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12º Encontro da ABCP 19 a 23 de outubro de 2020 Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa (PB)

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12º Encontro da ABCP 19 a 23 de outubro de 2020

Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa (PB)

Área Temática: 17. Teoria Política

“O conceito de revolução passiva nos estudos gramscianos contemporâneos”

Autora: Luciana Aliaga

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Resumo

Propomos neste trabalho uma revisão analítica do conceito de revolução passiva formulado por A. Gramsci nos Quaderni del Carcere. Nosso ponto de partida se baseia nas discussões contemporâneas sobre a excessiva extensão do conceito, presente tanto na obra original de Gramsci como nos estudos atuais, problema reconhecido e debatido pela bibliografia recente. A partir disto, sugerimos uma diferenciação entre os conceitos de revolução passiva e revolução-restauração como parte desta tarefa crítica de definição rigorosa do conceito. Buscamos demonstrar, deste modo, que permanece aberta uma importante agenda de pesquisa, fundamental para que se possa utilizar o conceito de revolução passiva como chave de leitura para diferentes contextos históricos na atualidade.

Palavras-chave: Revolução passiva; Revolução-restauração; Gramsci; Revolução Francesa;

Estado.

Abstract

In this paper we propose an analytical review of the concept of passive revolution formulated by A. Gramsci in Quaderni del Carcere. Our starting point is based on contemporary discussions about the excessive extension of the concept, present both in Gramsci's original work and in current studies, a problem recognized and debated by the recent bibliography. From this, we suggest a differentiation between the concepts of passive revolution and revolution-restoration as part of this critical task of rigorous definition of the concept. We seek to demonstrate, in this way, that an important research agenda remains open, fundamental so that the concept of passive revolution can be used as a key to reading for different historical contexts today.

Keywords: Passive revolution; Revolution-restoration; Gramsci; French Revolution; State. Introdução

Antonio Gramsci formulou o conceito de revolução passiva nos Quaderni del Carcere originalmente para se referir ao processo de constituição e modernização do Estado na Itália no final do século XIX, processo que ficou conhecido como Risorgimento. O autor chamava a atenção para o fato de que a revolução burguesa italiana se diferenciava substancialmente da ocorrida na França, cuja principal característica teria sido a ação jacobina, isto é, o ativismo revolucionário burguês. Este elemento jacobino esteve ausente na Itália, onde o centro dinâmico da modernização não se concentrou nas atividades das classes sociais, mas no protagonismo do Estado. Este fator teria, segundo o autor, importantes consequências para a restrição da democracia e da participação popular ativa na Itália. O autor, contudo, ainda nos

Quaderni, estende o conceito também para a explicação do fascismo italiano e do Fordismo

americano, ambos fenômenos do século XX.

Contemporaneamente, com a proliferação de pesquisas que buscam utilizar o conceito de revolução passiva como chave de interpretação histórica para diferentes realidades e temporalidades, desponta um novo olhar crítico no interior dos estudos gramscianos que aponta para o fato de que Gramsci teria estendido excessivamente o conceito, ameaçando esgarçar seus sentidos e impondo dificuldades para utilizá-lo como “chave de leitura”. De acordo com Callinicos (2010, p. 492-494), o conceito padeceu de “um

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problema crônico de excesso de extensão nos próprios Quaderni del Carcere” uma vez que foi alargado para a compreensão teórica mais abrangente das “transformações que criam as condições políticas da dominação capitalista”. Gramsci, assim, teria estendido o escopo da revolução burguesa do século XIX para o século XX. Esta extensão do conceito nos Quaderni leva Callinicos a uma postura cautelosa, e até mesmo cética em relação às tentativas atuais de estender ainda mais o conceito para a análise de contextos contemporâneos.

