UNIVERSIDADEFEDERALFLUMINENSE
PROJETO DE PESQUISA
DE CRIANÇA PARA CRIANÇA, ALFABETIZAÇÃO A PARTIR DA
LITERATURA:
Leitura e Escrita - um convite a autoria
CARMEN LÚCIA VIDAL PÉREZ
Orientadora
Faculdade de Educação
Lygia Higino da Silva
Curso de Pedagogia Matrícula UFF: 209.10.161
RESUMO
A pesquisa “De criança para criança, alfabetização a partir da literatura: Leitura e Escrita - um
convite a autoria” se pauta na investigação sobre as lógicas operatórias das crianças presentes em suas relações cotidianas e na construção de conhecimentos no processo de apropriação da leitura e da escrita de crianças das classes populares. A pesquisa tem como objetivo geral investigar a formulação de outras possibilidades para ação educativa da escola a partir da revisão-ampliação do conceito de alfabetização – aqui entendido como movimento de criação e autoria - articulando-o a uma perspectiva político-epistemológica que compreende as operações cognitivas da criança (e suas aprendizagens) como um processo de transcriação. O presente projeto insere-se no conjunto de
esforços que vimos entabulando no sentido de formar a professora alfabetizadora pesquisadora de sua própria prática. Trata-se de uma pesquisa-intevenção qiue se desenvolvera numa classe de alfabetização inicial da Escola Municipal Paulo Freire – São Gonçalo – RJ.
INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA
A alfabetização, apesar de todos os esforços e políticas, ainda é o grande nó da escola brasileira. Após décadas de farta produção teórica e implementação de políticas de fortalecimento da formação inicial e continuada de professores dos anos iniciais do ensino fundamental, a alfabetização ainda é um grande desafio para a educação brasileira: apesar de se constituir como uma temática de maior abrangência nas pesquisas educacionais; as formulações teóricas, os debates acadêmicos e as discussões teórico-práticas e as políticas de incentivo a formação de professoras alfabetizadoras e de formação de leitores, tem-se mostrado insuficientes, tanto para ampliar os índices de desempenho escolar no que se refere a apropriação da leitura e da escrita, quanto para ultrapassar princípios teóricos, descaracterizar pressupostos metodológicos e práticas docentes que
fundamentam a “crença pedagógica” de que alfabetizar é ensinar a língua padrão, com ênfase na leitura técnica e nas habilidades mecânicas de escrita.
Ao longo dos últimos trinta anos vimos assistindo o fracasso das crianças das classes populares nos quatro (agora cinco) primeiros anos de escolaridade; por outro lado, os programas de formação inicial e continuada de professores, não têm conseguido dar conseqüência teórico-prática ao pressuposto de que a alfabetização é um processo discursivo que se desenvolve na interação com as experiências culturais das crianças: suas formas de falar, suas variações lingüísticas – não legitimadas como saber-, suas formas de lidar com a leitura e escrita fora da escola, seus saberes e sua subjetividade - sua singular forma de ser e estar no mundo.
A pesquisa “De criança para criança, alfabetização a partir da literatura: Leitura e Escrita - um convite a autoria” se pauta na investigação sobre as lógicas operatórias das crianças presentes
em suas relações cotidianas e na construção de conhecimentos no processo de apropriação da leitura e da escrita de crianças das classes populares. A pesquisa busca investigar as possibilidades estéticas, éticas e cognitivas potencializadoras de aprendizagens, desfazendo a trama lógico-discursiva que nomeia as crianças das classes populares como incapazes, insubordinadas, indisciplinadas e/ou portadoras de dificuldades de aprendizagens, principalmente no que se refere à apropriação da leitura e da escrita.
O presente projeto insere-se no conjunto de esforços que vimos entabulando no sentido de formar a professora alfabetizadora pesquisadora de sua própria prática. Buscamos construir com a professora do primeiro ano de escolaridade (classe de alfabetização) do Ensino Fundamental, outras possibilidades teóricas e metodológicas para a produção da alfabetização de todas as crianças; pois insistimos em reconhecer a professora como capaz de teorizar sobre sua prática. Tal princípio político-epistemológco orienta nossas ações de investigação-formação, pois concebemos a escola (e seu cotidiano) como“...espaço de teoria em movimento permanente de construção, desconstrução,
reconstrução” (GARCIA, 2008:21).
