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Antropofagia processual: a evolução dos procedimentos especiais no código de processo civil brasileiro

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CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

DEPARTAMENTO DE DIREITO

CAIO EDUARDO DE SOUZA DIAS

ANTROPOFAGIA PROCESSUAL:

A EVOLUÇÃO DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS NO CÓDIGO DE

PROCESSO CIVIL BRASILEIRO

Florianópolis 2019

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ANTROPOFAGIA PROCESSUAL:

A EVOLUÇÃO DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS NO CÓDIGO DE

PROCESSO CIVIL BRASILEIRO

Trabalho de Conclusão de Curso submetido ao Curso de graduação em Direito da Universidade

Federal de Santa Catarina para a obtenção do grau de bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Dr. Marcus Vinícius Motter Borges

Florianópolis 2019

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Após um processo extenuante, porém, extremamente gratificante que é a produção científica, agradeço primeiramente, e antes de mais nada, a poder escrever em primeira pessoa do singular. Como é praxe escrever os agradecimentos por último em um trabalho, está sendo um momento de catarse, fecha-se o ciclo da graduação.

A produção científica é edificante e não poderia ter sido possível sem tudo o que a Universidade Federal de Santa Catarina me proporcionou. Foi minha casa em mais de uma ocasião e agradeço pelos espaços, oportunidades e pessoas que me proporcionaram e, literalmente, me fez a pessoa que tenho orgulho de ser hoje. Por isso, reitero a importância desse espaço e a necessidade da proteção, desenvolvimento e investimento no ensino superior público, de qualidade e democrático.

Ao meu orientador, Marcus Vinícius Motter Borges, agradeço pelas referências bibliográficas para a conclusão deste trabalho e por despertar o interesse do processo civil em mim desde sua primeira aula com sua didática e dedicação pelo Direito.

Agradeço igualmente à Nadine Pires Salomon por ser tão solicita em participar de minha banca avaliadora e por toda benevolência com prazos que sempre acreditei que apenas seres celestiais possuíssem tamanha virtude. Nunca mude.

Mesmo não presente, gostaria de agradecer a Luiza Silva Rodrigues por ter sido igualmente solicita em participar de minha banca, porém, por desencontros e situações que a vida jurídica demanda não pode comparecer. Me planejarei para no mestrado a avaliação ocorrer sem desencontros.

Gostaria de agradecer aos meus supervisores de estágio na Defensoria Pública da União, que tanto me ensinaram e, com certeza, me moldaram como futuro profissional. Como profissional especialmente, ao supervisor do atendimento Douglas Moresco que me ensinou muito sobre ética, respeito e profissionalismo no ambiente de trabalho da Defensoria, além de humanidade e confiança nas tardes de atendimento do Centro POP com a população de rua.

Aos meus colegas de estágio na Defensoria que desenvolvi uma grande amizade que espero conservar ao longo do tempo, Douglas Laurindo, Cíntia, Bruna,

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Obrigado pelas conversas, pelos conselhos e experiências, que as próximas experiências sejam logo.

Aos meus colegas de sala, muitíssimo obrigado e mil desculpas por esses cinco anos de graduação juntos, em especial ao Luiz Henrique, Larissa, Érico, João Pedro, Nathalia Schutz, Alexandra, Luana, Yasmin, Diego, Matheus, Karol, Sarah, Giovana. Agradeço especialmente ao Andrey por ser o primeiro amigo que fiz na faculdade e fico feliz que ainda o posso chamar assim. Caline Sartori, eu não poderia pedir por uma melhor dupla de NPJ, agradeço por esse curto semestre que dividimos e espero que você tenha aproveitado tanto quanto eu, desejaria sucesso profissional, contudo, tenho certeza que isso virá naturalmente.

Aos amigos que são tão bons em análises políticas quanto em festas de aniversário, Talita, o meu parceiro de Twitter Guilherme, Artur Brandes e Milena Barbi. Em especial à Milena, agradeço por ser essa amizade maravilhosa – e agradeço a paciência nesse período de TCC por não chamar pra sair – e espero que permanente, que sorte que tivemos em nos esbarrar na faculdade.

Bruna e Bayer, queridos amigos que tenho perto do peito, espero que nossa amizade floresça, pois, são uma força positiva na minha vida, assim como eu espero que eu seja na de vocês. Além, almejo ser apenas um pouco tão dedicado e compromissado quanto vocês com a educação, o estudo e a universidade.

Agradeço aos nem tão recentes amigos, Renê, Lua, Isa, Tonon, Caio, Luan e agora a recém-chegada Ana Luta que por eu ser uma pessoa horrível sem caráter tive a cara de pau de ainda não conhecer. Valorizo muito a amizade de vocês e agora com a tormenta passando, espero que possamos criar mais experiências memoráveis juntos.

Aos meus mais queridos amigos que amo tanto, que nem a distância ou o tempo pode separar, Carlota, Pedro, Censi, Binho, Tito, Foca, Leo, Jeka, Liloh e, em especial, ao casal que me deu a honra de ser o padrinho de casamento, Júlia e Marcos, eu só posso agradecer, obrigado por estar presente, construir memórias, zelar e retribuir o amor que eu sinto por vocês. O sentimento é realmente de agradecimento.

William, obrigado por ser esse amigo com um coração enorme que sempre esteve presente, é uma aspiração ao advogado que almejo ser e um jurista dedicado além de brilhante. Espero que suas novas empreitadas deem frutos o quanto antes e

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responsáveis do que sou profissionalmente e como pessoa.

A Íris, Eduardo pai, Eduardo Júnior e Luiz Antônio, obrigado por me acolher no seio familiar e me dar o suporte que muitas vezes me faltava devido à distância da cidade de minha própria família. Agradeço muito pelo suporte, carinho e por dividir o Rio de Janeiro comigo, este trabalho também é dedicado a vocês.

A minha companheira, amiga, confidente e porto seguro. Iara, obrigado por absolutamente tudo o que me proporcionou, obrigado por me aturar, por me motivar, por ouvir e conversar mesmo quando não está a fim. Obrigado por poder ser ambicioso junto com você, por ter criado o desejo de viajar em mim, por me acalmar nos momentos de dúvida e ser sempre alguém que posso contar pra me guiar quando necessário. Você fez parte dessa experiência que foi a graduação e me ajudou a ser quem sou, muito obrigado por isso.

A minha família, meu pai Ary e minha mãe Madalena, dedico este trabalho a vocês. Obrigado por me dar o suporte necessário para me formar, para concretizar meus sonhos, para correr atrás do que desejo. Obrigado por ser esses modelos que sempre tenho em mente nas relações interpessoais e principalmente nas relações profissionais, obrigado pelo apoio ao longo de todos esses anos. Agradeço a atenção, ao cuidado e ao carinho, sou convicto que o sentimento são tantos que muitas vezes as palavras não suportam.

Por fim, agradeço aquele que foi o único que me acompanhou em todas as tortuosas madrugas, noites, tardes e manhãs me fazendo companhia, nos momentos de felicidade e dúvida, que, ironicamente, não consegue ler uma única página sequer deste trabalho, Jorge, obrigado por ser meu cachorro.

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O Código de Processo Civil de 2015 trouxe uma série de inovações que afetaram diretamente os procedimentos especiais, principalmente com uma série de mudanças relativas ao procedimento comum. Esta perspectiva desenha uma nova teoria emergente das técnicas dos procedimentos especiais no procedimento comum, sendo que isto se dá especialmente pelo reconhecimento de novos direitos e expansão da tutela jurisdicional. Inicia-se a caminhada a partir da definição de processo e sua relação íntima com a cultura e experiências que uma sociedade extrai da existência em um determinado tempo e espaço, posteriormente irá se analisar a origem dos pressupostos processuais, o surgimento do procedimento comum, os procedimentos especiais em sua visão clássica e, finalmente, as técnicas processuais no procedimento comum. Objetiva-se definir este processo metafórico antropofágico, onde a vazão dos sentimentos, anseios e demandas de uma sociedade são expressos não somente no direito material, porém e especialmente, no desenvolvimento da ciência processual civil, pois, muito mais importante do que definir o que é justo, deve-se definir como irá se proceder o justo.

