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Os vales de fractura e a organização da drenagem

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Academic year: 2021

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Dois dos factores que se têm vindo a apontar como fundamentais para a evolução geral do relevo na Serra de Montemuro são o predomínio das rochas granitóides e a elevada fracturação presente em todo o maciço.

A análise da organização dos padrões de drenagem aponta para o facto de a rede hidrográfica estar claramente condicionada por esses dois factores, em especial o segundo (elevada fracturação). Assim, podemos aprofundar o conhecimento da própria estrutura e particularmente da rede de fracturação através das direcções apresentadas pelos cursos de água.

Mariano Feio e Raquel Soeiro de Brito (1949), acerca dos vales de fractura no modelado granítico português referiram: «Les vallées de fracture constituent un des traits marquants du modelé granitique portugais. Elles existent également dans des terrains d’autre nature, mais c’est dans le granit, grâce à l’homogénéité et à la dureté de la roche saine, que ces accidents sont le plus fréquents et vigoreux.» (ob. cit., pág. 254).

No entanto, antes de proceder a essa análise, importa apresentar alguns elementos caracterizadores da rede hidrográfica que drena a área em estudo, que julgamos fundamentais (Figura 12).

Em primeiro lugar, toda a área se enquadra no sector meridional da bacia hidrográfica do Rio Douro. É ele que estabelece, inclusivamente, o limite Norte da Serra de Montemuro. A drenagem não se faz, no entanto, na sua totalidade, directamente para este curso de água, realizando-se indirectamente pelos seus afluentes mais importantes neste sector: o Paiva, o Varosa (e seu afluente Balsemão26), o Cabrum e o Bestança.

O Rio Douro nasce na Serra de Urbion (Espanha), a cerca de 1700 metros de altitude, percorrendo 927 Km até ao Porto, onde desagua no Oceano Atlântico. Na área em estudo o Douro percorre cerca de 50 Km, estabelecendo a separação entre a Serra do Marão (a Norte) e a Serra de Montemuro (a Sul), que o “entalam”, correndo, assim, bastante encaixado.

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A área em estudo é drenada pelo Rio Varosa apenas no seu troço final, desde a confluência do Rio Balsemão até à confluência com o Rio Douro. O Rio Balsemão, esse sim, desenvolve toda a sua bacia na Serra de Montemuro.

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O Rio Paiva, afluente da margem esquerda do Douro, no extremo Oeste da área em estudo, nasce na Serra da Senhora da Lapa e drena toda a vertente Sul e Sudoeste da Serra de Montemuro. É o afluente mais importante do Douro neste sector, nele desaguando, na margem direita, o Rio Paivô, o Rio Teixeira, o Rio Ardena, bem como outros pequenos ribeiros que rasgam a referida vertente.

2.1. A influência da estrutura na organização da rede hidrográfica: os vales de fractura

A influência da estrutura na rede hidrográfica da Serra de Montemuro é evidente, mostrando uma grande adaptação dos cursos de água à fracturação (Figura 13).

Esta característica é comum às demais áreas do Maciço Hespérico português (essencialmente de constituição litológica granítica), facto já referido por Feio e Brito (1949). Este fenómeno foi também já referido por Cordeiro (1988), para o Maciço da Gralheira (a Sudoeste da Serra de Montemuro), e por Pedrosa (1993), para a Serra do Marão (a Norte).

Nestas regiões os cursos de água apresentam um traçado geométrico, proporcionado pelas faixas de esmagamento27 geradas por falhas e fracturas, às quais eles se adaptam.

Feio e Brito (1949) apontam vários indícios morfológicos para a determinação dos vales de fractura: a) dois, ou mais de dois cursos de água, ou troços de cursos de água, estão no mesmo alinhamento; b) curso de água rectilíneo por uma grande extensão; c) conjunto de vales encaixados, rectilíneos e paralelos; d) vales rectilíneos, ainda que sem a perfeição necessária para que esta qualidade seja por si só suficiente, paralelos a um (ou a mais que um) vale de fractura tendo uma qualquer das outras carcterísticas.

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Feio e Brito (1949) referem, em nota de rodapé (pág. 254), que apenas as falhas com zona de esmagamento facilitam o trabalho de erosão, sendo estas, portanto, aquelas que têm capacidade de fixar os cursos de água.

