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Gerencialismo e responsabilização : repercussões para o trabalho docente nas escolas estaduais de ensino médio de Campinas/SP

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS Faculdade da Educação

JEAN DOUGLAS ZEFERINO RODRIGUES

GERENCIALISMO E RESPONSABILIZAÇÃO:

REPERCUSSÕES PARA O TRABALHO DOCENTE

NAS ESCOLAS ESTADUAIS DE ENSINO MÉDIO DE

CAMPINAS/SP

CAMPINAS 2018

(2)

JEAN DOUGLAS ZEFERINO RODRIGUES

GERENCIALISMO E RESPONSABILIZAÇÃO:

REPERCUSSÕES PARA O TRABALHO DOCENTE

NAS ESCOLAS ESTADUAIS DE ENSINO MÉDIO DE

CAMPINAS/SP

Tese apresentada à Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas como parte dos requisitos exigidos para a ob-tenção do título de Doutor em Educação, na Área de Ensino e Práticas Culturais.

Orientadora: MARIA MÁRCIA SIGRIST MALAVASI

ESTE TRABALHO CORRESPONDE À VERSÃO FINAL DA TESE

DEFENDIDA PELO ALUNO JEAN DOUGLAS ZEFERINO RODRIGUES, E ORIENTADA PELA PROFA. DRA. MARIA MARCIA SIGRIST MALA-VASI.

CAMPINAS 2018

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Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca da Faculdade de Educação Pablo Cristian de Souza - CRB 8/8198

Rodrigues, Jean Douglas Zeferino

R618g RodGerencialismo e responsabilização : repercuções para o trabalho docente nas escolas estaduais de ensino médio de Campinas/SP / Jean Douglas Zeferino Rodrigues. – Campinas, SP : [s.n.], 2018.

RodOrientador: Maria Marcia Sigrist Malavasi.

RodTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação.

Rod1. Escolas - Organização e administração. 2. Comportamento. 3. Trabalho docente. I. Malavasi, Maria Marcia Sigrist, 1957-. II. Universidade Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Managerialism and accoutability: the repercussions for the

teaching work on the the State High Schools of Campinas/SP

Palavras-chave em inglês:

Schools - Organization and administration Behavior

Teaching work

Área de concentração: Ensino e Práticas Culturais Titulação: Doutor em Educação

Banca examinadora:

Maria Marcia Sigrist Malavasi [Orientador] Andreza Barbosa

Isaura Monica Souza Zanardini Luiz Carlos de Freitas

Selma Borghi Venco

Data de defesa: 03-12-2018

Programa de Pós-Graduação: Educação

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

TESE DE DOUTORADO

GERENCIALISMO E RESPONSABILIZAÇÃO:

REPERCUSSÕES PARA O TRABALHO DOCENTE

NAS ESCOLAS ESTADUAIS DE ENSINO MÉDIO DE

CAMPINAS/SP

Autor: Jean Douglas Zeferino Rodrigues

COMISSÃO JULGADORA:

Maria Marcia Sigrist Malavasi Andreza Barbosa

Isaura Monica Souza Zanardini Luiz Carlos de Freitas

Selma Borghi Venco

A Ata da Defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no SIGA/Sistema de Fluxo de Dissertação/Tese e na Secretaria do Programa da Unidade.

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AGRADECIMENTOS

A todos os trabalhadores da educação que cotidianamente enfrentam as mais diversas dificul-dades em seus locais de trabalho e, mesmo assim, não abdicam de suas lutas. Em especial, as quatro escolas e aos 18 profissionais que se disponibilizaram a colaborar na pesquisa.

À minha mãe, pelo porto seguro ao longo de nossas vidas.

À companheira Alini pelo apoio e paciência (muita paciência) em toda a trajetória. À Profa. Dra. Maria Marcia Sigrist Malavasi pela orientação, dicas e apoio.

Ao Miranda, pelo auxílio na construção do instrumento utilizado no processo de escolha das escolas.

Às Professoras Doutoras Regiane Helena Bertagna e Maria José da Silva Fernandes pela parti-cipação na banca de qualificação e todas as valiosas contribuições.

Aos membros da banca de defesa, titulares e suplentes, por terem aceitado o convite e pela leitura crítica do trabalho (Prof. Dr. Luiz Carlos de Freitas, Profa. Dra. Selma Venco, Profa. Dra. Isaura Monica Souza Zanardini, Profa. Dra. Andreza Barbosa.

Aos/às amigos/as do Loed pela parceria nas APPs, nos eventos e demais momentos de troca e aprendizagem.

À Paulinha e Luana pelas trocas, companheirismo, leitura e, principalmente, pela amizade. Ao Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia pelo afastamento concedido que possi-bilitou minha maior dedicação à pesquisa.

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RESUMO

Buscou-se identificar e analisar as repercussões das políticas gerenciais e de responsabilização no trabalho docente de professores do Ensino Médio da rede estadual de Campinas. Os objetivos específicos abordam: a) identificar e descrever os elementos gerenciais contidos nos programas que fundamentam a gestão dos professores; b) analisar as repercussões das políticas gerenciais e de responsabilização sobre o trabalho docente, especificamente, nas relações professor/professor e professor/direção escolar (direção e professor coordenador pedagógico) do EM noturno; c) caracterizar o posicionamento dos professores sobre as medidas implementadas; e d) verificar e caracterizar possíveis movimentações de resistência às políticas. Foram considerados na análise os seguintes programas da SEE/SP: Sistema de Avaliação de Rendimento do Estado de São Paulo (Saresp); Projeto São Paulo faz escola (SPfe); Programa de Qualidade da Educação (PQE): Idesp; Bonificação por Resultados (BR); Programa de Valorização pelo Mérito, e Educação – Compromisso de São Paulo. Para tanto, foram observadas quatro escolas e entrevistados 18 profissionais, entre os quais, quatro diretores, quatro professores coordenadores pedagógicos, seis professores de língua portuguesa e quatro de matemática. A partir de autores como, Au, Derber, Edwards, Falabella, Freitas, Gaulejac, Gruening, Jáen, Muller, Newman e Clark, Nichols e Berliner, problematizou-se, por um lado, o gerencialismo e suas variações, e por outro, a responsabilização (accountability) tanto como produto do gerencialismo, como um mecanismo de controle sobre o trabalho docente e a organização do trabalho pedagógico da escola. As políticas gerenciais e de responsabilização analisadas oferecem repercussões negativas, sistemáticas e específicas ao trabalho docente no EM, não contribuindo para a qualidade social da educação. As principais repercussões indicam: divergência, desconfiança e sentimento de injustiça em relação ao Idesp; conflito e tensão entre as etapas e ensino; desânimo, frustração e desestímulo em relação à carreira docente; cobrança, pressão e monitoramento da Diretoria de Ensino sobre a direção escolar; alinhamento da organização do trabalho pedagógico ao Saresp e AAP; redução da autonomia docente; estreitamento curricular; defesa do modelo de remuneração uniforme; resistência docente e discente às avaliações externas e migração de funcionários do Quadro de Apoio para escola de EF Anos Iniciais.

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ABSTRACT

On this research we aim to identify and analyze the repercussions of the management and accountability policies in the teaching work of High School teachers of the state network of Campinas. These specific objectives approach: a) to identify and describe management elements contained on programs that ground the management of teachers; b) to analyze the repercussions of the management and accountability policies about the teaching work, specifically on the relations between teacher/teacher and teacher/school management (management and pedagogical coordinator teacher) of the night term HS; c) to characterize the teachers’ position about the measures implemented; and d) to verify and characterize possible resistance movement towards the policies. It was considered in the analysis the following programs of SEE/SP: Sistema de Avaliação de Rendimento do Estado de São Paulo (Saresp) [Evaluation System of School Efficiency of the State of São Paulo]; Projeto São Paulo faz escola (Spfe) [São Paulo makes schools]; Programa de Qualidade da Educação (PQE): Idesp [Quality of Education Program]; Bonificação por Resultados (BR) [Performance Bonus]; Programa de Valorização pelo Mérito, e Educação – Compromisso de São Paulo [Valorization by Merit and Education Program – Commitment of São Paulo]. Therefore, four schools were observed and 18 professionals were interviewed, which among them, four principals, four pedagogical coordinator teachers, six Portuguese language teachers and four math teachers. Based on authors such as Au, Derber, Edwards, Falabella, Freitas, Gaulejac, Gruening, Jáen, Muller, Newman e Clark, Nichols e Berliner, it was problematized, on one hand, the managerialism and its variations, and on the other hand, accountability as a product of managerialism and a control mechanism over teaching work and the organization of the school’s pedagogical work. The managerial and accountability policies analyzed offer negative, systematic and specific repercussions to teaching work in HS, not contributing to the social quality of education. The managerialism and its variations (transactional and transformational) were problematized as well as the accountability, as a mechanism of control over the teaching work and the organization of the pedagogical work of the school. The main repercussions indicate: divergence, mistrust and injustice feelings towards Idesp; conflict and tension among the phases and teaching; dismay, frustration and discourage towards the teaching career; demands, pressure and the monitoring of the School Board over the school management; alignment of the organization of the pedagogical work with Saresp and AAP; reduction of the teacher autonomy; narrowing of the curricular; defence of a uniform remuneration model; teacher and student resistance of the external evaluations and migration of the Support Framework employees to the Initial Years of Middle School.