Palavras-chave: Direito Processual Civil; Procedimentos especiais; Tutela

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The Code of Civil Procedure of 2015 brought a series of innovations that directly affected the special procedures, mainly with a series of changes related to the common procedure. This perspective draws a new theory emerging from the techniques of special procedures in the common procedure, and this is especially true for the recognition of new rights and expansion of judicial protection. The study will begin in the intimate relationship with the culture and experiences that a society extracts from the mere existence in a certain time and space, later it will be analyzed the origin of the procedural presuppositions, the emergence of the common procedure, the special procedures in their classical view, and finally, procedural techniques in the common procedure. The objective is to define this metaphorical anthropophagic process, where the feelings, aspirations and demands of a society are expressed not only in material law, but especially in the development of civil procedural science, therefore, much more important than defining what is fair, one must define how the righteous will proceed.

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ADC: Ação Declaratória de Constitucionalidade ADI: Ação Direta de Inconstitucionalidade Art.: Artigo

CF/88: Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CNJ: Conselho Nacional de Justiça

CPC: Código de Processo Civil En.: Enunciado

FPPC: Fórum Permanente de Processualistas Civis Inc.: Inciso

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INTRODUÇÃO 8

1. OS PROCEDIMENTOS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL 11

1.1 Fundamentos da processualística civil brasileira 11

1.2 Os pressupostos processuais e o procedimento comum 24

2. PROCEDIMENTOS ESPECIAIS NO CPC 34

2.1 A crença no procedimento universal e a tutela diferenciada 34

2.2 Características gerais clássicas dos procedimentos especiais 40

2.3 Substituição da obrigatoriedade e a mão dupla procedimental 46

2.4 O art. 1.049 do CPC e a ideia de codificação 50

3. TÉCNICAS DOS PROCEDIMENTOS ESPECIAIS NO PROCEDIMENTO COMUM 52 3.1 Autorização para a concessão de tutela provisória satisfativa 54

3.2 Redefinição das situações jurídicas processuais 55

3.3 Inversão do ônus de iniciativa ou monitorização do procedimento 56

CONSIDERAÇÕES FINAIS 58

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INTRODUÇÃO

Oswald de Andrade, um dos pioneiros do Modernismo no Brasil, em seu Manifesto Antropofágico cita a “antropofagia. Absorção do inimigo sacro. Para transformá-lo em totem”. O autor buscou, através da filosofia por trás do ritual antropofágico, empenhar-se não em destruir, mas absorver, tornar para si, transformar e incorporar corpos culturais estranhos e identificar a brasilidade. Neste sentido, o Direito é uma das grandes vazões de expressão de uma sociedade – tenta delinear e expressar este complexo social, econômico e cultural de um país.

Ocorre que este processo antropofágico de absorção cultural entra em choque, reiteradas vezes, com o assentamento da tradição jurídica, confundindo-se ser um processo caótico e desorganizado quando figura-se na realidade uma assimilação cultural de novas tendências mundiais, das quais o Brasil é tão receptivo. O Direito brasileiro acaba recebendo alcunhas pejorativas das quais não é merecedor, como jabuticaba ou ornitorrinco.

Com o advento do Código de Processo Civil de 2015, não restou diferente resultado do que sua sujeição a corpos jurídicos estranhos, porém, a mudança de paradigma referente aos processos judiciais não se entende como isolada no Brasil, mas acompanha um contexto de tendências mundiais, buscando a desjudicialização dos conflitos; racionalização dos processos; reestruturação da organização judiciária.

Ao analisar as características dos procedimentos especiais e a configuração do procedimento ordinário que a doutrina clássica os imputava, nota-se a rigidez própria do racionalismo iluminista que percebia o legislador como fundamento último de sua legitimidade, ou seja, buscava corretamente na legalidade o desenho da lógica jurídica.

Neste desenvolvimento, percebe-se a evolução da tutela jurisdicional, onde o ente público dá os respectivos encaminhamentos para as demandas das partes, não havendo espaço para autonomia dos envolvidos, incorporando perfeitamente a real ideia de tutela. É o sistema de direito positivo que filtra as demandas passíveis de serem veiculadas pelo processo e, por meio desta seletividade estrutural, é o Estado

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que escolhe os ritos, aos quais as demandas devem se conformar para encontrarem processamento admissível.

Porém, deve-se levar em conta que o Estado não consegue criar um procedimento tão genérico que dê conta de todas as demandas que os conflitos humanos podem se aventurar em criar.

Além, novos direitos reconhecidos e a geração de políticas públicas com sua eventual normatização também é canal de desenvolvimento processual e de garantia de tutelas diferenciadas.

Percebendo a mutabilidade social, justifica-se a criação dos procedimentos especiais e seus objetivos, isto é, garantir a tutela diferenciada de certas situações jurídicas, seja pela urgência, complexidade ou peculiaridade, notando que o direito material deve ser o requisito principal para a especialização do procedimento.

Sujeita-se, assim, a maior flexibilidade procedimental, sendo apenas possível com o CPC de 2015 a partir de específico aparato normativo, como o art. 190 do CPC, sendo norteador para a autotutela entre os sujeitos processuais; o art. 327, § 2º, do CPC, na construção de uma via de mão dupla procedimental, dando maior autonomia aos sujeitos processuais; o art. 1.049, do CPC, recepcionando a legislação extravagante e universalizando o procedimento comum, prestigiando o ideal de codificação e valorizando o legislador.

Grifa-se, porém, que esta nova perspectiva muitas vezes não é recepcionada pelos operadores jurídicos brasileiros, havendo necessidade de maior aprofundamento e debate da questão. A defesa do direito ao procedimento adequado é possível pois o Código tem a tônica da flexibilização do procedimento e das formalidades dos atos processuais, seja uma flexibilização operada pelo juiz, seja pelas partes.

Assim, a doutrina especializada prevê indagações ao futuro dos procedimentos especiais que visam encaixar neste novo olhar. Pode-se imaginar a possibilidade de um número ainda maior de procedimentos especiais e uma maior flexibilização do procedimento comum ou uma desaceleração da criação de novos procedimentos especiais e até mesmo um livre trânsito das técnicas e dos procedimentos.

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Necessário tornar grave que, sob a nova ótica, os questionamentos tornam-se muitos, todavia, a busca pela universalização e flexibilização da tutela ainda tornam-se mantém.

Para cognescer as técnicas dos procedimentos especiais utilizadas no procedimento comum será analisado o conceito de cultura e como isto se relaciona com o direito processual na sociedade. Será necessário construir uma forte base constitucional e o entendimento do completo do formalismo-valorativo.

No capítulo subsequente, serão analisados os procedimentos especiais, sua ideia essencial de garantia da tutela diferenciada, as características dos procedimentos especiais na doutrina clássica e os dispositivos fundamentais que mudaram a perspectiva na nova codificação do Processo Civil em 2015.

Conclui-se com a análise de três técnicas procedimentais especiais, focando mais em situações concretas que o(a) operador(a) jurídico(a) pode enfrentar. Igualmente, será feita a análise teórica do direito ao procedimento adequado como corolário do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva.

A metodologia adotada para cumprir os objetivos específicos deste trabalho foram principalmente de revisão bibliográfica da doutrina jurídica especializada, além do Código de Processo Civil de 2015 e anteriores, igualmente analisou-se os Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis.

Feitos essas breves notas introdutórias e traçado o contexto que o trabalho se insere, deseja-se proveito na leitura que se inicia.

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1. OS PROCEDIMENTOS DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

Antes do estudo dos procedimentos especiais e da utilização de suas técnicas no procedimento comum, faz-se imperioso analisar os fundamentos que deram origem ao Código de Processo Civil de 2015, o movimento do formalismo-valorativo, além do papel da constitucionalização no molde do direito processual contemporâneo. Por fim, este capítulo buscará entender como surgiu a inovação do procedimento ordinário e um possível equívoco em sua utilização.

