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A Escala de Personalidade da Criança revisitada: dados de fidelidade teste-reteste. Orlanda Cruz & Ana Isabel Pinto

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Cruz, O., & Pinto, A. I. (2006). A Escala de Personalidade da Criança revisitada: Dados

de fidelidade teste-reteste [The Childhood personality Scale revisited: Test-retest

reliability]. In C. Machado, L. Almeida, M. A Guisande, M. Gonçalves, & V. Ramalho

(Coord.), XI Conferência Internacional. Avaliação Psicológica: Formas e Contextos.

Actas. Braga: Psiquilíbrios Edições.

A Escala de Personalidade da Criança revisitada: dados de fidelidade teste-reteste

Orlanda Cruz & Ana Isabel Pinto

(Universidade do Porto, Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação)

A Escala de Personalidade da Criança (EPC) é um instrumento originalmente desenvolvido por Dibble & Cohen (1974), que avalia as características gerais da personalidade de crianças em idade pré-escolar, recorrendo-se aos adultos que prestam cuidados às crianças como fonte de informação. É constituída por 48 itens avaliados numa escala de 7 pontos com descritores. O adulto deve avaliar o grau em que cada item descreve o comportamento da criança, reportando-se para tal aos últimos dois meses.

No âmbito do estudo referenciado neste simpósio, 43 educadoras completaram a EPC relativamente a 108 crianças com idades compreendidas entre os 54 e os 84 meses. Estas crianças tinham sido alvo de uma primeira avaliação quando tinham 14 a 49 meses, sendo portanto a segunda avaliação realizada, em média, após dois anos. Serão apresentados os resultados das avaliações efectuadas pelas educadoras, sendo que nenhuma destas participou no primeiro momento de avaliação. Para além da estrutura factorial revista e dos coeficientes de consistência interna relativos aos dados da presente amostra, serão também descritos os dados relativos à estabilidade temporal. A análise destes resultados permite concluir pela estabilidade relativa das dimensões avaliadas que, do ponto de vista teórico, funciona como um indicador da estabilidade das características de temperamento ao longo do período pré-escolar.

A que nos referimos quando falamos de temperamento? Os estudos mais recentes sobre as características temperamentais focalizam-se nas diferenças de estilo comportamental, nomeadamente no que se refere à expressão emocional, motora e atenção, que podem ser observadas desde muito cedo, praticamente após o nascimento. Há algum apoio científico no sentido de considerar que estas diferenças têm uma base biológica, apesar de algumas características temperamentais, como por exemplo a atenção persistente, só se evidenciarem mais tarde no desenvolvimento (Rothbart & Bates, 1998).

No âmbito da Psicologia do Desenvolvimento, o estudo do temperamento da criança é relevante na medida em que se tem revelado um importante determinante da parentalidade. Por exemplo, as crianças com um nível de actividade elevado estimulam mais comportamentos de controlo e de afirmação do poder por parte dos pais (Janssen, 1988). As crianças medrosas reagem mal a estratégias coercivas e melhor a estratégias de controlo subtis (Kochanska, 1991, 1993, 1995). O estudo do temperamento da criança como factor determinante do comportamento parental e do desenvolvimento da própria criança tem sido estudado de duas formas: (1) como determinante do comportamento parental e na sequência destes como

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determinante do desenvolvimento da criança e (2) como mediador entre o comportamento parental e o desenvolvimento da criança (cf. Cruz, 2005, p. 102-104).

A tendência dos investigadores, desde os estudo pioneiros de Thomas e Chess (1977) tem sido no sentido de identificar dimensões temperamentais, algumas mais consensualmente aceites do que outras. A identificação destas dimensões tem sido feita empiricamente através da aplicação das escalas de temperamento a crianças de variados escalões etários, sendo posteriormente os resultados submetidos a análises factoriais; porém, como sublinham Rothbart e Bates (1998, p. 110), a identificação de dimensões está desde logo sujeita a uma limitação fundamental que é o facto de estar dependente do conjunto de descritores incluídos nessas mesmas escalas de avaliação.

