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Meus, seus, nossos: caracterização demográfica da família mosaico no Brasil

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I SEMINÁRIO NACIONAL: FAMÍLIA E POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL GT 4 – FAMÍLIA, CONSUMO E CULTURA

Meus, seus, nossos: caracterização demográfica da família mosaico no

Brasil

Francismara Fernands Guerra1

Resumo: Informações demográficas sobre filhos são, geralmente, baseadas na fecundidade das mulheres. Isso significa que, em uma família mosaico, onde os filhos do marido não são, necessariamente, os filhos das esposas, há mais informações sobre a caracterização das famílias do que estamos conseguindo captar. Empregando o Censo Demográfico do Brasil de 2010, percebemos que a participação de enteados, madrastas e padrastos na família domiciliar é expressiva. Podemos concluir que tanto a fecundidade das mulheres, quanto a fecundidade dos homens descrevem a história da fecundidade marital e dos rearranjos da família moderna, cuja participação é responsável pela diversidade nas relações de parentesco.

Palavras-chave: família mosaico; parentesco; fecundidade marital.

Abstract: Demographic informations about children are, generally, based on the fertility of women. This means that, in a mosaic family, where husband's children are not necessarily the children of the wife, there are more information on the characterization of the families that we are managing to capture. Employing the Censo Demográfico from Brazil of 2010, we realized that the participation of stepchildren, stepmothers and stepfathers in household family is expressive. We can conclude that both the fertility of women, as the fertility of the men describe the history of marital fertility and rearrangements of the modern family, whose participation is responsible for diversity in family relationships.

Keywords: mosaic family; kinship; marital fertility.

1. INTRODUÇÃO

Estudos demográficos sobre família, em sua grande maioria, se restringem à análise somente dos filhos das mulheres, uma vez que conhecer a fecundidade dos homens é um grande desafio, por ser desconhecida ou de difícil modelagem. Como decorrência de distintas uniões ou recasamentos, as famílias se tornam mais complexas e a parturição da esposa não corresponde,

1 Doutora em Demografia, Professora do Instituto Federal de Minas Gerais – IFMG (Campus Governador Valadares), Brasil, francismara.fernandes@ifmg.edu.br

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necessariamente, à parturição do marido. O que chama à atenção para as múltiplas configurações dos novos (re)arranjos familiares.

Tais arranjos, muitas vezes, não têm a finalidade de gerar uma nova família através da geração de um filho, já que marido ou mulher já possuem filhos de uma união anterior. Mas, ao invés disso, a consolidação desta nova família se dá quando marido e mulher agregam seus respectivos filhos, gerando ou não um filho em comum. Haveria, então, alguma forma de mensurar a participação dos enteados e filhos dentro da família brasileira?

As pesquisas demográficas que abordam as múltiplas configurações de parentesco, ocasionalmente geradas por recasamentos ou novas uniões, são estudas sob a luz da fecundidade tanto da esposa quanto do marido e referem-se ao estudo das famílias mosaico ou reconstituídas (Stewart, 2002; Thomson, 2004; Levin e O’hara, 1978). A família mosaico ou reconstituída pode ser entendida como sendo uma família nuclear formada por recasamento (formal ou informal) com filhos de outras uniões.

Tendo em vista que, em uma família mosaico, a fecundidade da mulher mensura parcialmente a filiação, nosso objetivo é caracterizar as famílias mosaico brasileiras pelos componentes que se encontram presentes nos domicílios. Mesmo sabendo que, grande parcela das crianças de antigas uniões tenda a permanecer com a mãe, este estudo representa um primeiro esforço para tentar entender os efeitos da parturição dos homens dissociada da parturição das mulheres sobre as relações de parentesco dentro da família mosaico. E destina-se, portanto, a acrescentar ao estudo da família no Brasil, as implicações da fecundidade marital na diversidade de parentes.

