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2012 Lima, Loureiro Ambientes Virtuais de Aprendizagem - O Ratio Studiorum digital

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ESUD 2012 – IX Congresso Brasileiro de Ensino Superior a Distância Recife/PE, 19 – 21 de agosto de 2012 - UNIREDE

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AMBIENTES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM: O “RATIO

STUDIORUM” DIGITAL

Luciana de Lima1, Robson Loureiro2

1Universidade Federal do Ceará/ Instituto UFC Virtual, luciana@virtual.ufc.br 2Universidade Federal do Ceará/Instituto UFC Virtual, Robson@virtual.ufc.br

Resumo – Este artigo apresenta as reflexões de pesquisa realizada com base na

abordagem arqueo-genealógica de inspiração foucaultiana associada à pesquisa documental em meio digital e procura compreender a lógica de controle, poder e regulamentação programada nos ambientes virtuais de aprendizagem. Estes espaços virtuais de aprendizagem são comumente associados a novas formas de fazer educação, a mudanças de paradigma e a modernizações que se sugerem evoluções. No entanto, a pesquisa realizada tem demonstrado que é grande a possibilidade desta afirmação ser um engano e que o uso de tecnologias de ponta não implica em novos paradigmas interpessoais. O objetivo desse artigo é avaliar as ferramentas disponibilizadas com a finalidade de encontrar elementos que validem ou não as mudanças de poder, controle e disciplinamento que ao nosso entendimento estimulariam uma mudança de paradigma educacional. Foram catalogados 17 ambientes virtuais de aprendizagem acessados por meio de resgates históricos pesquisados na internet e esses ambientes foram submetidos a uma análise critica apoiada na arqueo-genealogia destes produtos. Identificou-se mais de 120 ferramentas agrupadas em três categorias de análise. Ferramentas de administração, de comunicação e de exposição dos conteúdos. Constatou-se que o foco dos ambientes virtuais de aprendizagem continua sendo a manutenção de relações controladoras, regulamentadoras e disciplinadoras inclusive proporcionando retrocessos em conquistas já consideradas consolidadas na educação presencial. As ferramentas que os sistemas disponibilizam não garantem uma mudança de paradigma nem um tipo de ação mais aberta por parte dos docentes. Enfim, ainda existe um grande caminho até que as mudanças tecnológicas representem uma evolução na ação docente e discente.

Palavras-chave: Ambientes. Comunidades. Educação. Filosofia da tecnologia.

Abstract – This paper analyzes the development of virtual learning environments

used in distance education in Brazil in the 90s. This research is inspired by the approach proposed by Foucault and considers the study of digital documents and seeks to understand the logic of control, power and regulations imposed on students in virtual learning environments. The virtual learning spaces are commonly associated with new ways of doing education, the modernization paradigm shifts and changes are suggested. However, the research has shown that a high possibility that this statement is a misunderstanding and that use of newer technologies do not necessarily imply new interpersonal paradigms. The purpose of this paper is to evaluate the tools available to find evidence to validate or not the changes of power, control and discipline to our understanding that stimulate a paradigm shift in

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education. We studied 17 virtual learning environments. They were accessed through historical research on the internet and these environments were subjected to a critical analysis supported by Foucault´s theory. We identified more than tools 120. They were grouped into three categories of analysis: tools for administration, communication and display the content. It was found that the focus of virtual learning environments remains the maintenance of controlling relations, regulatory and disciplinary. They provide setbacks in gains already considered in the consolidated presential education. The systems provide tools that do not warrant a paradigm shift or a more open type of action by teachers. Finally, there is still a long way toward technological changes for represent an evolution in action learning and teaching.

Keywords: Environments. Communities. Education. Philosophy of technology.

1. Introdução

Em 1599, foi feita a publicação de um livro, pela Companhia de Jesus, que era um conjunto de regras para normatizar a forma de se fazer educação, o Ratio Studiorum. A educação pareava com o controle, com disciplina e com respeito inquestionável a autoridade. Esse manual do século XVI pode ser considerado como uma das documentações que propiciaram a passagem do ensino medieval para o moderno. A educação sempre pautada em elementos de controle, exercícios de poder, disciplina, trouxe da época medieval para a moderna essa influência e daí para os Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA).