A Escala de Personalidade da Criança (EPC), apesar de invocar o constructo personalidade, na realidade é uma medida de temperamento que pretende avaliar as diferenças individuais em domínios como os níveis de acção, a atenção e o afecto da criança, diferenças essas subjacentes de facto à personalidade; porém, este constructo ultrapassa o domínio do temperamento, incluindo outras variáveis de carácter pessoal como as competências, os hábitos, os valores, o sentido de self, etc. (Rothbart & Bates, 1998, pp. 108-109).

A EPC foi inicialmente desenvolvida por Dibble e Cohen (1974) e traduzida e adaptada no Centro de Psicologia do Desenvolvimento e Educação da Criança da FPCEUP, tendo sido já objecto de apresentação na edição de 2004 deste Congresso (Pinto, Cruz & Bairrão, 2004). Nessa altura tivemos oportunidade de apresentar a sua estrutura factorial e a consistência interna das dimensões identificadas, bem como a relação com outras medidas da criança que apoiavam a sua validade, quando aplicada a crianças entre o 1 e os 3 anos de idade.

A aplicação desta escala às educadoras relativamente às crianças de 1 a 3 anos revelou uma estrutura factorial muito semelhante à encontrada por Dibble e Cohen (1974). Foram identificados cinco factores, cujos valores de consistência interna (entre .79 e .89) permitem assumir que estamos face a subescalas, cada qual avaliando uma dimensão do temperamento. Na altura foram denominadas Expressividade Verbal e Emocional, Atenção, Adaptabilidade, Controlo Socio-Emocional e Empenhamento/Evitamento (Pinto et al., 2004). Passaremos agora à sua descrição, ao mesmo tempo que fundamentaremos, com base na literatura mas sem pretensão à exaustão, a sua importância enquanto dimensões do temperamento. Apesar de as várias escalas/dimensões de temperamento se apresentarem com denominações diferentes, frequentemente os constructos subjacentes são os mesmos (Rothbart & Bates, 1998, p.112).

A dimensão Expressividade Verbal e Emocional inclui itens relativos a características de socialização positivas frequentemente associadas a um humor positivo. Na literatura

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encontramos frequentes referências a este tipo de dimensão. A sociabilidade é uma das dimensões identificadas na Emotionality, Activity, Sociability, Impulsivity (EASI, Buss & Plomin, 1975), o afecto positivo também é uma das dimensões identificadas por Rothbart e Mauro (1990) e inclui sorrir, rir, fazer a abordagem das situações novas, revelar flexibilidade e cooperação (atitude positiva nas relações sociais); finalmente, o Infant Behavior Questionnaire (IBQ; Rothbart, 1981) inclui uma escala denominada “Sorrir e rir”.

A dimensão Atenção refere-se à capacidade da criança para se envolver de forma prolongada nas actividades em curso. Esta dimensão surge de forma consistente nas escalas de avaliação do temperamento. É uma das nove dimensões do New York Longitudinal Study (NYLS) identificadas por Thomas & Chess (1977), que referem também uma dimensão de “

distractibilidade”

que seria oposta à atenção. Rowe e Plomin (1977), ao combinarem a EASI com as dimensões do NYLS (crianças de 5 meses a 9 anos) encontraram também uma dimensão de atenção/persistência, sendo esta dimensão também identificada por Rothbart e Mauro (1990). A Atenção por vezes também aparece sob a nomenclatura persistência na tarefa quando se trata de crianças de idade pré-escolar e escolar (McClowry, Hegvik & Teglasi, 1993; Presley & Martin, 1994). A dimensão de controlo identificada no Children’s Behavior Questionnaire (CBQ) de Rothbart, Ahadi e Hershey (1994) é definido em parte pela focalização da atenção e pela sensibilidade perceptiva.

