Trabalho, Tecnologia e Inovação
Aula 10:
As novas formas da in(ex)clusão e as
relações de trabalho no cotidiano das empresas
Nadya Araujo Guimarães
Outubro, 2006
Roteiro
z
A estrutura das desigualdades: o peso da
combinação perversa de sexo e cor
–
Onde chegam ? Os guetos são rompidos?
–
Quanto ganham ? O custo de ser mulher e/ou
negro(a)
–
Como circulam ? Segmentação dos percursos
z
Novas formas de controle e assédio moral
A estrutura das desigualdades: o peso
da combinação perversa de sexo e cor
1.
Acesso
2.
Remuneração
1
1
-
-
Desigualdades no acesso ao
Desigualdades no acesso ao
mercado de trabalho: sexo e cor
mercado de trabalho: sexo e cor
Quando as firmas se
reestruturam, o que muda
nos padrões de
desigualdade de sexo e cor
no mercado de trabalho?
Fato estilizado 1: O caso
limite do ABC paulista nos
anos 1990
ABC: um exemplo limite de radical
mudança na estrutura do emprego.
Evolução do Emprego Formal nos Setores de Comércio, Serviços e Ind.T ransformação ABC, 1989 a 2000 (em %) 0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0 89 90 91 92 93 94 95 96 97 98 99 2000
Destacando impactos:
1. Novos padrões de oferta de FT
Taxa de Participação - Grande ABC
0,0 10,0 20,0 30,0 40,0 50,0 60,0 70,0 80,0 90,0 Homens Mulheres Homens Mulheres Negros Brancos 1988-89 1998-99
Destacando impactos:
2. Mas, crescimento do desemprego
com riscos desiguais
Destacando impactos
3. Eleva-se significativamente o tempo
médio de procura de trabalho
Tempo Médio de Procura de Trabalho - Grande ABC (em semanas)
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 Homens Mulheres Homens Mulheres N egros Brancos 1988-89 1998-99
Destacando impactos
4. Assim como o tempo médio de
permanência no desemprego, também
marcadamente desigual
T e m p o M é d io d e D e s e m p re g o - G ra n d e A B C (e m m e se s ) 0 5 1 0 1 5 2 0 2 5 3 0 H om en s M u lh eres H om en s M u lh eres Negros Brancos 1 9 8 8 -8 9 1 9 9 8 -9 9Destacando impactos:
5. Sinais de mudança nos padrões de
mixidade?
Razão entre a Participação de Homens e Mulheres por Setores Econômicos na Região do ABC (1989 e 2000)
4,3 1,5 1,8 1,2 15,3 3,0 2,3 3,9 1,4 1,5 0,8 12,9 3,3 2,0 0,0 2,0 4,0 6,0 8,0 10,0 12,0 14,0 16,0 18,0 Ind.Transformacao Serviços Comércio Administração Pública Construção Civil Setor Primário Total 1989 2000
2
2
-
-
Desigualdades nos padrões de
Desigualdades nos padrões de
remunera
remunera
ç
ç
ão: sexo, cor e posi
ão: sexo, cor e posi
ç
ç
ão
ão
social.
social.
Fato 2:
Fato 2:
O preç
O pre
ço de ser
o de ser
mulher ou negro e sua
mulher ou negro e sua
varia
varia
ç
ç
ão entre os mais
ão entre os mais
ricos e os mais pobres.
ricos e os mais pobres.
Brasil, PNAD, 1999
Brasil, PNAD, 1999
O preço de não ser homem ...
... ou branco(a) no Brasil do fim do século
XX (cf. PNAD, 1999)
Variáveis Homem Homens negros Mulheres brancas Mulheres negras Branco(a) Média (b) Diferencial(b/a) Média (c) Diferencial (c/a) Média(d) Diferencial (d/a) Salário 818 393 48% 678 83% 335 41%
Os diferenciais de salários e seus
componentes: mercado? discriminação?
Tabela 5: Decomposição dos efeitos sobre os salários por cor e sexo para o total da PEA
(1999)
Item
Homens negros Mulheres brancas Mulheres negras
R$ % R$ % R$ %
Qualificação
247 30%
-160 -20% 120 15%
Inserção formal
11 1%
73 9% 78 10%
Inserção regional
44 5%
12 1% 58 7%
Inserção ocupacional
12 1%
1 0% 8 1%
Discriminação
59 7%
189 23% 160 20%
Salário de referência (homens brancos): R$818; dados estimados a partir do salário horário padronizado
para um turno de 160 horas por mês.