2. FECUNDIDADE MARITAL

Teoricamente, a fecundidade marital está sujeita a, basicamente, três efeitos (Griffith et. al, 1985; Vikat Et Al, 1999; Thomson, 1997b). O primeiro refere-se ao efeito do compromisso ou comprometimento, o qual trata a visão popular de que um casal deveria ter filhos ou que uma família é incompleta sem filhos. O segundo refere-se ao efeito da paternidade e da maternidade, no qual se destaca a importância em se ter filho para se afirmar como adulto perante a sociedade. E por último, o terceiro efeito trata-se do efeito da irmandade, que sugere haver a intenção de prover um irmão ao filho único (comum) do casal ou de prover um (meio) irmão, em recasamentos, na existência de filho único de um dos cônjuges.

Os achados de Griffith et. Al (1985), Vikat et. al, (1999) e Thomson (1997b) confirmam a existência do efeito do comprometimento na fecundidade marital, mas não o efeito da

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paternidade e maternidade. Já o efeito da irmandade, testado pela chance de concepção de um segundo filho é algo complexo de ser explicado. Um forte efeito da irmandade é encontrado por Thomson (1997b) nas intenções de esposas com apenas um filho, apesar do mesmo não ser encontrado nas intenções de maridos com essas características, nem percebido sobre o risco de reprodução do casal. Vikat et. al, (1999) encontra um resultado misto. Há tanto evidências que sugerem que meios-irmãos e coirmãos são substitutos de irmãos biológicos, quanto evidências consistentes com a motivação de prover um irmão biológico. Assim sendo, a ambiguidade dos resultados mostra a dificuldade imposta pelos rearranjos familiares para a compreensão dos determinantes da fecundidade marital e suas implicações na progressão da parturição (Thomson, 1997b).

Nesse sentido, Lauriat (1969) percebe que jovens mulheres recasadas, viúvas e divorciadas têm mais filhos que mulheres também jovens em casamentos contínuos. Isso porque essas mulheres se caracterizam pela baixa idade ao primeiro casamento e alta fecundidade ao início da união conjugal. A autora ainda explica que mulheres recasadas tendem a procurar a recuperação da fecundidade perdida entre a dissolução do casamento anterior e o recasamento, elevando as taxas de fecundidade além do nível observado entre as mulheres que se mantiveram na primeira união. Resultado semelhante foi encontrado por Thornton (1978), que acrescenta dizendo que a dissolução marital sem recasamento trunca a parturição e, desse modo, decresce o tamanho da família. No entanto, quando há recasamento, as mulheres estão aptas à reprodução, na qual o intervalo entre os nascimentos será estendido por causa do tempo entre a dissolução do casamento anterior e o recasamento.

Em sentido contrário, Levin e O’Hara (1978) chegam a conclusão de que há uma redução na fecundidade das mulheres recasadas relativamente à aquelas uma única vez casada. E que essa redução é maior entre as mulheres cujos maridos já foram previamente casados. Koo et. al (1984) mostram que, além do casamento prévio poder afetar a parturição feminina, o inverso também pode acontecer. Mulheres divorciadas com parturição elevada tendem a não se recasar. Sugerindo que o número de filhos da mulher afeta a possibilidade de recasamento.

Já Griffith et. al (1985) diz que o número de filhos tidos antes do casamento não afeta a probabilidade de reprodução no casamento. Ao invés disso, os autores demonstram que a idade da criança mais nova tem algum efeito na probabilidade ter um filho na nova união. Embora isso ocorra, parece que ter um novo filho é um importante passo no processo de formação de uma nova família e que deve ser iniciado rapidamente.

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Na decisão pela parturição, existem benefícios que podem ser compartilhados pela família segundo o número de filhos tidos. Segundo Thomson (2004), pelo primeiro filho, o casal ganharia o valor do comprometimento, o homem ganharia o valor da paternidade e a mulher, por sua vez, o valor da maternidade. Pelo segundo filho, o ganho seria relativo ao valor do irmão. Já para nascimentos de maior ordem, não haveria ganho, somente aumento nos custos da criação dos filhos. A autora ainda explica que, em um recasamento, as crianças das uniões anteriores não representam comprometimento, o que incentivaria o novo casal a continuar a reprodução.

