos Fonseca e Abubakar Serra, técnicos da ONG Acção para o Desenvolvimento. À Charlotte Karibuhoye e ao Andrew Plumptre por colocarem à disposição alguns dos seus trabalhos. À Natacha Mendes e à Raquel Xavier pelo apoio e prontidão com a literatura. Ao Rui Pinheiro pela companhia nas madrugadas de trabalho aquando das primeiras dúvidas e na fase inicial deste trabalho, pelo apoio e compreensão incondicionais. A todos os amigos que foram aparecendo a cada dia em imagens e recordações. À Cantarina pelo interesse em saber, pela paciência em escutar e por ter zelado pelo meu bem-estar. Ao Kau pela leitura e correcção. Ao Zé Pacano, à São e à Aida por, cada qual à sua maneira, serem imprescindíveis na minha vida.

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NOTAS PRELIMINARES

Situando-se na interface humanos-chimpanzés, esta dissertação foi organizada em dois blocos diferentes que, apesar de interdependentes, dizem respeito a dois objectivos distintos:

- Estimar a Densidade de Pan troglodytes verus em Quatro Florestas de Cantanhez

- Delinear Estratégias de Sensibilização Ambiental em Quatro Aldeias de Cantanhez

Os termos em inglês, crioulo e balanta são apresentados em itálico. Os termos referentes a nomes comuns de animais ou cerimónias religiosas seguem a ortografia que consta na obra de Moreira (1995) “Usos e Costumes das Plantas no Mato de Cantanhez”. Os termos científicos e vernáculos referentes à flora guineense seguem a classificação e ortografia do livro “Plantas Vasculares e Briófitos da Guiné-Bissau” de Catarino et al. (2006).

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INTRODUÇÃO

A. Chimpanzé da África Ocidental - Pan troglodytes verus

Schwarz, 1934

Nomes locais: dari em crioulo, fula e futafula; demo em mandinga (Reiner et al. 1999); madaro em Nalu, donos do chão de Cantanhez.

A espécie Pan troglodytes foi classificada em 1986, segundo a UICN Red List of Threatned Species, com o estatuto de “Vulnerável” (VU-Vulnerable). Esta classificação foi actualizada em 1996 e alterada para “Ameaçada” (EN-Endangered,

http://www.iucnredlist.org/search/details.php/15933/summ 2007). Alguns autores

afirmam que esta classificação é desapropriada e deveria ser imediatamente alterada para “Criticamente Ameaçada” (CR-Critically Endangered), argumentando que a actividade humana devastou os habitats na África Ocidental e Equatorial e que, em países como o Gabão, se verificou um declínio acentuado da população de chimpanzés (Walsh 2003). Pelo contrário, Oates (2006), contestando a proposta de Walsh, questiona a objectividade dos critérios que classificam o grau de ameaça e apresenta-se mais optimista relativamente à sobrevivência da espécie, afirmando que se está imergir no paradigma do declínio das populações (Oates 2006).

O chimpanzé constitui, das seis espécies de grandes símios, aquela que se apresenta em maior abundância e mais amplamente distribuída (Butynski 2003). Área que compreende a distribuição das quatro subespécies: Pan troglodytes troglodytes, Pan troglodytes schweinfurthii, Pan troglodytes verus e Pan troglodytes vellerosus (Figura 1), esta última reconhecida em 1997 (Gonder et al. 1997).

Figura 1 – Distribuição aproximada das quatro subespécies actualmente reconhecidas: Pan troglodytes troglodytes, Pan troglodytes schweinfurthii, Pan troglodytes verus e Pan troglodytes vellerosus (adaptado de Gao et al. 1999).

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O mosaico de habitats onde vive o chimpanzé da África Ocidental, fragmentos de floresta e áreas de vegetação mais aberta, poderá contribuir para aprofundar o nosso conhecimento sobre as condições em que viviam os primeiros hominídeos no Mio-Pliocénico (Hunt & McGrew 2002). As sociedades humanas e de chimpanzés exibem inúmeras semelhanças, como uso o de ferramentas, a caça, a agressão territorial e várias especificidades culturais, inexplicáveis por factores ecológicos (Whiten et al. 1999).

Os chimpanzés são omnívoros e o seu regime alimentar baseia-se fundamentalmente em fruta e partes de algumas plantas, incluindo, além disso, insectos e vários mamíferos, inclusivamente outros primatas (Goodall 1986). No entanto, o facto de serem essencialmente frugívoros torna-os mais vulneráveis à escassez de alimento do que outras espécies de primatas que também se alimentem de folhas (Plumptre & Cox 2006).

Vivem em grupos multi-macho/multi-fêmea, denominados comunidades, de tipicamente 30 a 80 indivíduos. Apresentam uma dinâmica social de fissão-fusão em que a comunidade se separa diariamente em grupos mais pequenos que comunicam através de vocalizações e drumming1. O número de indivíduos por grupo (party) é

influenciado por vários factores, quer de ordem ecológica (precipitação, disponibilidade de alimento), social (fêmeas em estro, presença de infantis) ou espacial (localização dentro do home-range). Os sinais acústicos apresentam um pico no início da manhã e no fim da tarde, momentos em que os os indivíduos se separam e se reúnem, respectivamente, e estão negativamente correlacionados com a precipitação (Sommer et al. 2004).

Existem padrões comportamentais transversais a várias comunidades de chimpanzés, enquanto outros aparentam ser únicos para certas comunidades (Whiten et al. 1999). Durante a infância, os chimpanzés passam a maior parte do tempo com a progenitora, dependência essa que proporciona a aprendizagem de variadas competências sociais, ecológicas e técnicas. A construção de ninho é, entre outros, um comportamento aprendido cuja aquisição requer experiência e prática (Videan 2006). As primeiras acções relacionadas com a construção de ninho aparecem aos 8 a 12 meses (Goodall 1986) e pode ser, como qualquer outro comportamento, específico de determinada comunidade e culturalmente aprendido (Fruth & Hohmann 1994). Existem indícios de que as fêmeas constroem os ninhos a alturas superiores aos machos (Plumptre & Reynolds 1997) e de que os machos constroem aproximadamente 40% mais ninhos diurnos que as fêmeas, não tendo sido registadas diferenças entre sexos na reutilização de ninhos (Plumptre & Cox 2006). Em locais como Fongoli (Senegal), além dos ninhos arbóreos, são construídos ninhos no chão que são usados aparentemente para a mesma função (Stewart 2007).

Em 2005, na área de Cantanhez foram encontrados inúmeros vestígios de presença de chimpanzé, entre os quais, ninhos frescos no topo de palmeiras (Sousa et al. 2005). Na maioria dos locais, os chimpanzés não constroem ninhos nestas árvores, mesmo

1 Em inglês, drumming, refere-se ao comportamento de produzir som percutindo troncos com as mãos e/ou pés.

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quando ocorrem na área. Apesar de esta particularidade já ter sido descrita como fenómeno ocasional, em Cantanhez são notoriamente o tipo de ninho dominante. Aliás, em 1995, Gippoliti e Dell’Omo apenas detectaram ninhos deste tipo (Gippoliti & Dell’Omo 1996).

O declínio que se tem verificado no efectivo populacional de muitas espécies de primatas advém sobretudo da conjugação de factores como destruição de habitat, caça e tráfico (Tutin & Fernandez 1984). Na Guiné-Bissau o chimpanzé não se inclui nas espécies mais afectadas pelo tráfico ilegal de carne pois é encarado como espécie semelhante à humana (Gippoliti et al. 2004). Contudo, é inserido no tráfico ilegal de animais vivos que são comercializados como animais de estimação. O decréscimo no efectivo populacional conduziu a preocupações relacionadas com a consanguinidade e a redução da variabilidade genética ao longo da área de distribuição desta espécie (Kormos et al. 2003).