Este problema já havia sido observado anteriormente por Felice (1978, p. 194-195), segundo o qual para recondução do fascismo, do transformismo e de outros fenômenos históricos no interior da categoria de revolução passiva foi necessário elevar “o grau de elaboração desta categoria a uma generalização muito maior”. Neste mesmo sentido Roccu (2017, p. 551), a despeito de afirmar que a extensão do conceito é de fato, “consistente com o entendimento de Gramsci da natureza inevitavelmente contraditória do capitalismo”, não pode deixar de reconhecer que houve uma extensão e que ela é problemática na medida em que suscita intrincadas dificuldades de interpretação, as quais ele próprio se dedica a investigar.

Questão intimamente relacionada à extensão do conceito de revolução passiva operada nos Quaderni consiste nos seus diversos usos contemporâneos. De acordo com Thomas (2018, p. 3), pelo menos quatro diferentes entendimentos sobre o significado da revolução passiva podem ser identificados em estudos recentes: 1. Foi pensado para representar uma reformulação do conceito mais estabelecido de “revolução (burguesa) pelo alto”, entendido como um processo no qual as elites políticas existentes instigam e gerenciam períodos de convulsão e transformação social; 2. A revolução passiva foi entendida também como uma “rival ou complemento de outras teorias sociológicas macro-históricas de formação, modernização ou descolonização do Estado”; 3. Visto pelas lentes da tradição italiana do transformismo, foi conceituado como uma “estratégia e técnica política específica da arte de governar” e; 4. Como uma “lente útil para analisar a natureza e a transformação do capitalismo contemporâneo, se entendido como ‘neoliberalismo’ ou em outros termos”. O que se constata a partir destes usos é que a revolução passiva acabou se constituindo como “uma série de conceitos com às vezes apenas uma fraca semelhança familiar”.

Estes problemas indicam que a interpretação e aplicação rigorosa deste conceito para contextos atuais exige cautela e maior aprofundamento crítico sobre os seus diferentes matizes. Diante disto, o objetivo deste trabalho se concentra em contribuir com a análise crítica do conceito de revolução passiva, bem como do conceito correlato de revolução-restauração, ambos formulados nos Quaderni del Carcere.

Como se sabe, a obra do cárcere é uma publicação póstuma, isto é, Gramsci escreveu no cárcere fascista, entre 1929 e 1935, um conjunto de notas em 33 cadernos escolares que

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no final da década de 1940 foram organizados e editados parcialmente sob a direção do Partido Comunista Italiano. No processo de composição dessas notas, contudo, o autor formulou diferentes versões, reescrevendo e reelaborando grande parte delas sem, entretanto, oferecer uma versão final, acabada. Este processo inseriu uma série de dificuldades de interpretação que só puderam ser plenamente conhecidas a partir de 1975, com a publicação completa do material produzido por Gramsci, na edição crítica organizada por Valentino Gerratana (cf. GERRATANA, 2007). Sabe-se hoje que o estudo dos Quaderni exige um método filológico capaz de reconstruir o processo de escrita do autor para que seja possível uma aproximação maior ao sentido rigoroso dos conceitos1.

Diante disto, para conclusão da nossa investigação utilizamos a metodologia da pesquisa filológica, que busca reconstruir a “história” da escrita, buscando identificar os principais interlocutores, fontes teóricas e contexto político e cultural em cada um de seus momentos, procurando compreender o conjunto das determinações teóricas, políticas e culturais da escrita. Uma pesquisa filológica detida, baseada na análise das diferentes notas e temporalidades da produção do cárcere nos conduziu a pelo menos duas constatações importantes com relação ao conceito de revolução passiva e ao conceito correlato de revolução-restauração: 1. O caráter de pesquisa em andamento e; 2. A citação de fonte secundária.

Sobre o caráter de pesquisa em andamento, embora a identificação entre os conceitos de revolução passiva e revolução-restauração seja hoje aceita de forma inequívoca, é importante notar que nos Quaderni ela aparece como uma questão a ser estudada e não como uma formulação acabada. Destarte, apresentamos aqui a hipótese de que estes dois conceitos são identificados na análise gramsciana sobre a Itália, mas eles não podem ser identificados em todos os casos, de modo que não seria correto afirmar uma revolução passiva na França, por exemplo2. Nossa hipótese consiste na proposição de que Gramsci não

desenvolveu o conceito em todas as suas potencialidades e não o delimitou de forma expressa nos Quaderni. Esta tarefa permanece, portanto, em aberto.