Na década de 1990, com o impulso que foi dado à modalidade de educação a distância no Brasil, os AVA utilizados na educação apoiada em tecnologia e a distância ganham nova força e se pautam sobre três eixos (Belloni, 1999), em razão de sua tendência ao exercício de controle e poder: time free, place free e pace free. Tais eixos sempre foram fictícios e não representam preceitos aceitáveis na educação a distância. Não faziam parte dos ambientes virtuais de aprendizagem sempre produzidos com inúmeras amarras tecnológicas que exigiam a definição de intervalos de tempo, de ações específicas, de separações de grupos e outras atividades mais delimitadas.

Neste trabalho, foram mapeadas as ferramentas de controle e comunicação usadas nesses AVA a partir de uma abordagem metodológica com base na perspectiva arqueológica e genealógica, de inspiração foucaultiana, utilizando documentos digitais sobre os AVA utilizados no Brasil. Salientam-se as propostas de ferramentas e sistemas que foram sendo agregadas aos AVA para proporcionar outras formas de interações sempre controladas. Será argumentado que estes espaços, longe de proporcionar novos fazeres educativos, na verdade, perpetuam o modelo de prática pedagógica tradicional estimulando inclusive um processo de embotamento da ação do professor tutor que em alguns casos passa a ser um “boneco de ventríloquo” do professor coordenador da disciplina. A educação cada vez mais faz parte da história das grandes sistemáticas de controle de pensamento, de comportamento ou ambos consolidando-se como um dispositivo do Estado.

Por outro lado, não se pode deixar de pensar que os AVA podem ser uma ponte para algo diferente, quem sabe novo e até revolucionário a partir do rompimento da ingenuidade político pedagógica sobre suas construções e da interferência de pensadores livres de “algemas” tecnológicas. Por isso, trata-se de compreender as tendências sócio-políticas disponibilizadas sob a forma de ferramentas de interação e disponibilização nesses espaços.

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elementos que referendam a idéia de poder, como o controle de acesso, administração absoluta de todos os espaços, controle de tempo, espaços delimitados e outros que são comuns aos AVA (Dillenbourg, 2007), considerados inerentes a esses espaços. Nessa perspectiva se pode pensar no ambiente virtual de aprendizagem, ainda que esteja na rede, como um espaço de confinamento ao invés de um espaço de excarceramento, já que as escolas físicas sempre foram equiparadas a uma perspectiva de arquitetura carcerária.

Foucault (1987) narra um parágrafo especialmente possível de auxiliar na compreensão do que se quer salientar sobre a influência histórica do controle e autoritarismo impostos ao processo educativo, inclusive expressos na arquitetura (fachadas) das escolas e refletido nos AVA:

“A “invenção” dessa nova anatomia política não deve ser entendida como uma descoberta súbita. Mas como uma multiplicidade de processos muitas vezes mínimos, de origens diferentes, de localizações esparsas, que se recordam, se repetem, ou se imitam, apóiam-se uns sobre os outros, distinguem-se segundo seu campo de aplicação, entram em convergência e esboçam aos poucos a fachada de um método geral. Encontramo-los em funcionamento nos colégios, muito cedo; mais tarde nas escolas primárias; investiram lentamente o espaço hospitalar; e em algumas dezenas de anos reestruturam a organização militar. Circularam às vezes muito rápido de um ponto a outro (entre o exército e as escolas técnicas ou os colégios e liceus), às vezes lentamente e de maneira mais discreta (militarização insidiosa das grandes oficinas).” (Foucault, 1987, p. 165)

Existe uma associação do uso da tecnologia com a ideia de processos de aprendizagem modernos, vinculados a abordagens onde os alunos irão criar, explorar e integrar conhecimentos (Stahl, 1991) e se submeterem ao controle daquilo que está sendo realizado no espaço virtual. Alardeia-se no espaço cibercultural o nascimento de um novo tipo de indivíduo e de trabalhador em todos os setores econômicos (Belloni, 1999) como se os aportes de tecnologias na educação e no trabalho gerassem um novo tipo de ser humano.