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LISTA DE FIGURAS

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LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Histórico dos valores pagos como bonificação por resultados (2017–2009) Gráfico 2 – Resultados do Saresp em Língua Portuguesa (2008 – 2016)

Gráfico 3 – Resultados do Saresp em Matemática (2008 – 2016) Gráfico 4 – Resultados do Idesp por escola pesquisada

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Aproximações entre os programas da SEE e a gerência científica Quadro 2 – Tipos de privatização da educação e políticas associadas

Quadro 3 – Classificação dos usos da avaliação externa como instrumento da gestão educacio-nal nos estados

Quadro 4 – Modalidades das políticas de responsabilização

Quadro 5 – Principais elementos de um sistema de responsabilização baseado no mercado Quadro 6 – Estrutura da entrevista

Quadro 7 – Dados das escolas pesquisadas – referência 2016

Quadro 8 – Informações sobre os profissionais pesquisados: professores, professores Coorde-nadores-pedagógicos e diretores

Quadro 9 – Etapa da análise segundo a técnica de Queiroz – unidades informantes Quadro 10 – Etapa da análise segundo a técnica de Queiroz – unidade escolas Quadro 11 - Recorrência do recebimento da Bonificação por Resultado, Escola D

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Valores de referência na escala do Saresp para a distribuição dos alunos nos ní-veis de desempenho em Língua Portuguesa e Matemática

Tabela 2 – Distribuição por nível de desempenho dos estudantes em Língua Portuguesa e Ma-temática

Tabela 3 – Resultados do Saresp em Língua Portuguesa e Matemática 2008 – 2016

Tabela 4 – Desempenho das escolas com maiores/menores Idesp de Campinas: 2008 –2014 Tabela 5 – Menores resultados: 2008 – 2014

Tabela 6 – Menores resultados segundo o Idesp: 2008 – 2014 Tabela 7 – Maiores resultados do Idesp: 2008 – 2014

Tabela 8 – Resultado da Análise de Envoltória de Dados – DEA

Tabela 9 – Cruzamento das informações da DEA/Idesp e a seleção das escolas Tabela 10 – Fluxo escolar da Escola A

Tabela 11 – Recorrência do recebimento da Bonificação por Resultado na Escola B Tabela 12 – Recorrência do recebimento da Bonificação por Resultado da Escola C

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AAP – Avaliação da Aprendizagem em Processo AGCS – Acordo Geral sobre o Comércio e Serviços

AGEE – A uma Agenda Globalmente Estruturada para a Educação ANA – Avaliação Nacional de Avaliação

APP – Atividade de Pesquisa Permanente APS – Ação Popular Socialista

ATPC – Atividade de Trabalho Pedagógico Coletivo BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento BM – Banco Mundial

BR – Bonificação por Resultados

CENP – Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas DE – Diretoria de Ensino

DEA – Data Envelopment Analisys DMU – Decision Making Unit

ECSP – Educação – Compromisso de São Paulo EE – Escola Estadual

EF – Ensino Fundamental EP – Entrevista Piloto

FDE – Fundação para o Desenvolvimento da Educação FE – Faculdade de Educação

FMI – Fundo Monetário Internacional EM – Ensino Médio

EUA – Estados Unidos da América

ICE – Instituto de Corresponsabilidade pela Educação ICM – Índice de Cumprimento de Metas

ID – Índice de Desempenho

IDESP – Índice de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo IF – Índice de Fluxo Escolar

IFC – Internacional Finance Corporation INSE – Índice de Nível Socioeconômico LC – Lei complementar

LOED – Laboratório de Observação e Estudos Descritivos LP – Língua Portuguesa

MAT – Matemática

NGP – New Public Management NSE – Nível Socioeconômico

OCDE – Organização para o Desenvolvimento Econômico OI – Organismo Internacional

OMC – Organização Mundial do Comércio ONG – Organizações Não Governamentais OS – Organizações Sociais

PISA – Programa Internacional de Avaliação de Alunos PPP – Parcerias Público-Privadas

PCP – Professor Coordenador Pedagógico PPP – Projeto Político-Pedagógico

PQE – Programa de Qualidade da Educação SED – Secretaria Escolar Digital

SEE – Secretaria da Educação do Estado de São SPBP – Schoolwide Performance Bonus Program

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SPFE – Projeto São Paulo faz escola

SARESP – Sistema de Avaliação de Rendimento do Estado de São Paulo TIC – Tecnologia da Informação e Comunicação

TPE – Todos pela Educação UFT – United Federation of Teachers

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 16

1. O SISTEMA DE METABOLISMO SOCIAL DO CAPITAL, O PROCESSO DE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA: AS IMPLICAÇÕES PARA A GESTÃO ... 27

1.1 O sistema de metabolismo social do capital: breves considerações ... 29

1.1.2 Os sistemas de mediações de primeira e de segunda ordem ... 30

1.2 A resposta à crise estrutural do capital: reestruturação produtiva e os novos elementos da gestão ... 34

1.2.1 Do taylorismo/fordismo à acumulação flexível: a mudança do princípio educativo ... 36

2. GERENCIALISMO E RESPONSABILIZAÇÃO: ELEMENTOS DA CONSTITUIÇÃO HEGEMÔNICA DA ORGANIZAÇÃO E GESTÃO DO TRABALHO DOCENTE ... 46

2.1 A função hegemônica dos organismos internacionais na constituição do consenso: o viés empresarial da educação ... 52

2.2 Do Estado Mínimo ao Estado Efetivo: transformar para não mudar ... 68

2.3 Da gerência científica ao gerencialismo (Nova Gestão Pública): a ideologia da transforma-ção ... 75

2.4 A centralidade da gestão gerencial na educação: a responsabilização como mecanismo de controle ... 86

2.4.1 Modelos de responsabilização docente... 104

2.4.1.1 O modelo de responsabilização burocrática ... 108

2.4.1.2 O modelo de responsabilização baseado no mercado ... 110

2.4.2 O pagamento por desempenho na educação: uma questão de fé ... 125

2.5 O trabalho docente e a subordinação da organização do trabalho pedagógico à lógica geren-cial ... 137

3. A POLÍTICA EDUCACIONAL PAULISTA: SISTEMATIZANDO OS ELEMENTOS GERENCIAIS E DE RESPONSABILIZAÇÃO ... 148

3.1 Gerencialismo e responsabilização nos programas da Secretaria Estadual de Educação 157 3.1.1 A avaliação na rede estadual: o SARESP e a Avaliação de Aprendizagem em Processo (AAP) ... 159

