Programa de Pós-Graduação em Administração
Mestrado
Rejane Maria Andrade Carvalho
INCLUSÃO SOCIAL E DESEMPENHO DOS ALUNOS COTISTAS NO
ENSINO SUPERIOR NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
INCLUSÃO SOCIAL E DESEMPENHO DOS ALUNOS COTISTAS NO
ENSINO SUPERIOR NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
Dissertação apresentada ao curso de Mestrado Acadêmico em Administração do Centro Universi-tário Unihorizontes, como requisito parcial para ob-tenção do título de Mestre em Administração. Orientador: Prof. Dr. Fernando Coutinho Garcia Linha de pesquisa: Relações de Poder e Dinâmica nas Organizações
Área de concentração: Organização e Estratégia
Ficha elaborada pela Bibliotecária do Centro Universitário Unihorizontes.
– Viviane Pereira CRB6 1663 - CARVALHO, Rejane Maria Andrade
Inclusão social e desempenho dos alunos cotistas no ensino superior na Universidade Federal de Viçosa. Belo Horizonte: Centro Universitário Unihorizontes, 2018.
80p.
Orientador: Dr. Fernando Coutinho Garcia
Dissertação (Mestrado) – Programa de Mestrado em Administração – Centro Universitário Unihorizontes.
1.Inclusão social – sistema de cotas - IES l. Rejane Maria Andrade Carvalho II. Centro Universitário Unihorizontes Programa de Mestrado em Administração. III. Título.
Declaro que fiz a correção linguística de Português da dissertação
de Rejane Maria Andrade Carvalho, intitulada
Inclusão Social e
Desempenho dos Alunos Cotistas no Ensino Superior na
Universidade Federal de Viçosa
, apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Administração do Centro Universitário Unihorizontes,
como requisito parcial para obtenção do título de mestre.
.
Viçosa, MG, 2 de outubro de 2018.
Edir de Oliveira Barbosa Revisor de Textos – UFV
Primeiramente, agradeço a Deus por ter me dado força para concluir mais essa
etapa.
Agradeço ao meu orientador, Doutor Fernando Coutinho Garcia, por ter tido a boa
vontade de me aceitar no final do mestrado e ter lido, pacientemente e com muito
critério, a minha pesquisa.
Agradeço às minhas filhas, Luiza e Julia, por ter tido paciência e compreensão
nessa fase.
Agradeço aos meus colegas de turma pelo companheirismo e apoio, presentes em
todas as etapas do mestrado. Sem eles talvez não chegaria até aqui.
Agradeço à amiga Neiva por toda disponibilidade e ajuda e, principalmente, por ter
se tornado a mãe de todos nós.
Este estudo busca contribuir para o debate sobre o desempenho acadêmico de alunos cotistas e não cotistas na percepção dos egressos no curso de Direito da turma de 2014 e no de Medicina da turma de 2013 da Universidade Federal de Viçosa. A literatura tenta justificar as ações afirmativas como uma forma de reduzir as desigualdades do passado por meio da promoção de justiça social. Tal discussão acerca desse tema nos cursos supracitados apresenta um aspecto social relevante no âmbito das Ações Afirmativas de Políticas de Cotas, visto que o sistema atual de cotas inclui questões étnicas, alunos que estudaram em escola pública e, ou, alunos de baixa renda familiar. Com o aumento, nas últimas décadas, de políticas que beneficiam grupos historicamente marginalizados e com grande vulnerabilidade socioeconômica, um dos principais argumentos na esfera pública é o de que a formação no ensino superior permite, a longo prazo, a redução das desigualdades sociais. Desse modo, o presente trabalho buscou demonstrar, com base na Lei de Cotas, a atual conjuntura da Universidade Federal de Viçosa, tendo como foco principal a percepção sobre o desempenho de alunos, por meio de uma pesquisa descritiva de abordagem qualitativa utilizando o método de coleta de dados por meio da história de vida. Buscou-se, no decorrer das análises, comparar por meio dos relatos o desempenho e os níveis de rendimento acadêmico dos alunos cotistas e não cotistas, bem como identificar possíveis fatores que influenciem para um maior ou menor desempenho acadêmico. Como resultado, percebe-se que não há diferença expressiva de desempenho quando comparados os cotistas com os não cotistas. Dessa forma, pode-se concluir que o sistema de cotas em vigor não traz nenhum prejuízo e que o desempenho e o resultado estão atrelados ao esforço e empenho individual.
Palavras-chave: Sistema de Cotas. Cotistas e Não Cotistas. Desempenho escolar.
This study seeks to contribute to the debate about the academic performance of quota and non-quota students in the perception of the graduates in the Law course of the class of 2014 and of the Medicine of the class of 2013 of the Federal University of Viçosa. Literature attempts to justify affirmative action as a way to reduce inequalities of the past by promoting social justice. Such a discussion about this theme in the courses mentioned above has a relevant social aspect in the scope of Affirmative Actions of Quota Policies, since the current quota system includes ethnic issues, students who studied in public schools and, or, students of low family income. With the increase in the last decades of policies benefiting historically marginalized groups with great socioeconomic vulnerability, one of the main arguments in the public sphere is that training in higher education allows, in the long term, the reduction of social inequalities. Thus, the present work sought to demonstrate, based on the Law of Quotations, the current situation of the Federal University of Viçosa, with the main focus being the perception on student performance, through a descriptive research of qualitative approach using the method of data collection through the life history. In the course of the analyzes, it was sought to compare, through the reports, the performance and the academic performance levels of the quota and non-quota students, as well as to identify possible factors that influence to a greater or lesser academic performance. As a result, it can be seen that there is no significant difference in performance when comparing quotaholders with non-quota holders. In this way, it can be concluded that the quota system in force does not cause any losses and that the performance and the result are linked to the individual effort and commitment.
Keywords: Quota System. Quotaholders and Non-Quotaholders. Academic
ACE Avaliação das Condições de Ensino
ANDIFES Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de
Ensino Superior
ANPAD Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior
CEA Comissão Especial de Avaliação
CEDAF Central de Ensino e Desenvolvimento Agrário de Florestal
CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
COLUNI Colégio de Aplicação
CONAES Comissão Nacional de Avaliação
ENANPAD Encontro da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação
em Administração
ESAV Escola Superior de Agricultura e Veterinária
ENADE Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes
ENAC Exame Nacional de Cursos
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
FIES Financiamento Estudantil
FINEP Financiadora de Estudos e Projetos
GEMAA Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa
GERES Grupo Executivo da Reforma da Educação Superior
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IFES Instituição Federal de Ensino Superior
LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC Ministério da Educação
ONU Organização das Nações Unidas
PAIUB Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras
PARU Programa de Avaliação da Reforma Universitária
PASES Programa de Avaliação Seriada para o Ensino Superior
PDE Plano de Desenvolvimento da Educação
PNAD Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
PROVÃO Exame Nacional de Cursos
REUNI Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais
SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
SIS Síntese de Indicadores Sociais
SISU Sistema de Seleção Unificado
UENF Universidade Estadual do Norte Fluminense
UERJ Universidade Estadual do Rio de Janeiro
UFPR Universidade Federal do Paraná
UFV Universidade Federal de Viçosa
UNB Universidade de Brasília
UNEB Universidade do Estado da Bahia
1 INTRODUÇÃO 10
1.1 Problema de pesquisa 11
1.2 Objetivo geral 14
1.3 Objetivos específicos 14
1.4 Justificativa 15
2 AMBIÊNCIA DA PESQUISA 17
2.1 A Universidade Federal de Viçosa e o acesso aos cotistas 17
3 REFERENCIAL TEÓRICO 21
3.1 Direito a igualdade e inclusão social 21
3.2 A inclusão no cenário brasileiro 24
3.3 Políticas públicas de Educação 27
3.3.1 Política de expansão do ensino superior 30
3.3.2 A política de cotas na universidade brasileira 33 3.3.2.1 O estigma acerca das políticas de cotas 36
3.3.2.2 Estudos sobre políticas de cotas 38
3.4 Mecanismo de avaliação no ensino superior no Brasil 42 3.4.1 A trajetória da avaliação da educação superior no Brasil 42 3.4.2 Legitimidade da avaliação na educação brasileira 44 3.4.3 Exame Nacional de Cursos – PROVÃO (1996-2003) 46 3.4.4 Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior 48
4 METODOLOGIA DA PESQUISA 51
4.1 Tipo, abordagem e método de pesquisa 51
4.2 Unidade de análise e sujeitos da pesquisa 52
4.3 Coleta de dados 53
5 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE RESULTADOS 55
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 69
1 INTRODUÇÃO
No Brasil, com a Constituição Federativa de 1988, e a abertura das políticas
públicas, foi estabelecido um percentual de vagas para que as pessoas com
deficiência pudessem exercer cargos públicos. Em 1995, adotou-se no território
nacional a primeira política de cotas, com a reserva de 30% das vagas para que as
mulheres estivessem à frente de cargos públicos (MOEHLECKE, 2002).