1 Sobre este assunto consultar COSPITO, 2019; BARATTA, 2004; GERRATANA, 2007;

FRANCIONI,1984.

2 Encontram-se na bibliografia recente análises gramscianas que identificam na França uma revolução

passiva. Por exemplo, Bianchi (2016, p. 129, grifos do autor) afirma: “a revolução passiva francesa foi um movimento de reação a um processo revolucionário, no qual os trabalhadores haviam assumido um forte ativismo político, e uma restauração da ordem por meio do acordo entre forças políticas da burguesia e da pequena burguesia urbana com os remanescentes do antigo regime. Gramsci sintetizou este processo com a fórmula revolução-restauração”. Do mesmo modo, Kebir (2003, p. 149) ao discutir o conceito de revolução-restauração, afirma “o potencial revolucionário e o potencial restaurador de complexos históricos integrais como o Renascimento, a Reforma protestante, as Revoluções francesas de 1789, 1830 e 1848”, e em seguida afirma que “toda história é revolução e restauração – ou revolução passiva” (p. 150).

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Sobre a citação de fonte secundária, embora as obras de Vincenzo Cuoco (La

rivoluzione napoletana de 1799) e de Edgar Quinet (Les révolutions d’Italie) constituam duas

matrizes fundamentais do conceito de revolução passiva, Gramsci não as leu no original. Segundo Gerratana, provavelmente Gramsci teve acesso ao conceito de Cuoco por meio do prefácio de Benedetto Croce à La rivoluzione napoletana de 1799, onde se encontra uma referência à expressão “revolução passiva” na acepção de Cuoco (Cf. GERRATANA, 2007, p. 2654-2655). Do mesmo modo, Gramsci chega a Quinet por meio do artigo de Daniele Mattalia, Gioberti in Carducci, in La Nuova Italia, 20 de novembro de 1931 (cf. idem).

A dificuldade de acesso às fontes primárias corroborou para que Gramsci se afastasse significativamente da argumentação elaborada por Cuoco e Quinet. De acordo com Di Meo, para Cuoco “a revolução não deveria extrapolar os limites de uma ativa e decisiva democracia liberal”. As mudanças no aparelho de Estado, portanto, deveriam ser guiadas pelo alto, mas, ao mesmo tempo, deveria atender às necessidades profundas do povo (cf. DI MEO, 2014, p. 5-8). Na medida em que a interpretação gramsciana foi mediada por Croce, a revolução passiva perde o elemento original de ligação entre intelectuais e simples e passa a ser entendida meramente como um processo de transformações moleculares pelo alto, desconectadas da participação popular, ou dos seus anseios. Por outro lado, Quinet formula o termo revolução-restauração a partir da análise da historiografia italiana. De acordo com o autor a interpretação das mudanças, inovações ou revoluções teriam sido “descritas por historiadores ou por cronistas sobretudo como como uma tentativa da restauração de uma situação anterior considerada melhor” (DI MEO, 2014, p. 17). O autor, portanto, se referia às formas de interpretação das inovações no presente a partir de experiências conhecidas e valorizadas no passado. Gramsci, contudo, concebe este conceito como uma “dialética histórica”, isto é, como um movimento histórico que relaciona elementos de inovação e de conservação.

Um estudo rigoroso das duas obras mostra, portanto, que a identificação entre elas, se considerados os argumentos dos autores originais, é imprópria. Ainda que se leve em conta que os conceitos de revolução passiva e de revolução-restauração presentes nos Quaderni sejam elaborações novas e originais de Gramsci, é importante insistir no fato de que a identificação entre eles foi proposta como uma questão a investigar e que Gramsci não os identificou em todos os casos e, portanto, tal extensão é inadequada. Diante disto emerge a necessidade de definição e delimitação rigorosa dos conceitos de revolução passiva e de revolução-restauração capaz de trazer a lume as especificidades dos dois conceitos, fundamental para que se possa utilizá-los como chave de leitura para diferentes contextos históricos na atualidade.