3.1.2 O currículo São Paulo faz escola: a prescrição da tarefa ... 164

3.1.3 O Programa de Qualidade da Escola: educar é atingir metas ... 168

3.1.4 A Bonificação por resultados: premiando a “qualidade” ... 173

3.1.5 O Programa de Valorização pelo Mérito: os vencedores se esforçam! ... 181

3.1.6 O Programa Educação – Compromisso de São Paulo: tudo está sob controle ... 185

4. CONSIDERAÇÕES ACERCA DO PERCURSO METODOLÓGICO ... 198

4.1 O processo de escolha das escolas ... 198

4.2 Instrumentos de coleta de dados ... 211

4.3 Os sujeitos e as escolas pesquisadas ... 220

4.4 Sobre a técnica de análise das transcrições das entrevistas ... 237

5. AS REPERCUSSÕES DAS POLÍTICAS GERENCIAIS E DE RESPONSABILIZA-ÇÃO NO TRABALHO DOCENTE ... 244

5.1 Escola A ... 246 5.1.1 Condições de trabalho sob as políticas gerenciais e de responsabilização: precariedade,

(15)

pressão, vigilância, conflito e desestímulo ... 246

5.1.1.1 Quando as condições de trabalho se tornam obstáculo à meta ... 249

5.1.1.2 Gerencialismo, responsabilização e as precárias condições de trabalho: os efeitos ne-gativos ... 253

5.1.1.2.1 Alterando o ambiente escolar: pressão, conflito e vigilância ... 254

5.1.1.2.2 As políticas de mérito: do desestímulo passageiro à desvalorização permanente ... 257

5.1.2 Linearidade e hierarquia da cobrança pelos resultados ... 260

5.1.3 Planejamento e habilidades: elementos de controle e alinhamento da organização do tra-balho pedagógico ... 267

5.1.4 Menos bônus, mais salário e carreira... 275

5.2 Escola B ... 277

5.2.1 Linearidade e hierarquia na cobrança pelos resultados: as estratégias de trabalho em grupo ... 278

5.2.2 Avaliação, habilidades e (inter)disciplinaridade: o alinhamento da organização do traba-lho pedagógico ... 283

5.2.3 Entre desânimo, frustração e compromisso: dos efeitos negativos da política de mérito à defesa da valorização salarial ... 288

5.2.4 A resistência dos estudantes às avaliações externas ... 295

5.3 Escola C ... 298

5.3.1 Gerencialismo e responsabilização docente sobre as precárias condições de trabalho: promovendo desânimo e frustração ... 300

5.3.2 Secundarizando os elementos da política da SEE: um sinal de autonomia docente?.... 307

5.3.3 (Des)merecendo a política de mérito: a defesa do salário e da carreira docente ... 314

5.3.4 Avaliações externas: da falta de sentido ao posicionamento político dos estudantes .... 319

5.4 Escola D ... 322

5.4.1 Precariedade, impositividade, conformação e autonomia: os limites da política gerencial da SEE ... 324

5.4.2 Política de responsabilização: os efeitos negativos predominam ... 332

5.4.3 Valorização da carreira: entre o mérito e a isonomia ... 337

5.5 Síntese final das Escolas A, B, C e D ... 342

5.5.1 Elementos gerenciais, responsabilização e precárias condições de trabalho: repercussões para o trabalho docente ... 342

5.5.2 Avaliação, planejamento e habilidades: o alinhamento da organização do trabalho peda-gógico ... 356

5.5.3 Nem "bônus" nem "prova de mérito", professores querem remuneração adequada ... 362

5.5.4 Avaliações externas: desinteresse, falta de sentido e posicionamento políticos dos estu-dantes ... 368

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 372

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 382

(16)

INTRODUÇÃO

Atualmente, as políticas educacionais, pautadas por princípios gerenciais, ganham cada vez mais espaço nos cenários mundial e nacional. Tomados de empréstimo do mundo empresa-rial, esses princípios buscam impingir à escola padronizações gerenciais que, associadas à ava-liação externa em larga escala, disputam um modelo de escola coerente com a sociabilidade contemporânea.

A implementação de mecanismos de gestão dos servidores e, sobretudo, dos professores, caracteriza-se como parte de ações que destacam, ainda que de forma parcial, tanto a reforma do Estado quanto dos sistemas de educação. Entre as variadas formas de controle sobre o tra-balho docente, as orientadas por testes padronizados são as mais evidenciadas. Dimensionando seu uso atual, observa-se a intersecção com políticas abrangentes, como as de responsabilização docente, cujos contornos se imbricam profundamente a princípios gerenciais, seja de ordem taylorista ou neotayloristas. O movimento ensaia estratégias extensivas e articuladas de inter-venção e busca oferecer corpo e organicidade à disputa dos rumos do trabalho pedagógico.

Mesmo com as advertências de inúmeros estudos1, que indicam pouca ou nenhuma

as-sociação entre as políticas gerenciais e de responsabilização docente2, com a melhoria da

qua-lidade da educação3, observa-se o seu avanço não somente no Brasil. Segundo Brooke e Cunha

(2011), dezenove estados brasileiros já desenvolvem sistemas de avaliação externa em larga escala4, dos quais sete a partir de instrumentos de responsabilização baseados em bonificação

por desempenho. São eles: Amazonas (Prêmio Escola de Valor); Ceará (Prêmio Aprender Pra Valer e Escola Nota 10); Espírito Santo e Minas Gerais (Acordo de Resultados); Pernambuco; Rio de Janeiro e São Paulo (Bonificação por Desempenho). Pesquisa desenvolvida por Bauer et al. (2015) reforça a tendência indicada por Brooke e Cunha (2011) de que a avaliação externa5

vem se firmando como instrumento de gestão, nas cidades brasileiras, tanto por meio de

1 Brooke e Cunha (2011), Casassus (2007), Falabella (2013, 2014), Freitas (2011a, 2012a), Marsh et al. (2011),

Ravitch (2011), Rodrigues (2010), Shanahan (2010), Souza (2008).

2 Por vezes, responsabilização docente poderá ser utilizada como sinônimo da manifestação de variadas políticas

que, articuladas, expressam potencial ferramenta de controle do trabalho docente, como, por exemplo: avaliações externas e de larga escala; publicização dos resultados; sistema de premiação e punição; pagamento por desempe-nho; forte controle da concepção do ensino e currículo. Destaca-se, de forma articulada, pelo fato de que, isolada-mente, a avaliação externa não constitui nem promove processos de responsabilização docente.

3 Essa perspectiva de qualidade da educação está associada, exclusivamente, ao aumento de índices quantificáveis,

obtidos a partir da aplicação periódica de testes padronizados.

4 Ao longo do texto, será utilizada a denominação de “avaliação externa em larga escala”, representando o

se-guinte entendimento: é externa pois, embora seja aplicada pelos profissionais da escola, sua concepção ocorre em esferas que não a unidade escolar; é de larga escala, uma vez que sua abrangência incorpora grande extensão (DURLI; SCHNEIDER, 2010).

5 Para fins de fluência do texto, será utilizada a expressão “avaliação externa” como sinônimo de avaliação

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iniciativas próprias de sistemas de avaliação como adesão a propostas do governo federal ou estadual.

A tendência em utilizar as avaliações externas no Brasil é crescente e, certamente, seus desdobramentos ainda serão observados, o que permite afirmar que a continuidade de estudos futuros direcionados à compreensão desses fenômenos é extremamente necessária. Nesse caso, o estado paulista destaca-se na implementação de políticas gerenciais e de responsabilização, sobretudo a partir de um conjunto articulado entre processos de gestão dos servidores e objeti-vos pedagógicos. Atualmente, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (SEE/SP) conta com inúmeras iniciativas e programas voltados a dar prosseguimento às mudanças nos sistemas escolares, segundo orientações tanto de organismos multilaterais quanto de entidades represen-tativas dos interesses do empresariado (MESKO; SILVA; PIOLLI; 2016; PERONI; CAETANA, 2016; PIOLLI; HELOANI; PIOLLI, 2016; RODRIGUES, 2010). Entre as principais ações, destacam-se:

1. Sistema de Avaliação de Rendimento do Estado de São Paulo (Saresp), de 1996; 2. Projeto São Paulo Faz Escola (SPfe), de 20086;

3. Programa de Qualidade da Educação (PQE): Idesp, de 2008; 4. Bonificação por Resultados (BR), de 2008;

5. Programa de Valorização pelo Mérito, de 2009; e 6. Educação – Compromisso de São Paulo, de 2011.

O fio condutor do movimento de reforma, incluindo os programas citados acima, sus-tentam-se na –já clássica –caracterização de que o Estado é ineficiente ante as demandas do mercado globalizado e competitivo, de modo que urge a superação das velhas e burocráticas concepções de gestão estatal e a adoção, portanto, de princípios modernizantes, entre os quais modelos gerenciais (Estado gerencial). O discurso da qualidade é incorporado como elemento constituinte da estratégia das classes dominantes na busca pelo consenso da sociedade civil em

6 É preciso destacar que o Projeto São Paulo faz escola constitui uma das diversas iniciativas da gestão estadual

do Governo José Serra (2007 – 2010) tendo à frente da SEE/SP Maria Helena Guimarães de Castro e Paulo Renato de Souza em relação à educação. Um resumo das ações daquele governo pode ser observado nas dez metas do documento uma Nova Agenda para a educação pública: 1. Implantação do Projeto Ler e Escrever; 2. Reorganiza-ção do Progressão Continuada; 3. ElaboraReorganiza-ção e divulgaReorganiza-ção das propostas curriculares da educaReorganiza-ção básica de São Paulo, com a indicação das expectativas de aprendizagem para todos os alunos em cada disciplina, série e ciclo do Ensino Fundamental e Médio; 4. Recuperação da aprendizagem: ciclos iniciais, 8a série e Ensino Médio; 5.