Manter um número considerável de indivíduos na população revela-se de especial importância para espécies que, como o chimpanzé, apresentam estruturas sociais complexas e cuja dinâmica reprodutiva envolve membros de outros grupos: as fêmeas sexualmente activas procuram, furtivamente, parceiros de outros grupos para acasalar; estratégia que evita a endogamia e assegura, ao mesmo tempo, a protecção conferida pelos machos do grupo de origem (Gagneux et al. 1999). A diminuição do efectivo populacional pode manifestar-se vários anos depois do início da degradação do habitat, visto que o insucesso reprodutor não apresenta efeitos imediatos (Chapman et al. 2000).

Os chimpanzés são primatas sensíveis à desflorestação, ocorrendo em menor densidade em zonas degradadas do que em zonas que não se encontram em exploração (Tutin & Fernandez 1984, Chapman et al. 2000). É uma espécie mais vulnerável que outros mamíferos pois ocorre normalmente em baixas densidades, apresenta um ciclo de vida longo e precisa de grandes áreas para sobreviver (Oates 2006). Contudo, apesar destes aspectos, constitui uma das espécies de mamíferos de floresta que apresenta uma maior área de distribuição em África, sendo de salientar que revela uma capacidade cognitiva que lhe permite evitar caçadores e deslocar-se entre manchas de floresta mais eficientemente que outras espécies (Oates 2006). Nos anos oitenta, aproximadamente 80% do coberto vegetal original da África Ocidental, tinha sido já destruído. Nos últimos 30 anos, as populações de chimpanzés da África Ocidental viram-se reduzidas para um terço, de 600.000 para 200.000 indivíduos (Conservation International 2001). Segundo o Plano de Acção Regional para a Conservação do Chimpanzé na África Ocidental, foram definidas para a Guiné-Bissau, duas áreas consideradas essenciais para a sobrevivência desta espécie (Figura 2): uma na região de Boé, que se insere numa das áreas “excepcionalmente importantes”, e uma situada nas regiões de Tombali e Quínara, que faz parte de uma das sete “mais importantes” (Kormos & Boesch 2003). São necessárias futuras investigações que desenvolvam planos de acção visando a conservação desta espécie, fundamentalmente através da delimitação de áreas protegidas de modo a assegurar, pelo menos, duas populações viáveis, uma nas Florestas de Cantanhez e outra no sector de Boé. As espécies de primatas, uma vez conservadas, actuam como espécies

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estandarte por promoverem a conservação de todo um habitat, o que na Guiné-Bissau se pode traduzir na conservação de um dos ecossistemas mais marcantes do país, a floresta sub-húmida (Gippoliti & Dell’Omo 2003).

Figura 2 – Áreas estabelecidas como prioritárias para a conservação do chimpanzé na África Ocidental (adaptado de Kormos & Boeach 2003).

B. Guiné-Bissau

«… a little known country, Guinea-Bissau.» (Mittermeier 2003)

A Guiné-Bissau, um dos países mais pequenos da África Ocidental, situa-se entre as latitudes 10º55'N e 12º40'N e as longitudes 13º38'O e 16º43'O. Compreende uma área de 36,125 km2 onde predomina o mangal e a savana, sendo ainda é possível encontrar pequenas manchas de floresta primária no sul do país, nas regiões administrativas de Tombali e Quínara (Gippoliti & Dell’Omo 2003). É constituída por uma parte continental com algumas ilhas separadas por rias, e outra insular (arquipélago dos Bijagós). Faz fronteira a norte com o Senegal e a sul e leste com a República da Guiné (Guiné-Conacri). O país tem uma área total de 36.125 km2, sendo que 1.500 km2 correspondem ao arquipélago dos Bijagós (Martins 1994).

A linha da costa tem um comprimento de 350 km onde desaguam sete sistemas fluviais, formando vales de cheia ou rias que se estendem para o interior. A topografia do país é pouco acidentada, alcançando a altitude máxima de 300 m no interior do país (Gippoliti et al. 2004), o que permite uma influência bastante marcada das marés caracterizada por amplitude de 3 a 7 metros. A Guiné-Bissau

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detém a mais significativa extensão de mangais e bancos costeiros de todo continente africano (Dodman et al. 2004).

Na África Ocidental, os principais factores que ameaçam a sobrevivência das espécies selvagens estão intimamente ligados à rápida exploração dos recursos que elimina oportunidades sustentáveis a longo prazo (Conservation International 2001).

B.1 Panorama Social e Económico

«(…) a Guiné-Bissau foi, de todos os PALOP, o país que mais ajuda recebeu, numa média 70 milhões de USD/ano para 1 milhão de habitantes. Porém, a falta de resultados visíveis (designadamente a melhoria das condições de vida das populações), bem como as modalidades de gestão da ajuda (…) contribuíram para uma percepção negativa da intervenção da comunidade doadora no país face às expectativas criadas.» (Guimarães 2007)

Em termos administrativos, o país está dividido em nove regiões e 36 sectores. O último recenseamento (2007) estimou a população em 1.389.497 habitantes

(http://www.stat-guinebissau.com/), compreendendo uma grande variedade étnica e

religiosa. A taxa de crescimento demográfico rondava 2% e a esperança média de vida cerca de 44,7 anos (Sangreman et al. 2006). A maioria da população está envolvida na agricultura (75% a 80%, Guimarães 2007), principalmente na produção de arroz em solo de mangal (arroz de bolanha), nas áreas inundáveis ou ainda, em combinação com outras culturas, na zona de floresta (arroz de sequeiro ou pampam, Dodman et al. 2004). Apesar do deslocamento de populações humanas em direcção às cidades ser crescente, particularmente para a capital, Bissau, o sector primário é o preponderante (agropecuária, silvicultura e pescas), o qual equivale a 62,6% do Produto Interno Bruto (PIB). A fruticultura e a horticultura estão em desenvolvimento (Vieira 2004), a manufactura está limitada à transformação de matérias-primas e à produção de bens de consumo básico (Guimarães 2007). A Guiné-Bissau possui ainda recursos florestais valiosos e diversos, existindo 2,4 milhões de hectares de floresta cuja exploração contribui para 7-10% das exportações (Vieira 2004). Em 1987, foi lançado o “Programa de Ajustamento Estrutural”, baseado nos acordos estabelecidos com o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial e caracterizado por uma política de exportação que incentiva a monocultura de caju, a indústria madeireira e o licenciamento de pesca industrial para frotas estrangeiras (Guimarães 2007).

As reservas de petróleo nas águas territoriais podem constituir uma fonte de riqueza a longo prazo, embora com potenciais impactos negativos, de ordem ambiental e social (Dodman et al. 2004).

Em 1998, muitas das infra-estruturas do país foram destruídas como consequência da guerra civil. A Guiné-Bissau tem uma dívida externa que, em 1997, representava duas vezes e meia a produção nacional, valor esse que a guerra civil de 1998 fez quintuplicar, devido à quebra de aproximadamente 28% no Produto Interno Bruto (PIB, Guimarães 2007).

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Entre as debilidades da Guiné-Bissau estão a incapacidade que as instituições estatais têm apresentado para assegurar os serviços mínimos, a burocracia e a corrupção ao nível estatal, o desrespeito pelos órgãos de soberania, a permanente violação dos direitos humanos, as fraquezas económicas e a ausência de uma cultura democrática (Guimarães 2007).

