Procura pela Defesa do Consumidor
aumenta 30%
PUBLICADO NA EDIÇÃO IMPRESSA | SEGUNDA-FEIRA, 11 DE MARÇO DE 2013 | POR ALBERTO PITA~
ENTREVISTA A GRAÇA MONIZ
Na semana em que é assinalado o Dia do Consumidor, a directora do Serviço de Defesa do Consumidor na Região, Graça Moniz, revela que são cada vez mais os madeirenses que procuram ajuda. O ano passado houve um aumento de 30% e o arranque de 2013 também está a apresentar uma percentagem elevada. Em entrevista ao Jornal da Madeira, Graça Moniz explica os motivos para tantos pedidos de ajuda, dá conselhos sobre o que fazer nas situações complicadas, garante que os consumidores estão cada vez mais exigentes e alerta que, num contexto de crise, se torna ainda mais imperioso reforçar a protecção do consumidor.
JORNAL da MADEIRA – Na próxima sexta-feira, assinala-se o Dia do Consumidor. Há motivos para festejo ou os consumidores sentem que pouco podem reclamar, dado o contexto actual?
GRAÇA MONIZ – A importância do Dia do Consumidor, independentemente da situação que o País atravesse, não pode, de forma alguma, ser descurada. Pelo contrário, em momentos económico-sociais mais difíceis, verifica-se que há sempre quem tente tirar proveito da situação, explorando as fragilidades do consumidor, que, na relação de consumo, constitui a parte tendencialmente mais fraca, pelo que, no contexto actual, torna-se ainda mais imperioso reforçar a protecção do consumidor, alertando-o, por um lado, para os potenciais riscos que corre e, por outro, para a existência de direitos constitucionalmente consagrados e de organismos que o protegem. Assim, mais do que nunca, faz sentido comemorar este dia, pois festejar o Dia do Consumidor é festejar também os seus direitos, sendo que um deles é o direito de reclamar.
Aliás, as actuais restrições que todos atravessamos não inibem absolutamente em nada o direito de reclamação dos consumidores junto das instâncias competentes, como é o caso na Região o Serviço de Defesa do Consumidor (SDM), serviço integrado no Instituto de Administração da Saúde e Assuntos Sociais, IP-RAM da Secretaria Regional dos Assuntos Sociais.
JM – Recentemente foi noticiado que a DECO está a promover um leilão de electricidade, com vista a negociar preços mais atractivos para quem adira à iniciativa. Há já cerca de 300.000 adesões no país. Admite que o Serviço de Defesa do Consumidor possa desenvolver na Madeira iniciativas deste género para outras áreas?
GM – O Serviço de Defesa do Consumidor tem todo o interesse em promover iniciativas que vão ao encontro das necessidades do consumidor, mas há que ter presente o facto de a DECO e o SDC serem organismos com natureza e atribuições distintas.
A DECO é uma associação de consumidores, o que pressupõe necessariamente que os consumidores tenham que pagar as respectivas quotas para poderem beneficiar da intervenção daquela associação. O SDC, ao invés, é um organismo de natureza pública, integrado no Instituto de Administração da Saúde e Assuntos Sociais, da Secretaria Regional dos Assuntos Sociais. É um serviço gratuito, cujas atribuições, embora maioritariamente semelhantes às da DECO (informar os consumidores, emitir alertas, por exemplo…) apresentam algumas diferenças, já que o SDC, ao promover a mediação de conflitos de consumo, tem obrigatoriamente de ser imparcial, não podendo, nomeadamente, preferir uma empresa em detrimento da outra. Esta é a razão pela qual não nos é possível ter o tipo de intervenção que a DECO está a promover, não cabendo a uma entidade pública, com as competências do SDC interferir nos mecanismos de mercado, na formação de preços e na concorrência.
JM – Nos últimos dois anos, quantos consumidores madeirenses recorreram aos vossos serviços e por que motivos?
GM – No ano de 2011 recorreram ao SDC 4.614 consumidores e no ano de 2012 o número foi de 5.910, o que se traduz num aumento de cerca de 30%. Aliás, os números de 2013 já confirmam a mesma tendência de aumento. Os consumidores recorrem ao SDC com vista a obterem esclarecimentos ou apresentarem reclamações sobre as mais variadas áreas que o direito do consumo abrange, nomeadamente, garantias de bens móveis e imóveis, comunicações electrónicas (serviços de telefone móvel, telefone fixo, internet e TV por cabo), seguros, arrendamento, serviços públicos essenciais, condomínio, etc.).
JM – Como está organizado o serviço para que possa responder a estas necessidades?
GM – O SDC, para além de estar representado na Loja do Cidadão (no balcão n.º 14), cujo horário, por ser alargado (das 8h30 às 19h30), possibilita um acesso privilegiado à informação e ao direito de reclamar por parte do consumidor, é composto por várias unidades técnicas, cada uma delas com competências específicas, o que permite um atendimento e tratamento personalizados dos pedidos de informação e das reclamações dos consumidores. O nosso serviço privilegia, igualmente, a mediação dos conflitos de consumo, com vista à respectiva resolução extrajudicial, que se caracteriza, no essencial, pela presença no serviço das partes (consumidor e operador económico) e pela intervenção de um técnico, habilitado com o diploma de mediador de conflitos, que age, de modo imparcial, na veste de facilitador da comunicação entre as partes.
JM – Face à procura que tem sido registada, sente que o Serviço precisa de mais meios? Quais?