1.1 Fundamentos da processualística civil brasileira

O Direito está imbricado na experiência e cultura do povo, compete à autonomia cultural do ser, é a mescla entre a convivência e conflitos sociais que resultam em experiências dificilmente mensuráveis. Provém de complexas variantes de historicidade em um determinado espaço e tempo, deve muito à filosofia e à doutrina teórica, porém, efetiva-se na prática e nas consequências de sua aplicação em sociedade (MITIDIERO, 2004).

A norma, ou o direito material, sem forma de expressar-se e surtir seus efeitos, é inócuo, não tem vinculação e, exatamente, não prestigia a finalidade do poder legislativo em um Estado de Democrático de Direito. Neste sentido, o processo se expressa não apenas como jurídico, mas, fundamentalmente como cultural e histórico da convivência em sociedade. Galeno Lacerda (1962), entende que no processo:

se fazem sentir a vontade e o pensamento do grupo, expressos em hábitos, costumes, símbolos, fórmulas ricas de sentido, métodos e normas de comportamento. Esses fatores determinam com que nele se reflita toda uma cultura, considerada como o conjunto de vivências de ordem espiritual e material, que singularizam determinada época de uma sociedade (LACERDA, 1962, p. 74-75).

O que se demanda, afinal, em uma sociedade com a aplicação da norma pelo processo que não se basta como fim em si, porém, à pacificação social através da realização de Justiça. Perceba-se, o conceito de justiça e sua realização perpassa uma série de objetivos a serem almejados, como afirmação de jurisdição, valores sociais, políticas públicas e organização do sistema jurídico (DINAMARCO, 2009).

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A teoria do direito não foi omissa na tentativa de pautar como ciência exata o que é substancialmente método de resolução de conflito, formalidades, pautas de legitimidade, mescla de subjetivismos, narrativas, busca de pontos em comum de realidades completamente discrepantes. O processo, neste cenário, encontra-se como responsável na criação de um campo onde sejam respeitados, entendidos e até mesmo debatidos, valores, costumes e normas de indivíduos que comungam da experiência que é viver em sociedade. Cita-se a lição de Carlos Alberto Alvaro de Oliveira (2006):

[…] mesmo as normas aparentemente reguladoras do modo de ser do procedimento não resultam apenas de considerações de ordem prática, constituindo no fundamental expressão das concepções sociais, éticas, econômicas, políticas, ideológicas e jurídicas, subjacentes a determinada sociedade e a ela características, e inclusive de utopias. (OLIVEIRA, 2006, p. 64)

Ao caso brasileiro, é particular o Código de Processo Civil em seu art. 1º1

estabelecer, diferentemente das codificações anteriores, que o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, em observância com disposições vigentes.

Este ponto de partida é, além de simbólico, primordial para entender onde fundamenta-se a perspectiva da codificação da processualística civil brasileira atual, sendo “[…] uma relação jurídica cujo conteúdo será determinado, primeiramente, pela Constituição e, em seguida, pelas demais normas processuais que devem observância àquela” (DIDIER JR., 2018, p. 40).

A constitucionalização do processo é uma característica bem-vinda introduzida pelo Direito contemporâneo (DIDER JR., 2018), notando que advém de um transcurso histórico e cultural. Com isto em mente, importa também trazer o que observa Daniel Sarmento (2009) inicialmente em seu ensaio sobre o neoconstitucionalismo:

Até a Segunda Guerra Mundial, prevalecia no velho continente uma cultura jurídica essencialmente legicêntrica, que travava a lei editada pelo parlamento como a fonte principal — quase como a fonte exclusiva — do Direito, e não atribuía força normativa às constituições. Estas eram vistas 1 Art. 1º O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as

normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.

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basicamente como programas políticos que deveriam inspirar a atuação do legislador, mas que não podiam ser invocadas perante o Judiciário, na defesa de direitos. Os direitos fundamentais valiam apenas na medida em que fossem protegidos pelas leis, e não envolviam, em geral, garantias contra o arbítrio ou descaso das maiorias políticas instaladas nos parlamentos. Aliás, durante a maior parte do tempo, as maiorias parlamentares nem mesmo representavam todo o povo, já que o sufrágio universal só foi conquistado no curso do século XX (SARMENTO, 2009, p. 49).

Em certo sentido, afirmar que as normas e princípios constitucionais serão prestigiados frente ao processo civil parece óbvia, porém, deve-se interpretar teleologicamente tal artigo. A funcionalidade de normatizar o corolário kelseninano é a constitucionalização do direito processual, que visa exteriorizar e expressar a norma superior em normas inferiores.

Sobre o movimento da constitucionalização de direitos fundamentais processuais, pode-se exemplificar a Convenção Europeia de Direitos do Homem2 e o

Pacto de São José da Costa Rica3 como ordenamentos jurídicos simbólicos desta

grande mudança contemporânea. Para além, Didier nota que há esta incorporação aos textos constitucionais de normas processuais em “[…] praticamente todas as constituições ocidentais posteriores à Segunda Grande Guerra” (2018, p. 54), assim os consagrando. O mesmo entendimento se dá em Sarmento, que coloca que “[…] as constituições europeias do 2º pós-guerra não são cartas procedimentais, que quase tudo deixam para as decisões das maiorias legislativas, mas sim documentos repletos de normas impregnadas de elevado teor axiológico” (2009, p. 49).

Segundo Didier, a evolução histórica do direito processual costuma ser dividida em três fases (2018, p. 52): 1) o praxismo ou sincretismo, sendo que não havia distinção entre direito material e direito processual; 2) o processualismo, havendo evolução na ciência processualista; e 3) o instrumentalismo, onde houve uma relação circular de interdependência entre o direito material e o direito processual, porém, estabelecendo diferença funcionais entre os dois. Ainda, segundo o autor, é possível estabelecer uma quarta fase – sendo esta a contemporânea –, o neoprocessualismo ou o formalismo-valorativo4, desenhando-se 2 O art. 6º da Convenção, responsável por elencar direito a um processo equitativo.

3 O art. 8º elenca garantias judiciais, o art. 10º traz que “toda pessoa tem direito de ser indenizada conforme a lei, no caso de haver sido condenada em sentença transitada em julgado, por erro judiciário” e o art. 25 traz elementos sobre a efetividade, eficiência, adequação e celeridade da tutela jurisdicional.

4 O neoprocessualismo ou formalismo-valorativo é assim denominado por Carlos Alberto de Oliveira, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.

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esse diálogo estreito entre o Direito constitucional e o Direito processual para a devida prestação do ato jurisdicional.

Pode-se apurar o ato jurisdicional como o poder que o Estado tem de aplicar o direito material a determinado caso, constituindo um dever e uma função do ente estatal; exercendo o monopólio da resolução dos conflitos de interesses e o qual também corresponde a uma prestação de serviço, conclui-se, de maneira simplificada, que pode-se conceituar o processo como o método de exercício da jurisdição (DIDIER JR., 2018, p. 37).

Feito este deslinde, sobre o instrumentalismo, esta ponte entre o direito processual e a aplicação do direito material (DINAMARCO, 2009), torna-se necessário fazer algumas considerações – alguns estudiosos sustentam que ainda vivenciamos a fase instrumentalista do processo (REDONDO, 2017, p. 42) – e acompanhar as críticas de José Joaquim Calmon de Passos.