A Guiné-Bissau é um país receptor de fundos de auxílio, sobretudo de entidades como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional, as Nações Unidas, a União Europeia e o Banco Africano para o Desenvolvimento (Vieira 2004, Guimarães 2007). Foi classificada, em Agosto de 2007, como um dos 29 países em crise que requerem assistência alimentar do exterior (Food and Agriculture Organization/GIEWS 2007) e foi declarada elegível para a Iniciativa dos Países Fortemente Endividados em Abril de 1998 (Guimarães 2007). Estes financiamentos englobam apoios a centenas de organizações não governamentais (ONG´s) nas áreas de desenvolvimento rural, pesca, formação e saúde; sendo privilegiadas as áreas de intervenção “tradicionais” e descuradas outras que, não apresentando um efeito mensurável, são descartadas, tais como apoio à reconciliação, à promoção de uma cultura democrática, entre outros. Assim, o apoio ao desenvolvimento é imposto a partir do exterior de acordo com modelos estruturados em centros de decisão internacionais, não tendo o governo guineense capacidade para rejeitar os projectos apresentados, nem tão pouco para os gerir (Guimarães 2007).

B.2 Evolução Sociopolítica

«As agências internacionais condicionam a ajuda à realização de eleições regulares sem ter em conta que a democracia não se limita à realidade formal de actos eleitorais, os quais servem muitas vezes para legitimar um poder questionável. (…) Verifica-se, portanto, uma transferência da lógica governamental do Norte para o Sul, sem que se verifique uma

adequação dos conceitos às realidades destes países.» (Guimarães 2007)

A proclamação unilateral do estado guineense ocorreu em 1973, tornando-se formalmente independente em 1974, decorridos 13 anos de luta contra o poder colonial português. A partir de então é adoptado um sistema político monopartidário, tendo sido, após 1991 adoptado o pluripartidarismo. A instabilidade política, o culminar da guerra civil em 1998 e o descontentamento das populações mergulharam o país num clima de incerteza. Desde então a Guiné-Bissau tem demonstrado várias fragilidades políticas e democráticas, já que a vitória eleitoral parece depender de factores subjectivos, como a etnicidade, que pouco se relacionam com a capacidade de governar (Guimarães 2007).

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B.3 Política Ambiental

«Existe uma ilha onde os pássaros nidificam e que não é habitada, estando as aves guardadas por

um irã2 . Os caçadores que lá se dirigem devem em troca levar ovos ou galinhas para lá deixar.

Conta-se que, um dia, um caçador apanhou demasiada caça e o irã lhe apareceu, perguntando se

ele queria acabar com os pássaros todos.» (Temudo 1996)

Depois de 1946, a Guiné-Bissau tem permanecido na sombra em termos de investigação científica. Foram necessários quarenta anos para que fosse retomada a investigação zoológica na Guiné-Bissau, em muito devido aos vários conflitos armados (Gippoliti & Dell’Omo, 2003). No entanto, recentemente, a Guiné-Bissau assinou vários acordos internacionais que visam a conservação dos recursos e do património natural: a Convenção sobre a Conservação de Espécies Migradoras de Fauna Selvagem (CMS), a Convenção do Combate à Desertificação (CCD), a Convenção das Alterações Climáticas e a Lei dos Oceanos, a Convenção RAMSAR, entre outros (Dodman et al. 2004; Johannesburg Summit 2002; Cassamá 2006).

Na Guiné-Bissau, muitos grupos animais permanecem ainda pouco estudados, sendo exemplo o caso dos Quirópteros. Os morcegos, sendo excelentes dispersores de sementes, constituem um factor importante para a regeneração florestal, o que faz deste grupo um importante objecto de estudo num país em que a desflorestação tem vindo a aumentar (Rainho & Franco 2001).

O último inventário demonstrou que, a nível nacional, desde 1978, o coberto florestal sofreu uma redução de 70% para 64% da área total do país (Johannesburg Summit 2002). As florestas constituem o habitat mais (sobre)explorado da Guiné-Bissau (Rainho & Franco 2001), cujos recursos se encontram sob a pressão crescente das actividades humanas, tais como: a intensificação agrícola, a privatização da terra, o abate de florestas e a caça (Dodman et al. 2004). Além de sistemas essenciais à sobrevivência de muitas espécies animais, detêm ainda um papel essencial na economia (13,7% do PIB) e na subsistência das comunidades rurais, que representam 65% da população.Todas as etnias utilizam em larga escala os produtos florestais (UICN 2000), tendo-se revelado essenciais à sobrevivência das populações locais durante a instabilidade civil (Dodman et al. 2004).

O sistema tradicional que regulava a posse de terra tem vindo a ser alterado para um regime formal de registos de propriedade e títulos de posse (Temudo 1998). O número crescente de proprietários privados e a própria incerteza sobre o regime predial, têm vindo a incentivar os agricultores a desflorestar para marcar os seus territórios plantando caju. A alteração está a desenvolver-se no sentido da monocultura, favorável aos comerciantes, que encorajará a produção de caju em detrimento do arroz, provocando a passagem para uma agricultura de cariz sedentário (IUCN 2000). As colheitas de caju têm aumentado significativamente nos últimos anos, factor que posicionou a Guiné-Bissau, no ano 2000, em sexto lugar mundial no que se refere a esta produção. São exportados, em menor quantidade, amendoim, miolo de palma e madeira (Dodman et al. 2004).

2 Irãs, em crioulo, constituem entidades sobrenaturais do imaginário mágico-religioso local que povoam Cubucaré e cujo mundo se encontra organizado à semelhança do humano (Temudo 1998).

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O recuo das florestas originais é agravado pelo aumento da pressão demográfica, o abandono dos arrozais tradicionais de mangal (bolanhas) em detrimento dos cultivos em solo de floresta e pelo desenvolvimento da comercialização de produtos florestais com destino ao Senegal e à Gambia (IUCN 2000). A exploração de madeira para exportação constitui uma ameaça séria para as florestas da Guiné-Bissau, especialmente se tivermos em conta que a legislação sobre esta actividade é mais apertada noutros países da África Ocidental e Central (Dodman et al., 2004). Espécies vegetais como o Pterocarpus erinaceus (pó di sangue em crioulo), a Azfelia africana (pó di konta em crioulo), a Ceiba pentandra (polon em crioulo) e o Borassus aethiopum (sibe em crioulo) são cada vez mais explorados devido às demandas nacional e estrangeira (IUCN 2000).

B.4 Caça Ilegal: Actividade de Mercado e de Subsistência

«Entenda-se por animal protegido determinada espécie animal cuja caça, captura, exploração e/ou exportação morta ou viva seja, na sua totalidade ou parcialmente, interdita pela regulamentação nacional ou internacional. Algumas espécies podem ser caçadas ou pescadas depois de se obter a autorização necessária das autoridades competentes.»(Féron et al. 1997)

Estima-se que uma área de 1.000 km2 possa assegurar populações saudáveis de chimpanzé, desde que se encontrem reunidas as condições necessárias e assumindo a não ocorrência de catástrofes naturais. No entanto, actividades como a caça e o comércio ilegal de animais e carne, não controladas na maioria das zonas legalmente protegidas da África Ocidental, dificultam a realização desse cenário (Oates 2006). Em pelo menos 62 países do mundo, a caça de fauna selvagem e a pesca perfazem, no mínimo, 20% da alimentação rural. Em África, 25% dos requisitos proteicos são colmatados recorrendo a carne selvagem (Bennett 2000). Desde há 40.000 anos que a caça constitui uma actividade amplamente difundida nos povos que habitam florestas tropicais; no entanto, por terem vindo a utilizar técnicas cada vez mais sofisticadas, actualmente traduz-se numa actividade raramente sustentável. A progressiva acessibilidade dos caçadores a zonas florestadas conduz à redução de zonas livres de pressão de caça. A intensificação do mercado provoca uma cascata de alterações sociais, tecnológicas e económicas que conduzem ao aumento da pressão da caça sobre as espécies selvagens (Bennett 2000).

