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texto Regina Guimarães encenação e cenografia Igor Gandra marionetas Maria Jorge Vilaverde Júlio Alves desenho de luz Rui Maia

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Academic year: 2021

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Texto

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texto

Regina Guimarães

encenação e cenografia

Igor Gandra

marionetas

Maria Jorge Vilaverde

Júlio Alves

desenho de luz

Rui Maia

interpretação

Carla Veloso

Igor Gandra

produção

Teatro de Ferro

Teatro Carlos Alberto

20 ‑30 Novembro 2008

Estreia Absoluta

ter ‑sex 15:00+21:30 sáb 21:30 dom 16:00

dur. aprox. [50’]

classif. etária M/12 anos

Ficha Técnica Teatro de Ferro direcção de montagem Virgínia Moreira vídeo, figurinos e adereços TdF oficina de construção Gil Rovisco, Virgínia Moreira

fotografia de cena Susana Neves Ficha Técnica TNSJ

coordenação de produção Maria João Teixeira assistência de produção Eunice Basto direcção de palco (adjunto) Emanuel Pina direcção de cena Cátia Esteves, Ricardo Silva maquinaria de cena Filipe Silva, António Quaresma, Carlos Barbosa, Paulo Ferreira

luz João Coelho de Almeida, Abílio Vinhas, Joaquim Madaíl

som Miguel Ângelo Silva, João Oliveira electricistas de cena Júlio Cunha, Paulo Rodrigues

apoios TNSJ

apoios à divulgação

agradecimento TNSJ Polícia de Segurança Pública apoios Teatro de Ferro

apoio à criação

edição Centro de Edições do TNSJ coordenação Pedro Sobrado design gráfico João Faria, João Guedes fotografia João Tuna

impressão Aprova AG Teatro Nacional São João Praça da Batalha 4000 ‑102 Porto T 22 340 19 00 F 22 208 83 03 Teatro Carlos Alberto Rua das Oliveiras, 43 4050 ‑449 Porto T 22 340 19 00 F 22 339 50 69 Mosteiro de São Bento da Vitória Rua de São Bento da Vitória 4050 ‑543 Porto T 22 340 19 00 F 22 339 30 39 www.tnsj.pt geral@tnsj.pt Teatro de Ferro Rua de França, 8 4400 ‑174 Vila Nova de Gaia T 22 370 00 11 TM 96 256 96 56 www.teatrodeferro.com geral@teatrodeferro.com Não é permitido filmar, gravar ou fotografar durante o espectáculo. O uso de telemóveis, pagers ou relógios com sinal sonoro é incómodo, tanto para os intérpretes como para os espectadores.

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Compreendeu que a tarefa de modelar a

matéria incoerente e vertiginosa de que

se compõem os sonhos é a mais árdua a

que se pode entregar um homem, embora

penetre todos os enigmas da ordem superior

e da inferior: muito mais árdua que tecer

uma corda de areia ou que cunhar o vento

sem cara. Compreendeu que era inevitável

um fracasso inicial. Jurou esquecer a

enorme alucinação que o desencaminhara

ao princípio e procurou outro método de

trabalho. Antes de experimentá ‑lo, consagrou

um mês a recuperar as forças que lhe gastara

o delírio. Abandonou toda a premeditação de

sonhar, e quase a seguir foi capaz de dormir

um razoável bocado do dia. As raras vezes

que sonhou durante esse período, não ligou

aos sonhos. Para retomar a tarefa, esperou

que o disco da lua ficasse perfeito. Depois, à

tarde, purificou ‑se nas águas do rio, adorou

os deuses planetários, pronunciou as sílabas

lícitas de um nome poderoso e adormeceu.

Quase imediatamente, sonhou com um

coração a bater. •

Jorge Luis Borges – “As Ruínas Circulares”. Trad. José Colaço Barreiros.

In Obras Completas: I: 1923 ‑1949. Lisboa: Teorema, 1998. p. 469 ‑470.