Nas universidades públicas federais brasileiras, as ações afirmativas chegaram a
partir de 2000. A universidade pioneira na reserva de vagas no seu vestibular foi a
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), em 2003. Essa reserva de vagas
ficou conhecida como cotas, a partir de um Projeto de Lei Estadual que destinava
45% do total de vagas para essas cotas, assim distribuídas: 20% para candidatos da
rede pública, 20% para negros ou indígenas e 5% para candidatos com deficiências
ou filhos de policiais, bombeiros e inspetores de penitenciárias mortos ou
incapacitados para o exercício de suas atividades. Logo depois da UERJ vieram a
Universidade Estadual do Norte Fluminense (UENF) e a Universidade de Brasília
(UNB) – que instituiu as cotas raciais –, a Universidade do Estado da Bahia (UNEB),
seguida pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), todas em 2004 (MAIO;
SANTOS, 2005; BAYMA, 2012).
Em 29 de agosto de 2012, foi sancionada no Brasil a Lei nº 12.711 – Lei das Cotas,
que dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais
de ensino técnico de nível médio, garantindo 50% das vagas nas escolas públicas,
distribuídas entre autodeclarados pretos, pardos e indígenas e por pessoas com
deficiência e alunos oriundos de famílias com baixa renda e de escolas públicas. Os
restantes 50% das vagas permanecem distribuídos para a ampla concorrência
(BRASIL, 2012).
A Universidade Federal de Viçosa (UFV) passou a adotar a reserva de vagas (cotas)
a partir do ano 2013, por meio do Sistema de Seleção Unificado (SISU) com
porcentagem de 50% para a ampla concorrência (UFV, 2017). Essa reserva de
vagas (cotas) permite aos estudantes de baixa renda familiar almejar o acesso a
cursos elitizados, e assim se realiza o ideal liberal de igualdade para todos
(BORGES, 2005).
Em relação às cotas raciais, há os que são desfavoráveis e consideram que tais
medidas são apenas paliativas, defendendo a melhoria do ensino fundamental para
que os alunos de classe social mais baixa (a maioria negra) consigam adentrar as
universidades públicas federais (CAMPOS; JUNIOR; DAFLON, 2013). Também, há
os que acreditam que os estudantes de baixa renda podem almejar, com o uso
dessas cotas, o acesso a cursos elitizados, realizando o ideal liberal de igualdade
para todos (BORGES, 2005).
Nesse sentido, a adoção de sistema de cotas em universidades públicas brasileiras
provocou debates e polêmicas que atualizam os debates sobre políticas públicas
direcionadas para a população marginalizada - em sua maioria, os negros (PINTO,
2004; REIS, 2006).
Para Cazella (2012), a aplicação do programa de cotas raciais para negros nas
universidades públicas brasileiras gera conflitos, uma vez que os cotistas negros que
aderem ao sistema de cotas são invariavelmente rotulados de incapazes de obter
sucesso por si mesmo, retirando-se o mérito individual deles, visto que necessitaram
de um auxílio que adveio de uma característica física, em que fora simplesmente
analisada a cor do aluno e não o seu intelecto. Como consequência, o sistema de
cotas causa polêmica, principalmente, pelo fato de que estudantes brancos que
obtiveram melhor pontuação no vestibular têm suas vagas retiradas por estudantes
negros com pontuação inferior.
1.1
Problema de pesquisa
A educação superior no Brasil até os anos de 1990 era privilégio somente das
privilégios advindos desde o ensino fundamental, em que as pessoas com mais
recursos estudavam em colégios privados, que detinham uma educação de
qualidade superior se comparada com a dos colégios públicos (SOARES; CESAR;
FONSECA, 1999).
Portanto, a partir da iniciativa norte-americana, outros países passaram a aplicar as
políticas das ações afirmativas como opção de garantir a democracia inclusiva
(CAZELLA, 2012). Assim, o exemplo norte-americano de promoção das políticas de
ação afirmativa criada pelo Estado vem sendo utilizado como paradigma pelos
ordenamentos jurídicos da maioria dos países que integram a Organização das
Nações Unidas - ONU (SOUSA, 2008).
De acordo com Sousa (2008), a educação superior constitui atualmente uma forma
para que as pessoas sejam inseridas num mercado de trabalho mais qualificado e
tenham acesso a uma camada social mais exigente. Em razão disso, criaram-se,
como já dito, as políticas públicas que culminaram na promulgação da Lei das Cotas
em agosto de 2012, em que os segmentos menos favorecidos, assim como os
negros, índios, pardos e quilombolas, também começaram a ter facilidade de acesso
às instituições de ensino superior público brasileiras.
Como as instituições públicas de ensino no Brasil são gratuitas, elas têm grande
demanda, fazendo que o acesso a elas se torne muito concorrido. A Lei das Cotas
surgiu junto com a expansão do ensino superior privado via Financiamento
Estudantil (FIES) e o Programa Universidade para Todos (PROUNI), com o intuito de
colocar mais jovens brasileiros, com idades entre 18 e 24 anos, no ensino superior.
O atraso escolar é uma das restrições de acesso de jovens brasileiros ao ensino
superior: 21% dos jovens de 18 a 24 anos não tinham sequer completado o ensino
fundamental e 27%, apesar de terem completado o ensino fundamental, não
ingressaram no ensino médio ou ingressaram, mas não o concluíram. Esses
contingentes somados representam praticamente a metade dos jovens (48%) que,
nessas condições, não possuem os requisitos educacionais formais para ingresso
Existem outros 33% do total de jovens nessa faixa etária que concluíram o ensino
médio, mas não ingressaram no ensino superior. E, finalmente, apenas 19% tiveram
acesso ao ensino superior, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios– PNAD (2009).
Com o passar do tempo, houve evolução nos números, que demonstraram o
aumento dos alunos concluintes do ensino médio. Porém, Costa e Gamerman (2011)
afirmam que, mesmo ao atingir o patamar quantitativo de escolaridade (conclusão
do ensino médio), não há garantia de igualdade de condições na disputa por uma
vaga na educação superior.