A partir dos ambientes virtuais analisados durante a pesquisa, ainda em andamento, não se pode perceber nem essas novas metodologias didáticas de vanguarda, nem a formação de um novo tipo de pessoa. Os ambientes são inóspitos, os contatos intergrupos são controlados e monitorados e os sujeitos não denotam maior engajamento ou significado por estarem em grupos virtuais em ambientes de aprendizagem (Loureiro, 2010).

Dessa forma, este trabalho vai abordar os ambientes de aprendizagem e evidenciar a tendência destes produtos digitais a serem desenvolvidos como instrumentos que revivem as “escolas” do século XVII, XVIII e XIX onde a arquitetura pedagógica e do sistema programado favorece o controle, a prática do poder docente e a observação dos coordenadores. O objetivo da pesquisa é, portanto, avaliar as ferramentas disponibilizadas com a finalidade de encontrar elementos que validem ou não as mudanças de poder, controle e disciplinamento que ao nosso entendimento estimulariam uma mudança de paradigma educacional.

2. Revisão de Literatura

Os caminhos de compreensão da ciberculturalização da sociedade que tem pautado toda a série de ações que envolvem os investimentos governamentais em tecnologias da informação e comunicação traduzem uma perspectiva ufanista do uso das TIC - Tecnologias de Informação e Comunicação no Ensino, tendo como base, entre outras, os indicadores de uso da internet fornecidos pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil, pelo volume de trabalhos

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envolvendo educação e tecnologias registrados nas bancas da CAPES, pelo Banco Mundial (BIRD) e outras instituições. Nesta mesma perspectiva, autores assumem essa perspectiva (Levy, 1999; Lemos, 2002; Belloni, 1999) de que o aporte tecnológico vai catapultar uma mudança no homem para uma forma de integração social mais intensa e de maior comprometimento com o outro. Em síntese, uma visão da “boa tecnologia ou da tecnologia para o bem” independente da ética do sujeito.

Seria uma ingenuidade acreditar que um fenômeno como a tecnologia, equipamentos de alto custo, financiamentos de fundos governamentais e militares seriam entregues a população e ao mercado sem um interesse bem definido e vinculado a processos de controle. Desde que o homem adquire uma existência política ele se converte em um objeto do governo (Castro, 2009). Não se faz raciocínio diferente quando se pensa nas tecnologias que nascem muito antes de serem implementadas (Heidegger, 2006). E, em geral, só são apoiadas e implementadas aquelas que reforçam a possibilidade de governamentalidade aplicadas ao meio acadêmico que produz os AVA.

Os AVA, uma das evoluções tecnológicas voltadas para a extensão da prática educativa, são construídos por especialistas de diversas áreas e passam a ser objeto de interesse e dedicação constituindo-se, nos anos 90, numa verdadeira avalanche de propostas e de possibilidades para uso de AVA em instituições de ensino superior e no meio empresarial. Sendo que a maioria das propostas pautadas pela certeza de que os administradores e professores poderiam manter perfeito controle das situações dentro do espaço institucional digital. Não poderia ser diferente me razão das origens de financiamentos, das instituições patrocinadoras e da episteme histórico-filosófica do desenvolvimento destes produtos.

Estes ambientes funcionam por meio da internet e se sabe que o volume de informações acessíveis nesse meio é bastante aumentado em razão da internet (Pozo, 2002) e nem a escola ou a universidade, os professores ou os alunos foram preparados para estas ofertas de tecnologia e informação. Os AVA oferecem um mundo de informações, mas não é oferecida formação ética automatizada.

A tecnologia torna mais complexo este processo de mutação, que nem sempre é mudança paradigmática. O aluno chega mudado, os professores têm que mudar e as ferramentas (AVA) e as metodologias traduzem influências do século XIX só que sob forma digital e multimodal. Digitalizou-se o controle, o disciplinamento e as regras das instituições do passado.