Na Guiné-Bissau, a fauna outrora diversa entrou em rápido declínio; realidade que decorreu essencialmente da procura de carne de caça para uma população em franco crescimento, promovendo a destruição do habitat e a caça ilegal, facilitada por um grande número de armas na posse das populações. É de sublinhar a venda desregrada e ilegal de carne de caça na cidade de Bissau e quatro empresas de caça desportiva que, já em 1998, operavam no país (Araújo et al. 1998). As peças de caça têm um bom valor no mercado e um fácil escoamento, sendo ainda vendidas nos mercados partes de animais para fins medicinais, vestuário, entre outros. Estes problemas, que poderão não ser preocupantes a nível local, tendem a expandir-se nos mercados de Bissau e outras cidades (incluindo no estrangeiro), podendo então tornar esta

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situação insustentável. No comércio ilegal de certas espécies para animais de estimação, os primatas e as aves são particularmente vulneráveis (Figura 3), em Outubro de 2001, um chimpanzé jovem valia 80 dólares na cidade de Quebo (Dodman et al. 2004).

Dependente da vontade dos respectivos governos, está a proposta de um parque transnacional ao longo da fronteira da Guiné-Bissau com a Guiné-Conacri, que seria extremamente importante do ponto de vista da conservação das grandes espécies de mamíferos, por assegurar comunicação entre diferentes populações (Torres 2006). A fauna selvagem constitui um recurso importante para as comunidades locais que habitam dentro ou em redor das florestas. As espécies de fauna são caçadas por serem fonte de alimento e receitas, por motivos culturais, sociais ou por serem pragas agrícolas (Bennett 2000). Contudo, o sedentarismo reduz a capacidade de sobrevivência dos recursos de caça, impedindo a sua recuperação.

No fundo, independentemente de quão importante determinada espécie é para uma comunidade específica, se a caça não for sustentável, o recurso esgota-se. Os caçadores são depois forçados a gastar mais tempo e energia à procura da sua fonte de proteínas e a espécie pode chegar a níveis tão mínimos que podem tornar-se localmente extintos. Então quando é que a caça é sustentável? A resposta simples será: quando o explorado não ultrapassa a produção (Bennett 2000).

C. Sector de Cubucaré – Florestas de Cantanhez

C.1 Enquadramento Histórico e Religioso

Embora seja um país pequeno e pouco populoso, a Guiné-Bissau conta com mais de 20 grupos étnicos. A península de Cantanhez reflecte esta diversidade cultural e nela estão representadas várias etnias: Balantas (62%), Fulas, (10%), Nalus (10%), Sossos (4%), Manjacos (2%), Mandingas (2%) e ainda outros grupos minoritários como o Djacanca, Bijagó, Tanda e Papel (11%, Cassamá 2006 cit. Georgis 1996). Embora sendo pouco povoado até ao século XX, o sector de Cubucaré tem sido caracterizado por grandes migrações e ocupações históricas. Pouco antes do século XV esta área foi

Figura 3 – Chimpanzé em cativeiro na cidade de Bissau (fotografia registada durante o decorrer do presente trabalho).

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ocupada por caçadores Nalu, vindos da Guiné-Conacri, povo de religião animista3 que

se instalou na região compreendida entre os rios Tombali e Boke, e se dedicou à extracção de óleo de palma e às actividades agrícolas de sequeiro. Desde então o Cubucaré é reconhecido como Chão Nalu (Tchon Nalu em crioulo), trata-se de um povo pouco numeroso localizado apenas no sul da Guiné-Bissau e na Guiné-Conacri (Moreira 1995, Temudo 1998).

No século XIX a etnia Fula, proveniente da Guiné-Conacri, invade Cubucaré. Guiledje é a primeira aldeia Fula a ser criada. Os donos do chão viram-se então obrigados a refugiar-se nas zonas mais litorais da região: Ilhéu de Melo e Ilha de Komo. Esta ocupação é acompanhada pela islamização dos Nalus que consistiu, simultaneamente, um meio para adquirir hegemonia política. O afastamento das práticas animistas marca o início da desintegração do sistema mágico-religioso de mitos e tabus que conferiam solidez à forma como os Nalus regulavam o acesso à terra e aos recursos naturais (Temudo 1998).

No final do século XIX, por volta de 1890, os Sossos, originários de Boffa na Guiné-Conacri, penetram no Sul da região de Tombali, aliam-se aos Nalus e combatem os Fulas que, por sua vez, são obrigados a recuar até à parte Norte de Cubucaré. Os Nalus reocupam então a parte central e Sul de Cubucaré, desta vez acompanhados pelos Sossos e aprendem com estes as técnicas de fruticultura (Cassamá 2006). No início do século XX, a partir de 1920, regista-se uma imigração massiva de Balantas, vindos da região de Mansoa. Fugindo ao trabalho colonial de abertura de estradas, começam a ocupar e a cultivar os férteis solos inundados e salobros e, com o consentimento Nalu, iniciam a prática da orizicultra de mangal, técnicas que ensinam aos Sossos e Nalus (Cassamá 2006).

Com o advento da luta de libertação nacional em 1963, assiste-se a grandes emigrações de pessoas para a Guiné-Conacri, fugindo aos bombardeamentos e à guerra. Após a independência, a terra foi nacionalizada e o poder das autoridades tradicionais desautorizado (Temudo 1998). O fim da guerra promoveu o regresso das populações refugiadas e a fundação de novas aldeias (tabancas), e outras etnias, como Djacancas, Tandas, Papeis, Manjacos e Bijagós, instalam-se no sector. Os Nalus constituem hoje uma minoria étnica, factor que também tem vindo a contribuir para o enfraquecimento da sua autoridade enquanto “donos do chão” (Temudo 1998) A população actual de Cubucaré aproximar-se-á a 19.500 habitantes, contra os cerca de 15.000 em 1979; o que significa que a densidade populacional passou de 13,3 habitantes/km2 para 17,1 habitantes/km2, em cerca de 10 anos. Se considerarmos a

região de Tombali na sua globalidade, verifica-se que a densidade populacional passou de 12,7 em 1979 para 20,7 habitantes/km2 em 1991, acréscimo significativo

que representa um aumento populacional na ordem dos 31,5% em 12 anos. Embora o sector de Cubucaré não seja o mais gravemente atingido, não deixa de ser potencialmente perigoso para a conservação da floresta, pois a motivação da forte

3 A visão animista do mundo basiea-se na ideia de que, numa comunidade de pessoas, apenas uma parte são

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imigração que se têm vindo a verificar nesta região está sobretudo ligada à exploração de novas terras.

C.2 Percepções da Natureza e Gestão dos Recursos

Na concepção da realidade Nalu considera-se que o Cubucaré é constituído por diversos tchons (chãos), cujos recursos são controlados pelo djagra (chefe da linhagem). Este pertence à linhagem daquele que primeiro se instalou nesse território e fez um contrato com as entidades sobrenaturais, reais proprietários desses territórios, os irãs (Temudo 1998). Assim, qualquer família ou indivíduos que desejem instalar-se em chão Nalu tem de o solicitar ao chefe da linhagem fundadora que, através de cerimónias, averiguará se o irã “dono do chão” está disposto a aceitá-los no seu território.