Há de se considerar que esse sistema de cotas, por visar atingir pessoas que
estudaram em escolas públicas, em que a tônica é a baixa qualidade do ensino,
suscita a questão “se, afinal, o nível educacional do ensino nas instituições federais
brasileiras tende a abaixar, uma vez que, dado o acesso ao ensino superior em
condições de desigualdade, há a necessidade de se fazer um nivelamento dos
estudantes para que eles possam acompanhar o ensino” (ALMEIDA; TEIXEIRA,
2011).
A política de cotas representa uma inclusão social tanto quantitativa quanto
qualitativamente das pessoas menos favorecidas e de raças anteriormente
desfavorecidas. Os alunos cotistas, oriundos de escolas públicas e de baixa renda
familiar, possuem baixa aprovação em cursos considerados de elite (Engenharias,
Medicina e Direito), enquanto os alunos não cotistas são oriundos de escolas
particulares, em que a qualidade do ensino é muito superior, em comparação com a
do ensino das escolas públicas. Um dos elementos que induzem essa comparação é
exatamente a educação anterior, que por si só aponta que pode existir nível
diferenciado (BRUINI, 2017).
Segundo Cazella (2012), a universidade pública brasileira tem por objetivo atender à
elite econômica brasileira. A nota de corte utilizada pelas universidades públicas
geralmente elimina grande parte dos alunos que estudam em escolas públicas de
de qualidade duvidosa, não permitindo que os pobres obtenham pontuação para
ingressar na universidade pública e gratuita e, ainda, não obtenham desempenho
satisfatório.
Diante dessas características, pressupõe-se que esse desempenho pode ser
diferenciado e condizente entre alunos cotistas e alunos não cotistas. Aqueles, em
relação a estes, normalmente possuem menor desempenho em relação às notas e à
permanência nos cursos escolhidos, levando-os, às vezes, ao abandono da
faculdade (BRUINI, 2017).
Destaca-se que, mesmo sendo garantido o acesso ao ensino superior, são grandes
as dificuldades que os estudantes provenientes de escolas públicas enfrentam para
permanecer nas universidades, bem como têm seu desempenho diferenciado
(CAR-VALHO; WALTENBERG, 2015).
Diante dessas considerações, surge a pergunta norteadora deste estudo: qual a visão dos formandos sobre o desempenho dos alunos cotistas e não cotistas nos cursos de Direito e Medicina, na Universidade Federal de Viçosa –
Campus-sede – Viçosa-MG?
Diante da pergunta exposta, apresentam-se a seguir os objetivos gerais e os
especí-ficos.
1.2 Objetivo geral
Descrever a percepção sobre o desempenho acadêmico dos estudantes cotistas e
não cotistas dos cursos de Medicina 2013 e Direito 2014 da Universidade Federal de
Viçosa – Campus-sede – Viçosa-MG.
1.3 Objetivos específicos
(i) Descrever o desempenho acadêmico dos estudantes matriculados na
Universidade Federal de Viçosa – Campus-sede – Viçosa, MG, nos cursos de
Medicina 2013 e Direito 2014.
(ii) Comparar o desempenho de alunos cotistas e não cotistas dos cursos de
Medicina 2013 e Direito 2014 da UFV pelas suas histórias de vida.
1.4 Justificativa
Como a produção científica tem como objetivo apropriar-se da realidade para melhor
analisá-la e, posteriormente, produzir transformações, a discussão sobre o
desempenho de alunos cotistas em relação aos alunos não cotistas, além do
aspecto social relevante, reveste-se de importância para entender o resultado que
está sendo obtido com a inclusão das cotas, tornando-se também importante
academicamente (VELLOSO, 2009).
Ainda no âmbito acadêmico, esta pesquisa é fundamental, pois poderá contribuir
para a ampliação do entendimento de estudos relacionados ao sistema de cotas e a
um estudo comparativo de desempenho na percepção de alunos cotistas e não
cotistas. Isso porque, em busca realizada no site da Associação Nacional de
Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ANPAD) e Encontro da Associação
Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração (ENANPAD), que se
referem a artigos publicados em congressos de dezembro de 2017, buscou-se o
tema “lei de cotas”, sendo obtido o retorno de apenas um artigo. Ao pesquisar sobre
o tema “desempenho de alunos cotistas”, não houve retorno de artigo. Já em uma
pesquisa refinada, buscando artigos no período de 2012 a 2017, ou seja, num
período de cinco anos, logo se verificaram opções de novos moldes de estudo,
abarcando o tema proposto.
Na perspectiva institucional, a maior produção de estudos e conteúdos sobre como
de um processo de transformação do sistema atual para que continue atendendo os
jovens que necessitam de mais oportunidades, todavia sem danificar a qualidade do
ensino superior (LORDÊLO; DAZZANI, 2009).
Diante desses fatores relevantes, nesta pesquisa o interesse foi realizar o estudo
desses alunos cotistas e não cotista e verificar a sua percepção quanto ao seu
desempenho em uma universidade pública federal brasileira, contribuindo, assim,
para a permanência do uso dessas ações afirmativas – reservas de cotas – e
abrindo precedentes para futuros estudos.
Esta pesquisa esta estruturada em seis capítulos: o primeiro capítulo apresenta a
introdução, que contextualiza o tema, a problemática, o objetivo geral e os objetivos
específicos mais a justificativa. No segundo capítulo consta a ambiência desta
pesquisa, já no terceiro capítulo, desenvolveu-se o referencial teórico, que trata das
temáticas: as ações afirmativas, políticas públicas na Educação; e o Sistema de
Seleção Unificada (SISU). No quarto capítulo trata da metodologia que foi utilizada
na pesquisa. No quinto capítulo esta a apresentação e análise dos resultados, no
sexto capítulo as considerações finais seguidas das referências utilizadas nesta
2
AMBIÊNCIA DA PESQUISA
Neste capítulo, descreve-se a instituição pesquisada, que constitui a unidade de
observação deste estudo. As informações abaixo constam no site da Universidade
Federal de Viçosa (UFV).
2.1 A Universidade Federal de Viçosa e o acesso aos cotistas
A Universidade Federal de Viçosa originou-se da Escola Superior de Agricultura e
Veterinária (ESAV), criada pelo Decreto no 6.053, de 1922, do então Presidente do
Estado de Minas Gerais, Arthur da Silva Bernardes.
A ESAV foi inaugurada em 28 de agosto de 1926, pelo seu idealizador, que na época
ocupava o cargo máximo de Presidente da República, Arthur Bernardes. Em 1927,
foram iniciadas as atividades didáticas, com a instalação dos Cursos Fundamental e
Médio e, no seguinte, do Curso Superior de Agricultura. Em 1932, foi a vez do Curso
Superior de Veterinária. No período de sua criação, o Professor Peter Henry Rolfs,
da Universidade da Flórida, Estados Unidos, foi convidado por Arthur Bernardes
para organizar e dirigir a ESAV. Também veio, a convite, o Engenheiro João Bello
Lisboa, que trabalhava em reformas urbanísticas na cidade de Ponte Nova, para
administrar os trabalhos de construção do estabelecimento.
Visando ao desenvolvimento da Escola, em 1948 o Governo do Estado a
transformou em Universidade Rural do Estado de Minas Gerais (UREMG), que era
composta pela Escola Superior de Agricultura, pela Escola Superior de Veterinária,
pela Escola Superior de Ciências Domésticas, pela Escola de Especialização
(Pós-Graduação), pelo Serviço de Experimentação e Pesquisa e pelo Serviço de
Extensão.