Fonte: Tabulação própria a partir dos micro-dados da PNAD de 1999, Ibge.
Componentes da desigualdades
por setores – os homens negros
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
PEA
Alimentos
Bens de
Capital
Couro e
Calçados
Telemática Vestuário
Qualificação
Inserção formal
Inserção regional
Componentes das desigualdades
– mulheres brancas
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
PEA
Alimentos
Bens de
Capital
Couro e
Calçados
Telemática Vestuário
Qualificação
Inserção formal
Inserção regional
Componentes das desigualdades
– mulheres negras
0%
5%
10%
15%
20%
25%
30%
PEA
Alimentos
Bens de
Capital
Couro e
Calçados
Telemática Vestuário
Qualificação
Inserção formal
Inserção regional
Inserção ocupacional
discriminação
O custo de ser mulher e/ou negro.
O custo de ser mulher e/ou negro. A conhecida
desigualdade em uma nova forma: sua expressão
ao
ao
longo da distribui
longo da distribui
ç
ç
ão de rendimentos
ão de rendimentos
0.0% 0.5% 1.0% 1.5% 2.0% 2.5% 1 9 17 25 33 41 49 57 65 73 81 89 97 C entésim o da distribuição % da p o p u laçã o do gr up o Homens brancos Homens negros Mulheres brancas Mulheres negras
O custo da discrimina
O custo da discrimina
ç
ç
ão de sexo e cor
ão de sexo e cor
se
se
torna
torna
maior
maior
quanto mais se galga a hierarquia
quanto mais se galga a hierarquia
de renda
de renda
0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40% 45% 50% 1 11 21 31 41 51 61 71 81 91 Centésimos da distribuição D ife re nc ia l pa ra o sa lá ri o dos hom en s b ran cos Hom ens negros
M ulheres brancas M ulheres negras
3 - Desigualdades nos percursos no
mercado de trabalho
Fato estilizado 3:
Trajetórias de homens
e mulheres (negros e
brancos) no mercado
da Grande São Paulo
(1994-2001)
Anos 90: dobra o risco do
desemprego em SP
Evolução da Taxa de Desem prego
0,0
5,0
10,0
15,0
20,0
25,0
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
Total
Aberto
Oculto
O
... E dobra também o tempo de
procura de trabalho em SP
5
15
25
35
45
55
65
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001
Este contexto torna incertas as
trajetórias no mercado
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
ab
r/9
7
out
/9
7
ab
r/9
8
out
/9
8
ab
r/9
9
out
/9
9
ab
r/0
0
ou
t/0
0
ab
r/0
1
Ignorado Empregadores Desempregados/Inativos Inativos Desempregados Autônomos Domésticos Ass sem carteiraMas os tipos de trajetória são
desiguais segundo
desiguais segundo
sexo e cor
sexo e cor.
4. Desigualdade nos percursos no
trabalho tem também uma expressão
espacial em São Paulo
Fato estilizado 4:
Trajetórias no mercado por
tipo do distrito de residência
em SP (rico, de classe
A desigualdade social se expressa
espacialmente na metrópole
(PED,2000)
Os instabilidade como norma nos
percursos dos que vivem nos distritos
pobres
Distritos pobres - Total (17104 casos)
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% abr/9 7 jun/97ago/97out/9 7 dez/9 7 fev/9 8 abr/9 8 jun/98ago/9 8 out/9 8 dez/9 8 fev/9 9 abr/9 9 jun/99ago/99out/9 9 dez/9 9 fev/0 0 abr/0 0 jun/00ago/00out/0 0 dez/0 0 fev/0 1 abr/0 1 Ignorado Empregadores Desempregados/Inativos Inativos Desempregados Autônomos Domésticos Ass sem carteira
II. Trabalho baseado na emoção,
controle e assédio
Fato estilizado 5:
aspectos do trabalho
das caixas de
supermercado
Um trabalho que apela para a boa
aparência
z
Coloque ao menos um batom pra ficar menos
pálida... Então as meninas passam sempre. Assim o
batom chega a ser mesmo uma exigência. A menina
chega sem batom e eu digo: ‘Olha o batom, você tá
muito pálida hoje’ então ela sobe e vai passar. Os
homens, a barba bem feita e os cabelos curtos.