O instrumentalismo parte da ideia de aperfeiçoamento dos objetivos jurisdicionais, visando a que se propõe o direito processual ao aplicar o direito material, sendo que “[…] a perspectiva instrumentalista do processo é teleológica por definição e o método teleológico conduz invariavelmente à visão do processo como instrumento predisposto à realização dos objetivos eleitos” (DINAMARCO, 2009, p. 178). Ou seja, segundo a perspectiva instrumentalista, o propósito do direito processual como meio é atingir o fim da aplicação da jurisdição do Estado a serviço dos escopos políticos e sociais de sua respectiva época. Neste sentido Dinamarco (2009) sustenta:

Há de estar informado dos conceitos e sugestões que outras ciências lhe possam fornecer e conhecer a vivência do processo como instrumento, conhecer a sua potencialidade a conduzir a resultados, ter sensibilidade para as suas deficiências, disposição a concorrer para seu aperfeiçoamento. A percepção e exame ordenado de todos os escopos que animam a instituição e exercício da jurisdição como expressão do poder político e a bem do harmonioso convívio social constituem fator de primeira grandeza para o encontro de soluções adequadas, seja no plano teórico ou prático, seja em casos particulares ou na generalização legislativa (DINAMARCO, 2009, p. 184).

Apesar dos relevantes apontamentos da finalidade processual de instrumentalização da jurisdição Estatal expressa pela aplicação do direito material, cabe as críticas de J. J. Calmon de Passos, evitando-se possível raciocínio que o direito material seria proeminente ou que o direito processual é independente à

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situação fática (tornando-se mera ferramenta para o direito material), “[…] como também afirmar a diversidade entre o direito material e processual e a instrumentalidade do segundo, em relação ao primeiro, não significa autonomia (no sentido de indiferença) entre os dois complexos de normas” (2001, p. 62).

Progressivamente é possível traçar o contorno de solidariedade entre o direito material e o direito processual no exercício da jurisdição. Perceba-se, o autor faz crítica profunda e acertada ao grifar que o processo não é e não deve ser mero instrumento de meio para os fins do julgador – sob o risco de estar a mercê de um juízo arbitrário –, e sim, método de adequação à legalidade para resolução teleológica da tutela, transformando o discurso jurídico desprovido de autoridade em ação comunicativa aplicada através de atores jurídicos. Reitera-se, a figura que se forma é de reciprocidade normativa (PASSOS, 2001, p. 62):

Assim como o direito processual não poderia existir sem o direito material, igualmente o direito material, deve-se acrescentar, não poderia existir sem o direito processual. Portanto, em sua diversidade está presente, outrossim, uma estreita interdependência (isto é, dependência recíproca) entre o direito material e o direito processual. […] demonstra que o escopo do processo é precisamente assegurar o que foi prometido pelo direito material, e somente isso, sem poder desvirtuar-se para outro objetivo nem deixar de estar a serviço desse objetivo.

Calmon de Passos chega em conclusão didática e elementar que o processo, expresso como comunicação ou palavra, entende-se como a linguagem que dá concretude ao direito, assemelhando-se ao pensamento. Logo, o processo jurídico imaginado de maneira fisiológica, entende-se o instrumentalismo antes como a expressão do pensamento do Estado do que como mera formalidade dispositiva (PASSOS, 2001, p. 64):

Falar-se, pois em instrumentalidade do processo é incorrer-se, mesmo que inconsciente e involuntariamente, em um equívoco de graves consequências, porque indutor do falso e perigoso entendimento de que é possível dissociar-se o ser do direito do dizer sobre o direito, o ser do direito do processo de sua produção, o direito material do direito processual. Uma e outra coisa fazem um.

Assim, sob essa perspectiva jurídica emergente, não desqualificando o instrumentalismo e sustentado na ótica constitucional, houve uma incorporação e investida de superação desta fase da história do direito processual. Acompanhando

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o movimento de constitucionalização da segunda metade do século XX (PASSOS, 2001). Calmon de Passos ainda complementa:

[…] representou novidade no campo do direito processual, concluiremos por identificá-la na denominada constitucionalização do processo. Decorrência necessária, a meu sentir, dos ganhos democráticos obtidos em termos de cidadania, que se traduziram em mais significativa participação nas decisões políticas de um maior número de instituições e pessoas. A noção de devido processo legal, já anteriormente trabalhada pela doutrina, ganhou dimensão nova, revestindo-se do caráter mais abrangente de garantia do devido processo constitucional. Compreendido o direito como algo não dado aos homens pela natureza mas por eles produzido, revelou-se fundamental entender-se o processo de sua produção, que se percebeu ter matrizes políticas, devendo, portanto, para legitimar-se, adequar-se a quanto estabelecido constitucionalmente para sua produção, em qualquer de seus níveis (2001, p. 59).

Como nota Bruno Garcia Redondo (2017), a fase contemporânea do Direito Processual – o neoprocessualismo ou formalismo-valorativo – não se contrapõe frontalmente ao instrumentalismo, pois, de fato, ambas fases objetivam o aprimoramento da prestação jurisdicional, buscando a real efetividade da tutela jurisdicional, entretanto possuem discrepâncias sensíveis que são relevantes pontuar (REDONDO, 2017, p. 44).

Primeiramente, nota-se nova perspectiva frente a teoria das fontes, reconhecendo a força normativa dos princípios, ao estabelecimento de cláusulas gerais e ao papel dos precedentes. Além, nota-se consequente ampliação da jurisdição constitucional. O reforço dos aspectos éticos do processo também tornam-se graves, com destaque para os princípios da boa-fé, da cooperação, da moralidade e da confiança legítima. Por fim, o que se obtém de mais proveitoso nesta nova fase – devido à exigência da efetividade da tutela jurisdicional – é o estabelecimento de um procedimento adequado, visando suprir inclusive tutelas diferenciadas, que será ponto de discussão do presente trabalho mais adiante.

Analisa-se mais detidamente o momento do processualismo contemporâneo em suas fases do neoprocessualismo ou, havendo preferência a este termo, do formalismo-valorativo. Primeiramente aponta-se os embaraços que a forma processual fixa, apesar de garantir – até certo ponto – a segurança jurídica, que possui detalhes que todo(a) operador(a) jurídico(a) deve se atentar.

Por conseguinte, Carlos Alberto Alvaro de Oliveira, sustenta que o formalismo não se deve confundir com a forma do ato processual, resume-se em garantir a

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previsibilidade do procedimento, portanto, pode ser entendido como garantia da segurança jurídica às partes. Assim, impede-se principalmente possíveis arbitrariedades do poder do Estado transfigurado na pessoa do(a) magistrado(a) (OLIVEIRA, 2006). Aprofundando a questão, assim coloca o autor:

Diz respeito à totalidade formal do processo, compreendendo não só a forma, ou as formalidades, mas especialmente a delimitação dos poderes,

faculdades e deveres dos sujeitos processuais, coordenação de sua

atividade, ordenação do procedimento e organização do processo, com vistas a que sejam atingidas suas finalidades primordiais. […] tarefa de indicar as fronteiras para o começo e o fim do processo, circunscrever o material a ser formado, e estabelecer dentro de quais limites devem cooperar e agir as pessoas atuantes no processo para o seu desenvolvimento (OLIVEIRA, 2006, p. 60).

Resulta o formalismo no equilíbrio entre o poder do Estado e às partes – sendo uma particularidade do plano normativo –, garantindo a paridade de armas, ao menos formal, entre os sujeitos do processo e, em última medida, a apreciação do direito fundamental processual do contraditório (OLIVEIRA, 2006).

Delimita-se outra particularidade, entretanto, no plano fático: o exercício igualitário de poderes pelas partes. Como já supracitado, este justo equilíbrio garante, na mesma medida, 1) atribuições; 2) faculdades; e 3) deveres; inclusive, torna-se possível a influência na discricionariedade da atividade do juiz, assim, assegura-se novamente o contraditório.

No formalismo, há sustentação da concretização e valorização da matéria fática na segurança e previsibilidade da forma processual, “[…] constitui o elemento fundador tanto da efetividade quanto da segurança do processo” (OLIVEIRA, 2006, p. 62). Ainda, sustentando-se em Passos temos:

Aspecto significativo do processo concerne à determinação dos fatos, pois, em princípio, não é possível fixar o direito adequado à solução da controvérsia sem investigar o suporte fático descrito pelo texto normativo, dito como incidente e do qual se reclama a aplicação. […] a influência do formalismo na formação e valorização do material fático de importância para a decisão da causa (OLIVEIRA, 2006, p. 62).