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Na área em estudo são muitos os exemplos de casos de adaptação dos cursos de água à estrutura, pelo que analisaremos, de seguida, aqueles que nos parecem mais importantes para a compreensão da fisionomia geral da Serra e também os que nos parecem mais claros.

a) Rio Douro

O Rio Douro, que apresenta uma direcção geral aproximadamente E-W, denuncia, no pormenor, um percurso sinuoso, evidenciando em alguns troços uma adaptação a linhas de fragilidade tectónica.

A. Pedrosa (1993) tinha já referido a influência da tectónica no curso do Rio Douro, a propósito do seu estudo da Serra do Marão.

Na área abrangida pelo nosso estudo, verificamos a ocorrência desta situação, pelo menos, em três locais.

Após a confluência do Rio Varosa, o Douro vê-se condicionado por dois acidentes tectónicos, de direcção NNE-SSW. O primeiro, correspondente à falha Verín-Penacova, obriga-o a adaptar-se a esta direcção nas proximidades de Peso da Régua (troço de 2 Km). De seguida, o Douro recupera a sua orientação anterior (ESE-WNW a E-W), até próximo de Mesão Frio, onde uma falha paralela à de Verín-Penacova, o obriga a nova adaptação. Neste caso, a falha é também responsável pelo desligamento da crista quartzítica que se estende da Serra do Marão até Avões, já na área em estudo, facilitando, desta forma, a passagem do Rio Douro por este relevo de dureza. Imediatamente a seguir, o Douro toma, num curto troço, a orientação SE-NW, parecendo adaptar-se ao contacto entre as rochas ordovícicas e granitóides.

A jusante, na confluência do Rio Bestança, a fractura que condiciona todo o curso deste rio (que analisaremos mais à frente), influencia também o Douro que, seguindo uma direcção ENE-WSW, se adapta à direcção SE-NW.

b) Rio Paiva

O Rio Paiva, que drena toda a vertente Sul e Sudoeste da Serra de Montemuro, além dos exemplos de adaptação que evidencia, apresenta também algumas rupturas de declive que importa analisar (Anexo 3).

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Desde que entra na área em estudo, junto a Castro Daire, até à confluência no Rio Douro, o Paiva corre sobre diversos materiais, denunciando pela morfologia a constituição litológica do subsolo. Sobre as rochas granitóides apresenta um leito pouco sinuoso, enquanto nos metassedimentos se observa uma intensa meandrização.

De Castro Daire até Ermida o rio corre sobre rochas granitóides, só voltando a percorrê-las num pequeno troço correspondente ao Granito de Alvarenga e, na parte terminal, sobre os Granitos de Fornelos e de Fornos. O resto do percurso é realizado maioritariamente sobre o Complexo Xisto-Grauváquico (afloramento de Parada de Ester) e sobre os metassedimentos ordovícicos, silúricos e carbónicos, do sinclinal de Valongo-Sátão.

A primeira grande adaptação do Paiva à estrutura verifica-se entre Ermida e Reriz. Correndo numa direcção SE-NW, o Paiva adapta-se à nova direcção NNE-SSW, imprimida pelo acidente tardi-hercínico Verín-Penacova. Entretanto, entre Castro Daire e o sector compreendido entre Ermida e Reriz verifica-se uma ruptura de declive bastante importante. Neste troço o Paiva apresenta uma diminuição altitudinal de cerca de 150 metros, numa distância aproximada de 7 Km. O declive médio que o Paiva apresenta antes de chegar a Castro Daire, inferior a 1%, sofre neste sector um incremento, passando a registar cerca de 2,1%, voltando, posteriormente, a valores inferiores a 1%. Observam-se, porém, dois degraus bem marcados que definem um patamar intermédio (que se desenvolve entre os 360 e 380 metros). Esta ruptura de declive estará relacionada com o contacto entre rochas granitóides, presentes a montante do sector Ermida-Reriz, e rochas metassedimentares, a jusante. Os granitóides, aqui mais resistentes à erosão linear, poderão funcionar como obstáculo à erosão regressiva desencadeada pelo Paiva.

Além disso, a presença, no sector Ermida-Reriz, do acidente tectónico Verín-Penacova, de direcção NNE-SSW, poderá ter favorecido o desenvolvimento desta ruptura de declive.