Sem dúvida, os ambientes virtuais de aprendizagem têm um impacto direto na relação professor-aluno e possibilitam a transformação de comportamentos mentais e físicos (Dias et al., 2011). Seria ingênuo acreditar que esse processo de formação crie um sujeito autônomo tecnologicizado e um cidadão integrado às necessidades da sociedade cibercultural. Quando podem surgir sujeitos de uma nova educação, quando são propostos espaços de controle e vigia panópticos sob total fiscalização de programadores, professores, tutores, sistemas de detecção e outras formas tecnológicas de fiscalização, não podemos supor que as tecnologias sejam incondicionalmente sinônimo de avanço pedagógico.

Em geral, os AVA, bem como a própria evolução da modalidade da EaD, são categorizados a partir dos avanços tecnológicos, a partir de complexidades de novos softwares e equipamentos. Não se classificam estes equipamentos a partir de seus avanços metodológicos ou mesmo das relações que se estabelecem nestes espaços com os discentes que os utilizam no dia a dia. Analisa-se o sistema eletrônico disponibilizado e não o conjunto que envolve o docente, o sistema, o aluno e as relações multirreferenciadas. Em suma,

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avaliamos os AVA de uma forma estática e desconectada do contexto onde são usados. É certo que a ciência moderna depende da tecnologia (Bunge, 1996), a educação dependerá também da tecnologia. Entretanto não se pode esperar que as resultantes desta dependência sejam imbricadas “naturalmente” nos atores e que eles sejam sujeitos da “nova era” com novos comportamentos, novos pensamentos e novas éticas. Essas novidades têm que atender a máquina ideológica existente e consolidada.

Pensa-se a era digital na educação com uma mente pré-digital. Os poderes ou controles, ainda mais elaborados, mais sutis, com horizontes mais largos, cercados por um discurso centrado nas necessidades de manutenção de um biopoder instituído sobre o sujeito aluno por parte do sujeito professor ou administrador, continuam sendo o principal foco das relações educacionais.

A compreensão do significado de AVA aparece nas definições utilizadas para caracterizá-los e chegam a tender ao simplismo banalizado. Um vazio de significado que não parece compor um “local” onde se espera que pessoas estejam construindo seus conhecimentos.

Nenhuma definição aborda o espaço em relação ao sujeito e as suas possibilidades de mobilidade longe do controle ou regulamentação do próprio ambiente. Todas as definições estão centradas no software e em relações idealizadas que raramente acontecem na prática da participação no ambiente virtual de aprendizagem (Loureiro, 2010) e daí não discutem o controle, a disciplina e o poder de fiscalização que o produto oferece ao usuário docente ou administrador.

Dillenbourg (2007) vai sugerir uma série de peculiaridades sobre as potencialidades de uso da internet e das TIC e daí dos AVA, como por exemplo, a pesquisa de informação na rede, possibilidade de construção de textos coletivos, estudantes como produtores de conhecimento e outras formas que traduzem, para ele, novas possibilidades educacionais. Estas abordagens ditas interativas sugerem que o aluno vai desenvolver seu conhecimento e produzir informação, não mais como um simples repositório de informação, mas sob forte controle e apoio dos docentes (Loiselle, 2002). É importante salientarmos que o controle é tido como algo benéfico e indispensável.

Acreditar na possibilidade de combinação de um ambiente virtual de aprendizagem com forte aporte tecnológico como sendo um caminho direto para a transformação do estudante apóia-se numa postura de que a tecnologia será associada à metodologia e isso proporcionará um novo aluno. Um aluno integrado à sociedade tecnológica, um ser coletivo, autônomo e integrado ao uso da tecnologia, afinal ele pertence à geração conectada (Mattar, 2009; Palloff; Pratt, 2004). Isso não acontece, pelo menos nesse momento porque os espaços virtuais não funcionam para possibilitar essa transformação que é antes de tudo cultural.