Segundo Temudo (1998), em cada chão estão presentes três tipos de espaços: a área da povoação, que inclui terrenos de habitação e cultivo, cuja limitação de terrenos é criteriosamente delineada utilizando elementos naturais, como rios, árvores e outros; os matos malgóce4, pequenos nichos florestais (área inferior a um hectare) que compreendem os locais de culto, onde é interdito explorar qualquer recurso ou entrar sem se fazer acompanhar pela linhagem “dona do chão”; e áreas florestais cujos recursos são de acesso limitado, pois a caça, a colheita de mel, de frutos e de raízes silvestres são permitidas aos habitantes da região, mas o corte de grandes árvores para a construção de canoas, de pilões e de traves das casas está sujeito a um pedido de autorização, pois estas árvores estão mangidas5 e poderá acontecer algo de terrível a quem as tentar cortar sem autorização. (Temudo 1998).

Na sociedade Nalu, a senioridade e o género apresentam-se como factores que atribuem primazia social face ao poder decisivo (Moreira 1995), o régulo, simples representante dos demais, e os “donos do chão” estabelecem, com os restantes homens grandes, um sistema de decisão de cariz consensual (Temudo 1998).

C.3 Sistemas de Produção Agrícola e Uso do Solo

Na Guiné-Bissau, as planícies aluviais dos rios constituem as principais zonas húmidas do interior e estendem-se até cerca de 230 km (no caso do Rio Corubal), formando planícies litorais que se elevam gradualmente para leste, onde atingem altitudes de 300 m, as máximas do país (Dodman et al. 2004). A disponibilidade de terrenos alagados faz deste país o cenário ideal para a produção de arroz.

Cantanhez é o principal centro de produção de arroz da Guiné-Bissau devido à fertilidade dos solos e à elevada precipitação anual. A existência de bolanhas

4 - termo crioulo que significa “mau gosto”, que no contexto local significa que, atendendo ao contexto da frase, a floresta foi alvo de protecção ritual e que aquele que a desafiar será de alguma forma punido.

5 - termo crioulo que define o estabelecimento de uma restrição relativamente à exploração de determinado recurso invocando uma entidade sobrenatural que averigua se a restrição é respeitada.

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salgadas, cuja produção de arroz fornece colheitas substanciais, permite que se acumulem excedentes comercializáveis. (Temudo 1998, Cassamá 2006). Este é o sistema produtivo dominante, aplicado nas zonas litorais alagadas por água salgada, onde o relevo bastante suave é dominado por fluviossolos (Cassamá 2006). Estes solos, predominantemente halomórficos e hidromórficos, são provenientes da desflorestação do mangal.

Instalando-se na proximidade dos rios, a etnia balanta é a que domina e gere da melhor maneira os factores que limitam o cultivo do arroz de bolanha: salinidade, acidez e a toxicidade férrica. O arroz produzido é utilizado para autoconsumo, troca e venda. Trata-se de um sistema de produção pouco ou nada monetarizado, onde o trabalho é familiar ou em grupo de jovens contratados dentro ou fora da tabanca, remunerados com aguardente de cana. A religião balanta é, na sua maioria, animista. A diferenciação social é praticamente inexistente, factor que se traduz numa forte coesão social (Temudo 1998, Cassamá 2006).

O sistema de planalto é praticado nas zonas interiores, de maior altitude, onde predominam os solos ferralíticos. As etnias que utilizam este sistema são muçulmanas (Fulas, Djacancas, Tandas), dedicando-se à cultura de arroz de sequeiro (pampam), sorgo, milheto, milho, amendoim (mancara) e fruta. Apesar de que a maior parte destas produções é destina-se ao autoconsumo, a mancara utilizada para a troca, enquanto a fruta, cereais e os produtos provenientes da palmeira para venda. O sistema de planalto é claramente monetarizado: o trabalho é familiar, salariado e em grupos de trabalho da própria tabanca. A terra para a cultura é proveniente do derrube da floresta e, como a auto-suficiência alimentar não é assegurada, a população recorre à troca e venda de produtos para compensar o défice alimentar. Do ponto de vista socioeconómico, tratam-se de sociedades hierarquizadas, onde os excedentes são utilizados individualmente e onde a localização das tabancas ao longo das estradas é utilizada para relações comerciais (Temudo 1998, Cassamá 2006). O sistema misto, predominante no sul da península de Cubucaré, compreende elementos comuns aos dois anteriores, compreende a orizicultura alagada e as culturas de sequeiro num sistema de derrube e queimada. As etnias que praticam este sistema são islamizadas e animistas: os Nalus e Sossos são os mais representativos, mas os Balantas e Fulas também o adoptam. O sistema misto é monetarizado: recorre à força de trabalho familiar, salariado e em grupos de trabalho de dentro e fora da própria tabanca. A auto-suficiência alimentar não é garantida, pelo que recorrem à venda e troca de produtos (Temudo 1998, Cassamá 2006).

Um estudo sobre a alteração da vegetação na península de Cantanhez demonstrou que de 1953 a 1973 se verificou um decréscimo nas áreas dedicadas ao arroz de bolanha, devido ao abandono deste tipo de cultivos durante a guerra da independência (Cassamá 2006). Parte destas áreas não foram recuperadas dando-se uma reorientação para as culturas de sequeiro (em solo de floresta), menos exigentes em termos de mão-de-obra e menos susceptíveis às variações climatéricas (Temudo 1998).

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Assiste-se, de há 10 anos a esta parte, a alterações importantes nos hábitos e comportamentos das populações, com graves implicações para a preservação de alguns ecossistemas. Nos últimos anos, a produção de arroz, alimento base e por vezes exclusivo da população do Sul, tem vindo a sofrer reduções decorrentes, quer da diminuição da pluviosidade, que afecta fundamentalmente o arroz de bolanha devido à salinidade e acidez dos solos, quer do êxodo rural da mão-de-obra juvenil para as grandes cidades (Vieira 2004).

Esta situação, afectando directamente os Balantas que cada vez mais apostam no arroz de sequeiro, veio também desequilibrar as etnias muçulmanas que, não conseguindo os excedentes de arroz dos Balantas, se viram forçadas a recorrer a mais desflorestações.

Num pomar de caju (Anacardium occidentale) bem desenvolvido as copas das várias árvores unem-se e impedem o crescimento de vegetação natural. Esta produção, transversal a várias etnias, é escoada de duas formas diferentes: a castanha destina-se sobretudo à exportação e a parte carnuda é utilizado pelas comunidades locais para produção de sumo, vinho ou aguardente (Cassamá 2006).

Recursos florestais, como a madeira (para combustível e para construção), o mel, frutos e animais silvestres são colectados no mato, assim como o vinho e óleo de palma que são retirados dos palmares (Cassamá 2006). O peixe, o marisco, a mandioca, os frutos (manga, caju, papaia, banana e a tradicional cola) são combinados com o arroz e o óleo de palma como complementos à alimentação (Catarino 2004).

Cerca de 20% das espécies da flora autóctone são utilizadas pelas populações (Dodman et al. 2004), o que revela uma forte ligação ao meio natural e um conhecimento profundo das respectivas potencialidades. Foram identificadas 201 espécies vegetais que apresentam fins medicinais, 142 espécies utilizadas na alimentação e condimentos; 30 espécies ornamentais, entre outras espécies úteis à construção e carpintaria, fibras, artesanato e artefactos, fitoquímica (tinta, sabão, colas), combustível, veterinária e ainda espécies utilizadas em cerimónias (Catarino 2004).