Porém, na visão do autor, deve-se ter cautela ao aplicar o formalismo, pois, segurança e previsibilidade excessiva no processo podem deixá-lo estático quanto à aplicação do direito material no caso concreto e, inclusive, atentando à garantia e aplicação de direitos construídos pelo processo histórico (OLIVEIRA, 2006).

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Argumenta que efetividade e segurança jurídica, mesmo que ainda sendo valores essenciais e norteadores para a aplicação normativa, são opostos e passíveis de ponderação pelo(a) magistrado(a), pois, “[…] o jurista deve observar a ordem jurídica, atento ao valor da segurança jurídica, sem confundi-la com a manutenção cega e indiscriminada do status quo” (OLIVEIRA, 2006, p. 67).

Esta cognição busca reconhecer o ato jurisdicional não como a mera aplicação da lei ou o reconhecimento do monopólio do Estado nas resoluções dos conflitos em sociedade, porém, torna o sistema jurídico como atuante e flexível na aplicação da norma ao caso concreto, tendo como restritivo e objetivo a lei constitucional. Importante grifar que a norma constitucional neste cenário carrega enorme peso histórico. Todo o processo constituinte, político e jurídico é subentendido na busca da adequação procedimental ao caso concreto, pois, afinal, objetiva-se a garantia e efetividade de direitos. Da mesma forma, Oliveira cita:

É preciso levar em conta, ademais, que a segurança não é o único valor presente no ambiente processual, mormente porque todo o processo é polarizado pelo fim de realizar a justiça material do caso, por meio de um processo equânime e efetivo. De tal sorte, o formalismo excessivo pode inclusive inibir o desempenho dos direitos fundamentais do jurisdicionado (OLIVEIRA, 2006, p. 67).

Assim, visando à efetividade, ponderando a segurança jurídica e preservando a previsibilidade do processo, cabe ao(à) magistrado(a) – cooperando com as partes – a ponderação destes norteadores processuais opostos. A efetividade jurisdicional não presta-se apenas a ter acesso à justiça, mas aplicá-la como princípio efetivo de resolução de demandas adequada às partes.

É axiomático que a norma positivada, ou o direito material, não acompanha a situação fática dos litígios no Brasil e no mundo, isto independe do ordenamento jurídico vigente, talvez salvo apenas aqueles de um príncipe absoluto onde sua palavra é lei e ele é o Estado, porém a história demonstra a fragilidade desta ordem jurídica frente a revolta populares.

Até 2016, desde a promulgação da Constituição de 1988, União, Estados e Municípios no Brasil editaram mais de 5,4 milhões de leis – uma norma geral para cada grupo de 38 habitantes brasileiros – (AMARAL; OLENIKE; AMARAL; YAZBEK. 2016) e, segundo o Conselho Nacional de Justiça (2018), até agosto de 2018 levantou-se que há em tramitação mais de 80 milhões de processos no país.

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Logo, urge-se, em uma lógica fatalista, a melhor aplicação da norma e adequação processual ao caso concreto. Ora, a Constituição nada mais é do que a utopia do Estado Democrático de Direito que a sociedade busca atingir, são princípios basilares da expressão popular, isto é, essencialmente, a busca constante por Justiça.

Além, não basta mera literalidade de acesso à justiça – como ingressar na fila de um serviço público não é o mesmo que estar o aplicando efetivamente –, o ato jurisdicional deve agir com eficiência e adequação, sem formalismos excessivos ou mera aplicabilidade da norma, imaginando que assim, alcançará suprir a demanda das partes.

A constitucionalização do processo desprende da teorização e da formalização inócua, substituindo-se por uma perspectiva de integração à aplicabilidade do direito material à realidade política e à realidade social. Encontra-se respaldo na lição de Oliveira (2006):

[…] o direito processual é o direito constitucional aplicado, a significar essencialmente que o processo não se esgota dentro dos quadros de uma mera realização do direito material, constituindo, sim, mais amplamente, a ferramente de natureza pública indispensável para a realização de justiça e pacificação social. (OLIVEIRA, 2006, p. 64)

Neste ponto faz-se um parênteses e um aviso.

Necessário trazer a crítica de José Afonso da Silva ao citar Luis Pietro Sanchís sobre o neoconstitucionalismo5, pois, o movimento está longe de se isentar

de críticas. O autor coloca (2014) que este fenômeno concentra-se na palpável situação em que o aplicador da norma privilegia princípios, relegando a união e diálogo com a norma infraconstitucional e, em verdade, apenas utiliza a supremacia da norma constitucional como subterfúgio para aplicar o seu arbítrio sem observar a subsunção normativa, base dos fundamentos mais elementares do Direito. Assim, transcreve-se:

O neoconstitucionalismo como teoria do Direito pode resumir-se nos seguintes aspectos: mais princípios que regras; mais ponderação que subsunção; onipresença da constituição em todas as áreas jurídicas e em todos os conflitos minimamente relevantes, em lugar de espaços isentos em favor da opção legislativa ou regulamentar; onipotência judicial em lugar da 5 Neste trabalho não se utilizará o termo neoconstitucionalismo como sinônimo da fase contemporânea processualista, porém, neoprocessualismo ou, preferivelmente,

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autonomia do legislador ordinário; e, por último, coexistência de uma constelação plural de valores, às vezes, tendencialmente contraditórios, em lugar de homogeneidade ideológica em torno de um punhado de princípios coerentes entre si (SILVA, 2014, p. 72 apud SANCHÍS, 2002, p. 420).

José Afonso da Silva (2014, p. 72-74), ainda fundamenta que o neo em constitucionalismo seria um termo equivocado, tentando tratar como inédito um movimento que não abandona a construção teórica constitucional contínua e anterior. Pelo contrário, o que se avoca como novo é, na verdade, fruto de um avanço histórico da constitucionalização do Direito, principalmente no pós-guerra. Podendo ser rememorado, por exemplo, primeiramente a constitucionalização do trabalho paradigmaticamente nas Constituições Mexicana de 1917 e a Alemã de Weimar (1919), logo, equivoca-se chamar de novo este processo que pode rememorar-se ao início do século XX.

Deve-se tratar este processo contínuo e dinâmico de abrangência dos direitos fundamentais, segundo Silva (2014), como constitucionalismo contemporâneo na perspectiva macroscópica da jurisdição constitucional, e não, como neoconstitucionalismo. Assim, entende-se que o neoprocessualismo ou formalismo-valorativo compartilha do mesmo processo do constitucionalismo contemporâneo – nos termos desenvolvidos acima munidos da crítica de Silva –, porém, na particularidade que atine restritamente a processualística civil e deve afastar-se das práticas que ocorrem sob a terminologia de neoconstitucionalismo.

Assim, delimitando-se os conceitos e tratando-os corretamente sem abandonar todo o processo histórico que os acompanha, se quer evitar as arbitrariedades e vicissitudes do inventar o novo em neoconstitucionalismo e não equipará-lo acriticamente com o formalismo-valorativo que, este sim, acompanha o processo do dinâmico do constitucionalismo contemporâneo e adequa-se a abrangência dos direitos fundamentais na processualística civil.

Superada esta questão terminológica, retorna-se a Oliveira (2006) que busca tratar o processo como uma transcendência da “justiça abstrata e genérica da lei para alcançar-se a justiça concreta e individualizada do caso, sai-se enfim da legalidade para ingressar no direito” (OLIVEIRA, 2006, p. 75), ou seja, só há realização do direito a partir da concretização da abstração legislativa, a lei torna-se decisão com efeitos no mundo real ao aplicá-la adequadamente pelo processo.