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Daydream é uma incursão num território híbrido. Este

espectáculo, que teve como ponto de partida a leitura do conto “As Ruínas Circulares”, de Jorge Luis Borges, foi construído sobre uma ideia de fragmentos de ilusão, uma ilusão convencionada, reinventada a cada momento. Lampejos de lucidez na vigília ou um cabecear sonolento em direcção ao onírico – os dois caminhos parecem cruzar ‑se de tempos a tempos.

Entre o extraordinário conto de partida, as ideias e imagens que precocemente nos fascinaram e o processo de criação do espectáculo, foram vários os avanços e recuos, algumas as direcções tomadas e abandonadas, caminhámos em círculos, corremos em frente e fizemos marcha ‑atrás. O espectáculo que aqui se apresenta é também o registo destes percursos, como tatuagens num corpo em transformação. Indícios, vestígios de uma presença anterior.

Só poderíamos fazê ‑lo através de uma prática que concretizasse as questões sobre as quais nos temos debruçado e que continuamos a desenvolver – a tensão entre actor/manipulador e objecto manipulado. O fluxo entre as propriedades cinéticas e poéticas nos materiais explorados. A transformação de objectos em personagens, a força transformadora da surpresa e o seu confronto com o expectável. A exploração do dispositivo cénico enquanto personagem marionetizada.

O que fazer com o espaço entre manipulador e forma animada, e aqueloutro entre esta e o espectador?

Daydream foi gerado sob a ideia do outro enquanto

suspeita e suposição, do mesmo enquanto incerteza; sobre a dificuldade igualmente grande em nos associarmos e em nos dissociarmos. A dança sugere ‑nos uma metáfora aglutinadora desta problemática igualmente circular e dialéctica. É nesta espécie de dobragem de um sujeito suposto ser que se situa a especificidade da contracena (ou do que resta dela).

As pequenas mortes e o despertar. A marioneta e o sonho, ou o habitante do sonho, possuem ambos uma característica incomum: são capazes de, dentro de uma representação, morrer de forma muito mais verdadeira do que qualquer outro actor. O sonho e o espectáculo podem ter como certo apenas o seu fim. Não é necessariamente um fenómeno triste. É, por vezes, reconfortante.

Concebemos (sonhamos) o título um pouco para além das suas traduções habituais em língua portuguesa (devaneio, alucinação, sonhar acordado). Daydream surge enquanto constructo e derivado do processo. Daydream reflecte, de algum modo, o regresso diário à sala de ensaios, ao ateliê, ao ficheiro informático do projecto, ao palco, ao público – a possibilidade improvável de retomar (retrabalhar) o sonho de ontem. Um sonho diurno, um sonho diário. •

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Daydream

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Apêndice 1

Construir um espectáculo, interpretar um espectáculo e assistir a um espectáculo. Estas três acções têm em comum um gesto performativo que se executa em privado. O construtor ‑encenador gesticula para si mesmo, receando não ser escutado pelos outros; o intérprete ‑tradutor desenvolve uma língua gestual desconhecida de todos, da qual ele é o único aprendiz; o espectador ‑espectador traz consigo uma quantidade de coisas que, um pouco como a figura do sem ‑abrigo que transporta tudo num carrinho de supermercado, estão ali só para o caso de serem necessárias.

Apêndice 2

Removido.

Apêndice 3

Os nomes de código de algumas cenas: Strip, Mochila 1, Mochila 2 e Mochila 2b aka Coelho Barroco, Tripé X, Hipnomanipulador, Malhão Apocalíptico, Anjos Caídos/Pequenas Mortes, Sweat Shop, Agasalho ‑te + Marioneta, A Dança + Entre a Passadeira VIP e a Necessidade Histórica, A Anomalia. Tal como o Apêndice 2, algumas destas cenas poderão já ter sido removidas.

A questão que domina “As Ruínas Circulares”, conto de Jorge Luis Borges, deu origem a um círculo virtuoso de reflexões do Teatro de Ferro. Que relações se estabelecem entre a marioneta e o actor/ manipulador? Até onde pode chegar a exploração dos mais diversos materiais? Um mês antes da estreia, tirámos uma polaroid a

Daydream.