Os achados de Vikat et. al (1999) corroboram a evidência de que a parturição anterior ao casamento corrente não afeta a motivação de ter um filho em comum. Os autores destacam, porém, que poucas diferenças foram encontradas entre o efeito dos filhos das pré-uniões do homem e da mulher. A explicação para esse fato estaria nas políticas públicas da Suécia e dos países Nórdicos que incentivam e oferecem suporte material e ideológico à paternidade e à equidade de gênero. Mais uma vez, os estudos de Buber e Prskawetz (2000) vão ao encontro da independência entre o número de filhos do cônjuge e o primeiro nascimento na nova união conjugal. Neste caso, contudo, os resultados indicam, claramente, que ter filho em uma segunda união sofre forte influência de filhos de pré-uniões quando estes são corresidentes.

Cabe ressaltar que, no processo decisório pela escolha da fecundidade, Thomson e Hoem (1998) percebem que vigora a equidade de gênero independente das políticas públicas familiares vigentes. Ou seja, tanto o marido quanto a esposa têm poderes semelhantes na escolha pela parturição na presença ou na ausência de políticas pró-natalidade que busquem a participação paterna. E notam ainda que não há diferença nos padrões de decisão entre casais formalmente casados e coabitantes. Nesse sentido, Thomson et. al (1990) complementam os resultados mostrando que casais em desacordo sobre o ideal de parturição experimentam taxas de fecundidade intermediárias àquelas experimentadas por casais que desejam ter maior ou menor número de filhos. Por outro lado, segundo Stewart (2002), os filhos das uniões prévias enfraquecem as intenções do casal de ter filhos e, deste modo, as diferentes histórias de fecundidade dos cônjuges são levadas em conta na decisão de quando ter filhos.

A correlação entre fecundidade e dissolução do casamento também entra no escopo da discussão. Para Koo e Janowitz (1983) há um processo simultâneo que ocorre no âmbito familiar, no qual não somente o estado marital pode afetar a reprodução, mas onde a reprodução pode influenciar o estado marital. Em síntese, as autoras sugerem que o número de filhos e a idade do filho mais novo de casamentos prévios, bem como o número de filhos tidos durante o

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casamento corrente não influenciam a probabilidade de separação. Ao mesmo tempo em que brigas matrimoniais não podem ser vistas como tendo influência sobre a reprodução dentro do casamento. Em contrapartida, para Lillard e Waite (1993), a possibilidade de dissolução afeta negativamente a fecundidade marital durante o casamento, espaçando os nascimentos e reduzindo as chances de reprodução.

Ao estimar que aproximadamente um terço dos nascimentos americanos tidos fora do casamento é de mulheres casadas, Brown (2000) descreve mais um exemplo surpreendente e contraditório da dinâmica demográfica da fecundidade. Esse fenômeno é resultado da fecundidade observada no período de coabitação. A autora mostra que a fecundidade da coabitação está positivamente associada à fecundidade pós-marital. O que sugere que as pessoas optam por coabitar, ter filhos, se casar e continuar tendo filhos.

Há diferentes caminhos para a formação de famílias por recasamentos de tal forma que considerável proporção das mulheres entra neste tipo de família em idade reprodutiva (Prskawetz et. al, 2003). Assim como há alguma evidência de padrão de fecundidade específico para famílias formadas por recasamentos, onde as fecundidades separada e compartilhada dos cônjuges devem ser consideradas (Thomson et. al 2000).

Segundo Bumpass (1984), crescer e torna-se adulto tendo como referência mais de uma família representa mais do que a simples adição de um padrasto ou uma madrasta, de conviver com pai ou mãe não corresidentes e relacionar-se com meios-irmãos e coirmãos. Para o autor, a diversidade é maior do que aquela captada pelos dados, por causa da variação do tempo entre a dissolução da primeira família e a formação da segunda. Para muitas crianças, esses eventos podem ocorrer em diversas etapas da infância e repetidas vezes, no entanto, serão histórias de vida não documentadas.