A Adaptabilidade relaciona-se com a reacção positiva da criança à novidade; é uma dimensão referida por Thomas e Chess (1977) e por Carey e Devitt (1978) na sua Revised Infant Temperament Scale (RITQ) em relação aos bebés, e ainda por Martin, Wisenbaker e Huttunen (1994). Esta dimensão aparece também incluída na lista das seis dimensões propostas por Rothbart e Bates (1998, p. 113) para as crianças mais velhas, sob o nome de adaptabilidade/sociabilidade.

O Controlo Socio-Emocional refere-se às características de auto-regulação relacionadas com a competência social. Uma das dimensões frequentemente consideradas nas escalas de temperamento é o nível de actividade nos bebés (Rothbart, 1981; Rothbart & Mauro, 1990; Thomas & Chess, 1977) e nas crianças mais velhas (Presley & Martin, 1994; Rowe & Plomin, 1977). A dimensão de controlo socio-emocional, como a identificamos aqui, não inclui apenas esta dimensão (“activa, é impossível acompanhá-la”), mas também faz apelo ao controlo emocional em situações de relacionamento social e, como tal, aproxima-se das dimensões de auto-regulação e controlo citadas por Rothbart e colaboradores (1994).

O Empenhamento/Evitamento inclui itens que descrevem características de timidez e passividade. Outras escalas abordam dimensões semelhantes como a aproximação-retraimento

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nos bebés, (RITQ, Carey & McDevitt, 1978), o medo (IBQ, Rothbart, 1981), o medo/inibição ou inibição social nas crianças mais velhas (Presley & Martin, 1994; Rothbart & Mauro, 1990).

Em análises posteriores dos resultados por nós obtidos através da aplicação da EPC às crianças de 1 a 3 anos, constou-se que dois dos factores, Expressividade Verbal e Emocional e Adaptabilidade apresentavam uma correlação elevada (r = .65), o que nos levou a optar por uma solução de quarto factores com rotação Varimax que explica 47% da variância e na qual os dois factores referidos surgem aglomerados numa única dimensão (Pinto, 2006). Conceptualmente, estes dois factores são coerentes e apontam para uma dimensão de temperamento fácil que se manifesta tanto nas relações com os outros como nas situações novas (Thomas & Chess, 1977). Decidimos portanto atribuir-lhe o nome mais simples de Sociabilidade/Adaptabilidade.

Também o quarto factor foi entretanto renomeado como Aproximação/Retraimento, na medida em que este nome parece mais coerente com as dimensões encontradas na literatura (approach/withdrawal). A investigação tem demonstrado a importância desta dimensão no domínio das relações com os pares. Por exemplo, níveis elevados de inibição e de medo/receio estão associados à timidez face aos pares estão relacionados com valores mais elevados de sociabilidade entre pares.

De salientar a sobreposição conceptual e empírica entre as dimensões, verificada através da correlação encontrada entre elas. Quando analisamos a capacidade de previsão do desenvolvimento da criança revelada pelas dimensões temperamentais, verificamos que frequentemente elas surgem aglomeradas. Por exemplo, o humor positivo e a adaptabilidade (que aqui incorporamos na dimensão única de sociabilidade/adaptabilidade) e a aproximação/retraimento são preditores relevantes, indicando que crianças mais alegres e bem dispostas, e crianças que habitualmente manifestavam disponibilidade para experimentarem situações novas e para conhecerem pessoas, tinham melhor adaptação ao grupo (Klein, 1991; Zajdeman & Minnes, 1991). Humor positivo e adaptabilidade são também as características da criança fácil no NYLS (Thomas & Chess, 1977).

O nível de actividade da criança, a sua persistência na tarefa e distractibilidade são dimensões temperamentais da criança que têm sido igualmente referidas como estando relacionadas a uma melhor adaptação a contextos de educação de infância: crianças menos activas, altamente persistentes e menos sujeitas a distraírem-se eram consideradas como estando mais bem adaptadas aos contextos de educação de infância (Klein, 1991).