Diver-sificação curricular do Ensino Médio; 6. Educação de Jovens e Adultos (Ensino Fundamental e Médio); 7. Ensino Fundamental de 9 anos e articulação com os municípios; 8. Sistemas de Avaliação; 9. Gestão por resultados e política de incentivos; 10. Plano de obras e investimentos. Destacam-se, entre as metas, a 8. Sistemas de Avaliação e a 9. Gestão por resultados.

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torno da necessidade da mudança. Nessa perspectiva, a qualidade, de modo geral, associa-se diretamente à ideologia gerencial e, por conseguinte, aos pressupostos da eficiência dos resul-tados.

Um indicativo da centralidade do discurso da qualidade, no caso, a educacional, nas iniciativas da SEE/SP é demonstrada por Filipe e Bertagna (2017), a partir do levantamento documental de leis ordinárias, leis complementares, decretos e resoluções. No universo pesqui-sado de 77 documentos, 60 apresentam relação com a qualidade da educação que, segundo as autoras, são induzidas pelas avaliações externas em larga escala, desdobrando como sinônimo de qualidade educacional os resultados passíveis de mensuração objetiva (FELIPE; BER-TAGNA, 2017).

No entanto, cabe uma demarcação política do entendimento de qualidade da educação utilizado nesta pesquisa. Política, pois, a priori, a concepção de qualidade é um produto histó-rico permeado pelos posicionamentos político e ideológico dos indivíduos, de modo que seu emprego remete a certa compreensão da realidade e de ser humano que se insere nas relações sociais, afastando-se, desse modo, da ideia de neutralidade (FLACH, 2005). O posicionamento acerca do que pode ou não ser considerado de qualidade remete, incondicionalmente, ao projeto histórico que orienta, de forma intencional ou não, as proposições afins.

Nesse sentido, defender a qualidade da educação exige, a princípio, a compreensão de que sociedade temos e que sociedade se busca construir. Logo, não é algo estanque, a-histórico. O entendimento de projeto histórico parece lançar luz ao debate, já que seu entendimento diz respeito à enunciação do “[...] tipo de sociedade ou organização social na qual pretendemos transformar a atual sociedade e os meios que devemos colocar em prática para a sua consecução. Implica uma ‘cosmovisão’, mas é mais que isso. É concreto, está amarrado às condições exis-tentes e, a partir delas, postula fins e meios” (FREITAS, 1987, p. 123).

A qualidade atrelada às iniciativas da SEE/SP parte de um projeto histórico conservador e, coerentemente, apresenta uma visão reducionista e pobre de qualidade educacional; ampa-rando-se nos preceitos mercadológicos e induzindo a uma formação predominantemente téc-nica de preparação para o trabalho. Essa concepção não tem eco nos fundamentos deste trabalho, uma vez que se considera a educação uma prática social e um ato político (SILVA, 2009), logo, descartando sua neutralidade e permitindo que o entendimento de qualidade da educação vin-cule-se ao conceito de educação de qualidade social como

[...] aquela comprometida com a formação do estudante com vistas à emancipação humana e social; tem por objetivo a formação de cidadãos capazes de construir uma sociedade fundada nos princípios da justiça social, da igualdade e da democracia. Por

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isso, não é restrita aos bancos escolares e, muito menos, à preparação para o mercado de trabalho; ao contrário, é um processo pedagógico voltado para a formação de cida-dãos e cidadãs capazes de construir outras formas de relação econômica, social, cul-tural, política, radicalmente diferentes das que existem atualmente. (BELLONI, 2003, p. 232).

Distinto da concepção apontada, os programas da SEE/SP, de maneira articulada, ou individual, repercutem tanto para a formação dos estudantes como para o trabalho docente (BAUER, 2006; BARROS, 2014; CASSETARI, 2010; COSSO, 2013; FIAMENGUI, 2008; RODRIGUES, 2010; 2011; SCORZAFAVE et al., 2014). Da mesma forma, a política de testes, associada às medidas de responsabilização, além de empobrecer o currículo e a formação dis-cente, induz profundas mudanças na prática docente. Pesquisas demonstram repercussões na organização do trabalho pedagógico, entre as quais destacam-se, segundo Rodrigues (2010), alterações no ambiente escolar: como atrito, constante cobrança, visibilidade positiva (destaque da escola ou do modelo a ser seguido) e negativa (destaque pelo baixo desempenho), constran-gimento, competição, resiliência; reorientação da prática docente ao imediatamente cobrado em avaliações externas; incerteza na tomada de decisões ao longo do ano letivo; diluição da soli-dariedade e aumento da competitividade; migração docente: professores selecionam escolas que oferecem as melhores condições para alcançar as metas estabelecidas.

Casassus (2007) aponta que tais iniciativas afetam a dignidade do professor; minam a própria motivação para o trabalho; enrijecem sua prática e seus procedimentos; além de influ-enciar nas relações entre professores e estudantes. Ravich (2011), da mesma forma, chama a atenção para a padronização dos processos; o assédio para cumprir as determinações externas; aumento de doenças relacionadas ao estresse; e a perda da autonomia dos professores e da ins-tituição escolar. Articula-se, a essa perspectiva, uma concepção de educação pragmática, vol-tada exclusivamente para o atendimento às demandas de formação de força de trabalho, se-gundo indicadores do nível de competitividade do País diante da globalização econômica mun-dial.

Nesse sentido, a pesquisa de mestrado (RODRIGUES, 2010) permitiu a aproximação à temática, a partir de um estudo específico que evidenciou, a exemplo das repercussões citadas nos parágrafos anteriores, implicações resultantes das “políticas de desempenho” para o traba-lho docente de professoras do 5o ano do Ensino Fundamental (EF) da rede estadual paulista.

Porém, as principais iniciativas da SEE/SP datam do ano de 2008, sendo que, no decorrer do tempo, adequações foram observadas nas políticas (ÚLTIMO SEGUNDO, 2011; COSTA, 2012), do mesmo modo que o “tempo de vida”, ou a permanência dos programas, tornou-se, seguramente, elemento a ser considerado, uma vez que o contato com os princípios das medidas,

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pelos profissionais da escola, acabam gerando novas situações e também novas respostas dos sujeitos, ora se adaptando às iniciativas, ora resistindo às regras externamente impostas (COSTA, 2012).

A crescente ampliação de tais políticas, nos mais diversos segmentos da educação básica, somada ao avanço das avaliações externas como ferramenta da gestão educacional e à pouca produção de pesquisas analíticas cujas temáticas envolvem o trabalho docente, especificamente no Ensino Médio (EM) (KUENZER, 2010), sugerem um campo que necessita de estudo. Nesse sentido, o fortalecimento das medidas que se organizam a partir do gerencialismo, na gestão dos servidores com foco nas ações de responsabilização docente, faz levantar a seguinte hipó-tese fundante: à medida que se aprofundam e se sistematizam as intervenções gerenciais, se acentuam as repercussões para o trabalho docente. Portanto, a pesquisa tem como objetivo ca-racterizar e analisar as repercussões da implementação de políticas orientadas pelo gerencia-lismo e responsabilização no trabalho docente na rede estadual paulista da 3a série do EM

no-turno.