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A composição do conceito de revolução passiva nos Quaderni

Embora a identificação entre o conceito de revolução passiva e o conceito de revolução-restauração seja consensual na bibliografia especializada3, a concepção de

revolução-restauração foi ainda pouco estudada e a completa identificação ao conceito de revolução passiva conduz a problemáticas antinomias, como é o caso de conceituar a Revolução francesa ao mesmo tempo como um processo de revolução ativa e de revolução passiva4.

Como se sabe, originalmente o termo “revolução passiva” estava ausente dos primeiros parágrafos dos Quaderni del Carcere e só foi adicionado posteriormente nas margens do primeiro caderno. Isto ocorre pela primeira vez entre fevereiro e março de 1929 no Q. 1, §44, Direzione politica di classe prima e dopo l’andata al governo. Neste parágrafo Gramsci utiliza a fórmula “revolução sem revolução” e só posteriormente acrescenta nas margens: “ou revolução passiva segundo a expressão de V. Cuoco” (Q. 1, §44, p. 415).

Gerratana fornece esta informação em nota de rodapé (Q. 1, §44, p. 41, nota “a”), mas utiliza a expressão “em época posterior”, de modo que não é possível definir quando Gramsci insere esta nota. Na segunda versão deste parágrafo, redigida entre fevereiro de 1934 e fevereiro de 1935 no Q. 19, § 25, p. 2011, a alusão à V. Cuoco está plenamente integrada ao texto.

Ainda no Q.1, § 150, escrito em maio de 1930, Gramsci observa que o nascimento dos Estados modernos na Europa se deu como “reação-superação nacional” da Revolução francesa e do napoleonismo e posteriormente acrescenta nas margens “revolução passiva” (p. 132). A primeira referência expressa no corpo do texto ao conceito de revolução passiva de Cuoco aparece numa nota de redação única, no Q. 4, § 57, p. 504, de novembro de 1930. Ao passo que a associação entre o conceito de revolução passiva de Cuoco e a concepção de revolução-restauração de Quinet aparecerá somente no Q 8, § 25, p. 957, redigido entre janeiro e fevereiro de 1932. Fundamental perceber, contudo, que esta associação aparece como uma questão a investigar. Diz Gramsci: “investigar o que significa e como é justificada

3 O mais significativo exemplo é o Dizionario Gramsciano, publicado na Itália pela Editora Carocci em

2009 (traduzido no Brasil pela Editora Boitempo em 2017), resultado de muitos anos de trabalho de um conjunto de especialistas europeus, norte-americanos e latino-americanos, não traz definição para o verbete “revolução-restauração”. O verbete está presente no Dicionário, mas remete o leitor ao verbete “revolução passiva” (cf. LIGUORI, G.; VOZA, 2009, p. 731).

4 De acordo com Di Meo (2014, p. 4) “a classificação de Cuoco das revoluções modernas continha duas

exemplificações significativas: a Revolução francesa iniciada em 1789 (entre as ativas) e a napolitana (entre as passivas)”. Esta classificação muito provavelmente foi assimilada por Gramsci.

5 Adotamos aqui o padrão internacional de citação de A. Gramsci nos Quaderni del Cárcere na Edição

Crítica organizada por Valentino Gerratana (cf. GRAMSCI, 2007), utilizando a letra “Q” para indica o caderno, seguida do parágrafo e da página de referência.

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em Quinet a fórmula de equivalência da revolução-restauração na história italiana” (Q. 8, § 25, p. 957).

A partir de fevereiro de 1932, Gramsci passa a identificar revolução passiva e revolução-restauração sempre que trata especificamente do Estado Italiano ou dos Estados europeus que se modernizaram após a Revolução francesa6. Após fevereiro de 1932, a

reflexão sobre a revolução passiva se adensa. Gramsci desenvolve o tema iniciado ainda em 1929 no referido Q. 1, §44, onde afirma a importância dos fatores internacionais para análise do Risorgimento (cf. Q. 1, §44, p. 54) e no Q. 1, § 150, p. 132, nota sobre o nascimento dos Estados modernos na Europa como “reação-superação nacional” da Revolução francesa e do napoleonismo.