Daydream é construído a partir de uma memória da leitura de “As Ruínas

Circulares”, de Jorge Luis Borges, mas Igor Gandra, mentor do Teatro de Ferro (TdF), confessa que já nem se lembra bem de como surgiu a ideia de criar um espectáculo em torno da narrativa do escritor argentino. “Verdadeiramente, penso que tudo começou na primeira vez em que li o conto, há uma data de tempo. Esta dimensão circular, esta ideia de ciclo e de ruína, sempre andou mais ou menos presente no nosso trabalho.”

Dito isto, façamos um breve rewind, até 1944: é o ano de publicação de Ficções, uma colectânea de contos de Borges que, apesar de ter vencido o Grande Prémio de Honra da Sociedade Argentina de Escritores, passou relativamente despercebida à escala global. A fama internacional de Borges só chegou com a atribuição do prémio internacional

Formentor, em 1961, partilhado com Samuel Beckett. Desde aí, poucos são os elogios que não lhe foram feitos: inventor do realismo mágico, maior escritor da língua hispânica, homem capaz de condensar numa série de pequenas histórias toda a história da literatura (e, há quem arrisque dizê ‑lo, toda a história do mundo). Um artigo do New York

Times, publicado em Janeiro, cita vários intelectuais (entre os quais

Umberto Eco) que sustentam a tese de que Borges foi um visionário da chamada Internet 2.0 (a Internet do YouTube, dos blogues, da Wikipedia), porque as suas criações “fazem do leitor um participante activo”. “As Ruínas Circulares”, um dos contos incluídos em Ficções, é disso exemplo: narra a história de um mágico, num templo rodeado por uma floresta tropical, que consagra o seu corpo “à única tarefa de dormir e sonhar” com um ser perfeito, de forma a materializá ‑lo.

Fim do rewind, voltemos ao que mais nos interessa: como é que uma companhia de teatro de marionetas pode abordar um tema aparentemente tão imaterial? “Partimos da ideia da possibilidade de construção ou reinvenção de um corpo, de um outro ser. Por isso é que, num dos textos mais antigos sobre o espectáculo, referia Pinóquio e Frankenstein. Nesses casos, as coisas não são postas nos mesmos termos em que Borges as põe, mas não deixa de haver um certo parentesco. Pelo menos, nós forçamo ‑lo um bocadinho, porque nos interessava aproximarmo ‑nos desse imaginário, da criação de uma entidade, a partir de ideias”, explica Igor Gandra. Ora aí está uma bela metáfora: não será uma marioneta o melhor exemplo possível da materialização de uma entidade a partir de um conceito? Para além disso, esta já não é a primeira vez que o TdF se apropria de histórias de homens isolados. “Já fizemos o Prometeu e o Sexta ‑Feira, e o nosso último espectáculo, Quase

Solo, era uma narrativa quase apocalíptica do último homem na terra.

Boa parte do nosso trabalho anda à volta da ideia de uma projecção do

outro a partir do um. E o conto ‘As Ruínas Circulares’ é mais uma variante

dessa ideia.”

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Coelho barroco

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Um regresso às marionetas?

Tudo começou a partir de um imaginário, mas este não foi um espectáculo construído convencionalmente, a partir de um texto ou guião. “Não há uma relação linear narrativa, que se estabeleça imediatamente. Há, isso sim, uma relação entre sonhador e sonhado, manipulador e manipulado, conter e ser contido.” Desta forma, o TdF aproveitou a deixa para ensaiar um regresso às marionetas e usar a exploração das propriedades de vários materiais como tiro de partida: “Quisemos testar a forma como eles reagem à acção que lhes é induzida. Nessa medida, o nosso trabalho é matricialmente marionetístico. Mesmo aquilo que em linguagem de cena se traduz como movimento tem esse progresso a partir da manipulação, das reacções mais espontâneas que os materiais nos propõem”. Os espectadores vão ‑se aperceber rapidamente dos frutos deste labor. Em Daydream, “a manipulação está latente em tudo”: em mochilas da Eastpak, em redes de mosquiteiro – “é a concretização da ideia do mínimo de matéria possível numa marioneta” –, mesmo no próprio cenário. Até a própria roupa poderia ter sido animada, como que por efeito de contágio. “Foi um processo curioso, porque nos disciplinamos no sentido da apropriação das propriedades cinéticas e plásticas que certas matérias nos têm oferecido, e das relações expressivas que podem ter entre si e com o campo mais simbólico.” O termo espectáculo de pesquisa é assumido com orgulho.