Peters (2004) destaca um caráter heteronômico na educação a distância (ela tende a ser individualizante), sua tendência para a predeterminação das ações dos estudantes, sua maior necessidade de estruturação e suas amarras. Enfim, uma perspectiva realista e que assume a necessidade de controle inerente ao processo de tecnologização da educação. Peters (op.cit) sustenta que todas essas características são controladas a partir do ambiente virtual de aprendizagem.

Okada e Santos (2004) sugerem uma classificação dos AVA em termos das relações que, potencialmente, eles possibilitem. As classificações são denominadas instrucionais, interativos e cooperativos, mas sua análise está centrada no ambiente, não considera o

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contexto social orgânico em que os atores humanos se inserem.

Valentini e Soares (2005) também salientam aspectos de interação procurando dar um ganho mais social, que de fato acontece, nos ambientes virtuais de aprendizagem, só que de forma controlada. Contudo, Loureiro (2010) identifica que a coesão nos espaços virtuais de aprendizagem não ultrapassa níveis básicos, traduzindo as relações como motivadas pela necessidade, impulso e interesse o que nos leva a inferir sobre a insignificância e superficialidade de muitas raízes construídas em ambientes virtuais de aprendizagem. Assim, procura-se delinear uma visão sobre as ferramentas que estes ambientes oferecem e estabelecer sentidos para as ferramentas neles disponibilizadas em relação a compreensão destas como instrumentos de interação, comunicação, troca, controle e exercício de poder.

3. Metodologia

Primeiramente é importante salientar que este projeto de pesquisa foi desenvolvido a partir de uma pesquisa que contou com apoio do Instituto UFC Virtual da Universidade Federal do Ceará, responsável pela criação do ambiente institucional de EaD da UFC e pela administração da Universidade Aberta do Brasil – UAB/UFC/CE que hoje atende mais de 6.000 alunos em um AVA específico.

A escolha metodológica foi pautada pela influência da pesquisa arqueo-genealógica de inspiração foucaultiana (Castro, 2009) que oferece a compreensão e possibilidade de se investigar os documentos virtuais. Neste caso, a visão de Foucault da genealogia vai ser usada para fundamentar o resgate histórico e os discursos materializados não nas palavras, mas nos produtos que foram analisados (Foucault, 2004).

Assim, através da perspectiva arqueo-genealogica se revisa a compreensão sobre os AVA, ferramentas e desenvolvimentos de programação eletrônica e didático metodológicas. Integra-se a pesquisa documental, de grande validade para a reconstituição do passado (Cellard, 2008; Caulley apud Lüdke, Andre, 1986; Helder, 2006), nesse trabalho, caracterizada como ciber-documental. Daí a importância da garimpagem de ambientes que foram usados no Brasil durante o apogeu das construções de AVA no recorte de meados da década de 1990 até o ano de 2009.

Também é preciso salientar que na abordagem clássica da pesquisa documental se sabe que os documentos devem ser situados dentro de uma forma teórica para que eles possam ser compreendidos no contexto em que serão entendidos, além do que os documentos não podem ser compreendidos isoladamente, na maioria dos casos (May, 2004). Feita a escolha destes ambientes, pautados pela sua emergência nas pesquisas realizadas na web, as ferramentas que cada um deles oferece ao discente, docente e administrador foram catalogadas. Foram feitas leituras cuidadosas dos espaços virtuais que aparecem como oficiais para ampliar nossa compreensão e conhecimento. Todas as fontes estão disponíveis de forma aberta na rede (não depende de registro ou login para ter acesso a informação).

Estabelece-se a relação entre as diversas ferramentas oferecidas e suas funções nos ambientes. Feito isso, observa-se a relação aos dados coletados que as ferramentas eram praticamente as mesmas e, além disso, eram utilizadas da mesma forma com raras exceções. Características como elementos de separação entre os cursos, impossibilidade de um aluno de um determinado curso dentro do ambiente virtual interagir com outro é muito comum dentro do espaço virtual. Alunos de um curso só conseguem dialogar dentro dos espaços virtuais com alunos do mesmo curso de sua turma e, em alguns casos, de forma bastante restrita.