A jusante, após meandrizar pelo Complexo Xisto-Grauváquico, o Paiva aproxima-se das cristas quartzíticas do sinclinal Valongo-Sátão e sofre uma quebra de declive da ordem dos 3%, seguindo-se um patamar, que se desenvolve ao longo do referido sinclinal paleozóico, entre 180 e 160 metros de altitude, durante cerca de 10 Km. Verifica-se, aqui, uma adaptação do rio ao próprio substrato, constituído por rochas essencialmente xistosas, que parece apresentar pouca resistência à erosão vertical.

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Segundo Fernando Rebelo, trata-se, aqui, de um caso simples de adaptação da rede hidrográfica às cristas quartzíticas (1984, pág. 3)

Ao encontrar a mancha do Granito de Alvarenga, o Paiva sofre nova ruptura de declive, entre os 150 e os 110 metros, apresentando um declive de cerca de 1,5%.

Os granitos desempenham, assim, um papel de maior resistência à erosão linear, funcionando como um obstáculo à erosão regressiva, protegendo os patamares que se desenvolvem a montante e correspondentes a um substrato constituído por rochas mais brandas, neste caso metassedimentares e predominantemente xistosas.

c) Rio Balsemão

Outro rio que apresenta um desenvolvimento francamente condicionado pela fracturação é o Rio Balsemão (Anexo 4).

O sector do alto vale do Balsemão apresenta vários indícios dessa adaptação. Desde Cruz do Rossão até próximo de Feirão, o Balsemão estende o seu leito seguindo uma orientação NNE-SSW, percorrendo o Alvéolo de Feirão. Apesar de, no pormenor, observarmos que o seu traçado não se apresenta rigorosamente rectilíneo, descrevendo alguns pequenos meandros, estes só se desenvolvem, graças à espessura de sedimentos que aí se encontra, proporcionada, inclusivamente, pela presença de um acidente tectónico.

Também a jusante deste sector, entre as cristas quartzíticas de Magueija-Meijinhos e Penude, o Balsemão sofre uma adaptação clara à estrutura, ocasionada pelo acidente tardi-hercínico Verín-Penacova. Este elemento estrutural provocou, aliás, um importante desligamento no referido afloramento ordovícico-silúrico que terá permitido e condicionado a adaptação do leito do Balsemão na passagem por estes materiais, mais resistentes à erosão linear.

A passagem nas cristas não é, no entanto, fácil. Se de Penude a Magueija o Balsemão escava o seu leito sem grande dificuldade, sofrendo um desnível de 50 metros em 4 Km (declive médio de 1,25%), ao passar pelo contacto entre o Granito de Feirão e a crista ordovícico-silúrica a sul de Magueija, sofre um desnível de cerca de 160 metros, provocando uma importante ruptura de declive. Assim, o rio apresenta aqui um declive de 8%.

O Granito de Feirão (biotítico-moscovítico porfiróide, de grão grosseiro) e os materiais ordovícico-silúricos, apesar de afectados pela tectónica, parecem-nos, neste

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sector, apresentar maior resistência à erosão linear que o Granito de Lamego (granito biotítico de grão médio), constituindo um obstáculo à erosão regressiva.

A ligação entre estes dois sectores do Balsemão, anteriormente analisados, parece denunciar, também, a influência de uma linha de fragilidade tectónica de orientação NW-SE, o que poderia ter condicionado, inclusivamente, a saída do próprio alvéolo.

No troço final do Balsemão, nova adaptação à estrutura se vislumbra. De Vila Nova de Souto de El-Rei até próximo da confluência com o Rio Varosa, o rio parece estabelecer o seu leito a favor de uma fractura de direcção NNE-SSW, relacionada, com certeza, com a falha Verín-Penacova.

d) Rio Bestança e Rio Cabrum

O Rio Bestança é, no seu conjunto, um dos exemplos mais nítidos de adaptação à estrutura na área em estudo (Fot. 7). O seu curso praticamente rectilíneo, desde a nascente até desaguar no Rio Douro, evidencia a presença de uma linha de fragilidade tectónica, a favor da qual se instalou (Figura 16).

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Esta prolonga-se um pouco para a margem norte do Douro, influenciando inclusivamente este e um curso de água que desagua na sua margem direita e apresenta uma orientação geral NNW-SSE.