Porém, para Igor Gandra, este regresso às origens “também é relativo”: a companhia sempre trabalhou com marionetas. Mas o intérprete reconhece que o processo que conduziu a Daydream forçou o retorno a uma ideia “matricial”, e que estava algo arredada dos últimos trabalhos do TdF: “Uma noção da marioneta que se aproxima mais da linguagem da dança e do questionamento do corpo e das suas possibilidades”, precisa o encenador. “Houve uma reflexão sobre a prática, porque isto é sobretudo uma coisa de fazer e fazer muito, aprender e reaprender.”

Nesta espécie de back to basics, acabou por ser decisivo o trabalho da estrutura no projecto Desmontagem, um ateliê multidisciplinar em que participam jovens integrados em projectos de reinserção social, e que se materializa num espectáculo. “Quando começámos a trabalhar com os miúdos, tivemos a necessidade de recodificar a forma de fazer e falar sobre as coisas. Isso traduziu ‑se, quer queiramos quer não, numa espécie de objectivação daquilo que não estávamos habituados a objectivar. Tornou, de algum modo, o nosso trabalho mais científico, porque tínhamos de lhes explicar o que estávamos a fazer, e porquê. Isso contagiou o resto do trabalho.” Igor Gandra admite que isso aproximou a companhia “de um certo essencialismo”.

Mas este processo não significa uma simplificação pura e dura, porque mesmo as marionetas manipuláveis de forma mais convencional fogem às convenções. Na oficina/sala de ensaios/sala de espectáculos do TdF, na zona ribeirinha de Vila Nova de Gaia – para onde a companhia se mudou em Dezembro de 2003 –, pudemos observar verdadeiros esqueletos de marionetas, por entre porcas e parafusos, chaves de fendas e alicates. Nas mãos de Igor Gandra ajustava ‑se uma marioneta que poderia ser perfeitamente descrita como uma máquina, um robot, se não tivesse uma face delicada, profundamente humana. “É meio ciborgue, tem um corpo destacável, pré ‑fabricado, e peças que saem, como um Meccano [um jogo de construção baseado em peças de metal que se ligam através de porcas e parafusos]. Aqui está um pouco a ideia do Frankenstein.” É esta personagem que, já perto do final da peça, protagoniza um dos momentos de maior relação com a narrativa de

Borges: vemo ‑la a percorrer o cenário e a dormir, com sons de floresta tropical como banda sonora. “As máquinas também têm uma dose de sonho na forma como as vemos. Activam algo de irracional, ao mesmo tempo assustador e divertido. Há aqui alguma tensão entre o aspecto mecânico e o lado humano: os olhos abrem e fecham, têm pestanas que ninguém vê.” Pela sua dureza, a marioneta ofereceu muita resistência ao trabalho de manipulação: “Chegámos a uma altura em que nos zangávamos com ela, porque não conseguíamos descobrir o que ela queria fazer”, confessa Carla Veloso, a outra intérprete do espectáculo. “Com ela só se podia negociar. Nós construímo ‑la, mas ela é que nos constrói a nós enquanto manipuladores”, acrescenta Igor Gandra.

As possibilidades expressivas das marionetas são, no entanto, imensas. “Uma das características do teatro de marionetas é a

possibilidade de morte em cena. Se deixarmos de animar uma marioneta, ela morre muito mais verdadeiramente do que um actor pode morrer”, teoriza Igor Gandra (e isto corresponde a uma das imagens fortes de “As Ruínas Circulares”: a ideia de um homem criado, mas inanimado). O forte ambiente onírico que perpassa Daydream e todo o trabalho em volta dos materiais obrigou a equipa do TdF a “repensar a concepção de relação entre actor e personagem, manipulador e marioneta”. Olhamos em volta do cenário de ensaios e percebemos que ainda há muito por construir: há cenas cristalizadas, como a do coelho barroco (nome de código, está bom de ver), mas também há croquis no meio do chão. “Há um ciclo interno de pequenos surgimentos e pequenas mortes.”