Graças à sua sólida base e ao seu bem estruturado desenvolvimento, a UREMG
que ocorreu em 15 de julho de 1969, com o nome de Universidade Federal de
Viçosa (UFV).
A Universidade Federal de Viçosa vem acumulando, desde a sua fundação, larga
experiência e tradição em ensino, pesquisa e extensão, que formam a base de sua
filosofia de trabalho.
Desde os seus primórdios, a UFV se preocupa em promover a integração vertical do
ensino. Nesse sentido, trabalha de maneira efetiva, mantendo atualmente, além dos
cursos de graduação e pós-graduação, o Colégio de Aplicação (COLUNI), com
ensino médio geral; a Central de Ensino e Desenvolvimento Agrário de Florestal –
CEDAF (ensinos médio, técnico, médio geral e superior); Rio Paranaíba (curso
superior). Por tradição, a área de Ciências Agrárias é a mais desenvolvida na UFV,
sendo conhecida e respeitada no Brasil e no exterior. Apesar dessa ênfase na
agropecuária, a instituição vem assumindo caráter eclético, expandindo-se em
outras áreas do conhecimento, como: Ciências Biológicas e da Saúde, Ciências
Exatas e Tecnológicas e Ciências Humanas, Letras e Artes. Trata-se de uma postura
coerente com o conceito da moderna universidade, tendo em vista que a interação
das diversas áreas otimiza os resultados.
A UFV tem contado com o trabalho de professores e pesquisadores estrangeiros de
renome na comunidade científica, que colaboram com seu corpo docente, ao
mesmo tempo que executa um programa de treinamento que mantém diversos
profissionais se especializando tanto no Brasil quanto no exterior. Nesse particular, a
UFV é uma das instituições brasileiras com índices mais elevados de pessoal
docente com a qualificação em nível de pós-graduação. Já em 2006 mais um
campus universitário foi criado, na cidade de Rio Paranaíba, (UFV, 2017).
De acordo com informações obtidas no site da UFV, o campus principal situado na
cidade de Viçosa oferece cursos de graduação e programas de pós-graduação
stricto sensu, em níveis de mestrado (acadêmico e profissional) e doutorado, além
de cursos de pós-graduação lato sensu (presenciais e a distância). O Campus
congrega as atividades de seis cursos técnicos da Central de Ensino e
Desenvolvimento Agrário de Florestal (CEDAF) e de 10 cursos superiores da UFV
que, juntos, reúnem em torno de 1,5 mil estudantes. Já as atividades acadêmicas do
Campus Rio Paranaíba tiveram início no segundo semestre de 2007, com o
oferecimento dos cursos de Administração (integral e noturno) e Agronomia
(integral). No segundo semestre de 2008, passaram a ser oferecidos dois novos
cursos: Sistemas de Informação (integral e noturno) e Ciências de Alimentos
(integral). Atualmente já são oferecidos 10 cursos de graduação.
A Universidade Federal de Viçosa aderiu ao SISU a partir do primeiro semestre de
2011, desde então como fase única de seleção. Em 2011, 20% das vagas foram
destinadas ao SISU e 80%, ao vestibular e ao Programa de Avaliação Seriada para
o Ensino Superior – PASES/UFV. Em 2012, o vestibular deixou de ser aplicado;
assim, de 2012 a 2015, 80% das vagas foram preenchidas por meio do SISU e os
20% restantes, pelo PASES (RODRIGUES, 2016).
Em respeito à Lei no
12.711, a partir de 2013 a UFV passou a utilizar o SISU e o
PASES, com reserva de vagas (cotas) para estudantes que cursaram o ensino
médio integralmente na rede pública. O percentual de vagas reservadas foi
crescente de 2013 a 2015, sendo, respectivamente, 20%, 30% e 40%. Já em 2016,
quando não havia mais turmas dos vestibulares seriados, a UFV disponibilizou 100%
das vagas pelo SISU, e o percentual de vagas reservadas foi de 50%. As vagas
destinadas aos estudantes de escola pública se subdividem nas seguintes
modalidades (RODRIGUES, 2016):
a) Modalidade 1 ou Grupo 1: Escola pública, etnia, renda inferior ou igual a 1,5
salário mínimo per capita;
b) Modalidade 2 ou Grupo 2: Escola pública, renda superior ou igual a 1,5 salário
mínimo per capita;
c) Modalidade 3 ou Grupo 3: Escola pública, etnia;
e) Modalidade 5 ou Grupo 5: Ampla concorrência, que tem como único requisito
para classificação a nota do candidato.
O valor do percentual das vagas reservadas para estudantes autodeclarados pretos,
pardos ou indígenas (modalidades 1 e 3) tem que ser proporcional à população
informada no último Censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística),
3
REFERENCIAL TEÓRICO
Neste capítulo, aborda-se a fundamentação teórica utilizada no desenvolvimento
desta pesquisa com os seguintes tópicos: direito a igualdade e inclusão social; a inclusão no cenário brasileiro; políticas públicas de educação; política de expansão
do ensino superior; política de cotas na universidade brasileira; estigma acerca das
políticas de cotas; e mecanismos de avaliação no ensino superior no Brasil, que
possui como subitem: a trajetória da avaliação da educação superior no Brasil;
legitimidade da avaliação na educação brasileira; Exame Nacional de Cursos –
PROVÃO (1996-2003); e Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior –
SINAES (2003).
3.1 Direito a igualdade e inclusão social
A compreensão de igualdade, em uma divisão jurídica de primeira grandeza,
emergiu com urgência como princípio jurídico incontornável nos documentos
constitucionais validados. Com a Revolução Francesa e seus ideais de liberdade,
igualdade e fraternidade, surge a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão
de 1789. No entanto, como apenas direitos individuais foram alcançados nesse
período, a isonomia assumiu feição puramente formal. Falava-se apenas em
igualdade perante a lei (ARAÚJO, 2007).
Com essa prescrição da igualdade, surge a ideia de discriminação, que traz implícito
a recusa à discriminação, que é qualquer distinção, exclusão, restrição ou
preferência por algo, resultando em prejuízo ou anulação do exercício, na igualdade
das situações, dos direitos humanos e liberdades, ramos econômicos, político,
social, cultural e civil ou em qualquer área. A discriminação equivale sempre à
desigualdade e, assim, ocorre quando somos tratados como desiguais em situações
iguais (GOMES, 2001).
A igualdade em seu sentido puramente formal, também denominada igualdade
in-divíduos, visando subordinar todos analisados minuciosamente na legislação,
inde-pendentemente de raça, cor, sexo, credo ou etnia (GOMES, 2001).
Para Piovesan (2005), garantir a igualdade não significa somente a proibição da
discriminação, com o auxílio de leis de repressão. É necessário haver ferramentas
promocionais que possam fomentar a inserção e inclusão de grupos considerados
desfavorecidos pela sociedade nos âmbitos sociais.
Para Silvério (2002) proibir a exclusão não acarreta inclusão automaticamente.
Dessa forma, não é bastante impedir a exclusão para colocar a igualdade em
prática, é preciso usar a inclusão social verdadeira de grupos marginalizados que
suportam a discriminação e a violência. No entendimento desse autor, acredita que
ainda no século XIX possam ter surgido algumas ações que atualmente se
denominam ação afirmativa.