Pode-se mudar o temperamento? Qual a estabilidade das características temperamentais? Por definição as características temperamentais tenderão a ser estáveis mas, como referimos atrás, a investigação tem demonstrado que, não só os pais educam de diferentes formas crianças com temperamentos diferentes, mas também diferentes formas de educar as

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crianças podem ter diferentes implicações desenvolvimentais em função do seu temperamento. Por exemplo, uma criança com baixo nível de actividade apresenta níveis superiores de exploração do ambiente se a mãe direccionar a sua atenção para ela; pelo contrário, numa criança com um nível elevado de actividade verifica-se uma relação negativa entre os comportamentos de exploração e a focagem da atenção materna (Gandour,1989).

Nesta comunicação pretendemos: (1) verificar se os factores da EPC identificados nas crianças de 1 a 3 anos também se revelam consistentes quando esta escala é aplicada a crianças de idade pré-escolar, (2) perceber a sua relação com outras variáveis das crianças e famílias e (3) estudar a estabilidade temporal desta medida de temperamento, já que foi pedido às educadoras que preenchessem a escala relativamente às mesmas crianças1.

Método Participantes

Participaram neste estudo 108 crianças – 56 meninas e 52 meninos – das 120 que já tinham integrado o estudo quando tinham entre 14 e 49 meses. Estas crianças apresentam agora idades compreendidas entre 54 e 84 meses e um Quociente de Desenvolvimento (QD) médio de 96.98 (D-P = 10.86). As mães apresentam em média 10.8 anos (DP = 4.5) de escolaridade. Todas as crianças frequentam jardins-de-infância e residem na zona do Grande Porto.

As crianças foram avaliadas por 43 educadoras, nenhuma das quais tinha participado no primeiro momento de recolha de dados.

Instrumentos

A Escala de Personalidade da Criança foi traduzida e adaptada para a população portuguesa (Pinto, et al., 2004) a partir da Child Personality Scale (Dibble & Cohen, 1974). É constituída por 48 itens com uma escala de resposta tipo Likert de 7 pontos, em que 0 corresponde a nunca e 6 corresponde a sempre. Deve ser preenchida por um adulto que esteja regularmente com a criança; ao avaliar em que medida cada item corresponde a uma descrição precisa do comportamento da criança, o adulto deve referenciar os dois últimos meses. Existem versões paralelas para pais/mães e educadoras/professoras. Neste estudo vamos apenas utilizar os dados resultantes das respostas das educadoras.

A avaliação do QD foi feita através das Escalas de Desenvolvimento Mental de Ruth Griffiths, que são um instrumento estandardizado de avaliação do desenvolvimento da criança que contempla seis domínios: locomotor, pessoal-social, audição e fala, coordenação óculo-manual, realização e raciocínio prático (Griffiths, 1984; Griffiths, 1996). O valor da consistência

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interna da escala total é bastante razoável (coeficiente alfa de .83, n=79), o que nos permite utilizar o QD com confiança.

Procedimento

A EPC foi preenchida pelas educadoras relativamente às crianças previamente seleccionadas como tendo participado já no primeiro momento de recolha de dados e cujos pais continuaram a autorizar esta participação.

As Escalas de Desenvolvimento Mental de Ruth Griffiths foram administradas individualmente às crianças no jardim-de-infância por investigadores devidamente treinados para tal.

Resultados

Com o objectivo de verificar se os factores ou subescalas identificadas no primeiro momento também se aplicam às crianças em idade pré-escolar, foi calculada a sua consistência interna, recorrendo-se para tal ao coeficiente alfa de Cronbach. Apresentam-se no Quadro 1 os valores relativos ao primeiro e ao segundo momento.

Quadro 1. Valores de consistência interna da EPC.

Dimensões Itens 1 a 3 anos 4 a 6 anos Exemplos de itens Sociabilidade/Adaptabilidade 16 .89 .88 É alegre, sorri e ri muito

Atenção 8 .89 .80 Consegue prestar atenção durante

muito tempo

Controlo socio-emocional 10 .81 .84 Empurra outras crianças e adultos de forma pouco amigável

Aproximação/Retraimento 11 .79 .78 Evita chamar a atenção. Afasta-se. das pessoas

Como se pode verificar da leitura do Quadro 1, os valores de consistência interna atingem valores razoáveis, o que nos permite considerar cada factor como uma subescala ou uma dimensão.