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Ao afastarmos o formalismo como um fim em si, dá-se ambiente fértil para a discricionariedade do magistrado. Ora, com maior liberdade às maquinações do pensamento, visa-se um processo equânime prestigiando o caráter finalístico do direito processual. Acompanha-se a lição de Oliveira (2006):

A esse respeito, não se pode deixar de salientar que o fim do direito é servir à finalidade pragmática que lhe é própria. Processualmente, visa-se a atingir a um processo equânime, peculiar do Estado democrático de direito, que sirva à ideia de um equilíbrio ideal entre as partes e ao fim material do processo: a realização de justiça material. (OLIVEIRA, 2006, p. 76).

Esta ideia de equidade visa afastar do processo uma reverência absoluta ao Código, busca um entendimento crítico à situação de fato, flexibilizando a forma, havendo necessidade de uma interpretação processual não restritiva ao ponto de embrutecimento, mas abrangente e permissiva sob a limitação das garantias constitucionais das partes envolvidas.

A título ilustrativo, recorre-se à literatura para exemplos da figura muitas vezes pitoresca que o formalismo excessivo na realidade pode presentear à ficção. Os labirintos burocráticos de Franz Kafka (2005) em O Processo e o suprassumo do pacta sunt servanda [acordos devem ser mantidos] em O Mercador de Veneza de William Shakespeare (1978), infelizmente, não se refreiam apenas na literatura, porém, é já do imaginário popular o esteriótipo que o cria; de juristas aplicadores de uma leitura fria da letra da lei que imaginam estarem buscando o Direito, porém, inadvertidamente reproduzem injustiças em suas ações.

Assim, obviamente a adequação e criatividade do(a) magistrado(a) e partes deve-se equilibrar entre o utópico e o possível. Oliveira (2006) argumenta que a lei não deve ser aplicada em troca da maleabilidade dos princípios e garantias fundamentais constitucionais, resume no famoso brocardo que ainda vale, os fins não justificam os meios.

Conclui-se que ao momento que o(a) magistrado(a) privilegia as garantias processuais das partes, pode o(a) julgador(a) decidir pelo procedimento mais adequado condizente ao caso concreto.

Com o intuito de afastar o formalismo excessivo, não podendo suprimir as essencialidades do processo, mitigando-se a forma e preservando o escopo da tutela jurisdicional, visa-se o formalismo-valorativo a partir do momento que a mera

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forma processual atenta contra princípios e valores do ambiente do processo justo (OLIVEIRA, 2006). Neste ponto, define-se:

[…] o formalismo-valorativo, informado nesse passo pela lealdade e boa-fé, que deve ser apanágio de todos os sujeitos do processo, não só das partes, impõe, […], a cooperação do órgão judicial com as partes e destas com aquele. Esse aspecto é por demais relevante no Estado democrático de direito, que é tributário do bom uso pelo juiz de seus poderes, cada vez mais incrementados pelo fenômeno da incerteza e complexidade da sociedade atual e da inflação legislativa, com aumento das regras de equidade e aplicação dos princípios (OLIVEIRA, 2006, p. 81).

Destarte, entende-se que o “discurso jurídico só obriga até onde conduza a sua força de intrínseca persuasão, força vinculante que há de assentar no sistema jurídico (constitucional e infraconstitucional)” (OLIVEIRA, 2006, p. 85) evitando arbitrariedades a partir do entendimento do direito como totalidade fundada em valores e princípios que a sociedade emana.

O processo sob sua perspectiva de seguir o paradigma traçado na Carta Magna consagra o direito fundamental ao devido processo, com todos seus princípios e fundamentos. Como exemplos deles se tem o contraditório, a proibição de prova ilícita, a adequação, a efetividade, o juiz natural, a duração razoável, entre outros (DIDIER JR., p. 37).

Grifa-se que o Código de Processo Civil de 1973 introduziu as normas da processualística com a jurisdição do Estado em seu artigo primeiro6 e dedicou seu

capítulo introdutório ao processo de conhecimento. Este Código advindo da fase do processualismo científico trouxe à tona obras clássicas7, sendo que “[…] os estudos

dessa época foram voltados aos principais elementos do Direito Processual e à construção dogmática das bases científicas dos institutos processuais (tais como jurisdição, ação, processo, defesa e coisa julgada)” (REDONDO, 2017, p. 41).

O que se configurou no código passado era a preocupação primordial da legitimidade procedimental, gerando certo excesso de formalismo, contrariamente ao CPC vigente, que reafirma as normas e preceitos constitucionais dando concretude a estes e norteando a interpretação que deve ser seguida adiante. “A doutrina passa

6 Art. 1º A jurisdição civil, contenciosa e voluntária, é exercida pelos juízes, em todo o território nacional, conforme as disposições que este Código estabelece.

7 Estrangeiros como Giuseppe Chiovenda, Francesco Carnelutti, Piero Calamandrei, Enrico Tullio Liebman, Adolph Wach, Leo Rosenberg, James Goldschmidt, Jaime Guasp e brasileiros como Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda, Alfredo Buzaid, Alfredo Araújo Lopes da Costa, José Frederico Marques e Moacyr Amaral Santos, entre outros (REDONDO, 2017).

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a examinar as normas processuais infraconstitucionalmente como concretizadoras das disposições constitucionais, valendo-se, para tanto, do repertório teórico desenvolvido pelos constitucionalistas” (DIDIER JR., 2018, p. 55), ou seja, objetiva-se a supracitada ideia de circularidade normativa.

Pontua-se que no CPC de 2015 é traçado no capítulo introdutório inteiro às normas fundamentais com doze artigos e importante lição podemos retirar de Didier Jr. (2018) neste ponto:

Esse capítulo reproduz alguns enunciados normativos constitucionais (art. 3º, caput, p. ex., que praticamente reproduz o inciso XXXV do art. 5º da CF/1988) – e, nesse sentido, não inova. Nos casos em que há mera repetição do texto constitucional, o conteúdo normativo será, sempre, constitucional, não infraconstitucional. Os dispositivos copiados são meras reafirmações de texto da Constituição – exemplo claro de legislação simbólica: repete-se, em fonte normativa de nível inferior, o enunciado normativo de nível superior, sem qualquer novidade, nem mesmo a atribuição de maior densidade normativa ao comando constitucional. No particular, a norma constitucional é ventríloqua: fala também por intermédio do texto legal (DIDIER JR., 2018, p. 86, grifos do autor).

A ideia de tutela estatal não mais focaliza-se na legitimidade e reafirmação do poder jurisdicional do Estado, mas na concretização de princípios e normas fundamentais, que apenas assim se faz valer a tutela do Estado, garantindo e privilegiando as normas constitucionais.

Com o Código de Processo Civil de 2015 a eficácia não torna-se mais unilateral, porém, recíproca (DIDIER JR., 2018, p. 55). Ora, esta é a ideia primordial de codificação, não apenas de hierarquia unilateral piramidal – onde a norma superior cria e subjuga a norma inferior –, porém de subsunção e retroatividade.

Sob esse assentamento teórico constitucional, é possível aprofundar-se no procedimento comum do CPC de 2015 para a tutela da maioria das demandas da sociedade. A busca foi no intuito de um procedimento uniforme, universal e padronizado, porém, será possível analisar suas limitações frente a situação fática do dia a dia.

1.2 Os pressupostos processuais e o procedimento comum

O pioneirismo da introdução da teoria dos pressupostos processuais levou à autonomia do direito processual frente ao direito material. O que eram consideradas

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como meras noções preliminares úteis e recomendáveis ao estudo do processo, estavam sendo definidas como requisitos absolutos e essenciais para a realização da relação jurídica processual.

Este debate deu origem ao embrião do procedimento padrão, mais genérico e autônomo, que abarca a maioria das demandas; não mais o direito material dava origem à relação processual – entendida como atos sucessivos meramente procedimentais –, porém, a relação processual, em tutelas comuns abrangentes, possuía sua própria independência de existência, validade e eficiência.

A ação, antes de existir, ser válida e produzir seus efeitos, necessita cumprir requisitos pré-processuais. Estes atos complexos de formação sucessiva (DIDIER JR., 2018, p. 363) são conceituados como pressupostos processuais; se não forem cumpridos, impedem o surgimento da relação jurídica processual e, consequentemente, do processo como um todo.