Um trabalho que apela para a
sexualidade
z Há também uma dimensão sexual pois as operadoras de
caixa também devem realizar o trabalho sexual (Adkins, 1992), isto é um trabalho que apela para a sexualidade da trabalhadora, por exemplo responder a insinuações sexuais, cantadas, uniforme sexy. No trabalho sexual o corpo ou uma parte do corpo da trabalhadora é
instrumentalizado na produção do serviço. Essa dimensão sexual está presente no trabalho das operadoras de caixa de supermercados, pois para ter acesso e permanecer no emprego, elas devem ser atrizes sexualizadas e exibir uma aparência “atraente” ou “agradável”. Elas devem cultivar uma certa aparência : elas não podem parecer cansadas, nem usar bijuterias “excêntricas”, a maquiagem deve ser discreta, os
cabelos devem ser presos, etc. A operadora de caixa não tem escolha quanto a aceitação dos padrões associados à aparência. Devemos ressaltar que a trabalhadora é repreendida caso a aparência não esteja conforme aos padrões estabelecidos pela gerência do supermercado. Desta maneira podemos dizer que uma parte do trabalho das caixas é de se manter "em forma".
Um trabalho emotivo: as “regras de
sentimentos”
z O trabalho emotivo é a gestão de suas próprias
emoções e sentimentos a fim de se criar uma aparência facial e corporal que é observada publicamente (Hochschild, 1983). Três características principais estão presentes no trabalho emotivo: (1) ele exige um contato face-à-face ou, pelo menos, um contato verbal com o público; (2) a atitude e a expressão da emoção do/a trabalhador/a produzem um estado emocional (por exemplo: confiança, segurança, medo, etc) no cliente; (3) a dimensão emotiva fazendo parte das tarefas que compõem o trabalho, pode ser
controlado pelo empregador, por exemplo, através da formação e da supervisão.
z O trabalho emotivo é colocado em prática através
das regras de sentimentos (feeling rules) – a emoção exigida e apropriada para cada interação, em cada papel a ser desempenhado. Por exemplo, muitas vezes no trabalho deve-se sorrir mesmo se não se tem vontade de sorrir. O sorriso faz parte do trabalho das operadoras de caixa. Essa gestão das emoções exige uma coordenação do Eu e de suas próprias emoções para que o trabalho pareça ser realizado sem esforços.
z O trabalho emotivo não comporta apenas a gestão
de suas próprias emoções, comporta também a gestão das emoções do outro, a fim de mudar seu estado emotivo como mostra (Thoits, 1996).
Angelo Soares
z
Às vezes o cliente chega muitas
vezes de mau humor, mas da
maneira como a gente trata ele, ele
muda, e se torna então um bom
cliente
z
Ela atende bem os clientes, ela
procura uma razão para estar de
bom humor.
(Marta, operadora de caixa, 20 anos, 9
meses de experiência).
z
A gente deve ser uma pessoa que
sorri, sem mostrar o que você
ressente (...) fazer as coisas com
atenção. Eu acredito que tudo isso
são tarefas da caixa.
(Marcia, operadora de caixa, 20 anos,
1 ano de experiência).
... E um trabalho também sujeito ao
sexismo e ao racismo
z
Às vezes, eu me sinto... eu me olho e me sinto
um pouco engraçado (...) Eu me sinto um
pouco constrangido em trabalhar como caixa
(...) Uma vez um cliente passou no meu
check-out e me perguntou “por que não é uma
mulher?” (...). Foi um pouco constrangedor
porque ele me humilhou. Eu fiquei muito puto
porque ele me disse assim “por que não
colocam mulheres em lugar de homens, as
mulheres são muito melhores”
(João, operador de caixa, 23 anos, 2 meses de
experiência).
z
Uma caixa modelo seria uma pessoa que não
tivesse problemas familiares, isto é, ela não
tem marido, ela não tem crianças (...) uma
pessoa que tem uma boa postura, paciente,
observadora, prudente, atenciosa, uma boa
presença, agradável, uma pessoa mais ou
menos assim e que não seja difícil de encontrar
(Pedro, gerente, 54 anos, 4 anos de experiência).
z A cliente me disse: “Tinha que ser uma preta pra proibir isso”. Eu não disse nada, mas a minha vontade era de dizer:”Não senhora, eu sou negra mas eu sei trabalhar muito bem, eu segui as normas da empresa, mas eu deixei passar, a gente precisa do trabalho
(Sebastiana, operadora de caixa, 25 anos, 1 ano e meio de experiência).
Um outro fato importante é a presença marcante de nordestinas como operadoras de caixa.
z