C.4 Floresta Sub-Húmida

Matos, na terminologia local

A floresta sub-húmida é comporta estratos vegetais definidos, compostos por árvores de grande e médio portes e vegetação arbustiva (DGA 1994), podendo algumas árvores ultrapasssar os 30 metros de altura (Cassamá 2006). A cobertura vegetal total ultrapassa os 100%, esta sobreposição das copas reduz a quantidade de radiação solar que consegue atingir o solo, mantendo as condições de temperatura e humidade necessárias para que o desenvolvimento vegetal se estenda a todo o ano, incluindo na época seca (Cassamá 2006).

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A biomassa por unidade de área é, na floresta sub-húmida, muito superior à das outras formações vegetais (Dodman et al.2004). Espécies lenhosas como Ceiba pentandra (polon em crioulo), Antiaris africana (pó di lite em crioulo), o Azfelia africana (pó di konta em crioulo), Erythrophleum guineense (manconde em crioulo), Parinari excelsa (mampataz em crioulo), Milícia excelsa (pó de bitxo em crioulo) e Anisophyllea laurina (miséria em crioulo, DGA 1994), Dialium guineense (veludo em crioulo), Alstonia congensis e Hunteria umbellata, Malacantha alnifolia e Albizia dinklagei são características deste tipo de floresta (Catarino 2004).

Na zona de Cantanhez são factores como o tipo de solo e a altitude que determinam, em grande medida, a distribuição dos tipos de vegetação (Cassamá 2006). A região é dominada por ferralsolos, de textura arenosa, profundos, bem drenados e pobres em nutrientes e matéria orgânica (Catarino 2004); e por fluvissolos halo-hidromórficos, argilosos que apresentam altas concentrações de sal e pH elevado. Os primeiros são característicos de zonas de maior altitude, tipicamente solos de floresta densa, floresta aberta e savana e onde são instaladas as culturas de sequeiro, como o amendoim, a mandioca, as fruteiras e o arroz de pampam; por seu turno, os fluvissolos são característicos de zonas alagadas como o mangal e a lala de água salgada, sendo nestes solos que se pratica o arroz de bolanha (Cassamá 2006).

A temperatura média oscila entre 28º e 31º e a precipitação varia entre 2000 a 2500 mm, o que classifica a floresta de Cantanhez como a zona da Guiné-Bissau que apresenta os valores pluviométricos mais elevados do país (Simão 1997). No período seco, a humidade relativa do ar é mantida, em parte, devido à proximidade do mar e à baixa altitude (Catarino 2004).

É uma área que até metade do presente ano, não era regulada por nenhum estatuto de protecção, sendo apenas definido como Reserva de Não-Caça (Dodman et al. 2004). Encontra-se agora em vias de oficialização, o já aprovado Parque Nacional das Florestas de Cantanhez, que inclui os vales de cheia de rios e mangais, as margens norte e oeste do Rio Cacine e as áreas de savana e de floresta que se distribuem para sudeste até à fronteira.

Actualmente, no seio da comunidade humana residente, é reconhecida a divisão: mato reservado versus zona de pressão, que se distinguem por a desflorestação ser proibida no primeiro e autorizada no segundo. No entanto, não existe nenhum mapa com as delimitações dessas zonas, nem marcação in situ (Simão 1997).

Os maciços florestais de Cantanhez, outrora formações vegetais contínuas, deram lugar a algumas manchas de floresta isoladas (Figura 4). Segundo Simão (1997), existem 14 matos distintos (Tabela 1), contudo Cassamá (2006) afirma existirem 16, adicionando aos anteriores a floresta de Caboxanque e Camarampô mas, o Parque Nacional de Cantanhez, em vias de ser oficializado, cobrirá uma área mais vasta que compreenderá mais de vinte florestas.

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Tabela 1 – Nomes e áreas (ha) das várias florestas (matos) que se inserem na zona de Cantanhez segundo a cartografia definida por Simão (1997). Os números entre parêntisis referem-se à figura 4.

Nome da Floresta Área (ha) Nome da Floresta Área (ha)

Amidara (1) Cambeque (3) Canamine (10) Cibe Cadique (6) Cafatche (9) Caghode (11) Catomboi (5) 2 507,5 1 285,5 1 067,5 552,5 457,5 442,5 437,5 Lautchande (2) Madina-Cantanhez (4) Caiquene (7) Cabum (8) Muna (12) Cugha (14) Capicada (13) 405,0 402,5 362,5 232,5 102,5 75,0 47,5

Figura 4 – Área de estudo no contexto geográfico de Cantanhez. Mosaico de floresta, savana e mangal. Segundo Simão (1997) Cantanhez era composto por 14 florestas.

As actuais florestas de Cantanhez conseguem ainda suportar uma diversidade faunística elevada que inclui sete espécies de primatas. Entre os primatas incluem-se o chimpanzé da África Ocidental Pan troglodytes verus, o colobo vermelho da África Ocidental Pilicolobus badius, o cólobo branco e preto da África Ocidental Colobus polykomos, o Cercopithecus mona campbelli, Cercopithecus aethiops sabaeus e o babuíno Papio papio (Féron 1996, Kingdom 2004). Entre outros mamíferos ameaçados, tal como listados por Féron (1996), encontram-se o porco-do-mato Hylochoerus meinertzhageni ivorensis, o búfalo-africano Syncerus caffer, as cabra-mato, Cephalophus maxwelli, Cephalophus dorsalis e Cephalophus sylvicultor, o Sim-sim Kobus ellipsiprymnus e a gazela-de-lala Redunca redunca. O manatim Trichechus senegalensis já foi registado nos troços superiores do Rio Cacine e, nalgumas zonas, o crocodilo pequeno Osteeolaemus tetrapsis.

O estado de conservação das florestas de Cantanhez parece ser um tema controverso, pois existem autores que afirmam que estas manchas de floresta se encontram ameaçadas (Martins 1994, UICN 1997) e em contínua deterioração, reflexo

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de uma cobertura florestal progressivamente mais fragmentada, decorrente do aumento da área dedicada às plantações de banana, caju e outros frutos (Figura 5, Gippoliti et al. 2004).

Porém, segundo Cassamá (2006), a análise de imagens de satélite dos períodos 1953 a 2003, demonstra que 60% da área de floresta densa permaneceu inalterada e que as alterações mais importantes na vegetação natural ocorreram principalmente nas zonas povoadas e ao longo das principais entradas. Durante o mesmo período, reporta-se que 66% da área de savana arborizada foi transformada em floresta densa, provocando um incremento de 73,9% nesta classe, em parte devido à recuperação de zonas anteriormente exploradas e à intensificação da produção de pomares de caju, que em avançado estado de desenvolvimento, pode ser confundido com floresta sub-húmida e portanto contemplada na classe floresta densa. Torres (2006), com base nas mesmas imagens de satélite, afirma que o chimpanzé parece preferir zonas com características específicas, entre as quais se encontram áreas de floresta densa que se apresentam estáveis desde os últimos sete anos e áreas que se inserem nas classes floresta densa, floresta aberta e savana arborizada. Ainda segundo Cassamá (2006) e Torres (2006), as áreas preferidas pelo chimpanzé têm vindo a aumentar na península de Cantanhez desde 1953, não estando portanto ameaçadas. Independentemente desta controvérsia, que poderá resumir-se ao conceito de “floresta densa” e que irá certamente ser esclarecida num futuro mais ao menos próximo.

OBJECTIVOS

Este trabalho decorreu no âmbito do projecto “Distribuição das Comunidades de Chimpanzés (Pan troglodytes verus) na Região Costeira da Guiné-Bissau e a sua Relação com as Comunidades Humanas Locais” – POCI/Ant/57434/2004, cujos grandes objectivos são delinear estratégias de conservação que visem a sobrevivência do chimpanzé na região e aprofundar o conhecimento desta subespécie que, situando-se no limite noroeste da distribuição da espécie, persiste para a Guiné-Bissau desconhecida do ponto de vista ecológico e comportamental.