Introduzidos por Oskar Von Bülow em meados do século XIX, o jurista buscava com a Teoria das Exceções e dos Pressupostos Processuais ser pioneiro em estabelecer o processo como uma relação jurídica autônoma distinta daquela que constituía o direito material.

O autor (1964) argumenta que a ciência processual civil necessita percorrer um longo caminho para alcançar o passo das demais áreas do direito. Observa que há longo desenvolvimento a ser atingido e urge, então, para um estudo dogmático livre. Acentua posteriormente que:

Ainda estão nas sombras as ideias processuais mais importantes e básicas, obscurecidas por uma construção conceitual inadequada e uma terminologia errada; ambos, herança herdada da lei medieval e preservada com a maior fidelidade e perseverança (BÜLOW, 1964, p. 15, tradução minha).8

Ele (1964, p. 15-16) pretende que sua obra possa elucidar alguns conceitos fundamentais para descartar a teoria equivocada e falseadora de todo o sistema processual civil defendida até então. Culpa esta teoria desacertada por acobertar estes conceitos basilares, pois, percebia algo de incompleto nas definições da época

8 Tradução original do espanhol: Todavía yacen en la penumbra las más importantes y básicas ideas procesales, oscurecidas por una construcción conceptual inadecuada y una errónea terminología; ambas, herencia recebida del derecho medieval y conservadas con la mayor fidelidad y constancia.

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a partir de seus desdobramentos, logo, estava convencido de que estes conceitos fundamentais encontravam-se desfuncionais.

Além, alerta que nota essas incompletudes não por se afastar demasiadamente do campo teórico, muito pelo contrário, entende e percebe a incompletude por se encontrar muito apegado a ideias tradicionais. Assim, para o teórico (2005), o processo “se desenvolve de modo progressivo, entre o tribunal e as partes”, sendo essencial a litiscontestação9, o conflito ou ato jurisdicional para tomar

forma.

O autor (1964) cita que o processo e a relação processual são diferentes das demais relações de direito. Ao seu tempo, costuma-se tratar das relações de direito apenas aquelas que se dirigiam ao direito privado, sendo confundido o processo com os sucessivos atos procedimentais a serem exarados, assim, para cada direito material haveria um procedimento específico a ser utilizado.

O que pode ter causado certo equívoco e desentendimento na teorização da relação jurídica processual é a falta de percepção que o processo nada mais é que uma relação de continuidade, o desenvolvimento do processo se perfectibilizar a cada passo e ato processual.

O que ocorreu, em verdade, foi a redução do processo aos sucessivos atos procedimentais. Bülow (2005, p. 7) argumenta que esta redução é uma “unilateralidade que tem sua origem na jurisprudência romana da Idade Média e que foi favorecida pela concepção germânica do direito”, justificando o seu enraizamento, porém, que não se sustenta ao estudo e sob a perspectiva de continuidade própria da relação jurídica processual e seus pressupostos particulares. Neste sentido:

[…] O processo é uma relação jurídica que avança gradualmente e que se desenvolve passo a passo. Enquanto as relações jurídicas provadas que constituem a matéria do debate judicial, apresentam-se como totalmente concluídas; a relação jurídica processual se encontra em embrião. Esta se prepara por meio de atos particulares. Somente se aperfeiçoa com a litiscontestação, o contrato de direito público, pelo qual, de um lado, o tribunal assume a obrigação concreta de decidir e realizar o direito deduzido em juízo e de outro lado, as partes ficam obrigadas, para isto, a prestar uma colaboração indispensável e a submeter-se aos resultados desta atividade comum. Esta atividade ulterior decorre também de uma série de atos separados, independentes e resultantes uns dos outros. A relação jurídica 9 Herança do direito romano. Um pacto de vontades celebrado entre as partes – litiscontestatio –

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processual está em constante movimento e transformação (BÜLOW, 2005, p. 6, grifos meus).

Contudo, cita que na tradição romana há reconhecimento da natureza jurídica unitária do processo, logo, não havia sustentação a ideia rasa do processo como simplesmente uma série de atos meramente procedimentais proferidos por um magistrado e as partes. Conclui que “Poder-se-ia, segundo o velho uso, predominar o procedimento na definição do processo, não se descuidando de mostrar a relação jurídica processual como a outra parte da concepção” (BÜLOW, 2005, p. 8).

Assim, o direito processual da época estava calcado em apenas uma parte da tradição romana, não abarcando seu mais importante quesito, a natureza da relação jurídica própria entre os sujeitos do processo. Houve falha ao resumir toda essa inteiração jurídica contínua processual a estes atos meramente procedimentais e ao direito material já concebido.

Os pressupostos processuais são passíveis de análise para observar quais são constitutivos, impeditivos e principalmente extintivos, pois, “tão logo a falta de um pressuposto processual seja denunciada e confirmada no início do procedimento, este se malogra totalmente” (BÜLOW, 2005, p. 12).

Bülow (2005, p. 14) elegantemente argumenta que os pressupostos processuais encontravam-se no instituto impróprio de exceções dilatórias, sendo estas, exatamente, as condições que dão as configurações de uma relação jurídica processual, porém, expressados negativamente, ou seja, os pressupostos processuais originariam a matéria às exceções processuais. São estas:

1. referentes às pessoas do processo: as exceptio fori incompetentis,

praeventionis, judicis inhabilis vel suspectí; deficientis personae standi in judicio; procuratoría vel deficientis legitimatïonis ad processum, deficientis tutoris vel syndicatus [exceção do foro incompetente, da prevenção, do juiz

inabilitado ou suspeito; exceção de falta de personalidade para estar em juízo; exceção procuratória ou de falta de legitimação para o processo, de falta de tutor ou síndico];

2. correspondentes à matéria do processo em si: a exceptio non rite formati

processus [exceção de processo não ritualmente formado];

3. concernentes à proposição da demanda, a sua comunicação e à prestação de caução: as exceptio libelli obscuri vel inepti, termini nimis

angusti, loci non tuti, praestandae cautionis pro expensis vel pro reconventione [exceção de libelo obscuro ou inepto, de prazo demasiado

estreito, de lugar inseguro, da caução que deve prestar-se pelas custas ou pela reconvenção];

4. relativas à ordem consecutiva dos processos: as exceptio praejudicialis,

connexitatis causarum, praeposteritatis [exceção prejudicial, de conexão de

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José Carlos Barbosa Moreira (1989), entretanto, critica que os pressupostos processuais ao serem exarados no processo, possui pouca funcionalidade concreta. Sendo considerada a análise dos pressupostos como preliminar para o julgamento e, posteriormente, perceber-se a questão de mérito procedente ou improcedente.

O autor (1989) argumenta que não sendo cumpridos os pressupostos de existência, percebe-se tão óbvia a incompletude e, mesmo assim, o(a) magistrado(a) denega algo e, questiona que, afinal, não cumprido os pressupostos de existência – jurisdição, partes e demanda – há denegação de algo que, teoricamente, não existe. Mais compreensível é a questão se entender o cumprimento dos pressupostos de existência como questões de admissibilidade do pedido.

Por enquanto, não se aprofundando tanto na questão da necessidade de uma perfectibilização da teoria dos pressupostos processuais e percebendo sua importância, basta entender o instituto como pioneiro ao reconhecer a autonomia do direito processual frente ao material, os pressupostos de existência, os requisitos de validade e, por fim, a fundação do procedimento comum como o entendemos hoje. Complementando, o autor define que, “[…] o surgimento da relação jurídica processual, analogamente, depende da presença de determinados elementos, que condicionam, em termos globais, a existência. Tais seriam os pressupostos processuais10” (MOREIRA, 1989, p. 84).

Assim, a literatura jurídica clássica brasileira define o procedimento comum como “o procedimento padrão, que serve a uma variedade de situações jurídicas materiais” (DIDIER JR.; CABRAL; CUNHA, 2018, p. 18). Entende-se como o procedimento aplicável ordinarizado para as mais variadas situações, utilizado quando não houver outro específico, abarcando o maior número de pretensões do direito material.