3. MATERIAL E MÉTODOS

Para caracterizar as relações de parentesco dentro da família mosaico, no caso brasileiro, empregamos o Censo Demográfico de 2010. O censo estabelece as relações das pessoas residentes em um domicílio definido-as segundo sua relação com o responsável por esse domicílio. Caso o responsável e/ou seu cônjuge/companheiro(a) tenha(m) filhos corresidentes, estes serão relacionados como filhos de um, de outro ou de ambos. Permitindo, assim, estabelecer as relações de enteado, madrasta e padrasto existentes nas famílias mosaico.

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Foram selecionadas famílias com as seguintes características: casal com filho(s) sendo um dos cônjuges responsável pelo domicílio em uma união formal ou informal, cuja esposa se encontre em idade reprodutiva (de 15 a 49 anos) e cujo marido tenha entre 15 e 69 anos. Este corte foi escolhido para que um indivíduo não pudesse ocupar diferentes posições na família, bem como, para evitar declarações exageradas. Foram selecionadas, ainda, famílias em que todos os filhos corresidentes fossem crianças, isto é, tinham até 14 anos de idade. Neste trabalho, estamos tratando somente de crianças tendo em vista que uma parcela importante desta população tende a residir com seus progenitores.

4. ANÁLISE ESTATÍSTICA

O universo das famílias nucleares do Brasil conta com mais de 13,5 milhões de famílias, dos quais 14,9% correspondem às famílias mosaico, e conta, ainda, com mais de 23,4 milhões de crianças, das quais 17,9% pertencem a famílias mosaico. Isso mostra, primeiramente, que representativa parcela das famílias brasileiras reside em domicílios cujo arranjo familiar é mais complexo do que a tradicional concepção de família “pai, mãe e filhos”. E mostra, também, que as famílias mosaico são maiores que as nucleares simples, já que a proporção de crianças é maior que a proporção de famílias correspondentes.

TABELA 1 – Proporção de famílias mosaico segundo características da fecundidade marital, Brasil, 2010

Características %

Sem filho em comum do casal 55,7

Sem filho em comum do casal sendo todos os filhos da esposa 41,6 Sem filho em comum do casal sendo todos os filhos do marido 11,4

Onde há filhos da esposa 88,6

Onde há filhos da esposa de outras uniões (i.e., enteados do marido) 82,6

Onde há filhos do marido 58,4

Onde há filhos do marido de outras uniões (i.e., enteados da esposa) 20,8

Onde há filhos em comum do casal 45,0

Onde há todas as filiações possíveis 0,7

Fonte: Censo Demográfico Brasileiro (2010) – Microdados.

Nota-se, pela Tabela 1, maior participação da parturição feminina na fecundidade marital das famílias mosaico e, apesar disso, significativa participação da parturição masculina (seja

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7 28,2% 38,9% 32,9% Três ou mais filhos Dois filhos Um filho

unilateralmente ou compartilhada). Este fato, provavelmente, está relacionado com as questões legais e afetivas da criação dos filhos que tendem a pender para o lado materno, embora já se perceba a modernização de tais questões através da inclusão dos filhos exclusivos dos maridos nas famílias mosaico. Uma consequência natural deste fato é a grande proporção de famílias cujo marido tem enteado, aproximadamente quatro em cada cinco, e apenas uma em cada cinco família observa-se a esposa com enteado.

Além disso, menos da metade dos casais optaram por ter um filho em comum. E isso pode ser visto como uma questão ambígua para o casal. Pois há muitos pontos a serem levantados na decisão de ter outro filho. A decisão por não ter mais filhos pode ser explicada por uma série de fatos que não podemos testar. Pela parturição pré-marital, pelo fato de marido e esposa se sentirem “velhos” para serem pais de novo, pela impossibilidade de ter mais filhos pelo uso de métodos contraceptivos permanentes, ou, mesmo, pela rejeição imposta pelos filhos. Por outro lado, esse quadro pode ser uma questão de tempo até que o casal consiga alcançar a parturição compartilhada.