A cenografia, correspondendo à própria imaterialidade da peça, não poderia deixar de ser despojada: uma série de tubos de metal ligados entre si formam linhas que delimitam um campo de acção, que pode muito bem ser interpretado como as ruínas circulares de Borges, o velho templo devorado pelas chamas onde o mágico sonhava. “Preferimos formas que nos permitissem ter espaço, que não tomassem para si, excessivamente, a atenção do espectador.” Mas a ideia não é assim tão rígida, e a própria estrutura efectua movimentos que, apesar de lentos, lhe dão a capacidade de se tornar também numa personagem. “Não é bem uma marioneta, mas é um espaço um bocado marionetizado.”

Uma realidade paralela

Tudo começa aos 49:59:11. É com a contagem decrescente digital da duração da peça – eram para ser 50 minutos certos, mas houve um corte de vídeo acidental e a equipa “achou graça” ao novo número – que o público se depara ao entrar na sala. “Este espectáculo não é antidigital, mas é muito mais orgânico, trata da noção de acção sobre um espaço e sobre a matéria. Coloca ‑nos um bocado sobre um prisma de observação de um tempo, mensurável, e a sua relação com o tempo da cena.” No fundo, trata ‑se de uma réstia da realidade lá fora, enquanto se desenrolam os sucessivos momentos (ou quadros) que compõem

Daydream. Isto porque, desde o primeiro instante, a assistência vai

perceber que é colocada numa realidade paralela, uma espécie de País das Maravilhas, similar àquele em que Lewis Carroll coloca Alice: o tempo continua lá fora, mas dentro do teatro está parado. O primeiro momento é, aliás, sintomático: uma cena de acção de camarim, em que Igor Gandra tira as roupas de civil e entra nesse mundo novo. Inicia ‑se um círculo perfeito: “O timecode tem a ver com as interacções possíveis das escalas que utilizamos na cena com os ritmos que são produzidos”.

O multimédia, que já caracterizou alguns espectáculos anteriores do TdF, é reduzido a esta contagem, e também a linguagem verbal é

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Teatro de Ferro

Criado em 1999, o Teatro de Ferro (TdF) desenvolve o seu trabalho nos campos do teatro de marionetas, do movimento e do multimédia. É na fusão destes elementos que o TdF forja o seu vocabulário teatral, performativo e interventivo.

A companhia tem apresentado regularmente várias produções, com objectivos distintos:

1. Espectáculos para crianças, dirigidos ao público escolar e familiar – Blurp (2001), Pisa ‑Relva (2003),

Pólo ‑Pólo (2004), Branca de Neve (2006) e Alberto e a Bomba (2007);

2. Ateliês multidisciplinares com duração de seis meses, materializando ‑se em espectáculos em que participam jovens integrados em projectos de reinserção social –

Planeta Boogie e Urbânia (2002), Desmontagem (2003), Desmontagem 2 (2004), Desmontagem 3 (2005), Desmontagem 4 e Desmontagem 4.1 (2006), e Desmontagem 5 (2007);

3. Espectáculos de pesquisa onde se procuram caminhos inexplorados por este colectivo: Belamáquina (2000),

Next e Belamáquina 2.0 (2002), Prometeu e Topgun

(2004), Sexta ‑Feira (2007), Quase ‑Solo, Estufa Fria e

Daydream (2008).

Sedeado na cidade de Vila Nova de Gaia, o TdF tem direcção artística de Igor Gandra, distinguido pelo Clube Português de Artes e Ideias com o prémio O Teatro na Década 1997; pelo Ministério da Cultura/Instituto das Artes com o Prémio Revelação Ribeiro da Fonte (2004); pela cidade de Vila Nova de Gaia com a Medalha de Mérito Cultural e Científico (2005); e pelo Jornal do

Centro (Viseu) com o Troféu Aquilino Ribeiro (2005).