Em nossa concepção a alfabetização é um processo vivo de construção coletiva dos conhecimentos, que se processa a partir de e no diálogo dos saberes das crianças, com os saberes da
professora e com os saberes das diferentes áreas de conhecimento escolar. Assim, entendendo a alfabetização como processo discursivo tomamos a literatura infantil como um dispositivo de uma prática alfabetizadora fundada no diálogo transcriador.
OBJETIVOS
A presente pesquisa tem como objetivo geral investigar a formulação de outras possibilidades para ação educativa da escola a partir da revisão-ampliação do conceito de alfabetização – aqui entendido como movimento de criação e autoria - articulando-o a uma perspectiva político-epistemológica que compreende as operações cognitivas da criança (e suas aprendizagens) como um processo de transcriação.
Tal objetivo se desdobra nos objetivos específicos da pesquisa, a saber: (i). Desenvolver
uma investigação-ação fundamentada numa concepção ampliada de alfabetização; (ii).Investigar as
diferentes racionalidades que sustentam a diversidade de processos e estilos cognitivos que circulam
no cotidiano da sala de aula;(iii).Investigar as lógicas operatórias das crianças das classes populares
presentes em suas decifrações cotidianas;(iv) afirmar a aprendizagem da leitura e da escrita - a
entendida como aquela que reflete sobre, discute e reformula seu saber-fazer; (vi) construir, na
interação com professora e crianças e bolsistas de IC a compreensão dos processos de alfabetização escolar como atividade de construção ativa e coletiva de conhecimentos articulando leitura e conhecimentos múltiplos sobre diferentes áreas.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA E METODOLOGIA
Na pesquisa procuro traçar um caminho teórico-metodológico que ao privilegiar a articulação cotidiano-infância, conjuga uma concepção de cotidiano como significante flutuante do
real-social (PAIS, 2003) a uma concepção que vê a criança como produtora de cultura e portadora
de história (DEMARTINI, FARIA e PRADO,2002). Entendo que investigar processos de
transcriação, autoria e, as significações das crianças mediadas pela literatura infantil implica na
articulação dos estudos do cotidiano com os estudos da infância. É essa perspectiva teórico-metodológica que sustenta a presente investigação.
Assim a investigação transforma-se no (pre)texto para conhecer as diferentes lógicas operatórias e os diferentes estilos cognitivos das crianças, procurando compreender o seu
compreender a partir de si mesmas. Tal preocupação tem me conduzido a uma pluralidade de caminhos metodológicos. Em meio a tantas possibilidades, procurei eleger instrumentos [teóricos] que melhor se adequassem aos objetivos da pesquisa.
A conjugação de linguagens desenho, escrita, oralidade e informática, etc. tem me permitido ampliar a compreensão sobre os processos cognitivos/criativos das crianças. A informação veiculada pelo desenho é complementada pela escrita e ampliada pelo relato oral. Michel de Certeau (1998) nos lembra que todo relato é uma prática e são as narrativas que vão “ ...precisar as
formas elementares das práticas organizadoras das focalizações enunciativas” (1998:201). A
pesquisa com as crianças tem confirmado as formulações de Michel de Certeau, ao apontar que as
lógicas operatórias são plurais, por que são plurais as experiências dos praticantes.
No que se refere às lógicas operatórias das crianças, a conjugação de linguagens (gráfica, oral e escrita, artística, digital, etc.), tem se revelado um procedimento bastante eficaz do ponto de vista metodológico, portanto, afirmo que um dos fios que tecem a pesquisa é a análise descritiva das práticas e das lógicas operatórias das crianças das classes populares em suas decifrações cotidianas.
Entendo que na pesquisa com as crianças não existe coleta de dados, mas, uma produção dos
dados que “visa ressaltar que há uma real produção, mas que, em alguma medida, já estava lá de modo virtual” (KASTRUP, 2007:13).
O combustível que move a presente investigação é o desejo de buscar junto com professoras
Ao focar-se na literatura infantil, em sua dimensão discursiva, como um território de observação, a pesquisa busca implementar/desenvolver no cotidiano da sala de aula outra abordagem conceitual organizadora da prática educativa escolar [que rechaça a concepção de que o trabalho com as crianças se reduz a produção de meios “facilitadores da aprendizagem” ou a
processos de “infantilização do saber”], que promove a inversão da lógica hegemônica, substituindo a lógica da explicação pela lógica da descoberta, potencializando a capacidade criadora das crianças, sua imaginação, suas diferentes percepções de mundo e a diversidade de significações presentes em seu universo simbólico e material.