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Todos os espaços são pautados pela ideia de interação e cooperação com seus pares fechados e limitados pelo sistema.

O uso do enfoque da pesquisa documental no espaço digital lança outra luz a esse tipo de abordagem metodológica que é pouco utilizada na educação. Contudo, aquilo que está disponível na rede são documentos. É exatamente nesta contextualização, histórica, social e cultural dos documentos que a abordagem arqueo-genealógica ganha importância, já que sua abordagem vai conduzir a busca da episteme, dos modos de ser daqueles que registraram na internet as suas criações.

Por outro lado, o foco arqueo-genealógico possibilita fundamentar a análise em termos de estratégia e poder aplicadas nos discursos (vídeos de palestras) e escritas digitais.

4. Resultados e Discussão

Foram estudados 17 ambientes virtuais de aprendizagem por meio de documentos digitais disponíveis na web. As referências dos documentos são encontradas no blog criado pelos autores deste trabalho. Os ambientes estudados foram:

(1) WEBCT - Criado em 1996 por University of British Columbia;

(2) BLACKBOARD - Criado em 1997, por Blackboard Inc. Formada pela junção de duas pequenas companhias que trabalhavam com pequenos softwares-cursos em Cornell University;

(3) E-PROINFO - Criado em 1997, pela Secretaria de Educação a Distância - SEED do Ministério da Educação – MEC;

(4) AULANET - Criado em 1997 pelo Laboratório de Engenharia de Software (LES) do Departamento de Informática da Pontifica Universidade Católica (PUC-RJ);

(5) EUREKA - Criado em 1998 pelo Laboratório de Mídias Interativas – LAMI da PUCPR através de um acordo com a Siemens Telecomunicações;

(6) TELEDUC - Criado em 1998 por Nied (Núcleo de Informática Aplicada a Educação) sob a orientação da Professora Dra. Heloísa Vieira da Rocha do Instituto de Computação da Unicamp;

(7) LON-CAPA - Criado em 1999, por Michigan State University. Surgiu da união de dois Ambientes Virtuais de Aprendizagem criados anteriormente, o CAPA (criado em 1992, pensado para aulas de ciências oferecendo feedbacks instantâneos e permitindo alterações nos trabalhos até a data limite) e o LectureOnline (Criado em 1997, disponibilizando material online para estudo e atividades individuais diferentes);

(8) ADAPTWEB - Criado em 2001 foi desenvolvido por um projeto de pesquisa no Instituto de Informática da UFRGS e no Departamento de Computação da UEL;

(9) MOODLE - Criado em 2001 pelo educador e cientista computacional Martin Dougiamas (Austrália). É desenvolvido colaborativamente por uma comunidade virtual, que reúne programadores e desenvolvedores de software livre, administradores de sistemas, professores, designers e usuários de todo o mundo;

(10) AMADEUS - Criado em 2001 com a aprovação de um projeto CNPq ProtenCC por docentes da UFPE;

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(Unisinos);

(12) UNISULVIRTUAL - Criado em 2004 pela Universidade do Sul de Santa Catarina;

(13) SOLAR - Criado em 2005 por docentes da UFC;

(14) WIKIVERSIDADE - Criado em 2006 por usuários WEB mais como uma comunidade de aprendizado livre e gratuito;

(15) LIVEMOCHA - Criado em 2006 por pesquisadores, executivos e professores da Universidade de Michigan;

(16) STORY BIRD - Criado em 2007 por MARK LASZLO é um produto de iniciativa própria de um educador americano que via potencial nos desenhos e histórias contadas pelo seu filho, e desenvolveu um portal web colaborativo para criação de história;

(17) PORTAL EDUCAÇÃO - Criado em 2010 por Ricardo Nantes. Com ajuda de colegas e pequenos apoios criam a marca unindo os pequenos portais anteriores em um grande portal.