No decorrer deste trabalho foram abordados dois universos contíguos: a floresta e a aldeia. Assim, duas metodologias diferentes foram aplicadas a dois contextos diferentes mas interdependentes: as florestas (Caiquene, Cibe Cadique, Lautchande

Figura 5 – Desflorestação e queimada para cultura de sequeiro. Foto da esquerda foi tirada num dos trilhos de Cibe Cadique e a foto da direita foi registada à beira da estrada Iemberém-Cadique Nalu.

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e Madina-Cantanhez) e as respectivas aldeias (Caiquene, Cadique Nalu, Lautchande e Madina). Em ambos os contextos o objecto de estudo foi o chimpanzé: nas florestas o objectivo consistiu em estimar a densidade desta espécie e, por outro lado, nas aldeias pretendeu-se testar diferentes veículos de sensibilização ambiental, de forma a definir quais as estratégias mais eficientes e adequadas à forma como as comunidades humanas percepcionam esta espécie.

Este estudo foi pioneiro no que se refere a estimar a densidade de chimpanzés nas Florestas de Cantanhez, região em que o chimpanzé demonstra preferência por construir ninhos em palmeira, particularidade que poderá condicionar os métodos de amostragem. Esta abordagem, de cariz preliminar, pretende contribuir para o início da monitorização sistemática das populações de chimpanzés em Cantanhez.

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Densidade de Pan troglodytes verus

em Quatro Florestas de Cantanhez,

República da Guiné-Bissau:

Uma Abordagem Preliminar

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RESUMO

Palavras-Chave: chimpanzé; palmeira; contagem de ninhos; estimativa de densidade; Cantanhez.

O uso de transectos lineares é considerado um dos procedimentos mais eficazes e comumente utilizados para estimar a densidade de chimpanzés. No entanto, este método implica a abertura de novos caminhos na floresta o que, no contexto de Cantanhez, significa novas plataformas de oportunidade para a caça. Devido às condições específicas do campo e do processo de conservação destas florestas, seguir velhos caminhos foi a única metodologia possível. O método Marked Nest Counts, aplicado ao longo de 4 meses e obedecendo a uma amostragem estratificada, seguiu períodos de amostragem quinzenal em que os ninhos novos encontrados foram registados e classificados.

Dos ninhos novos detectados, 92,60% correspondem a ninhos em palmeira (Elaeis guineensis), podendo tomar duas estruturas distintas: ninho de folhas partidas e ninho de folhas dobradas. Enquanto que o primeiro tipo entra em decaimento, o segundo pode sofrer desdobramento e deixar folhas disponíveis para a construção de um novo ninho. Três a quatro repetições parecem constituir o esforço de amostragem mais adequado, já que um número elevado de palmeiras marcadas, que podem ser reutilizadas, poderá conduzir ao aumento da probabilidade de existirem ninhos não detectados, e portanto, a uma subestimativa da densidade.

Os valores de densidade estimados, considerando o habitat homogéneo quanto à distribuição dos ninhos, foram: 2,649 e 3,245 chimpanzés que constroem ninho/km2,

recorrendo a aferição da curva de detectabilidade ou ao programa DISTANCE 5.0, respectivamente. No entanto, visto que existem diferenças quanto à taxa de detecção de ninhos entre as quatro florestas em estudo (Caiquene, Cibe Cadique, Lauchande, Madina) e entre as áreas de floresta e as orlas de floresta, é importante ter em conta estas descontinuidades. Assim, tendo em conta a heterogeneidade do habitat, temos: 1,937 e 2,340 chimpanzés que constroem ninho/km2, recorrendo à

aferição da curva de detectabilidade ou ao programa DISTANCE 5.0, respectivamente.

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ABSTRACT

Key-Words: chimpanzee; palm tree; nest-count; estimating density; Cantanhez.

Cantanhez is a patchy environment characterized by a mosaic of fragmented primary sub-humid forest, secondary forest, savannah, mangrove and agricultural fields. It is still not recognized as an official Park and little is known about both hunting and deforestation pressures and their effects on non-human primate populations. This study took place in four of those forests: Caiquene, Cibe Cadique, Lautchande and Madina.

Line transect sampling is one of the most accurate (and widely used) method to estimate chimpanzee densities. It implies however the opening of new forest paths that also means new hunting platforms. Due to conservational aspects and specific field aspects (e.g. bomb-shells and other ammunition remais of the independence war), following old trails was considered the most suitable method. A stratified sampling with repeated marked nest counts was applied during a 4 month period. During each two-week repetition new chimpanzee nests were registered and classified.

Within the detected new nests, 92.60% had been built in palm trees. These nests were distinguished within two types: broken leaves nest or bended leaves nest. While the first type gets into a decaying process, the second type can, through unfolding, turn the leaves available again for new nest building episodes. Three to four repetitions seem to be the adequate sampling effort since a high number of marked palm trees leads to the increasing probability of undetected nest events which would lead to an underestimation.

The density values when assuming a homogenous habitat were estimated at 2,649 and 3,245 nest builders/km2, using the detectability curve fitting or the DISTANCE

5.0 software, respectively. However, due to the nest encounter rate differences found between forests and forest and limit areas, it is very important to take these different strata into account. Thus, if the habitat heterogeneity in terms of nest building is taken into account, the estimated density values are: 1,937 and 2,340 nest builders/km2, using the detectability curve fitting or the DISTANCE software,

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INTRODUÇÃO

Na Guiné-Bissau coexiste uma notável variedade de tipos de vegetação, por se encontrar na Zona de Transição Regional Guineo-Congolesa/Sudanesa divide-se em regiões botânicas: a região Sudano-Guineense, a norte e nordeste do território, é caracterizada por floresta aberta seca e savana arborizada; a região Guineense, que se estende pelo centro do país, apresenta florestas densas secas que alternam com semi-secas; e a região Guineense Sub-Húmida, que cobre o sul do país com florestas densas semi-perenifólias ou sub-húmidas (Martins 1994). Muitas vezes, na orla destas formações florestais existem palmares mistos, dominados por Elaeis guineensis (Catarino 2004, Cassamá 2006).

A sobrevivência das últimas manchas de floresta sub-húmida primária poderá permitir conservar in situ um grande número de espécies de considerável interesse. O desaparecimento progressivo das florestas densas provoca o desaparecimento dos conhecimentos tradicionais das populações que as exploram e confere dificuldade à sobrevivência dos grandes mamíferos, em particular dos predadores, que necessitam de vastas áreas para garantir alimentação e reprodução (Dodman et al 2004).

O Chimpanzé, Pan troglodytes verus

O chimpanzé da África Ocidental, Pan troglodytes verus, é catalogado pelo World Conservation Monitoring Centre como a segunda subespécie menos abundante, cuja estimativa ronda os 25.000 a 52.900 indivíduos (UNEP-WCMC 2001). Apresenta uma distribuição vasta mas descontínua, desde o sudeste do Senegal até ao rio Níger (Butynski 2003).