A igualdade em sua face formal, contudo, é insuficiente à medida que desconsidera
as peculiaridades dos indivíduos e grupos sociais menos favorecidos, não
garantin-do a estes as mesmas oportunidades em relação aos demais. É nesse sentigarantin-do que
ocorreu a crise no liberalismo estatal, uma vez que o neutralismo do Estado criava
inúmeras situações de injustiça, já que a igualdade puramente formalista favorecia
tão somente uma parcela elitista da sociedade em detrimento dos mais fracos
(SIL-VÉRIO, 2002).
Nessa vertente, com o advento do Estado Social, houve a reconstrução do sentido
de igualdade. O Estado adquire feição intervencionista, com o objetivo de proteger
os grupos menos favorecidos, efetivando os seus direitos fundamentais (DI PIETRO,
1998).
Nesse momento, surge a concepção de igualdade em sua acepção substancial, que
não se limita apenas ao plano jurídico-formal, mas busca uma atuação estatal
positiva (FERES JÚNIOR; DAFLON; CAMPOS, 2011). Segundo o Grupo de Estudos
pessoas pertencentes a grupos discriminados e vitimados pela exclusão
socioeconômica são beneficiados com recursos governamentais, como tentativa de
diminuir a desigualdade na política, educação, saúde, emprego, bens materiais,
redes de proteção social e, ou, no reconhecimento cultural.
Segundo Piovesan (2005), ações afirmativas, como políticas de recompensas
empregadas para minimizar e remediar as situações advindas de um passado
discriminatório tem papel importante no projeto democrático: valorizar a diversidade
e os diferentes contextos sociais. São intervenções eficazes que propiciam o direito
à igualdade, dentro do pensamento de que a igualdade acontece quando existe o
respeito à diferença e à adversidade. Por intermédio dessas ações, caminha-se da
igualdade formal para a igualdade material e substantiva.
Essas intervenções foram pioneiras nos Estados Unidos, para Silva (2014) surgiram
como políticas públicas a partir do ano 1960. Essas políticas apareceram bem
tímidas em 1866, com a aprovação da Lei dos Direitos Civis no mandato do então
presidente Lincoln. Com o passar dos anos, os atos foram se intensificando e
proporcionando aos grupos antes discriminados a oportunidade de “entrarem no
mundo dos brancos e abastados”. Tais mudanças foram ocasionadas devido à
grande pressão da sociedade americana que apoiava os movimentos raciais
liderados, principalmente, por Martin Luther King. Com esse novo pensamento, as
ações afirmativas provocaram profundas mudanças nas leis americanas, sobretudo
no que dizia respeito à busca de empregos, em que as empresas passaram a
empregar os profissionais sem que a cor fosse característica relevante (SILVA,
2014).
Já para Tavares (2008), as intervenções surgiram surgiu em 1961, nos Estados
Unidos, na época do então presidente John Kennedy. Essa intervenção denominada
de cotas raciais era utilizada como forma de combater os danos causados pelas leis
segregacionistas, as quais impediam que os negros frequentassem as mesmas
3.2 A inclusão no cenário brasileiro
A desigualdade social no cenário brasileiro da atualidade está em constante debate.
Depois do histórico de décadas de crescimento econômico concentrador de renda e
riqueza, essa situação de desigualdade social e econômica só fez aumentar. Mesmo
com os avanços da Constituição Federal de 1988, a globalização não possibilitou a
melhora de forma ampla desse cenário (DUMÉNIL; LEVY, 2003). Para esses
autores, o pequeno andamento do crescimento promovido a partir da década de
1980, juntamente com o crescimento financeiro do capital, a entrada passiva e
subordinada do país no ambiente das economias globalizadas, o desmonte da
estrutura do Brasil e a desestruturação do mercado de trabalho, foi alguns
acontecimentos que fizeram a situação do Brasil no final do século XX.
Ainda segundo Duménil e Levy (2003), juntamente com esse contexto
socioeconômico, as políticas públicas no país sempre estiveram, desde a época da
sua institucionalização, em conjunto com um método conservador, indo ao encontro
somente dos interesses econômicos de uma burguesia agrária ou industrial e, ou,
bancária. Mesmo de certos momentos de inflexão ao longo do seu percurso, essas
políticas não conseguiram colocar com efetividade um padrão redistributivo nas suas
atitudes. Para Medeiros (2001), isso acontece em parte devido ao modelo
econômico concentrador empregado pelo Brasil, “nenhumas coalizões nos
trabalhadores industriais e não industriais”, marcado pelo fato de os trabalhadores
não se mobilizarem; e a uma burocracia de baixo grau de autonomia sobre o
governo.
Cutter (2011) salienta que, em geral, os problemas sociais são estruturais e, em
maior parte, com relação à questão de vulnerabilidade social. Segundo Kaztman
(1999), a instabilidade é um desequilíbrio na estrutura de escolhas do cidadão, o
qual acaba colocando-o em ocasiões de desvantagem, visto que fragiliza suas
relações sociais e também dificulta seus acessos a uma boa educação, o que vai de
A relação entre o desenvolvimento econômico e a igualdade social deve fornecer
atitudes voltadas para as populações mais delicadas. Essa organização
socioeconômica precisa do envolvimento de todos os atores sociais, sendo relevante
destacar a gestão social e as políticas públicas como importantes fatores para a
Administração Pública e mecanismos de inclusão social.
Depois dessa trajetória, a questão social reverteu-se em diferentes caminhos e
manifestações, de acordo com cada sociedade, instituições e cultura. Raichelis
(2006, p. 15) salienta que foram várias lutas sociais que “transformaram a questão
social em uma questão política e pública”, e, assim, o país teve que intervir para
reconhecer os “novos sujeitos sociais como portadores de direitos e deveres” e
possibilitar que, por intermédio de políticas sociais, houvesse o acesso a bens e
serviços públicos.
De acordo com Raichelis (2006), na sociedade do Brasil a questão social é o pilar
dos movimentos sociais e da constante luta pelo acesso à riqueza social
arrecadada. São essas lutas que impulsionam o país para responder “às demandas
de saúde, trabalho, educação e habitação, como também são elas que impulsionam
o movimento político das classes populares pela conquista da cidadania na esfera
pública” (RAICHELIS, 2006, p. 18).
Neste segmento, a administração das demandas e o que o cidadão precisa
configuram-se em uma gestão social, isto é, a gestão de ações públicas
(CARVALHO; SEGATO, 2002). Dessa forma, evidencia-se a procura por opções
teóricas no ramo da Administração, e o tema gestão social vem chamando atenção
de estudiosos do tema desde a década de 1990, como Cançado, Tenório e Pereira
(2011), que estão se dedicando a esse assunto com programas de pesquisa,
encontros especializados e periódicos acerca da temática.
Na abordagem dos modelos de Gestão Pública, Paes de Paula (2005, p. 41) salienta
a gestão social como a que “enfatiza a elaboração de experiências de gestão
participativas”. Dowbor (1999) afirma que as vertentes contemporâneas da gestão
social fazem que as maneiras de organização social sejam revistas, se repense a
semelhança entre o político, o econômico e o social e se elevem e promovam
estudos interdisciplinares, bem como se escutem os atores do Estado, empresas e
comunidades. Essa esfera da Gestão Pública atualmente está sendo construída.
Uma gestão implicada com o social necessita de uma abordagem que possibilite o
setor público a reconhecer peculiaridades da gestão social, à medida que precisa
discernir acerca do que pode ser incorporado ao setor privado (FRANÇA; FILHO,
2007).