FIGURA 1 – Distribuição relativa (%) das famílias mosaico segundo o número de crianças (filhos) residentes, Brasil, 2010

Fonte: Censo Demográfico Brasileiro (2010) – Microdados.

A distribuição relativa das famílias mosaico segundo o número de filhos (Figura 1) nos dá indícios do que havíamos observado anteriormente. Aproximadamente, uma em cada três famílias mosaico tem apenas um filho, que, obviamente, é filho somente da esposa ou somente do marido. Estas famílias, provavelmente, são jovens casais, recém unidos, que ainda podem gerar um filho em comum. Em maior proporção, as famílias com dois filhos mostram que, mesmo configurando-se como um recasamento, parece que o ideal de dois filhos é algo comum

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8 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

0 a 4 anos 5 a 9 anos 10 a 14 anos

filhos somente do marido filhos somente da esposa filhos da esposa e do marido 29,8% 14% 56,2% Ambos os pais

Somente com o pai (i.e. com madrasta)

Somente com a mãe (i.e. com padrasto)

na sociedade brasileira como um todo. E com representativa parcela da população, como esperado, destacam-se as famílias com três ou mais filhos. Estas famílias não são as mais comuns pois são, provavelmente, aquelas que possuem as mais diversas características e combinações em uma família mosaico.

Figura 2 – Distribuição relativa (%) das crianças (filhos) de famílias mosaico segundo o a corresidência com ambos os pais, somente com o pai e somente com a mãe, Brasil, 2010

Fonte: Censo Demográfico Brasileiro (2010) – Microdados.

Maior parte das crianças pertencentes a famílias mosaico reside somente com a mãe, seguida por aqueles que residem com ambos os pais e por fim, como esperado, por aquelas que residem somente com o pai (Figura 2). Isso mostra que, algo em torno de, sete em cada dez crianças de famílias mosaico residem com a madrasta ou com o padrasto. É um número considerável de crianças que vem de uniões anteriores, que se encontram em uma situação complexa de convivência, incluindo meios-irmãos e coirmãos e uma relação distanciada da mãe ou do pai.

Figura 3 – Distribuição etária das crianças (filhos) de famílias mosaico segundo sua filiação, Brasil, 2010

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Por outro lado, podemos perceber um padrão na distribuição etária das crianças segundo sua filiação (figura 3). Em famílias mosaico, crianças mais novas tendem a ser filhos do casal, mas crianças maiores tendem a ser filhos exclusivamente da esposa, uma vez que filhos de pais separados permanecem geralmente com a mãe, como já mostrado anteriormente.

Tratando-se dos filhos mais velhos e filhos mais novos (Tabela 2), constatamos que a participação de ambos revela porcentagens idênticas. Essa semelhança é explicada pela mutualidade das relações de irmandade, isto é, se um indivíduo é irmão de outro, este outro também é irmão desse indivíduo. Em outras palavras, se há um filho mais velho, também haverá um mais novo. Portanto, a igualdade entre as estatísticas não é mera coincidência ou erro de cálculo.

Mesmo assim, outro fato pode chamar à atenção no tocante à proporção de filhos mais novos, de filhos do meio e de filhos mais velhos, cuja soma não totaliza 100%. Na realidade, o que acontece é que existem filhos únicos e crianças que possuem somente irmãos da mesma idade na família, como coirmãos, gêmeos, etc., fazendo com que não entrem em nenhuma dessas categorias descritas, uma vez que o critério usado para estabelece-las foi anos completos.