O procedimento comum conjugará e objetivará por todos os meios juridicamente possíveis a certeza de uma decisão, por óbvio, obedecendo as respectivas formalidades. Assim, “[…] o procedimento ordinário era o padrão

10 Didier Jr. (2018) sustentado por José Orlando Rocha de Carvalho faz uma diferenciação terminológica. Entende haver uma polissemia no composto pressupostos processuais, mesmo sendo citado em dispositivo normativo (art. 485, inc. IV do CPC) e jurisprudência; “[…]

‘pressupostos processuais’ latu sensu, como locução que engloba tanto os requisitos de validade como os pressupostos processuais stricto sensu (somente aqueles concernentes à existência do processo) (DIDIER, 2018, p. 365)”.

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perfeito, no qual se esgotavam todas as fases, a permitir o exercício de uma cognição plena e exauriente” (DIDIER JR.; CABRAL; CUNHA, 2018, p. 19). No procedimento comum, respeitando o contraditório e a ampla defesa, o(a) magistrado(a) tratará de buscar o juízo de certeza através desta cognição exauriente, plena, exaustiva.

O processo, aqui, reside importante papel de legitimidade à decisão judicial por sucessivos atos procedimentais. O(A) juiz(a) competente trata de prestigiar o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal. Por todos os meios possíveis e permitidos por lei busca-se, literalmente, estafar a função da inteligência ao adquirir um conhecimento – respeitando o princípio da duração razoável no processo11 – findando em uma decisão convicta.

Ocorre que ao haver um procedimento que supre a cognição exauriente, não se limitando as circunstâncias que o direito material estabelecia, havendo autonomia do direito processual, identificava-se que outra forma de suprir a tutela jurisdicional seria defeituosa ou incompatível. Debuta-se a busca e o surgimento do mito da universalização do procedimento. Assim, “procedimentos que se limitavam à realização de juízos sumários sobre as circunstâncias da causa, sem exaurir todas as possíveis etapas procedimentais, não eram compatíveis com a verdadeira função jurisdicional” (DIDIER JR.; CABRAL; CUNHA, 2018, p. 19).

Fredie Didier Jr., Antonio do Passo Cabral e Leonardo Carneiro da Cunha (2018) percebem que o procedimento comum e sua função jurisdicional máxima aliada a sua independência, são – como visto e sustentado neste trabalho – expressões culturais, intelectuais que identificam-se com “o racionalismo […] mediante a utilização da metodologia das ciências naturais ou da matemática” (SILVA, 2003, p. 347) e cotidianas de sua época em determinado espaço.

Como características basilares do procedimento comum, é importante e pode-se elencar específicas características como, primeiramente, a concessão de tutela provisória, cautelar ou satisfativa, fundada em urgência ou em evidência, liminarmente ou durante o processo, na generalidade dos processos (arts. 294 e ss.).

11 Art. 5º […] LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004).

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Em seguida, temos os dispositivos normativos relativos a adaptabilidade e flexibilidade na adoção do procedimento adequado para satisfação da demanda e ato jurisdicional, como a norma processual fundamental inscrita no art. 7º que, in verbis, assegura “às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório”.

Destaca-se, também relativo a adaptabilidade do procedimento comum, o art. 139, inciso IV, que transcreve sobre as medidas coercitivas atípicas e o art. 297 e art. 300, referentes a tutela provisória e de urgência, além do art. 536, em seu § 1, que elenca os poderes de coação que o juiz se encontra munido para prestar o cumprimento de sentença.

Grifa-se, igualmente, que no procedimento comum há possibilidade da mitigação da obrigatoriedade da atuação do Ministério Público como fiscal da ordem jurídica, sendo taxativo no CPC as situações que age – elencadas no art. 178 do CPC. Também, nota-se prerrogativas processuais diferenciadas12 e adaptadas aos

entes públicos para melhor atendê-los, obter mais celeridade nos trâmites e preservar o interesse da sociedade.

Ainda neste fio, segue-se impossível não comentar sobre o incidente de resolução de demandas repetitivas e o recurso especial e extraordinário repetitivos – podendo ser objeto dos julgamentos repetitivos tanto questões de direito material como processual – inscrito no art. 928 do CPC, inclusive inaugurando “o reclamo doutrinário de criação de uma ‘tutela diferenciada’ para a litigância em série” (DIDIER JR.; CABRAL; CUNHA, 2018, p. 65).

O procedimento comum em sua adaptabilidade ao cumprimento jurisdicional permite o fracionamento da decisão de mérito da lide, conforme os arts. 354, § único, e 356, do CPC, possibilitando decisões parciais de mérito.

12 Luciano Alves Rossato (2015) enumera: i) a dispensa de procuração aos advogados públicos; ii) a atribuição de prazos processuais diferenciados; iii) o adiamento do tempo de pagamento das despesas processuais; iv) a possibilidade de intervenção anômala como terceiro interessado; v) a previsão de limites ao deferimento da antecipação de tutela; vi) a exigência de reexame necessário das decisões definitivas de 1ª instância; vii) a estipulação de regra específica para a condenação ao pagamento de honorários advocatícios; viii) a submissão dos débitos decorrentes de decisões judiciais ao regime de precatório; ix) a incidência de taxa diferenciada de juros moratórios em relação a esses mesmos débitos, quando de natureza não tributária; e x) a previsão de procedimento específico para a execução de créditos fiscais.

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Este tipo de procedimento permite ainda prever o saneamento e organização do processo, conforme art. 357 do CPC, com a finalidade de justamente prestigiar os princípios da eficiência processual e da celeridade processual, além, mitigando a probabilidade de prova surpresa entre as partes; organiza-se o processo, buscando a adaptabilidade das atividades às necessidades da lide.

Comentário pertinente a se fazer sobre o dispositivo normativo supracitado, é a possibilidade de saneamento compartilhado, se interpretarmos o art. 357 em conjunto com o art. 6º13 – princípio da cooperação – do CPC. No Código passado, o

saneamento processual se dava de forma solitária na figura do(a) magistrado(a), visto a competência privativa do ato jurisdicional. Agora, porém, as partes podem apresentar ao(à) juiz(a) questões a serem homologadas que visem rapidez e efetividade processual.

Por fim, o(a) magistrado(a) também possui maior discricionariedade no procedimento comum para decidir a demanda, não apenas havendo a procedência ou denegação da concessão do direito material, porém podendo transitar nos planos de cognição e juízo para adequar sua decisão ao caso concreto. Logo, “[…] estrutura-se no sentido de admitir quatro ‘circuitos’ ou ‘rotas’ procedimentais para o encerramento do processo com solução do pedido, o que lhe confere excelente carga de adaptabilidade” (DIDIER JR.; CABRAL; CUNHA, 2018, p. 66), são essas:

i) improcedência liminar do pedido – juízo de mérito sem a citação do réu

(art. 332, CPC); ii) julgamento antecipado do mérito – juízo de mérito sem necessidade de complementação da atividade instrutória com prova oral ou técnica (arts. 355-356, CPC); iii) extinção do processo em razão da não

impugnação de tutela provisória satisfativa de urgência concedida em caráter antecedente – juízo que, embora não seja de mérito, tem aptidão

para gerar estabilidade dos efeitos da decisão (arts. 303-304, CPC); iv)

julgamento do mérito após a audiência de instrução. (DIDIER JR.; CABRAL;

CUNHA, 2018, p. 67)

Apesar de míope aos procedimentos especiais – e poder induzir ao erro que há superação da tutela diferenciada a vista – bem-intencionada é a finalidade na busca da adequação do procedimento, sem, entretanto, mitigar a segurança jurídica ou eficiência no processo. Do trecho que retira-se essa cognição, cita-se:

De igual modo, esse ideal é um resquício da era das codificações, que buscava reunir em um bloco monolítico de regras todos os esquemas 13 Art. 6º Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo

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