Assim, a gestão social se “elabora num espaço público, seja ele estatal ou societário
ou, mesmo, na confluência entre estes, representados na articulação entre Estado e
sociedade” (FRANÇA FILHO, 2007, p. 34). Tal fato evidencia o aspecto político que
não é apenas o contexto governamental, mas o contexto econômico que não é
apenas o mercadológico.
Na visão de Tenório (1998), o foco deve ser a relação das categorias
sociedade-Estado e trabalho-capital. Ressalta que a cidadania é a principal nessas relações,
pensando sob o prisma da sociedade e do trabalho. Assim, o cidadão é sujeito
“daquilo que interessa à sociedade nas demandas do Estado e daquilo que interessa
ao trabalhador na interação com o capital” (TENÓRIO, 1998, p. 21). Para esse autor,
a cidadania é a expressão do exercício de direitos a favor da coletividade.
Na ótica da relação sociedade-Estado, a Administração Social consolida-se pela
confecção de políticas públicas que veem o cidadão como agente concreto no
processo de elaboração dessas políticas. Dessa forma, o processo acontece “desde
a identificação do problema, o planejamento de sua solução e o acompanhamento
da execução até a avaliação do impacto social efetivamente alcançado” (TENÓRIO,
1998, p. 22).
Nessa mesma perspectiva, Cançado, Tenório e Pereira (2011) denominam Gestão
pautados no diálogo, no entendimento, na transparência e na liberdade como
resultantes. Esses autores acreditam que, para que o governo e a sociedade
interajam melhor, é preciso uma política social com ações legítimas e pautadas na
transparência.
França Filho (2007) também ressalta duas outras grandes dificuldades para a
Gestão Social. O primeiro seria ir para além da cultura normal que está junto na
cadeia das organizações sociais, explorando o relacionamento da sociedade civil e o
poder público valorizando e impulsionando o poder do stakeholders que tomam
parte na sociedade civil, para ir na frente da realização da ação. A segunda
dificuldade é o fato de ser preciso formar um sistema metodológico que configure a
premissa básica de gestão engajada com o social. Não se deve menosprezar o
conhecimento técnico-gerencial, porém pode empregar uma abordagem sistêmica
que consiga possibilitar a apresentação do que pode ser adotado pelas instituições
privadas com sucesso, lembrando-se da importância das singularidades, sendo
racional na esfera da gestão social.
3.3 Políticas Públicas de Educação
O tema das Políticas Públicas vem recebendo atenção diferenciada da sociedade e
das universidades, que começaram a fazer pesquisas com a finalidade de entender
e analisar as políticas públicas, que eram vistas como assunto exclusivo do Estado
ou do governo. Contudo, devido a transformações ocorridas na população,
principalmente depois dos anos de 1980, a temática ganhou mais atenção,
principalmente em países em desenvolvimento (SOUZA, 2006).
Não dá para dizer que existe uma única denominação sobre o tema políticas
públicas. Contudo, para Souza (2006), as decisões e análises acerca de políticas
públicas precisam passar por três questões: Quem ganha o quê? Por quê? Que
diferença faz? Outros acham que a política pública precisa resolver problemas
do conhecimento que procura “colocar em ação juntamente com analise dessa ação
e, se preciso, fazer mudanças nessa ação”. A produção de políticas públicas é um
momento em que os governos mostram suas propostas de mudanças ou, mesmo,
os resultados produzidos (SOUZA, 2006).
Há certos modelos que procuram explicar a forma que os governos atuam, tomando
ou deixando de tomar alguma atitude que cause impacto de forma correta na vida
das pessoas. Entre esses modelos, o Ciclo de Políticas Públicas vem se
apresentando como um modelo de interesse, já que tem singularidades que
possibilitam que a sequência das etapas seja um processo dinâmico e possibilite o
aprendizado em cada etapa (SECCHI, 2010).
A etapa de denominação da agenda de políticas públicas é a que configura as
prioridades a que o governo precisa manter atenção, sendo esse momento um dos
mais importantes do ciclo. Sequencialmente, na identificação de opções é colocada
qual opção melhor resolve o problema da etapa anterior. Na produção de programas
de decisão, deve-se optar pela mais conveniente das alternativas de ação (SECCHI,
2010).
Normalmente, a instância de decisão responsável olha qual o programa de
compromisso negociado antecipadamente entre os atores políticos mais relevantes.
A instauração de políticas é vista como aquela fase do ciclo em que a demanda de
ação é escolhida na fase anterior à formulação das políticas e, por sua vez, faz do
mesmo modo certos resultados e abalos de policy. Na etapa da avaliação de
políticas e da correção da ação, importam os programas já feitos e suas
repercussões efetivas (SOUZA, 2006).
Mediante essa perspectiva, de acordo com Kaztman (1999), a principal ferramenta
pública com a capacidade de atuar como elemento de ligação social é o sistema
educativo com potencial para diminuir as desigualdades. Assim, é crescente a
de inclusão social, sabendo que aqueles com maior grau educacional normalmente
ocupam os melhores empregos, atingindo as maiores rendas.
De acordo com Guimarães (2015), independentemente do modelo econômico, a
procura de igualdade quando se fala em oportunidades é crucial para o crescimento
de um país. Para tal, a educação dada por intermédio de políticas sociais de
formação de capital humano pode ser vista como ferramenta na procura por
igualdade e contra a exclusão social (GUIMARÃES, 2015). Conforme esse autor, o
acesso à educação geralmente é um tema que precisa ser tratado objetivamente
para consolidar o equilíbrio entre o bem-estar social e os interesses econômicos que
aparecem nos grupos sociais.
Lindblon (1981, p. 8) salienta quanto é importante o controle social, segundo alguns
questionamentos: “quem formula a questão governamental? São as elites que
realmente decidem quais as políticas a seguir? As eleições são realmente
importantes? Importa o fato que o partido ganha?”. Para o autor, o processo
decisório político é entendido depois de uma ruptura sem seus elementos,
analisando, de forma isolada, cada um deles, conforme a afirmação que se segue:
Estuda-se em primeiro lugar como surgem os problemas de decisão política, e como chegam à agenda das autoridades governamentais, em seguida, como as pessoas formulam os temas da ação governamental, como processa a subsequente ação legislativa, ou de outra natureza, como os administradores aplicam a política escolhida e, finalmente, no término do processo, como essa política pode ser avaliada (LINDBLON, 1981, p. 8-9).
Dando seguimento, aquele mesmo autor atenta para o risco em se admitir, mesmo
que seja de forma explícita, que o processo decisório ocorre de maneira mais ou
menos ordenada, racional, como se fosse uma dissertação acadêmica. A fim de
confirmar esse argumento, Lindblon (1981) usa exemplos em que a solução
colocada por um grupo pode ser um problema para outro grupo – segundo esse
autor, “a elevação dos preços dos produtos agrícolas resolve as dificuldades dos
De acordo com Lindblon (1981), outra maneira encontrada para entender a não
linearidade no processo decisório seria o fato de que algumas decisões, que não
são todas por negociações entre muitas partes interessadas, não têm nenhuma
relação com o que era de interesse de cada uma das partes.
3.3.1 Política de expansão do ensino superior
Nas últimas décadas, o governo federal criou políticas com o objetivo de incentivar a
educação superior, das quais fazem parte o Programa Universidade para Todos
(PROUNI), o Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais
(REUNI), o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Sistema de Seleção
Unificada – SISU (RISTOFF, 2014). A política de expansão do ensino superior é uma
resposta à demanda por esse nível de ensino que, conforme afirmam Oliveira et al.
(2006), vem crescendo desde a década de 1990.