Figura 16. Perfil longitudinal do Rio Bestança.

Quanto ao Rio Cabrum, embora de forma menos clara, também aparenta desenvolver pequenos troços do seu curso explorando linhas de fragilidade tectónica.

Um deles estende-se a montante da barragem da Freigil, troço praticamente rectilíneo, com orientação NW-SE, por cerca de dois quilómetros. Um pouco a montante, um troço menos extenso, onde está instalada a barragem do Cabrum, também nos parece instalado aproveitando um linha de fracturação, com a mesma orientação da anterior, mas deslocada em relação a ela para NE.

Mais para montante, num afluente deste rio, o Ribeiro da Gralheira, a ocorrência de uma fractura parece condicionar o seu curso em dois locais, agora com uma direcção NNE-SSW, típica dos desligamentos tardi-hercínicos.

e) Cursos de água secundários

Tal como os cursos de água mais relevantes referidos atrás, também outros de menor importância apresentam o seu percurso total ou parcialmente condicionado pela rede de fracturação.

As direcções dos alinhamentos podem-se agrupar em duas orientações gerais: uma, predominante, de NNE-SSW a NE-SW; outra, menos frequente, de NW-SE.

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A primeira afecta praticamente toda a Serra, com especial relevo para o sector oriental e para as áreas graníticas elevadas do sector ocidental.

Neste sector vários são os cursos de água que percorrem vales com este alinhamento, condicionados por fracturas. Exemplo disso é o Ribeiro de Piães, afluente do Douro, condicionado pela falha do Carrapatelo.

A SE deste alinhamento encontramos vários cursos de água de traçado rectilíneo praticamente paralelos a este, drenando quer a vertente duriense, quer a vertente virada a SW, para o Rio Paiva.

O Ribeiro de Santa Marinha, que desagua no Rio Ardena (vertente SW) apresenta um traçado rectilíneo, encontrando prolongamento na vertente NE, onde um afluente do Ribeiro de Sampaio drena para o Douro, com a mesma orientação NNE-SSW.

Imediatamente a SE verificamos a mesma situação, com uma outra fractura a condicionar os traçados do Ribeiro da Noninha (vertente SW) e do Ribeiro de Enxedrô (vertente NE), apresentando uma orientação geral NNE-SSW.

No sector oriental, além dos rios principais apontados anteriormente, de referir ainda o Ribeiro de S. Martinho, que apresenta o seu leito, desde a nascente até S. Martinho de Mouros, com uma direcção NNE-SSW, claramente relacionado com a linha de fractura que afecta o Rio Douro, o alto vale do Balsemão, e proporciona o aparecimento do alvéolo de Feirão.

Mais a Sul, o Rio Pombeiro aparece igualmente condicionado por um alinhamento com a mesma orientação, praticamente desde a nascente até próximo de Vilar, correspondendo, desta vez, ao acidente tardi-hercínico Verín-Penacova.

No que diz respeito à direcção NW-SE, é evidenciada por diversos troços de cursos de água, quer no sector NE da área em estudo e entre Resende e o Rio Bestança, quer na vertente SW da Serra de Montemuro.

Além dos Rios Bestança e Cabrum, já referidos, constatamos a existência de outros cursos de água também condicionados por alinhamentos estruturais com esta orientação: o Ribeiro de Sexta, a oriente do Rio Cabrum, que apresenta desde S. Romão de Arede até desaguar no Douro um curso rectilíneo, instalado sobre uma falha, representada, inclusivamente na carta geológica 14 A-Lamego, à escala 1/50000; o Ribeiro Corvo apresenta, igualmente, entre Cárquere e Resende, um curso rectilíneo, claramente instalado a favor de um alinhamento tectónico.

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Na vertente SW da Serra, encontramos, também vários cursos de água condicionados por linhas de fracturação com orientação NW-SE.

É o caso do Rio Ardena, em dois sectores do seu curso: um sector a montante da localidade de Carvalhais, que culmina numa mudança brusca de direcção para SW-NE (seguramente devido também a fractura com esta direcção); pouco depois volta a retomar a direcção NW-SE, junto a Nespereira, instalando-se segundo uma fractura com a referida orientação, que explora por mais de três quilómetros.