GM – O SDC tem registos de um acréscimo significativo de pedidos de informação e de reclamações, pelo que a necessidade mais premente regista-se ao nível dos recursos humanos. Tal potenciaria uma resposta mais célere e, consequentemente, mais eficaz aos pedidos dos consumidores. Todavia, temos de cooperar, com o maior esforço possível, aliado à qualidade e empenho de todos os colaboradores deste serviço e compreender as actuais restrições e dificuldades da administração pública, em geral, nesta conjuntura.
GM – Verifica-se que os consumidores, e os números de pedidos de informação/reclamações apontam nesse sentido, estão mais cientes da importância que a figura do consumidor assume no mercado e na sociedade e, reconhecendo essa importância, procuram, cada vez mais, informação sobre os seus direitos. É só, nesse aspecto, que poderemos afirmar que os consumidores estão mais exigentes, circunstância que nos deixa, enquanto serviço que visa a promoção dos direitos dos consumidores, muito satisfeitos.
JM – Nota que continua a haver um consumo excessivo que leva ao sobreendividamento das famílias ou os casos que existem decorrem de outros factores, como o desemprego ou o divórcio?
GM – É público e sabido que a actual conjuntura tem trazido um acréscimo de situações de desemprego e de redução de rendimentos, e essa circunstância traz responsabilidades acrescidas ao serviço, e daí a nossa preocupação em procurarmos prestar ajuda, apoio, aconselhamento e o melhor encaminhamento em cada um dos casos.
JM – Que procedimentos devem adoptar os consumidores se forem enganados, como aconteceu com o caso da carne de cavalo?
GM – Sempre que os consumidores suspeitem que estão, de alguma forma, a ser vítimas de comportamentos menos correctos e escrupulosos dos agentes económicos, devem reclamar junto das entidades competentes, onde o SDC se inclui. Se entendermos que a reclamação não se enquadra nas atribuições deste serviço (nomeadamente, por estar em causa um crime económico) encaminharemos a reclamação/consumidor para o organismo competente, neste caso concreto, à IRAE. Se se tratar de infracção mais grave, encaminharemos para as entidades policiais ou para o próprio Ministério Público.
JM – As compras online são cada vez mais comuns. Quais os cuidados que as pessoas devem ter?
GM – Aconselhamos alguma prudência em qualquer compra celebrada à distância, onde se incluem as realizadas através da Internet. O comércio electrónico constitui, na
verdade, uma modalidade cada vez mais comum, de compra e venda à distância, através da qual se adquirem os mais variados produtos ou se contratam serviços (como uma passagem de avião, a reserva de um quarto de hotel, o aluguer de um automóvel e o acesso a uma base de dados.
Os conselhos que normalmente o SDC deixa aos consumidores são os seguintes: Antes de encomendar um produto é fundamental saber se a página é segura, na medida em que são, normalmente, transmitidos dados pessoais e, em muitos casos, bancários. Uma das dicas é verificar se na página aparece o símbolo de um cadeado e se a sigla “URL” tem a indicação https:// em vez de http://.
Conhecer a identificação completa da empresa com que se pretende celebrar o contrato (por exemplo, endereço electrónico, a morada, o número de telefone e de fax, o número de contribuinte e o número da matrícula na Conservatória do Registo Comercial) na medida em que constituem elementos fundamentais, no caso de surgirem problemas e de ser necessário apresentar uma reclamação ou pretender desistir do contrato nos prazos previstos na lei.
A designação .pt nem sempre coincide com o país onde a empresa fornecedora está estabelecida, no caso, Portugal. Verifique o domicílio do fornecedor para não ser confrontado com custos não previstos. Se as compras forem efectuadas fora da União Europeia, terá de suportar o pagamento dos encargos alfandegários o que, a acrescer aos portes de envio, podem alterar muito o preço do bem.
Neste tipo de contratos, em que o consumidor não dispõe de contacto directo com o bem que compra, é essencial que a informação sobre o produto seja o mais completa possível.
Estar atento à indicação do preço, a qual deve corresponder ao preço final do produto, depois de aplicados os impostos e taxas ou os portes de correio.
O consumidor dispõe de um período de reflexão de 14 dias, se a empresa vendedora pertencer à União Europeia. Caso o vendedor não pertença à UE, exija informação concreta sobre a existência do período de reflexão e sobre a forma de efectivar a desistência.
Antes de fornecer dados bancários, informe-se se o vendedor tem um certificado de segurança que proteja a informação transmitida, ou seja, que a codifique e não permita o acesso de outras entidades.
Em alguns contratos são solicitados vários dados pessoais ao comprador. Na União Europeia existe legislação sobre a recolha, tratamento e utilização de dados pessoais, mas todo o cuidado é pouco quando se navega por páginas exteriores ao espaço comunitário, já que os seus dados podem ser utilizados para fins diversos.
Recordar mensagem de John Kennedy
JM – Que mensagem quer deixar por ocasião do Dia do Consumidor?
GM – Achamos que nunca é de mais repetir uma mensagem deixada, pela primeira vez, no dia 15 de Março de 1962, por John Kennedy, que eternizou aquele dia, tornando-o oficialmente, a partir daquela data, no Dia Mundial do Consumidor. "Consumidores somos todos nós" foi a mensagem proferida por John Kennedy, que, embora simples, se tornou o marco fundamental do nascimento dos chamados direitos dos consumidores e cujos ecos ainda se fazem ouvir hoje, em todo o mundo. Prova disso é continuarmos a comemorar, volvidos 51 anos, este dia, que é de todos e de cada um de nós: Consumidores. Mensagens que têm uma força e intensidade como esta, possuem ainda o mérito e a particularidade de estimular aperfeiçoamentos e actualizações legislativas. É isso a que se tem assistido na actual sociedade e que se vai com certeza continuar a assistir.