Em 1998 estimou-se um total de 12.000 indivíduos, estimativa que declarou não existirem populações naturais em países como a Guiné-Bissau, Gambia, Burkina-faso, Togo e Benim. Segundo este estudo, a distribuição da espécie circunscrevia-se à Costa do Marfim, onde ocorre a população mais numerosa, Guiné-Conacri, Serra Leoa, Libéria, Mali, Gana e Senegal (Ape Aliance 1998). No entanto, recentemente foi reportada a existência de chimpanzés na zona de Fazao-Malfakassa (Togo, Oates 2006) e existem indícios de que estão presentes também no Burkina-Faso (Butynski 2003). Estas situações exibem contornos semelhantes ao ocorrido na Guiné-Bissau quando em 1995, um breve estudo levado a cabo na área do Rio Cacine e Florestas de Cantanhez, revelou a presença de sete espécies de primatas, quatro delas actualmente incluídas na Red List of Threatened Animals da UICN e, entre estas, o chimpanzé da África Ocidental. Anteriormente declarado extinto na Guiné-Bissau, foi então definido como espécie localmente comum na zona do Rio Cacine e Cantanhez (Gippoliti & Dell’Omo 1996), ocorrendo também no Parque Natural das Lagoas de Cufada (Região Administrativa de Quínara, Karibuhoye 2004), no sector de Boé e noutras áreas que não detêm qualquer estatuto de protecção. Gippoliti et al. (2004) estimam que existam na Guiné-Bissau entre 600 a 1000 indivíduos.

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A Guiné-Bissau apresenta-se como o limite ocidental da distribuição do Pan troglodytes verus, o que potencialmente poderá ter conduzido ao aparecimento de especificidades culturais e comportamentais, sendo desde já exemplo a preferência por ninho em palmeira (Gippoliti et al. 2004). Estas plataformas, na sua maioria utilizadas para passar a noite, podem ser detectadas e contadas (van Schaik et al. 2005), factor que tem encorajado os cientistas a estimar a densidade das espécies de grandes símios através da contagem de ninhos (Buckland et al. 2001).

Descontinuidades implícitas à Ecologia dos Ninhos de Chimpanzé

«(…) chimpanzee nests should no longer be considered a homogenous grouping.»

(Brownlow et al. 2001)

O padrão e a distribuição dos ninhos são influenciados por diversos factores dos quais resulta variabilidade (Furuishi & Hashimoto 2003). Por vezes, em proporções específicas para cada local, existem eventos de reutilização de ninhos (Plumptre & Reynolds 1997, Plumptre & Cox 2006), nos quais os animais juntam ramos com folhas e tornam os ninhos já existentes mais confortáveis e robustos, fenómeno que, mais frequente em ambientes secos, parece ser influenciado por factores ecológicos (Fruth & Hohmann 1996). Outra descontinuidade prende-se com a construção de ninhos diurnos que, utilizados para breves períodos de descanso, constituem plataformas mais simples que os ninhos para pernoitar (Plumptre & Reynolds 1997). Por exemplo, na Floresta Budongo (Uganda) foram registados, relativamente ao número total de ninhos encontrados, 13,8% de reutilizações e 22,9% de ninhos diurnos; cuja diferença (9,1%) se traduz num factor de correcção de 1,09 ninhos construídos por cada chimpanzé por noite (Plumptre & Reynolds 1997).

METODOLOGIA

ÁREA DE ESTUDO

No passado, grande parte da Guiné-Bissau era ocupada por um mosaico de floresta plana de diferentes tipos, contudo tem vindo a ser substituída por extensas áreas de savana e prados secundários. Apresenta clima tropical, geralmente quente e húmido, com precipitação anual de 1.500 a 2.000 mm na maior parte do território, sendo mais elevada no sul onde excede os 2.000 mm (Dodman et al. 2004). Existem dois regimes anuais perfeitamente distintos: a estação das chuvas, que se estende de Maio a Setembro, cuja temperatura ronda os 20ºC a 38ºC, e a estação seca, entre Outubro e Junho, durante a qual a temperatura oscila entre 15ºC e 30ºC (Vieira 2004).

As florestas de Cantanhez constituem as últimas manchas de floresta sub-húmida existentes na Guiné-Bissau e, na sua unicidade conservam ainda a biodiversidade e riqueza características (Simão 1997, IUCN 2000) que se fazem representar por 82 espécies vegetais lenhosas (Catarino 2004) e inúmeras espécies animais.

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Neste trabalho, pretende-se estimar a densidade de chimpanzés para a área de distribuição potencial. Assim, dos habitats representados em Cantanhez, a área de estudo circunscreveu-se às manchas de floresta sub-húmida. Contextos como a savana, o mangal, cultivos ou aldeias não foram considerados, pois assume-se que, apesar de alguns deles serem utilizados pelo chimpanzé, não constituem zonas utilizadas para pernoitar. Das florestas que constituem Cantanhez, a área de estudo compreendeu as florestas de Caiquene, Cibe Cadique, Lautchande e Madina-Cantanhez, escolha dirigida apenas por constrangimentos logísticos.

MÉTODOS DE AMOSTRAGEM

As quatro florestas seleccionadas foram definidas como estratos (strata), dentro dos quais se procedeu ao único esquema de amostragem possível: não linear e não aleatório. Estas florestas de pequenas dimensões, conjugadas num mosaico de savana, mangal e cultivos, apresentam-se como entidades únicas e vulneráveis. A política local é a de “reservar” determinadas zonas de floresta, sendo portanto imperativo que entidades externas a respeitem (Fashing & Cords 2000). Em detrimento de abrir novos caminhos na floresta, que poderiam criar novas plataformas de oportunidade para a caça, o esquema de amostragem mais adequado às características e ao contexto da região foi utilizar caminhos já existentes na floresta (Walsh & White 1999). Em cada floresta foram percorridos todos os trilhos disponíveis, evitando apenas locais onde foram encontradas antigas bombas ou outro tipo de munições por detonar, utilizadas na guerra da independência. Esta foi outra razão que levou a que fossem seguidos caminhos, já que estes artefactos são aí mais facilmente identificáveis.

Atendendo aos constrangimentos citados, decidiu-se descartar a estrutura considerada ideal, transectos lineares de disposição aleatória ou sistemática (Buckland et al. 2001, Morgan et al. 2006, ver anexo 1), em detrimento de outros valores/factores considerados essenciais ao estado actual do processo de conservação das Florestas de Cantanhez.

A probabilidade de um local se inserir na zona amostragem deverá ser igual para toda a área de estudo, caso contrário surge o enviesamento dos resultados (Thomas et al. 2006). Apesar do esquema de amostragem escolhido não permitir responder aos pressupostos de linearidade ou aleatoriedade, não existe razão para assumir que a distribuição dos chimpanzés poderá ser influenciada pela existência de trilhos é visto que o chimpanzé é uma espécie que não constitui alvo de caça (Fashing & Cords 2000) e os caminhos usados são canais extremamente finos e antigos. Além disso, alguns estudos têm demonstrado que abrir trilhos pode constituir um elemento repulsivo (Plumptre & Reynolds 1997).

Se forem geradas linhas ou pontos de amostragem exclusivamente dentro da área de amostragem estamos perante um minus sampling, que é caracterizado pela ocorrência de subestimação do limite da área de amostragem e uma probabilidade de cobertura heterogénea (Thomas et al. 2006). Como tal, do total de quilómetros

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Figura  1  –  Distribuição  aproximada  das  quatro  subespécies  actualmente  reconhecidas:  Pan  troglodytes  troglodytes,  Pan  troglodytes  schweinfurthii,  Pan  troglodytes  verus  e  Pan  troglodytes vellerosus (adaptado de Gao et al
Figura 2 –  Áreas estabelecidas como prioritárias para a conservação do chimpanzé  na África  Ocidental (adaptado de Kormos & Boeach 2003)
Tabela  1  –  Nomes  e  áreas  (ha)  das  várias  florestas  (matos)  que  se  inserem  na  zona  de  Cantanhez  segundo  a  cartografia  definida  por  Simão  (1997)
Figura 6 – Ninho de chimpanzé em palmeira.
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Referências

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