Considerando a hipótese indicada, cabe questionar quais são as repercussões para o tra-balho docente e que consequências podem ser observadas a partir das iniciativas gerenciais e de responsabilização da SEE/SP. Todavia, algumas questões podem colaborar na problematiza-ção da temática. São elas: na política educacional que se materializa a partir dos inúmeros gramas, é possível observar elementos gerenciais nas relações de trabalho que envolvem o pro-fessor? Considerando que o gerencialismo diz respeito à sujeição da organização sob a lógica da eficiência, eficácia e produtividade, exigindo, de certo modo, a conformação subjetiva dos trabalhadores a determinados fins (BRAVERMAN, 1987; HELOANI, 2006; NEWMAN; CLARK, 2012), como podem ser caracterizadas as relações estabelecidas entre os professores e a direção escolar (diretor e professor coordenador pedagógico)? Qual o posicionamento dos docentes acerca da política de responsabilização implementada pela SEE/SP? Concordam, dis-cordam, fazem considerações? É possível observar situações de resistência? Como se apresen-tam?

O estudo busca a compreensão e análise dos efeitos sofridos pelo trabalho docente de-correntes das políticas gerenciais e de responsabilização. Com efeito, termos como “repercus-sões”, “implicações”, impactos ou “regulações”, são utilizados em referência aos produtos e consequências dessa relação para os professores. No entanto, os termos ora mencionados co-nectam conceitualmente ao argumento de que há um movimento de racionalização do trabalho educativo ocasionando, para o professorado, “[...] certa desqualificação, separação de funções conceituais e perda de controle sobre seu trabalho. Em geral, se pode admitir a ideia de que suas

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condições de trabalho estão sendo desvalorizadas com a racionalização” (JÁEN, 1986, p. 62). Por outro lado, a impossibilidade de separação definitiva entre a concepção e a execução no processo de trabalho docente faz com que o Estado desenvolva formas de racionalizar o traba-lho dos professores, e afastá-los de momentos e situações de reflexão, remetendo-os ao controle pelo viés técnico (CONTRERAS, 2002).

Inúmeras indagações podem ser elaboradas, a partir da relação que se estabelece entre a apropriação da lógica empresarial nos meios educacionais; a crescente tendência de utilizar as avaliações externas como critério de gestão da educação; e as repercussões para o trabalho docente no EM. Nesse sentido, para fins de análise, foram considerados os seguintes programas da SEE/SP: Saresp; SPfe; PQE; BR; Sistema de Promoção por Mérito aos Integrantes do Qua-dro do Magistério; e o Educação – Compromisso de São Paulo.

A formulação dos objetivos específicos orientou a trajetória metodológica, de forma a:

• Identificar os elementos gerenciais contidos nos programas que fundamentam a gestão dos professores;

• Analisar os desdobramentos das políticas gerenciais e de responsabilização sobre o trabalho docente, especificamente, nas relações professor/professor e professor/direção escolar (direção e professor coordenador pedagógico) do EM noturno;

• Caracterizar o posicionamento dos professores sobre as medidas implementadas; e

• Verificar e caracterizar possíveis movimentações de resistência às políticas implementadas.

A discussão proposta a partir desta pesquisa considera o momento porque passa o capi-talismo e as movimentações da classe burguesa e suas frações na incessante busca pela hege-monia dos processos de produção e reprodução do capital. Do mesmo modo, leva em conta a movimentação das classes que, antagonicamente organizadas, complexificam a própria reali-dade, a partir da materialização e do desdobramento de cada projeto societário, inscritos, em última instância, como elementos de uma única unidade. A organização objetiva da humanidade permite que os vínculos, as conexões e ligações entre os sujeitos e a própria realidade seja orientada, de certo modo, segundo sua posição relativa à produção material dessa própria rea-lidade, oferecendo, portanto, distintas formas de relacionamento com o mesmo real.

A complexidade, no entanto, parece manifestar-se como a principal identidade da reali-dade, povoando-a a partir de um senso instrumental, pragmático, imediato, revelando-a como o mundo dos meios, dos fins em si mesmos, de modo que o sujeito cria suas próprias

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representações a partir da apropriação rígida do fenômeno, propiciando um cotidiano que pe-netra em sua consciência e assume um caráter independente, natural, estático e não histórico (KOSIK, 2002).

É preciso ir além. O mundo não pode ser considerado a partir de um conjunto de cone-xões finitas e acabadas. Mas, pelo contrário, como processos “[...] complexos nos quais as coi-sas e seus reflexos intelectuais em nossos cérebros, os conceitos, estão em mudanças contínuas e ininterruptas de devir” (SANFELICE, 2008, p. 75), exigindo do pesquisador um esforço do pensamento para captar a movimentação do real e, a partir das mediações necessárias e impres-cindíveis, avançar sobre o sincretismo do fenômeno em direção à realidade concreta.

A reforma educacional, foco desta pesquisa, apresenta-se por meio dos diversos progra-mas implementados nas escolas da rede estadual paulista e objetiva, acima de tudo, oferecer regulações segundo finalidades específicas ao ambiente escolar e seus sujeitos. Entre as propo-sições mais amplas que determinam a orientação da política educacional, há determinações que fogem aos pressupostos imediatamente educacionais, sugerindo, por vezes, mediações a partir do campo econômico, seja em âmbito nacional como no internacional.

Por outro lado, cada unidade escolar apresenta, potencialmente, possibilidade de rein-terpretação e resistência, por parte de seus sujeitos, sugerindo que aspectos contraditórios, or-ganizados segundo interesses e posições distintas, sejam elementos que impelem a linearidade das intenções contidas nas políticas e, concomitantemente, produzindo marcas, efeitos, trans-formações, se constituindo em tendências ou manifestações e, exigindo, nesse sentido, uma forma de pensar, cuja dinâmica possibilite a apreensão do caráter transitório ou relativo da ver-dade, a partir da prática social. Conforme Goldmann (1979, p.7), “o pensamento é uma opera-ção viva, cujo progresso é real sem ser, entretanto, linear e, sobretudo, sem nunca estar aca-bado” (grifos do autor).

Compreender, minimamente, como as determinações mais amplas se relacionam aos programas amparados em plataformas gerenciais, meritocráticas e de responsabilização que, por sua vez, acabam oferecendo implicações para o trabalho docente, exige penetrar na reali-dade, desvelar o que é central e não secundário, entendendo que os fenômenos relativos ao problema citado são elementos parciais, partes que apenas ganham significado quando enten-didos por seu lugar no conjunto, implicando, inevitavelmente, que o não conhecimento de um inviabiliza o conhecimento dos outros (GOLDMANN, 1979).

O todo inicialmente manifestado por representações caóticas da realidade, ou seja, por sua expressão fenomênica, portanto, pode e é apreendido antes pela opinião e experiência, no entanto, para ir além da forma imediata de captação da realidade, se exige do indivíduo um

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detour, ou seja, a possibilidade de o concreto tornar-se compreensível dar-se-á pela necessária

mediação do abstrato, da mesma forma como o todo tornar-se-á compreensível pela mediação da parte (KOSIK, 2002).

Logo, para progredir do abstrato ao concreto, exige-se um movimento do pensamento e no pensamento, negando a própria imediaticidade. É um movimento “[…] da parte para o todo e do todo para a parte; do fenômeno para a essência e da essência para o fenômeno; da totalidade para a contradição e da contradição para a totalidade; do objeto para o sujeito e do sujeito para o objeto” (KOSIK, 2002, p. 37).

A própria realidade é composta por uma multiplicidade de relações em desenvolvi-mento, cabendo ao pesquisador o papel de desvelar e compreender a centralidade, a essência (FREITAS, 2007). Aproximando o debate para os propósitos da pesquisa, é possível afirmar que, atualmente, se evidencia uma disputa enfática tanto pela concepção de educação pública como pelo controle do aparelho escolar. Freitas (2012, 2014) e Frigotto (2010) exploram e con-textualizam os desdobramentos desse processo e as repercussões para os professores do ponto de vista das condições de trabalho, assim como para a formação dos estudantes. A reflexão dos autores caminha no sentido de que o controle da educação em seus amplos aspectos relaciona-se aos interesrelaciona-ses operados por empresários em atendimento às demandas de formação da força de trabalho para a reprodução e ampliação do próprio capital.