Junto a Alvarenga, outra linha de água apresenta o seu curso condicionado por uma fractura de direcção NW-SE.

A direcção NW-SE parece condicionar de forma mais evidente a orientação da rede hidrográfica nos metassedimentos do Complexo Xisto-grauváquico, essencialmente da vertente SW da Serra, apesar de também encontrarmos a direcção NNE-SSW.

Por outro lado, ao nível dos granitóides, a direcção predominante é NNE-SSW, reflexo da importância da fracturação tardi-hercínica nesta zona do Maciço Hespérico.

Em suma, as duas principais direcções de fracturação exercem na orientação da drenagem uma forte influência, a qual se repercute não só nos cursos de água mais importantes, como também nas pequenas linhas de água. Apesar da área ocupada pelos materiais metassedimentares ser reduzida relativamente aos granitos, e de ambas as referidas direcções de fracturação aí se verificarem, é um facto que naqueles materiais a influência da rede de fracturação sobre as linhas de água não é tão evidente, nem proporciona o desenvolvimento de vales de fractura tão imponentes como nos terrenos graníticos, como é o caso do belo exemplar do vale do Rio Bestança.

2.2. Desenvolvimento de capturas

Um aspecto relacionado com a organização da drenagem, igualmente influenciado, frequentemente, pela estrutura e pela constituição litológica, é o desenvolvimento de capturas.

Afectando, em geral, os troços iniciais das linhas de água, em áreas de partilha ou disputa de drenagem, provoca por vezes mudanças bruscas na direcção de drenagem, afectando inclusivamente cursos de água de consideráveis dimensões.

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Fernando Rebelo (1975) refere, na sua tese de doutoramento, acerca das capturas: «factos de pormenor, aparentemente sem grande importância, estas capturas podem corresponder a alinhamentos de interesse para o conjunto funcionando, portanto, como indicadores morfológicos para a compreensão da tectónica regional; independentemente disso, por muito pequenas que sejam, significam sempre uma luta no comando da drenagem em função de um certo nível de base» (pág. 145).

Na área em estudo os casos de capturas verificam-se, como se apontou anteriormente, sobre troços iniciais de cursos de água, geralmente tributários dos cursos de água de média importância.

A observação da cartografia e da fotografia aérea, bem como a deslocação ao local, permitiu-nos verificar estes fenómenos, bem como observar situações que, a médio ou longo prazo, poderão vir a traduzir-se em novos reajustamentos das redes de drenagem na Serra de Montemuro.

a) A captura do Ribeiro da Gralheira

O Ribeiro da Gralheira e o Ribeiro do Taquinho são duas linhas de água, ambas tributárias do Rio Cabrum, que drenam (em parte dos seus cursos) a área da Lagoa de D. João, área que apresenta uma certa planitude (Figura 17).

O Ribeiro do Taquinho, tomando uma orientação geral N-S e demonstrando uma certa rectilinearidade, drena toda a parte Norte da referida área. Por seu lado, o Ribeiro da Gralheira apresenta um troço com orientação W-E, desde a confluência no Rio Cabrum até à Lagoa de D. João, onde inflecte repentinamente, assumindo orientação idêntica à do Ribeiro do Taquinho, praticamente na mesma direcção.

Parece-nos que, neste caso, a fracturação, que certamente condiciona ambos os cursos de água em parte dos seus cursos, como referimos anteriormente, não terá uma influência directa na captura, podendo esta dever-se apenas a um nível de base mais próximo, que terá provocado esta divergência na drenagem, acelarando aqui a erosão linear regressiva.

De facto, todos os indícios apontam para que a drenagem da Lagoa de D. João se fizesse na sua totalidade para o Ribeiro do Taquinho, processando-se posteriormente a captura por parte do Ribeiro da Gralheira, uma vez que este apresenta um maior declive, oferecendo um percurso mais rápido.

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b) A captura do Rio das Poldras

Nesta captura estão envolvidas duas linhas de água que drenam vertentes opostas: na vertente Norte, directamente voltada para o Rio Douro, corre o Rio das Poldras, afluente do Varosa; na vertente Sul, confluindo directamente para o Paiva, corre o Rio Pombeiro.