As ferramentas encontradas foram divididas para efeito de catalogação e análise em três tipos: de comunicação, administrativas e de exposição. As primeiras englobam os softwares que permitem a comunicação síncrona e assíncrona, como os fóruns e chats; as ferramentas administrativas que possibilitam a administração do sistema e das pessoas que utilizam ambiente virtual e por fim as ferramentas de exposição que possibilitam a disponibilização de aulas, materiais diversos, vídeos, áudio e outros.

Quando se pensa em comunicação, Moraes (2002, p.203) salienta que “Em qualquer situação de aprendizagem, a interação entre os participantes é de extrema importância. É por meio das interações que se torna possível a troca de experiências, o estabelecimento de parcerias e a cooperação”. Entretanto, a despeito dessa importância os ambientes de aprendizagem analisados (com exceção de um dos ambientes) possibilitam esta comunicação, mas a forma como estas trocas ocorrem é mediada, controlada e pautada em conformidade ou não com os alunos. Na verdade as trocas de experiências são definidas por outros atores e as interações têm um tempo cronológico definido para acontecerem.

A Internet e a World Wide Web são apontadas como solução para a criação de ambientes virtuais de aprendizagem que possibilitam uma aprendizagem interativa, flexível e à distância como nunca foi possível anteriormente (Salas et al., 2002). No entanto, é preciso salientar que essas questões que envolvem posturas humanas são eminentemente vinculadas aos sujeitos que regulam estas interações e à maneira como trabalham as questões de poder e disciplinamento no ambiente.

Segundo Piccoli, Ahmad e Ives (2001), muitos dos fatores que determinam a efetividade dos ambientes virtuais de aprendizagem estão ligados a aspectos relacionados à forma de ação dos discentes, dos tutores, da proposta pedagógica, dos aportes tecnológicos, dos controles aplicados sobre os discentes, dos conteúdos e interações. Todos estes elementos influem na efetividade de um AVA.

Observa-se que autores seminais da educação a distância não tratam de questões que envolvem a ideologia e a forma de governamentalidade proposta no ambiente virtual de aprendizagem. Esta perspectiva em nenhum caso é discutida ou abordada. A preocupação que se percebe surgir nesses processos é de que alguns estudantes possuem características que

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comprometem a efetividade dos AVA, fazendo com que a educação a distância comece a ser alinhada a um tipo de discente que seja mais aplicado do que reflexivo, mais solucionador de problemas e autônomo do que crítico e humano em suas abordagens. E, por fim, caracterizará um aluno que se submeta absolutamente aos moldes e modelos da forma pedagógica.

Do ponto de vista administrativo, todos os espaços requerem que o aluno acesse o ambiente reproduzindo um movimento historicamente conhecido de que “o aluno vai até a escola”. Não se tomou conhecimento de AVA que vá até o aluno.

Outro fato comum a dezesseis (16) ambientes é que os administradores, a qualquer momento, sabem quem está no espaço digital caracterizando um grande dispositivo panóptico de vigilância. Muitos destes controles se justificam nas explanações destes ambientes em razão da necessidade organizacional, do controle de fraudes e de outras ações que visam o “bem estar da comunidade” institucional.

Apenas um (n=1) dos ambientes coloca como opcional a questão da apresentação de um registro e senha para se ter acesso ao ambiente de aprendizagem. Em grande parte dos ambientes, grupos são seccionados e um aluno de um curso e de determinada disciplina não consegue se relacionar com alunos de outros cursos, ainda que em alguns casos exista a possibilidade dele visualizar e se relacionar com alunos da mesma disciplina.

O próprio gerenciamento de arquivos do professor não é totalmente controlado por ele e sim por administradores em razão de uma necessidade organizacional. Tal influência traduz o que afirmamos anteriormente por meio de Dillenbourg (2007), Santos (2003), Valentini e Soares (2005) que explicitam estas características de forma indireta através de suas concepções do que é um ambiente de aprendizagem virtual. São situações consideradas “naturais” nos espaços digitais que imitam os espaços orgânicos de um ou dois séculos atrás.