Cunha (2014) argumenta que, por intermédio das políticas públicas que criaram o
Programa Universidade para Todos (PROUNI), que concede, nos cursos de
graduação de instituições privadas, bolsas de estudo integrais ou parciais (50%) a
alunos de baixa renda familiar que ainda não possuem diploma de curso superior,
esses estudantes passaram a ter a oportunidade de frequentar, em escolas
particulares, cursos sequenciais de formação específica, tendo, então, acesso a um
ensino mais qualificado.
Em 2007 foi instituído, por meio de políticas públicas, o Programa de Apoio aos
Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), que é
umas das ações integrantes do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).
Esse programa foi criado com o objetivo de expandir a educação superior no país
(PORTAL MEC, 2016), e as universidades que se aderissem a ele deveriam se
ajustar às suas regras e, como benefício, ganhariam mais recursos para os seus
cursos, projetos e infraestrutura do seu campus. REUNI amplia o acesso e a
permanência na educação superior no nível de graduação, a partir da expansão
De acordo com o Ministério da Educação, os objetivos gerais do programa são:
expandir, ampliar, interiorizar e consolidar a rede de Institutos e Universidades
Federais, democratizando e ampliando o acesso de vagas na Educação Profissional,
Tecnológica e Superior; promover a formação de profissionais qualificados,
fomentando o desenvolvimento regional e estimulando a permanência de
profissionais qualificados no interior do Brasil e, por último, potencializar a função
social e o engajamento dos Institutos e Universidades como expressão das políticas
do Governo Federal na superação da miséria e na redução expressão das políticas
do Governo Federal na superação da miséria e na redução das iniquidades sociais e
territoriais (BRASIL, 2009).
Finalmente, também por meio de políticas públicas para a educação, o Sistema de
Seleção Unificada (SISU) surgiu como proposta de iniciativa do Ministério da
Educação, a partir da reformulação do Exame Nacional do Ensino Médio, que
passou a ser o “Novo ENEM”. Trata-se de um novo formato de seleção, em
substituição ao tradicional vestibular, em que os candidatos podem concorrer às
vagas de qualquer Instituição Federal de Ensino Superior (IFES) do país, com o
intuito de abrir o leque de oportunidades para os estudantes (BRASIL, 2009).
Às IFES foi dada a autonomia para utilizarem as notas do ENEM de quatro formas
possíveis: como fase única; como primeira fase; combinado com o vestibular da
instituição; e como fase única para as vagas remanescentes do vestibular. A
instituição poderia ainda preservar qualquer forma de políticas afirmativas, bônus
diferenciado e pesos para as provas (SANTOS, 2012).
A centralização do processo seletivo a partir do SISU teria, entre outras, as
seguintes vantagens: a) aumento da capacidade de recrutamento das IFES; e b)
possibilitar que candidatos de menor poder aquisitivo diversifiquem suas opções na
disputa por uma das vagas oferecidas (BRASIL, 2009). Apesar das diversas políticas
públicas educacionais, muito se tem discutido sobre sua efetividade. Conforme
salientado por Veloso e Luz (2013), democratizar o ensino superior vai além da
permanência, a formação de qualidade e o desenvolvimento acadêmico dos
estudantes. Para o auto, mesmo no que tange ao acesso, o país precisa avançar,
pois as vagas oferecidas em instituições públicas são inferiores à demanda.
A proposta do Sistema de Seleção Unificada (SISU) foi apresentada, no primeiro
semestre de 2009, à Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais
de Ensino Superior (ANDIFES), com o objetivo de unificar a seleção às vagas das
referidas instituições a partir das notas obtidas no ENEM. Assim, a partir de uma
prova única, o novo formato de seleção substituiria o tradicional vestibular
descentralizado (BRASIL, 2009).
O SISU, instituído em janeiro de 2010, é um sistema informatizado que seleciona
candidatos a partir das notas obtidas no ENEM, para ocupação de vagas em cursos
superiores de graduação em instituições públicas. Assim, o candidato inscreve-se
para uma ou duas instituições participantes, elegendo a primeira e a segunda opção.
É possível escolher dois cursos em uma mesma instituição ou um curso em uma
instituição e um curso em outra (INCERTI; TAVARES, 2014).
O modelo de seleção centralizado proposto pelo SISU objetivou democratizar as
oportunidades de concorrência às vagas federais de ensino superior, tornando o
processo seletivo mais isonômico. A perspectiva da nova proposta foi dar
oportunidade a pessoas com menores condições financeiras e residentes nas
localidades mais distintas do país, possibilitando maior mobilidade entre estudantes
nas diferentes unidades da federação (BRASIL, 2009).
Segundo Cunha (2014), o SISU é um sistema de gestão inteligente informatizado,
criado pelo governo federal para acelerar o processo de inclusão de alunos nas
instituições públicas de ensino superior, tendo como exigência para inscrição que os
candidatos participem do ENEM e tenham nota maior que zero na redação. O
resultado da prova é a pontuação utilizada para selecionar os candidatos às vagas
escolhidas. Assim, após o período de inscrição o sistema seleciona
autor, o SISU, além de trazer benefícios para o estudante, serve de indicador de
qualidade para as escolas brasileiras. Finalmente, depois do sistema de ensino
detalhado, pode-se entender melhor o funcionamento das cotas, uma vez que ele
está inserido no novo sistema de ingresso que as universidades de todo o Brasil
vêm adotando, que é o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). É a principal
avaliação da educação média e porta de entrada para a educação superior.
3.3.2 A política de cotas na universidade brasileira
O contexto brasileiro abrange, historicamente, uma sociedade totalmente desigual, o
que contempla não só aspectos econômicos, como também sociais e políticos,
impactando a vida dos sujeitos menos privilegiados. Este estudo tem como foco as
discussões nos aspectos da desigualdade no cenário brasileiro. O primeiro é acerca
do acesso à escolaridade de qualidade, o que é proporcional à renda dos indivíduos,
tendo como ponto de partida que as escolas públicas ofertam ensino de menor
qualidade que as particulares. O segundo engloba o tema preconceito racial, visto
que, mesmo que a abolição da escravidão tenha sido um marco para o fim da
diferenciação legal entre negros e brancos, ainda que o racismo, latente e
declarado, ainda é uma constante na sociedade brasileira (COHEN; EXNER;
GANDOLFI, 2018).
A pesquisa de “Análise das condições de vida da população brasileira” do IBGE
(2017) mostrou que, em 2016, os 20% mais ricos representavam 38,8% dos
universitários em instituições públicas e 43% em instituições privadas. A população
de baixa renda segue tendo a menor escolaridade, e apenas 20% passa, em média,
5,4 anos na universidade. O censo demográfico realizado pelo IBGE (2014) aponta
que, no grupo de pessoas de 15 a 24 anos de idade que frequentam o nível superior,
31,1% dos estudantes são brancos, enquanto apenas 12,8% são pretos e 13,4%,
pardos. A publicação mostra também que as pessoas brancas seguem recebendo
Para tentar responder ao problema de configuração parecida nos casos citados,
surge o conceito de “ações afirmativas”, que podem ser vistas como políticas de
caráter compensatório das injustiças e desigualdades que vão de encontro à
sociedade brasileira moderna (MUNANGA, 2001). Dentro do sistema de ações
afirmativas, a política de cotas é a mais conhecida e se configura em estabelecer um
número ou percentual a ser ocupado em uma área específica, a fim de incluir grupos
minoritários, isto é, grupos marginalizados da sociedade no mercado de trabalho ou
no sistema de ensino de qualidade, por exemplo.