É uma área de disputa entre bacias, aquela em que ocorre esta captura. Trata-se de um nível aplanado a cerca de 950 metros de altitude, a Sul de Bigorne.

A drenagem da vertente NW do Sítio da Cruz, anteriormente realizada pelo Rio Pombeiro, terá sido desviada para Norte, pelo Rio das Poldras, passando a fazer-se o escoamento das águas no sentido do Rio Varosa, em detrimento da bacia do Rio Paiva.

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Pela observação da carta topográfica número 147/Tarouca (escala 1:25.000), realizada em 1945 (Figura 18), e confrontando-a com a mesma carta, mas de 199628 (Figura 19), constata-se que a drenagem da área referida era feita pelo Rio Pombeiro na carta de 1945, enquanto que na de 1996 a mesma era drenada já pelo Rio das Poldras, sendo portanto uma captura relativamente recente.

Porém, a observação atenta da carta mais antiga leva-nos a pensar numa hipótese mais arrojada: a drenagem deste vale processar-se-ia na sua totalidade através do Rio Pombeiro. Talvez por acção do nível de base mais baixo do Douro em relação ao Paiva, ou por outro factor de caracter local (como por exemplo a estrutura)29, ter-se-à verificado uma progressiva mudança na direcção da drenagem.

Figura 19. Captura do Rio das Poldras (baseada na carta topográfica de 1996).

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As datas atribuídas às referidas cartas reportam-se ao ano de realização dos trabalhos de campo e não ao da sua publicação.

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De referir que o traçado deste curso de água se apresenta relativamente rectilíneo, podendo estar condicionado por uma linha de fragilidade tectónica, com direcção NE-SW.

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c) A captura de um afluente do Rio Cabrum

Assiste-se, aqui, a um caso de captura por parte de um afluente do Rio Cabrum a um pequeno afluente do Rio Bestança (Figura 20). O primeiro, correndo na margem esquerda do Rio Cabrum junto a Ramires, apresenta, sensivelmente para montante desta localidade um percurso practicamente rectilíneo, com orientação NNE-SSW. Esta rectilínearidade é quebrada por uma mudança brusca de direcção , passando a correr com uma orientação practicamente meridiana. Foi neste cotovelo que se efectuou a captura sobre a linha de água que, com direcção ENE-WSW, drenava para o Rio Bestança.

Trata-se aqui, sem dúvida, de uma acção proporcionada pelo factor estrutural, uma vez que a rectilinearidade do curso captor evidencia a presença de uma linha de fragilidade tectónica, que terá permitido o desenvolvimento mais acelerado da erosão linear e consequentemente a concretização desta captura.

Também neste caso a litologia não terá constituido um factor determinante, uma vez que a área é constituída pelo granito biotítico-moscovítico de grão médio, porfiróide.

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O Ribeiro de Porto Chão, localizado a Este das linhas de água anteriormente referidas, terá, por sua vez, e num momento anterior ao da captura analisada, efectuado também a captura do curso de água afluente do Rio Bestança, pelo que este teria drenado inicialmente grande parte do sector Ocidental da “Serra da Gralheira”30.

Estas capturas poderão ter-se desencadeado como resposta a um basculamento tectónico quaternário em direcção ao Douro.

d) A captura do Ribeiro de Alhões

Como se pode verificar pelo caso acima analisado e este que analizaremos de seguida, os limites entre bacias ou sub-bacias são, na Serra de Montemuro, extremamente instáveis e flutuantes, devido, em grande parte, ao nível de base do Rio Douro, que provoca uma intensa e acelerada dissecação do modelado.

Neste caso, o Ribeiro de Alhões, afluente do Rio Bestança, intersecta o Rio Cabrum, originando uma captura (Figura 21). Esta captura ocorre pelo facto do Rio Cabrum drenar, aqui, uma área aplanada - a Lagoa Pequena. O Ribeiro de Alhões, drenando a vertente que se sucede a ocidente, atinge o rebordo da referida área aplanada e quebra a regularidade aí existente, procedendo à captura da linha de água que corre próximo.

Também aqui, o facto de o curso captor apresentar um percurso mais rápido, devido à maior declividade, é extremamente decisivo.

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“Serra da Gralheira” é o topónimo atribuído às alturas que se estendem desde a localidade da Gralheira até próximo de Ferreiro de Tendais.

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Referências

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