Serão apresentadas de seguida as relações das dimensões com algumas características de carácter socio-demográfico – género e idade das crianças e escolaridade das mães – e com o QD das crianças.

Apresenta-se no Quadro 2 as estatísticas descritivas dos resultados obtidos em cada dimensão em função do género das crianças. Note-se que a amplitude de cada escala é de 0 a 6 valores.

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Dimensões Raparigas Rapazes Total Sociabilidade/Adaptabilidade 4.65 (.66) 4.50 (.81) 4.58 (.73) Atenção 4.22 (.90) 4.12 (.81) 4.17 (.86) Controlo Socio-Emocional 3.94 (1.05) 3.66 (.96) 3.80 (1.01) Aproximação/Retraimento 4.95 (.62) 4.79 (.82) 4.87 (.73)

A análise das diferenças através de testes T revela que, apesar de as raparigas terem valores mais elevados em todas as subescalas, essas diferenças não são estatisticamente significativas.

Relativamente à idade cronológica, verificaram-se correlações positivas de valor moderada com as dimensões de Atenção (r = .39, p =.001) e de Controlo Socio-Emocional (r = .32, p = .004). As correlações com as dimensões de Sociabilidade/Adaptabilidade (r = .18, p = .13) e de Aproximação/Retraimento (r = .21, p = .06) são mais baixas e não significativas do ponto de vista estatístico.

Tal como a idade cronológica, também a escolaridade das mães aparece correlacionada positivamente, apesar de com valores baixos, com as dimensões Atenção (r = .24, p = .012) e Controlo Socio-Emocional (r = .28, p = .003).

Das quatro dimensões de temperamento consideradas, apenas o Controlo Socio-Emocional aparece correlacionado com o Quociente de Desenvolvimento (r = .23, p = .043). Este valor porém diminui para r = .14, quando se controla a escolaridade das mães, o que permite afirmar que é esta variável que em grande parte explica a relação entre a dimensão de temperamento e o QD.

Com o objectivo de estudar a estabilidade das notas obtidas nas subescalas entre o primeiro (1 a 3 anos) e o segundo momento (4 a 6 anos) da recolha dos dados, foram calculados os coeficientes de correlação entre as escalas (Quadro 3).

Quadro 3. Correlações entre os resultados obtidos com as subescalas da EPC quando aplicadas às mesmas crianças de 1 a 3 anos e de 4 a 6 anos.

1-3-Anos 4-6 Anos Sociabilidade/

Adaptabilidade

Atenção Controlo Socio-Emocional Aproximação/ Retraimento Sociabilidade/Adaptabilidade .37** .14 .01 .25* Atenção .30** .37** .11 .25** Controlo Socio-Emocional .13 .14 .37** .03 Aproximação/Retraimento .22* .12 .09 .30** * p<.05; ** p<.01

A análise do quadro 3 revela que existem correlações de valor moderado entre as subescalas avaliadas em diferentes momentos temporais. Para além desses valores, são apenas de realçar as correlações entre Sociabilidade/Adaptabilidade aos 1-3 anos e Atenção e

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Aproximação/Retraimento aos 4-6 anos, bem como as correlações entre Aproximação/Retraimento aos 1-3 anos e Sociabilidade/Adaptabilidade e Atenção aos 4-6 anos. Porém, as correlações mais elevadas são observadas entre as mesmas escalas.

Discussão

A aplicação de um mesmo instrumento em dois momentos temporais distintos permite-nos realizar uma apreciação repetida das características desse instrumento, verificando se aquilo que observamos num primeiro momento tem um carácter de especificidade ou se, pelo contrário, as características são repetidamente observadas e, como tal, podem ser atribuídas a esse instrumento com maior confiança. Assim, neste momento podemos afirmar que as dimensões extraídas através de uma análise de componentes principais (ACP) quando a EPC foi aplicada à amostra de 1 a 3 anos, se revelam consistentes quando o instrumento é novamente aplicado cerca de dois anos mais tarde em relação às mesmas crianças, mas preenchido por outros adultos. Apesar de não termos podido repetir a ACP, dado o elevado número de sujeitos que seria necessário para uma tal análise, o cálculo do coeficiente de consistência interna confirma a coerência empírica das dimensões extraídas. Do ponto de vista teórico, existe apoio suficiente na literatura, como tivemos oportunidade de referir, para suportar conceptualmente as dimensões por nós identificadas.