Foram catalogadas cento e vinte e duas (n=122) ferramentas e recursos (visualização no blog), digitais ou analógicos, nos AVA sendo que as ferramentas de correio eletrônico, fórum, entrega de exercícios e correções, chat e avisos existem em quatorze (n=14) ambientes de aprendizagem. Palloff e Pratt (2004) fazem análise destes espaços virtuais, de maneira genérica, e identificam estas ferramentas como muito comuns nos espaços virtuais, fato que foi plenamente constatado em nossas análises.

Nenhuns destes espaços são exclusivos dos alunos e todos são monitorados. Destes espaços virtuais, dezesseis (n=16) ambientes possibilitam a troca de correios eletrônicos entre alunos e podem ser monitorados. Os alunos não têm ambientes que sejam construção exclusiva deles. No AVA institucional somente é possível a criação de espaços e comunicações autorizadas pelos administradores e professores e são ambientes sujeitos a regras e monitoramento.

Ferramentas que sondam as comunicações entre as pessoas, indicação de quem conversou com quem, analisadores de plágio e referências são alguns exemplos de ferramentas que estão disponíveis nos espaços virtuais de aprendizagem com a finalidade de controlar e fiscalizar a formação do discente.

Cinco (n=5) ambientes possibilitam a realização de comentários nos trabalhos, contudo, o professor ou administrador decide se o aluno pode ou não ver o que foi comentado. Existem AVA que fornecem boletins com notas, suportes para jogos que atendam uma censura definida e que podem ou não ser mantida conforme a vontade do professor ou administradores, montadores de prova, avaliações automáticas pelo sistema e uma série de outras ferramentas ou recursos. Cinco (n=5) ambientes possibilitam a pesquisa de opinião ou

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enquetes, mas nenhum deles garante o anonimato do respondente.

Mesmo com as classificações propostas por Okada e Santos (2004) é possível perceber que qualquer um destes ambientes podem ser classificados como instrucionais, interativos ou cooperativos. Atributos como instrução, interação e cooperação são humanos e não podem ser, no momento, delegados aos softwares. A minoria das mensagens destes espaços é utilizada para trocas entre os discentes e docentes reproduzindo a sala de aula tradicional em que as comunicações só devem acontecer de aluno para professor e vice versa.

5. Considerações Finais

As questões que emergiram nesse trabalho têm demonstrado que a vinculação da ideia de desenvolvimento tecnológico de ferramentas, softwares ou outros produtos da “era digital” estejam intrinsecamente associadas a um novo paradigma humano educacional é equivocada já que não se percebe mudanças significativas nas lógicas que caracterizam as instituições de ensino superior.

A programação destes ambientes, as propostas de interação, as ferramentas e toda a filosofia que acompanha os AVA está firmemente ancorada em uma educação tradicional no que se refere as relações interpessoais.

Os sistemas são vigiados de forma muito ampla sob pretexto de que é importante o controle e regulamentação para o “bom andamento” das ações, o que fica muito claro em razão da preocupação com relatórios, controles de acesso e permanência.

A lógica das instituições tradicionais permanece inalterada a não ser pelo fato de que passam a acontecer em um lócus digital. Nenhum dos ambientes de aprendizagem analisados mudou a lógica das relações entre aluno e professor, não alterou as relações de poder e não deixa de lado a necessidade histórica de controle dos administradores e docentes.

Em muitos aspectos a educação construída por meio destes ambientes de aprendizagem desfaz avanços históricos e políticos conquistados na educação presencial, como por exemplo, a possibilidade de o aluno transitar dentro da instituição de ensino sem que isso implique em contravenção ou a possibilidade de se experimentar outras lógicas de acesso e formatação de conteúdos.

Pretende-se dar continuidade na pesquisa, analisar aspectos de interação e de estabelecimento de relações dentro destes ambientes. Os usos amplos de tecnologias aplicadas aos ambientes virtuais de aprendizagem e aos conteúdos disponibilizados não refletem de forma nenhuma um avanço na ação docente ou discente nem nas relações institucionais entre alunos e instituição. Os ambientes de aprendizagem tendem a ser muito mais compulsórios e coercitivos do que se pode esperar das ações geradas na cibercultura.

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Referências

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