TABELA 2 – Proporção de crianças (filhos) que moram em famílias mosaico segundo características da ordem de nascimento e filiação, Brasil, 2010

Características %

Filhos mais velhos 32,4

Filhos mais velhos sendo filhos somente da esposa 8,9 Filhos mais velhos sendo filhos somente do marido 3,4 Filhos mais velhos sendo filhos de ambos 20,7

Filhos mais novos 32,4

Filhos mais novos sendo filhos somente da esposa 25,7 Filhos mais novos sendo filhos somente do marido 5,0

Filhos mais novos sendo filhos de ambos 1,1

Filhos do meio 19,0

Filhos do meio sendo filhos somente da esposa 8,9 Filhos do meio sendo filhos somente do marido 2,2

Filhos do meio sendo filhos de ambos 7,8

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Observe que parece haver uma inconsistência das informações quanto à distribuição dos filhos mais velhos (Tabela 2), onde nota-se que há irmãos mais velhos filhos de ambos os cônjuges. Se a família é reconstituída, logicamente, os filhos em comum do casal seriam mais novos, o que nos leva a refletir que as relações conjugais são ainda mais complexas do que se espera. Podemos imaginar que um casal ou um dos cônjuges, que possua filhos mais velhos em comum e filhos mais novos de outras relações, tenha dissolvido sua união inicial, envolvido em outras uniões e, algum tempo depois, reatado a sua primeira união. Ou, podemos imaginar ainda que a existência de filhos mais novos unilateralmente trata-se de fecundidade extramarital durante o casamento.

Por fim, pelas estatísticas apresentadas na Tabela 2, notamos claramente a diversidade das relações de irmandade ao desmembrarmos as relações de parentesco dentro de uma família reconstituída. Ainda que essa diversidade não seja a característica mais comum da população brasileira, há uma presença significativa de meios-irmãos e coirmãos nas famílias brasileiras atualmente.

Como esperado, famílias mosaico são mais numerosas que as famílias nucleares simples, refletindo, sobretudo, no número médio de filhos - 2,1 filhos por família contra 1,7 filhos por família (menores de 14 anos), respectivamente. Ainda assim, ambas as médias representam uma baixa parturição, principalmente quando há a combinação entre duas ou três histórias de fecundidade. Dessa forma, a diferença entre as estimativas, que gira em torno de 0,4 filhos, pode parecer pequena, contudo, considerando os níveis da fecundidade corrente, este valor é expressivo e pode representar o filho em comum que o casal da família mosaico tinha como objetivo ter.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao observar nossas estatísticas, percebemos que a caracterização das famílias mosaico deixa algumas lacunas a serem investigadas quanto à diversidade de parentes nas famílias brasileiras. A principal delas é a lacuna percebida referente à impossibilidade de determinar a ascendência da criança que é exclusivamente filha do marido ou da mulher. Neste caso, quando há mais de uma criança corresidente com essa característica, não se sabe se esses filhos são irmãos biológicos ou meios-irmãos, isto é, se estas crianças vêm de outras famílias mosaico. O efeito da parturição pré-marital (ou pré-união) e do número de filhos corresidentes com os pais sobre a fecundidade marital corrente também demanda mais investigações com dados brasileiros.

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Apesar de ainda restrito, nosso estudo revelou que a sociedade brasileira atual é tradicional em relação ao casamento, ao mesmo tempo em que é moderna em se tratando de comportamento reprodutivo. Isso porque apenas 15%, aproximadamente, das famílias nucleares são do tipo mosaico, apresentando uma média de 2,1 filhos (menores de 14 anos) por família. Nesse sentido, constatamos que apenas 45% dos casais dessas famílias têm filhos em comum e que, cerca de, 39% das famílias mosaico se constituem por 2 filhos (incluindo filhos em comum e exclusivos, que são majoritariamente das esposas), o que representa a escolha por famílias pequenas, mesmo que sejam famílias oriundas de recasamento ou novas uniões com fecundidade pré-marital não nula.

Por fim, concluímos que, no âmbito dos arranjos familiares, o estudo sobre famílias mosaico ganha novas dimensões ao se apontar que o escopo familiar é mais amplo e mais diverso do que se espera, analisando-se apenas a fecundidade da mulher.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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