Entretanto, as relações que englobam hoje a disputa pelos caminhos da educação, assim como os demais segmentos, se apresentam de maneira sincrética, carregada de contradições e perpassada pelo jogo ideológico, ofuscando ainda mais o entendimento desse contexto e exi-gindo do pesquisador rigorosidade metodológica para adentrar e compreender a realidade. Con-siderando que a pesquisa busca apreender as implicações das políticas da SEE/SP para o traba-lho docente, é preciso, no entanto, localizar no fenômeno o caminho para o concreto; identificar o todo e em relação às partes; e caracterizar a própria relação entre sujeito e objeto em meio ao movimento do real que se apresenta, imediatamente, de forma complexa e confusa. No entanto, questiona-se

Mas quais seriam as relações da parte com o todo? Queremos saber sobre o movi-mento do objeto. Aprofundar no seu conhecimovi-mento é um caminhar do fenômeno à essência e isso nos leva a infinitas possibilidades. Sem explicar o movimento e as contradições, pouco se faz. O pensamento precisa sempre estar aberto à própria coisa que num claro-escuro se mostra e se esconde. Mas sabemos que este pensamento si-tuado, terá o seu mirante de onde olha e este lhe dá o seu alcance e seu limite. (SAN-FELICE, 2008, p. 85).

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A partir desse cenário, como localizar o trabalho docente exercido na escola, conside-rando o constante movimento entre as partes e o todo? O que deve ser levado em conta na tentativa de captar os elementos essenciais que interseccionam as múltiplas relações nas quais a organização do trabalho pedagógico está inserida? Como referir o trabalho docente às deter-minações mais amplas do capital sem, no entanto, secundarizar, ou mecanizar, as especificida-des que dão corpo a essa atividade? De que maneira é possível relacionar o trabalho docente às políticas da SEE/SP e captar repercussões ou impactos? Espera-se, ao longo do trabalho, res-ponder a tais questões à altura exigida pela problemática.

O segmento, ou seja, o lócus do estudo é o EM noturno da rede estadual paulista da cidade de Campinas. Autores como Kuenzer (2010) e Costa e Oliveira (2011) afirmam que as políticas de regulação do trabalho dos professores vêm ganhando espaço, de modo que os estu-dos que se voltam para as repercussões das políticas gerenciais e de responsabilização para a última etapa da Educação Básica não são numerosos, revelando, dessa forma, a necessidade de mais pesquisas. Costa e Oliveira (2011) e Schmitz (2011) apontam que a maioria dos professo-res desse segmento tem grandes quantidades de aulas, turmas, estudantes; trabalha nos três tur-nos, e muitos desenvolvem outra atividade remunerada em caráter complementar, assim como sofrem processos de precarização e intensificação do trabalho docente.

Também justifica o olhar para o EM, sobretudo o noturno, a escassa produção científica no Brasil voltada à relação entre trabalho docente, práticas pedagógicas e as políticas gerenciais, meritocráticas e de responsabilização. Em países cuja aplicação de tais reformas já completaram décadas, como é o caso dos Estados Unidos da América (EUA), Inglaterra e Chile, a produção de estudos demonstra fôlego, constituindo importante base de dados para os estudos brasileiros.

Nesse sentido, a escolha pelo EM deu-se por alguns fatores, externos e internos. As justificativas externas que levaram à pesquisa desta etapa originam-se na consulta à literatura específica e a indicação de que há poucos estudos associando políticas gerenciais e de respon-sabilização ao EM. Essa constatação tornou-se um estímulo a mais, uma vez que o conheci-mento produzido colaborará na compreensão desse segconheci-mento educacional. As justificativas in-ternas dizem respeito à trajetória acadêmica e às discussões que fazem parte do grupo de pes-quisa da qual faço parte, o Laboratório de Observação e Estudos Descritivos (Loed)7 da

7 O Laboratório de Observação e Estudos Descritivos (Loed) participa da Área 4, denominada Ensino e Práticas

Culturais, inserindo-se no campo da avaliação educacional criada para apoiar estudos de Mestrado e Doutorado. Responsáveis: Prof. Dr. Luiz Carlos de Freitas, Profa. Dra. Maria Marcia Sigrist Malavasi, Profa. Dra. Mara Regina Lemes de Sordi, Profa. Dra. Adriana Varani. Essa linha tem por finalidade enfatizar estudos de mestrado e doutorado no campo da avaliação, com avaliações institucional, escolar e de sistemas.

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Faculdade de Educação (FE) da Universidade de Campinas (Unicamp), ou seja, tanto a trajetó-ria acadêmica deste pesquisador como o grupo de pesquisa apontam para áreas de estudo se-melhantes, propiciando, portanto, as condições favoráveis para definição do objeto de pesquisa.

Em relação aos aspectos metodológicos, na pesquisa, trabalhou-se com quatro escolas que ofereciam o EM noturno8. Para tanto, o procedimento de escolha utilizou os índices (Índice

de Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo - Idesp) das 89 escolas de Campinas, numa perspectiva longitudinal – recorte de tempo entre 2008 e 2014. Com base nesse procedi-mento, as unidades escolares foram organizadas a partir dos maiores e menores desempenhos, segundo o Idesp.

Outro recurso utilizado de forma concomitante no processo de escolha das unidades foi a técnica conhecida como Análise Envoltória de Dados (Data Envelopment Analisys - DEA). A iniciativa permitiu que o processo não se orientasse exclusivamente por variáveis oriundas do sistema de avaliação externa em larga escala, incluindo, dessa forma, outras características como critério de seleção.

A DEA permite construir uma medida de eficiência para determinar a produtividade da escola segundo fatores expressos em termos não estritamente econômicos, isto é, indicando outras características que se inscrevem para além dos resultados quantitativos. Desse modo, a partir da DEA, foi possível organizar as escolas em níveis de eficiência distintos (+ Eficientes; - Eficientes; e as Eficiências Intermediárias).

O passo seguinte foi efetuar uma análise comparativa entre as diferentes formas de ca-racterização das escolas (Idesp e DEA) e encontrar quais apresentavam intersecções, ou seja, grupo 1 maiores desempenhos (Idesp)/+ Eficientes ou Eficiências Intermediárias e grupo 2 me-nores desempenhos (Idesp)/- Eficientes. Das idas e vindas, foram escolhidas quatro escolas, que representaram as características dos grupos 1 e 2. Os sujeitos da pesquisa somaram ao todo dezoito profissionais, dentre os quais dez eram professores e oito da gestão escolar. Os instru-mentos de coleta de dados foram organizados a partir do tripé: observação das unidades esco-lares; entrevista com os sujeitos; e pesquisa documental.

Desenho da tese

A tese orgniza-se em seis capítulos. O primeiro, O sistema de metabolismo social do capital, o processo de reestruturação produtiva: as implicações para a gestão, foram discutidos

8 Além do EM noturno, as escolas ofereciam outras etapas da educação básica, como, por exemplo, EF Anos

Ini-ciais e Finais, Educação de Jovens e Adultos. Para obter detalhes, verificar o Quadro 7 – Dados das escolas pes-quisadas.

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as intersecções entre os imperativos do sistema socioeconômico, os desdobramentos e caracte-rísticas da administração científica (taylorismo) e a conformação do princípio educativo ati-nente à hegemonia do padrão de acumulação vigente.

No segundo capítulo, Gerencialismo e responsabilização: elementos da constituição he-gemônica da organização e gestão do trabalho docente, a discussão envolveu as transformações ocorridas no Estado e o advento do gerencialismo (Nova Gestão Pública) como elemento cen-tral da gestão da educação. Destaca-se ainda, a problematização dos principais modelos de res-ponsabilização (accountability) e pagamento por mérito.

No terceiro capítulo, A política educacional paulista: sistematizando os elementos ge-renciais e de responsabilização, a partir dos seis programas da SEE considerados foram levan-tados e analisados características gerenciais e de responsabilização de cada uma das inicitivas.

Ao longo do quarto capítulo, Considerações acerca do percurso metodológico, são apre-sentados o processo de escolha das escolas; os instrumentos metodológicos e os sujeitos da pesquisa, assim como, a técnica de análise dos dados utilizada.