Desde 2003, o TdF tem contado com o apoio do Ministério da Cultura/DGArtes – Direcção ‑Geral das Artes e, desde 2006, do Município de Vila Nova de Gaia (Pelouro da Cultura). •

reduzida. “Há pouca palavra. Temos explorado uma utilização mais plástica da voz, que não tem necessariamente a ver com o texto. É apenas mais uma das camadas, dentro de uma sobreposição de processos sinestésicos ou de tradução. Concretamente, tentamos produzir movimento em som, ou apropriamo ‑nos do som para a produção de uma outra intencionalidade física, e por aí fora.” Um dos momentos da peça é particularmente expressivo na concretização deste processo: parece uma missão impossível, mas conseguimos imaginar uma criatura aos saltos, em esforço físico, concretizada apenas na manipulação de uma mochila. A música, contudo, tem um papel decisivo na criação da atmosfera etérea que domina Daydream. As recolhas de Igor Gandra trouxeram à tona Matmos, Autechre, Lawrence English, Pan Sonic ou os mais obscuros Twentythrees: música com um cunho electrónico e experimental. “A ideia foi escolher sonoridades que nos colocassem simultaneamente aqui e alhures, que nos mantivessem no espaço da cena, mas que também provocassem um deslocamento ou descentramento.”

A palavra propriamente dita domina apenas um momento, em que entra em cena um hipnotizador. “É uma experiência muitas vezes tentada, mas poucas vezes conseguida: a hipnose colectiva”, diz a personagem, através das palavras escritas por Regina Guimarães. “Saímos da espiral do tempo”, ouve ‑se pouco depois, e o tempo do

timecode pára mesmo. É um quadro à parte do restante espectáculo,

protagonizado por Igor Gandra. “A hipnose tem a ver com o próprio título do espectáculo: para nós, este daydream tem o sentido de sonhar acordado. Eventualmente, será discutível esta apropriação do termo, que é relativamente específico na sua língua original. Mas, para nós, é por aqui que a coisa tem funcionado, como motor de arranque.” Não se esperam momentos de alucinação colectiva – apesar de ser sugerido aos espectadores que dêem as mãos, “fraternalmente” –, mas sim a reflexão “sobre uma prática que está a ser desenvolvida naquele momento”. “Trata ‑se de sonhar a partir de estímulos concretos, pela forma como o

input do real se traduz, manifesta ou condiciona num outro espaço, que

é o da imaginação ou do devaneio.” Para além disso, podemos encarar o hipnotizador como tendo uma função de comic relief: “O humor está ligado à nossa apropriação da ideia de daydream, porque é outro estado de consciência, que se desenvolve sob circunstâncias específicas, e também tem um pouco a ver com a noção de marioneta e de riso de Henri Bergson [filósofo francês que defendeu que o riso “é a mecânica aplicada no ser vivo”]. Gostávamos de contar com esta possibilidade no nosso trabalho, até porque isto é tudo negro, metálico, e nós também gostamos de nos divertir”, observa Igor Gandra, com um sorriso.

De resto, este é um hipnotizador que “o mais que consegue é hipnotizar ‑se a si mesmo, mas que nesse processo transforma toda a matéria da cena”. E, obviamente, também se podem estabelecer paralelismos entre ele e o sonhador do conto: “Ele próprio é apanhado na sua própria manipulação, na sua própria criação, no seu próprio engenho, naquilo que se propõe dominar”. Esta ideia remete para o final de “As Ruínas Circulares”, para a sua última frase, que muda tudo o que está para trás. “O espectáculo reflecte sobre o modo como nós projectamos os outros, como os prendemos dentro dos nossos sonhos, como os ‘lixamos’ deste modo. O conto é a rasteira a isso.” Não revelamos mais nada, sob pena de criar um spoiler para quem nunca o leu. Se ainda não o fez, podemos prometer duas coisas: demora 15 minutos a ler e pode levar 15 séculos a digerir. E Daydream pode funcionar como ponto de partida para a sua leitura, ou como ponto de chegada de uma prolongada meditação, porque a parábola de Borges é, em boa verdade, infinita. •

Referências

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