Tratando-se de um instrumento de avaliação de características temperamentais, está sobretudo vocacionado para a identificação de diferenças individuais; porém, não podemos esquecer que estamos a falar das características temperamentais de crianças em desenvolvimento e como tal, não será de estranhar verificar que algumas dimensões tenham um pendor desenvolvimental. De facto, a capacidade de atenção da criança e a sua capacidade de se auto-regular emocionalmente em situações de interacções com pares são duas importantes competências com desenvolvimento notório no período pré-escolar (cf. Cruz, Almeida, Simões & Silva, 1997; Thompson, 1991). Pelo contrário, a sociabilidade/adaptabilidade e a abordagem/retraimento são características mais estáveis e menos dependentes do desenvolvimento.

Ao contrário do que aconteceu no primeiro momento de recolha de dados, em que as relações entre as dimensões de temperamento e os anos de escolaridade das mães eram praticamente nulas, neste segundo momento com as crianças de 4 a 6 anos, observamos que as mesmas dimensões acima referenciadas como tendo um pendor desenvolvimental – Atenção e Controlo Socio-Emocional – também se relacionam com a escolaridade das mães. Sabendo nós que a escolaridade materna é um importante determinante dos comportamentos educativos utilizados (cf. Cruz, 2005), teremos de levantar a hipótese de estas dimensões, mais do que as

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outras duas, serem permeáveis à intervenção educativa materna. Esta será uma questão a aprofundar em estudos posteriores.

Outra característica da dimensão de Controlo Socio-Emocional é ainda a sua relação com a competência desenvolvimental (tal como avaliada através do QD), ao contrário do que acontecia na amostra de 1 a 3 anos; esta relação parece porém dever-se ao efeito da escolaridade das mães.

Ao relacionarmos os resultados obtidos em dois momentos temporais podemos ainda elaborar acerca da estabilidade dos resultados obtidos que reflecte, ao mesmo tempo, uma característica do instrumento e uma característica dos próprios dados. Na realidade, as correlações são simplesmente moderadas, sendo antes de realçar que as correlações entre as mesmas dimensões são mais elevadas do que entre dimensões diferentes. Parece-nos razoável concluir que, apesar de as nossas observações recaírem sobre faixas etárias caracterizadas por processos desenvolvimentais dinâmicos, os resultados revelam uma estabilidade razoável das dimensões observadas.

A título de conclusão, parece-nos continuar actual a afirmação de Rothbart e Bates (1998, p. 160), segundo a qual “estabelecer a natureza das relações entre as características de temperamento nos mais novos e a personalidade nos mais velhos (…) será uma das principais tarefas a realizar nesta área” e decorrerá naturalmente de estudos longitudinais. O nosso grupo de investigação tem intenção de continuar a observar as mesmas crianças com as mesmas dimensões seguindo para tal um desenho longitudinal.

Notas

1 A administração da EPC às crianças de 1 a 3 anos decorreu no contexto do projecto A qualidade das

interacções da criança em contexto familiar e de creche e o seu impacto no desenvolvimento socio-cognitivo da criança, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (POCTI / PSI / 35207 /

2000), estando mais informação disponível em ww.fpce.up.pt/qualinterac/apresentacao.htm. A administração EPC às crianças de 4 a 6 anos, por seu lado, decorreu no contexto do projecto Estudo

longitudinal do envolvimento e da adaptação, também financiado pela FCT (POCTI/PSI/58712/2004) e

que constitui um segundo momento de recolha de dados das crianças e famílias observado no primeiro estudo referido.

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