As ações afirmativas são políticas públicas governamentais que têm por objetivo
reverter a desigualdade e discriminação de indivíduos de grupos específicos. A
finalidade dessas ações é sanar uma desigualdade que pode ser prejudicial ao
desenvolvimento social como um todo (FERES JÚNIOR; DAFLON; CAMPOS, 2011).
Nas universidades federais públicas brasileiras, as ações afirmativas foram criadas
por meio das políticas públicas intituladas como reserva de vagas. Essa reserva de
vagas ficou conhecida como cotas. Silva (2014) argumenta que as cotas vieram pela
Lei no 12.711 de 2012, sancionada pelo governo federal para sanar as dívidas que o
Brasil tinha com os escravos afrodescendentes, com os índios, indivíduos
provenientes de escola pública, quilombolas e portadores de necessidades
especiais.
A partir de então, várias universidades públicas federais passaram a utilizar a
reserva de vagas (cotas), designando diferentes níveis de porcentagens para essas
cotas, e o restante para os indivíduos que entram nas universidades por meio da
ampla concorrência (MAIO; SANTOS, 2005).
Em síntese, a ação afirmativa é “planejar e atuar no sentido de promover a
representação de certos tipos de pessoas pertencentes a grupos que têm sido
subordinados ou excluídos em determinados empregos ou escolas” (COHEN;
EXNER; GANDOLFI, 2018, p. 7). Esses autores salientam que a ação afirmativa não
país por décadas, havendo também grandes chances de garantir melhor diversidade
em ambientes que antes eram elitizados ou ocupados mais por pessoas brancas.
Por trajetória, o ensino superior com qualidade é das elites, razão por que algumas
classes sociais estão no mundo acadêmico e outras classes mais baixas estão
encaminhadas para a pobreza (MOURA, 2010). A educação é marcante para que o
sujeito alcance renda mais alta à medida que, quanto mais inclusivo for o alcance da
educação básica e dos serviços de saúde, proporcionalmente será a probabilidade
de que, mesmo os potencialmente pobres tenham chance maior de passar pela
pobreza (SEN, 1999). Por consequência, as chances são aumentadas, assim como
as liberdades individuais, como relata Sen (1999, p. 33): “ter mais liberdade melhora
o potencial das pessoas para cuidar de si mesmas e para influenciar o mundo,
questões centrais para o processo de desenvolvimento”.
De forma a possibilitar a questão de uma diversidade crítica, trazida por Herring e
Henderson (2011), é preciso não somente ações afirmativas, em relação às ideias
de justiça compensatórias, sendo necessário também que membros de
organizações tenham a crença de que a diversidade aloca benefícios para a
instituição. A diversidade é diretamente proporcional à inovação, troca de
conhecimentos e variedade de experiências e histórias de vida (HERRING;
HENDERSON, 2011). Nessa dimensão, adversidade, quando se colocada no prisma
da universidade, é crucial para que se construa um ambiente cada vez mais
diversificado, favorecendo o desenvolvimento de ideias e pensamentos diferentes
daqueles vistos em um grupo homogêneo.
Para Moehlecke (2004), a entrada na universidade é demasiadamente concorrida,
tornando-se injusta por vezes, visto que determinada parte da sociedade já possui
privilégios em relação a outra parte. Esses privilégios são associados à renda, uma
vez que boa renda abre caminho para uma educação de qualidade e para a
possibilidade de maior tempo de estudo. Renda, então, é um elemento determinante
para propiciar a desigualdade entre as pessoas, colaborando para deslegitimar a
processos vestibulares. Na ideia positiva da sociedade, são raras às vezes que, de
fato, se merece algo, dado que os privilégios são injustos (MOEHLECKE, 2004).
As cotas dão chances de educação para todos propiciando que os menos
privilegiados, provenientes de famílias de baixa renda, também possam ter
oportunidade de competir em condições de igualdade com quem tem renda mais
elevada (CASTRO, 2012). A pesquisa Síntese de Indicadores Sociais (SIS, 2014),
divulgada pelo IBGE, ilustra essa ideia. Em 2004, apenas 1,7% dos indivíduos
pertencentes aos 20% mais pobres tinha acesso ao Ensino Superior Público. Em
2013, esse número aumentou para 7,2%. O sistema de cotas foi um processo de
bastante importância, apesar de não ser o único que favorece o acesso à
universidade pública. O princípio da equidade estabelece tratamento desigual para
desiguais, sendo sua finalidade central configurar um patamar de igualdade para
que, de fato, a meritocracia torne justa e includente o “faze por merecer” dessa
forma precisa de condições de igual competição (CONHEN; EXNER; GANDOLFI,
2018).
3.3.2.1 O estigma acerca das políticas de cotas
Pautando-se na contextualização acerca das políticas de cotas na universidade
brasileira, é relevante evidenciar que este trabalho tem como objetivo compreender
se há diferença no desempenho entre os alunos cotistas e os não cotistas. Ouve-se
em diversos discursos no campus universitário da UFV que, após a implementação
da política de cotas, pode haver declínio no nível dos discentes da universidade,
visto que os alunos que entraram pelas cotas dispõem de uma base conteudista
inferior à daqueles que ingressam pela ampla concorrência. Esse discurso é
repassado pelo senso comum da sociedade brasileira e já é possível perceber o
desenvolvimento de um estigma sobre o aluno cotista.
Segundo Dubar (1997), as identidades são as representações que os sujeitos
elaboram acerca de si mesmos e dos outros. São construídas na relação do sujeito
exemplo, resultantes dos vários processos de socialização. As organizações, dessa
forma, a exemplo das universidades, são um espaço privilegiado de construção de
identificações e de definições de si mesmos e dos outros (SANSAULIEU, 1997).
Em relação aos cotistas que não estão nas categorias de pretos, pardos ou
indígenas (PPI), é importante frisar que, mesmo que a questão social não mude o
grupo, em um contexto universitário é normal emergirem debates sobre a
legitimidade do aluno cotista nesse lugar. Esta ideia é pautada no argumento de que
esse grupo não está no mesmo grau que os outros, por ter entrado na universidade
por intermédio do sistema de cotas. Assim, o aluno cotista pode ficar com o estigma
de ser diferente ou inferior quando se fala dos alunos que entram por ampla
concorrência. Essa comparação advém de estereótipos socialmente formados por
imposição e aceitos na universidade e na sociedade, utilizados como formas de
avaliação e justificação dos que lá estudam e ambientes sociais caracterizados
adequadamente (SILVA, 2013).
A questão para os alunos que entram por meios das cotas raciais é mais séria que a
política de cotas, que, mesmo facilitando o acesso ao ensino superior, não significa
que não haverá mais discriminação e, sim, valorização da cultura negra. Na
verdade, é mais “um elemento importante para a centralização da visibilidade negra
no espaço acadêmico, onde a figura do negro é posta em questão como sujeito
(in)capaz de dividir o mesmo espaço que os indivíduos de cor branca” (SILVA, 2013,
p. 185). Entende-se, assim, que o cotista negro sofre não somente com a falta de
legitimidade no contexto das universidades, mas também com a ideia de pertencer e
se adequar a um lugar que nunca foi seu e, sim, da maioria branca.
De acordo com Goffman (2008), o estigma é uma propriedade de descrédito do
indivíduo. Quando o estranho está na nossa frente, podem emergir evidências de
que ele tem singularidades que o tornam diferente dos outros que estão em um nível
em que ele poderia ser incluído, podendo ser até mesmo de uma espécie