O último capítulo, As repercussões das políticas gerenciais e de responsabilização no trabalho docente, traz os dados de pesquisa levantados a partir dos instrumentos metodológicos, além de anunciar os resultados da análise organizando-os em um conjunto de revelações envol-vendo tanto o trabalho docente como outras relações intrínsecas à organização do trabalho pe-dagógico. Por fim, nas Considerações finais, com base nos questionamentos e objetivos da pes-qusia, são retomados os principais resultados e, ao mesmo tempo, anunciados novas possibli-dades de estudo desencadeados pelos achados.

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1. O SISTEMA DE METABOLISMO SOCIAL DO CAPITAL E O PROCESSO DE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA: AS IMPLICAÇÕES PARA A GESTÃO

De modo geral, são cada vez mais recorrentes, na produção do conhecimento, certo praticismo e o esvaziamento teórico das pesquisas, a partir da argumentação de que o ato de teorizar é relativizado por ser mais uma estrutura discursiva entre tantos discursos, ou pela teoria ser compreendida como especulação pura e simples, que se distancia dos aspectos reais que marcam um suposto “saber fazer” (MORAES, 2001).

Tal ponto de vista é passível de algumas considerações, uma vez que as relações processadas no dia a dia da escola acabam, muitas vezes, se colocando como sinônimo legítimo da realidade e passam a ser compreendidas como produto final e não um fenômeno, fragmento de um todo que se apresenta de maneira sincrética e esconde, por assim dizer, relações amplas, articuladas, que se assentam em níveis profundos, mais amplos e complexos.

Na busca da objetividade do movimento real e de seus desdobramentos, deve-se considerar o cotidiano, porém, sem perder de vista que é preciso desvelar tal empiria e penetrar a realidade, em busca do que é central e não secundário, entendendo que os fenômenos relativos ao problema são elementos parciais, partes que apenas ganham significado quando entendidos por seu lugar no conjunto (GOLDMANN, 1979).

Assim como o método, a teoria, sem dúvida, nos oferece uma base racional e crítica para que possamos entender e avançar na compreensão do real. Na educação, a reflexão teórica permite desnudar determinados discursos que, além de postular suposta centralidade, ressignificam um conjunto de conceitos e categorias, com o objetivo de sedimentar visões praticistas e pretensamente técnicas de planos, reformas e orientações de instituições econômicas, que lhe dão forma e corpo, e se colocam como verdades absolutas (MORAES, 2009).

Dessa maneira, compreender a escola e seus processos intrínsecos, de forma isolada da análise da própria sociedade em que se insere, é aventurar-se em caminhos que não apontarão para respostas coerentes, mas serão devaneios que não explicarão a complexidade de tais relações. Atualmente, muito se fala na centralidade de uma educação de qualidade que favoreça o desenvolvimento do País e seja suporte para o crescimento econômico. Entretanto, é comum a literatura específica apresentar variação para esse conceito, com significados que se relacionam desde a intervenções orientadas por construções democráticas e coletivas no interior das escolas, como também associados a reformas verticalizadas sob a influência de organizações internacionais e empresariais. Enfim, propostas que se pautam por projetos societários fundamentalmente antagônicos.

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Os aparelhos privados de hegemonia, principalmente os organismos internacionais, as agências de análise de risco, organizações corporativas empresariais, e organizações da sociedade civil, tal como o movimento Todos pela Educação (TPE)9, entre outros, cada vez

mais consideram a importância de certo perfil educativo coerente com as necessidades colocadas pela economia altamente competitiva e globalizada10. Embora a educação não seja o

principal objeto, é elemento necessário e importante para a produção e reprodução do capital e tem se tornado, atualmente, processo singular na formação da força de trabalho, fato este confirmado nas inúmeras produções dos organismos internacionais (DE TOMMASI; WARDE; HADDAD, 2003; MORDUCHOWICZ, 2003; VIANNA JR, 1998; RODRIGUES; OLIVEIRA, 2013).

Não parece exagero afirmar que os processos educacionais gerais não fogem à regra, pois são perpassados pela mesma lógica que comanda os demais segmentos da sociedade capitalista. Ou seja, para que os imperativos metabólicos fundamentais do capital se realizem, observam-se relações de sujeição, não sem resistência, às exigências de controle. Para tanto, que relações se estabelecem entre os objetivos de produção e reprodução do capital e as relações educativas? Em que medida tais processos são afetados e de que maneira se apresentam?

Para se debruçar sobre a realidade escolar e compreender a situação que hoje circunscreve a organização do trabalho docente e as intersecções entre a escola e os aspectos sociais mais amplos, será necessário o aporte esclarecedor dos pressupostos que marcam a imanente condição de produção e reprodução do capital e como tal lógica se expande para além do estritamente econômico, vindo a afetar outros domínios, como a organização do trabalho docente.

Para tanto, a partir dessa necessidade, serão problematizados, de maneira breve, os

9 O programa Todos pela Educação foi fundado em 2006 e, segundo o site, é um movimento da sociedade civil

com o objetivo de assegurar que todas as crianças e jovens tenham o direito à Educação Básica de qualidade. Consideramos que tal movimento é, atualmente, um dos mais influentes “intelectuais orgânicos coletivos” (NE-VES, 2010) cujo objetivo articula-se a uma visão específica de qualidade educacional associada umbilicalmente aos pressupostos do mercado e de uma nova sociabilidade da classe dominante. Segundo o TPE (2013) é “[...] um movimento financiado exclusivamente pela iniciativa privada, que congrega sociedade civil organizada, educado-res e gestoeducado-res públicos [...]”. Conforme o relatório Sistema de Ensino Privado na Educação Pública Brasileira (2015, p. 28) “em 2013 o Todos pela Educação era integrado, dentre outros representantes de grupos empresariais e instituições bancárias de grande porte, por: grupo Pão de Açúcar; Fundação Itaú social; Instituto Gerdau; grupo Suzano; Sesc-SP; Fundação Bradesco; Banco Santander; Iochpe-Maxion S.A. e Fundação Iochpe; Fundação Ro-berto Marinho e sócio das organizações Globo; Fundação Educar DPaschoal e Instituto Ayrton Senna; Instituto Faça Parte, do Centro de Voluntariado de São Paulo e embaixadora da Boa Vontade da Unesco; Instituto Itaú Cultural.

10WORLD BANK, Learning for all: investing in people’s knowledge and skills to promote development, World

Bank Group Education Strategy 2020. Washington: The World Bank Group, 2011; ROBERTSON, S. L. A estranha não morte da privatização neoliberal na estratégia 2020 para a educação do Banco Mundial. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro. v. 17, n. 50, maio/ago. 2012; LAUGLO, J. Críticas às prioridades e estratégias do Banco Mundial para a educação. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, n. 100, mar. 1997.

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elementos constituintes do sistema de metabolismo social do capital, como fundamento inicial para a compreensão das relações que se dão para além do estritamente econômico e, posteriormente, como tais relações influenciam a organização escolar, sobretudo o trabalho docente.

1.1 O sistema de metabolismo social do capital: breves considerações

Assim como não há dúvida a respeito da hegemonia do modo de produção tipicamente capitalista, também não há de que os desdobramentos necessários à acumulação e expansão do capital representam desastrosas consequências para a humanidade. Por um lado, o sistema do capital atingiu um grau de eficiência produtiva inédito, na história, com formas e tecnologias cada vez mais sofisticadas, acumulando, concomitantemente, um conjunto considerável de conhecimentos afins. Por outro, o capital produz não somente mercadorias voltadas exclusivamente para o valor de troca, mas, de maneira intrínseca, promove e reproduz, em escalas sempre crescentes, relações cujo produto se materializa na pobreza, indigência e sujeição subjetiva dos indivíduos aos desígnios impostos (MARX, 1978).

A eficiência representada pelo baixo custo de produção das mercadorias (extração das mais-valias relativa e absoluta) antagoniza, na mesma medida, com o agraciado consumo e desperdício dos mesmos objetos anteriormente originados pela mais ávida racionalidade econômica, isto é, o sistema do capital, em um primeiro momento, busca, de maneira desenfreada, o menor custo de produção para, em seguida, expandir as relações em que a taxa de utilização das mercadorias seja decrescente (MÉSZÁROS, 2011). Devem, portanto, ter o menor tempo útil de uso para garantir, dessa forma, o constante consumo, numa lógica permeada pela racionalidade do menor custo na produção, que conta com o maior desperdício no consumo das mercadorias produzidas.