Destarte, a revolução passiva na Itália será analisada a partir da articulação entre as condições nacionais e a situação internacional europeia, revelando um processo de reação e impulsão das transformações políticas e sociais provocadas pela Revolução Francesa. O conceito de revolução passiva vai sendo construído ao longo da redação dos Quaderni. Enquanto a revolução passiva aparece já no Q. 4, § 57, em 1930, a concepção de revolução-restauração de Quinet é aproximada da revolução passiva somente no Q 8, § 25, em 1932. A partir de então, Gramsci consolida a percepção da importância do período da Restauração na França para a formulação do conceito de revolução passiva. O período da Restauração passa a ser o mais significativo na medida em que os Estados que se modernizam após a Revolução francesa foram movidos pelas correntes ideológicas vindas da França e, ao mesmo tempo, são reações a elas (cf. Q. 10I, § 9, p. 1226; Q. 10II, § 41.XIV, p. 1324 e Q10II, § 61, p. 1361).

A Revolução francesa nos Quaderni é definida no longo período de 1789 a 1870. Seu primeiro período é definido como modelo exemplar de revolução ativa, jacobina, propulsora por “reação” das revoluções passivas na Europa. No longo período que se encerra em 1870 se observam momentos de restauração como reação à Revolução Francesa, que pode então ser considerada um caso antitético ao de revolução passiva, ainda que possua momentos de restauração.

Revolução passiva e revolução-restauração: a necessária distinção

Gramsci claramente sugere a identificação entre revolução passiva e revolução-restauração – isto fica claro na aproximação nos Quaderni entre o historicismo de Croce, a tradição moderada do Risorgimento e o pensamento reacionário da restauração francesa (Q. 10II, §41, XIV, p. 1325-1326). O autor, contudo, não afirma uma revolução passiva na França.

6 Ver Q. 8, § 36; Q. 8, §39, texto A (retomado junto com o Q. 8 § 25 no Q. 10II, § 41.XIV); Q. 8, § 51;

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O contexto da identificação entre revolução passiva e revolução-restauração nos Quaderni é o da história italiana e dos Estados europeus que se modernizaram após a Revolução francesa, de modo que é possível concluir que os dois conceitos estão profundamente articulados, mas não se equivalem para todos os casos. O caso francês, neste sentido, pode ser caracterizado como a concretização histórica da dialética revolução-restauração, sem ser também um caso de revolução passiva.

Desta maneira, podemos inferir que a dialética revolução-restauração se identifica com a revolução passiva para o caso da Itália, mas não para o caso da França. Se o progresso histórico é, como afirma Gramsci, “dialética de conservação e inovação”, a categoria de revolução-restauração assume maior generalidade e abrangência que o conceito de revolução passiva. Destarte, propomos aqui interpretar a revolução-restauração como um movimento histórico, nas palavras de Gramsci, uma dialética, da qual, o conceito de revolução passiva seria um dos seus operadores, isto é, o caso particular é que possibilita sua efetivação num contexto específico, ou, pode-se dizer, a forma histórica particular de realização da dialética revolução-restauração.

Se, ao contrário, identificarmos totalmente e para todos os casos a revolução passiva à revolução-restauração, estaremos afirmando uma antinomia: na França desenvolveu-se um processo de revolução passiva e de revolução ativa. Com isto, ao mesmo tempo, estaremos abrindo a possibilidade de afirmar que todos os processos revolucionários na história podem ser caracterizados como revoluções passivas, o que lança o conceito numa profunda indeterminação. Isto implicaria numa excessiva extensão do conceito, que de tão alargado se esgarça, o sentido se rompe e não é mais capaz de explicar.

REFERÊNCIAS

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cadernos: o pensamento dialógico de Antonio Gramsci. Rio de Janeiro: DP&A, 2004.

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Filosofia Italiana, Outubro, 2014.

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