O presente projeto visa pensar/praticar a alfabetização escolar como um processo de
transcriação, na perspectiva que Geraldi e Ponzio (2010) defendem - quem escreve não faz mera
transcrição ou toma notas, mas muito mais que isso, transcria a vida e a experiência por meio da
linguagem escrita. Apoiada nestes autores e em seus estudos sobre Bakhtin entendo a alfabetização
como um processo transcriação, portanto, um processo de autoria. Tal perspectiva articula os
processos criadores, éticos e cognitivos, o que confere à alfabetização uma dimensão estética e política, para além da dimensão pedagógica e escolar.
Metodologicamente a presente investigação pode ser definida como uma
pesquisa-intervenção – no sentido de que o conhecimento que produz concorre para a
produção/transformação do contexto social no qual se desenvolve a investigação. Assim busco, na pesquisa ampliar o conceito de alfabetização a partir de um olhar qualitativo para a escrita e para a criança que a aprende, para tanto, serão realizadas observações longitudinais de grupos de crianças buscando caracterizar as mudanças cognitivas/discursivas identificadas, construindo na ação ferramentas de compreensão da alfabetização como processo discursivo, ético, estético e epistêmico.
Faço questão de ressaltar que a pesquisa se pauta na tomada de partido pelo direito das crianças das classes populares de terem seus processos de aprender respeitados, o que implica uma ordem escolar emancipatória contra a própria condição da infância ou o infante como o ser sem voz ou que não sabe o que diz.
PLANO DE TRABALHO RESUMIDO PARA A BOLSA SOLICITADA
Infantil e do desenvolvimento das crianças; ►Produzir pelo menos um artigo a ser apresentado em evento científico; ►Apresentar os resultados (parciais) da pesquisa em pelo menos 01 evento científico nacional.
CRONOGRAMA DE EXECUÇÃO
ATIVIDADES/BIMESTRES 1º 2º 3º 4º 5º 6º Planejamento das Ações de
Pesquisa
X
Levantamento Bibliográfico
X X
Coleta de Dados X X X X X X
Tabulação de Dados X X X X
Análise de Resultado X X X X
Discussão/Conclusão X X
Relatório Final X
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAKHTIN, M. M. (1992). Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes.
BAKHTIN, M. M. (2010). Para uma filosofia do ato responsável. São Carlos : Pedro & João
Editores.
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano 1. Artes de fazer. Petrópolis. Vozes, 1994, 3ª ed.
GARCIA, Regina Leite (orgs). A formação da professora Alfabetizadora: reflexões sobre a prática. São Paulo. Cortez, 2008, 3º Ed.
DEMARTINI, Zeila de Brito F., FARIA, Ana Lúcia Goulart de e PRADO, Patrícia Dias (orgs). Por
uma Cultura da Infância. Metodologia de pesquisa com crianças. Campinas. Autores associados,
2002.
GERALDI, J. W. & PONZIO, A. (2010). Onde o estético e o ético se encontram hoje. In: Círculo – Rodas de Conversa Bakhtinianas. São Carlos : Pedro & João Editores.
GERALDI, J. W. (2010). A Aula como Acontecimento. São Carlos : Pedro & João Editores.
KASTRUP,V. O funcionamento da atenção no trabalho do cartógrafo. In: Psicologia e Sociedade. no.1. Porto Alegre 2007.
PAIS, José Machado. Vida Cotidiana. Enigmas e Revelações. São Paulo. Cortez, 2003.
PÉREZ, Carmen Lúcia Vidal e Alves, Luciana Pires. Injustiças Cognitivas: ressignificando os conceitos de cognição, aprendizagens e saberes no cotidiano
escolar. Relatório de Pesquisa. Rio de Janeiro. FAPERJ, 2009
PONZIO, A. (2009). A Revolução Bakhtiniana: o pensamento de Bakhtin e a ideologia
contemporânea. (1ª reimp). São Paulo : Contexto.
VYGOTSKY, L.S. Pensamento e Linguagem. São Paulo. Martins Fontes, 2001.
ZACCUR, Edwiges. Apropriações da Linguagem Oral e Escrita: pensando aproximações. IN; SAMPAIO, Carmen Sanches e PÉREZ, Carmen Lúcia Vidal (orgs). Nós e a Escola. Sujeitos,