Não há limites para o capital. Sua forma imanente supera os amplos impedimentos legais e extraeconômicos que cerceiam sua movimentação nas inúmeras esferas da produção (MARX, 1978). Certamente, a subsunção à lógica do capital das funções primárias de mediação (MÉSZÁROS, 2011) – as quais poderiam garantir relações vitais, estruturais e fundamentais para o conjunto da humanidade – favorecem o desencadeamento de inúmeros conflitos e guerras; induzem níveis avançados de degradação ambiental; e a deterioração cada vez mais sistemática das condições de trabalho, como o desemprego estrutural e a precarização crescente das condições dos trabalhadores.

Ao partir da noção de totalidade das relações, o intuito é esboçar, minimante, um conjunto argumentativo lógico que permita compreender as relações entre os imperativos do

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capital e os diversos domínios sociais. Uma compreensão que possa servir de base aos desdobramentos de tais imperativos para além da esfera do estritamente econômico, possibilitando, dessa forma, a adequada análise das manifestações e, ao mesmo tempo, respeitando as especificidades que permeiam os processos associados à organização do trabalho docente e sua relação com as políticas gerenciais e de responsabilização.

1.1.2 Os sistemas de mediação de primeira e de segunda ordens

Pode-se questionar se não é tautologia explorar, para fins de um estudo sobre as repercussões para o trabalho docente, as leis mais amplas que condicionam a produção do capital. Sobre tal questão, recorre-se à afirmação de Marx (2008, p. 243), quando responde a certas análises econômicas que fragmentam a realidade destituindo-a de seu caráter histórico, já

[...] que cada forma de produção cria suas relações de direito, suas formas de governo próprias. A grosseria e a incompreensão consistem precisamente em não relacionar, senão fortuitamente, umas às outras, em não enlaçar, senão no domínio da reflexão, elementos que se acham unidos organicamente.

É preciso, no mínimo, captar os elementos que, indiretamente, fundamentam, organizam e dimensionam as relações sociais frutos de um modo específico de produção e, certamente, seus desdobramentos. Para esse fim, o sistema de mediações de primeira e de segunda ordem proposto por Mészáros (2011) parece colaborar significativamente para o entendimento do

modus operandi do capital e permitir as necessárias relações que se situam para além do

estritamente econômico.

Segundo Antunes (2009, p. 21), o sistema de metabolismo social do capital tem seu advento como resultado da própria divisão social, que permitiu a subordinação estrutural do trabalho ao capital, de modo que os próprios indivíduos sociais “[...] tornaram-se mediados entre si e combinados dentro de uma totalidade social estruturada, mediante um sistema de produção e intercâmbio estabelecido. Um sistema de mediações de segunda ordem sobredeterminou [...] suas mediações de primeira ordem”. As mediações primárias pretendem garantir as condições objetivas de sua reprodução sob situações que mudam, de forma inevitável e progressivamente, como resultado de sua própria intervenção, por meio da atividade produtora. Diferentes das mediações de segunda ordem, as primeiras mediações devem garantir a reprodução do metabolismo social, por meio de imperativos racionalmente controláveis e humanamente compensadores (MÉSZÁROS, 2011). Consequentemente, duas características inalteráveis marcam o sistema de mediações de primeira ordem:

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1) os seres humanos são uma parte da natureza que deve satisfazer suas necessidades elementares por meio de um constante intercâmbio com a natureza – e... 2) eles são constituídos de tal maneira que não podem sobreviver como indivíduos da espécie a que pertencem (a única espécie “intervencionista” do mundo natural) num intercâmbio não mediado com a natureza – como fazem os animais – regulado pelo comportamento instintivo diretamente determinado pela natureza, por mais complexo que seja esse comportamento instintivo dos animais. (MÉSZÁROS, 2011, p. 212, grifos do autor).

A partir das mediações de primeira ordem é que os indivíduos devem garantir sua própria reprodução e estabelecer intercâmbio entre si e com a natureza, mediados pela atividade produtiva, isto é, a ação imanente ao ser humano: o trabalho. As funções vitais de primeira ordem permitiriam à humanidade um rearranjo societário qualificadamente distinto do que se observa hoje, a partir da predominância das funções de segunda ordem, que visam à expansão das relações de valor de troca em detrimento das que se organizam a partir do valor de uso. Destaca-se que as mediações primárias incorporam processos que garantem a reprodução tanto do indivíduo como de suas complexas e amplas condições, sempre a partir da ação sócio-histórica. Tais condições são inscritas como:

a regulação da atividade reprodutora biológica, mais ou menos espontânea […], em conjunto com os recursos disponíveis; a regulação do processo de trabalho […]; o estabelecimento de relações adequadas de troca […]; a organização, a coordenação e o controle das múltiplas atividades pelas quais se asseguram e se preservam os requisitos materiais e culturais para a realização de um processo bem-sucedido de reprodução sociometabólica das comunidades humanas cada vez mais complexas; a alocação racional dos recursos humanos e materiais disponíveis […]. Como se pode ver, nenhum desses imperativos de mediação primária exige, em si e por si, o estabelecimento de hierarquias estruturais de dominação e subordinação como o quadro indispensável da reprodução sociometabólica. As determinações opressivas dos modos hierárquicos de controle da reprodução surgem de outras raízes no curso da história. Inevitavelmente, as mediações de segunda ordem de sistemas de reprodução social historicamente específicos afetam profundamente a realização de quaisquer das funções de mediação primária. (MÉSZÁROS, 2011, p. 213).

A análise pressupõe, como condição indispensável, a ação humana, em perspectiva histórica, e a complexidade do intercâmbio entre os seres humanos e a natureza; e, entre si, como fatores objetivos de construção de dada realidade. O autor caracteriza, dessa maneira, um conjunto de possibilidades de intercâmbio que levaria a uma constituição societária qualificadamente diferente da que vivemos hoje.

É interessante e essencial, para o desenvolvimento desta tese, o entendimento do que Mészáros (2011) denominou de mediações de segunda ordem do capital. Essencial, uma vez que é a partir desse conceito e de sua problematização que se efetuam as possíveis relações

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entre a lógica expansionista do capital e os demais domínios sociais.

Historicamente, o advento das mediações de segunda ordem do capital articula-se com a própria constituição do sistema do capital que, segundo Mészáros (2011, p. 188),

[…] não passa de um modo e um meio dinâmico de mediação reprodutiva, devorador e dominador, articulado como um conjunto historicamente específico de estruturas e suas práticas sociais institucionalmente incrustadas e protegidas. É um sistema claramente identificável de mediações que, na forma adequadamente desenvolvida, subordina rigorosamente todas as funções de reprodução social – das relações de gênero e família até a produção material e a criação das obras de arte – à exigência absoluta de sua própria expansão, ou seja: de sua própria expansão constante e de sua reprodução expandida como sistema de mediação sociometabólico.

As mediações de segunda ordem operam e avançam diretamente entre a crescente destruição das relações fundadas nas mediações de primeira ordem, entre os seres humanos e entre estes e a natureza, e a constituição de novas mediações qualitativamente redimensionadas. Se, antes, o valor de uso e as necessidades vitais predominavam nas condições objetivas de organização societária, agora, são as relações pautadas pelo valor de troca que detêm centralidade. A imanência dos imperativos voltados para a reprodução expansiva do capital tem sido a marca permanente desse sistema que supera as diversas barreiras impostas conformando relações aos propósitos perseguidos. Nesse sentido, a segunda ordem de mediações do sistema do capital apresenta as seguintes características:

• A família nuclear que articula, como microcosmo da sociedade, as relações do macrocosmo social;

• Os meios alienados de produção e suas diversas personificações, cuja atribuição torna-se a imposição do capital;

• O dinheiro e as suas formas;

• A submissão das necessidades humanas às formas fetichizadas da produção, submetendo-a aos imperativos de expansão e acumulação;

• Separação e alienação do trabalho e do trabalhador de seus meios de produção; as diversas formações e características do Estado na relação direta de garantia e proteção para o funcionamento da incontrolabilidade do mercado mundial (MÉSZÁROS, 2011).

O conjunto constituinte das mediações de segunda ordem do capital organiza-se e opera unido organicamente, sustentando-se de maneira recíproca com objetivos claros, não somente para sua reprodução e expansão, mas, também, para a constante autorregeneração e

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