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A União Europeia e a crise Líbia : uma Política Comum de Segurança e Defesa?

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UMA PERSPETIVA ANALÍTICA DA POLÍTICA COMUM DE

SEGURANÇA E DEFESA DA UNIÃO EUROPEIA:

O PÓS-TRATADO DE LISBOA A PARTIR DO ESTUDO

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Agradeço a todos os Professores que me acompanharam ao longo do meu percurso académico, em particular aos Professores que tive o privilégio de contactar no âmbito do Mestrado em Economia Internacional e Estudos Europeus, e em especial ao meu orientador, Professor Doutor António Goucha Soares, pela sua orientação metodológica, disponibilidade e aconselhamento.

Dirijo ainda uma palavra de especial apreço e gratidão à minha família, e ao Rodolfo, pelo apoio e motivação transmitidos em momentos de menor inspiração.

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UMA PERSPETIVA ANALÍTICA DA POLÍTICA COMUM DE SEGURANÇA E DEFESA DA UNIÃO EUROPEIA: O PÓS-TRATADO DE LISBOA A PARTIR DO

ESTUDO DE CASO DA LÍBIA Por Ana Marta de Almeida Rodrigues

Resumo:

A ambiguidade do papel da União Europeia na cena internacional tem representado uma das grandes questões para toda a sociedade internacional, incluindo para a própria Europa em que mais do que nunca os seus Estados membros devem determinar até onde estão dispostos a ir em nome da defesa de interesses comuns.

O presente estudo pretende dar resposta à seguinte questão central – Quais as implicações da crise Líbia no processo de definição gradual de uma política de defesa da União Europeia, integrando a Política Comum de Segurança e Defesa criada pelo Tratado de Lisboa?

A nova Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD), renomeada pelo Tratado de Lisboa, substituiu e ampliou o anterior mandato da Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD). Uma das inovações do Tratado consiste na possibilidade dos Estados membros estabelecerem entre si cooperações reforçadas (CR) e cooperações estruturadas permanentes (CEP) no âmbito da defesa, não necessitando do aval dos 27 Estados membros.

A crise política e militar na Líbia será o nosso caso de estudo. Adotaremos como referencial político o Tratado de Lisboa que, tendo abolido a estrutura dos três pilares comunitários, e criado novos instrumentos e mecanismos por forma a agilizar os processos de tomada de decisão e a circulação de informação na União, se vê ainda bastante limitado na sua aplicação prática.

A resposta chave ao desafio estratégico de uma política de segurança e defesa integrada na política externa europeia reside na necessidade de uma vontade política comum para tornar a União Europeia num ator internacional relevante, no ambiente estratégico atual, capaz de afirmar os seus valores e defender os seus interesses comuns. Só a materialização desta vontade política permitirá concluir que as lições do caso da crise na Líbia foram de facto aprendidas e a União está em condições de concretizar uma nova estratégia decorrente do Tratado de Lisboa.

Palavras-Chave: Política, Defesa, Segurança, Estratégia, Gestão de Crises, União

Europeia, Tratado de Lisboa, Política Comum de Segurança e Defesa, Líbia, NATO, Primavera Árabe, França, Reino Unido, Alemanha.

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Abstract

The ambiguity of the EU's role on the international scene has represented one of the major issues for the whole international society, including to Europe itself that more than ever its Member States shall determine how far they are willing to go in the name of defending common interests.

This study aims to answer the following central question - What are the implications of the Libya crisis in the process of framing of a defense policy of the European Union, incorporating the Common Security and Defence created by the Lisbon Treaty?

The new Common Security and Defence Policy (CSDP), renamed by the Treaty of Lisbon, replaced and expanded the previous mandate of the European Security and Defence Policy (ESDP). One of the innovations of the Treaty is the ability of Member States to establish closer cooperation among themselves and a permanent structured cooperation (PSC) within defense issues, not requiring the agreement of the 27 Member States.

The political and military crisis in Libya will be our case study. We will take as a political reference the Lisbon Treaty, that having abolished the structure of the three pillars of community, and created new instruments and mechanisms in order to streamline the decision-making and circulation of information in the EU, we still see quite limited in its application on the field.

The key answer to the strategic challenge of a common security and defense in the integrated European foreign policy is the need of a common political will to make the European Union a significant international player in the current strategic environment, able to assert its values and defend their common interests. Only the realization of this political will conclude that the lessons of the case of the crisis in Libya were indeed learned and the Union is able to implement a new strategy under the Treaty of Lisbon.

Keywords: Politics, Defense, Security, Strategy, Crisis Management, European

Union, Lisbon Treaty, the Common Security and Defense Policy, Libya, NATO, Arab Spring, France, UK, Germany.

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Índice

1. INTRODUÇÃO ... 6

2. ENQUADRAMENTO CONCETUAL E JURÍDICO ... 10

2.1. Tratado de Lisboa: Uma Nova Política Externa ... 10

2.2. A Estratégia ... 12

3. A CRISE DA LÍBIA ... 14

3.1. “A Primavera Árabe” ... 14

3.2. O Regime Líbio ... 15

3.3. UE-Líbia: Interesses Comuns ... 16

3.4. A Ação da União Europeia ... 17

3.5. UE: Missão EUFOR Líbia ... 21

3.6. Motivações na constituição da Coligação Anglo-Francesa ... 22

3.7. O Posicionamento Alemão ... 24

3.8. A Organização do Tratado do Atlântico Norte: Operação Protetor Unificado ... 28

4. ANÁLISE DE RESULTADOS: A PCSD NO QUADRO DE ATUAÇÃO DA LÍBIA ... 30

4.1. Um novo contexto e direção estratégica para a Europa ... 36

4.2. O quadro para uma política externa e de segurança e defesa europeia ... 36

5. CONCLUSÕES: LIÇÕES PARA UMA SEGURANÇA E DEFESA EUROPEIA ... 38

ANEXOS ... 44

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 45 ANEXOS ... Erro! Marcador não definido.

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1. INTRODUÇÃO

O presente Trabalho Final de Mestrado (TFM) expressa os resultados do projeto de investigação desenvolvido pela autora no âmbito do Mestrado em Economia Internacional e Estudos Europeus, ministrado pelo Instituto Superior de Economia e Gestão da Universidade Técnica de Lisboa. Colocamos um nível de ambição limitado, como o título traduz, a uma perspetiva analítica, em função da extrema complexidade do tema e das limitações colocadas pelo período temporal curto que decorreu entre a assinatura do Tratado de Lisboa e a crise na Líbia e, também, pela informação disponível limitada a fontes abertas, produzida pelos diferentes atores - Estados, organizações internacionais, think thanks, institutos, académicos, militares e civis.

Ao elegermos como um ponto de observação a crise na Líbia tal resulta da ideia de que é nessa crise que atingem o ponto mais alto as perplexidades, indecisões políticas e estratégicas, que remetem a formulação de uma política de segurança e defesa europeia, tal como o Tratado de Lisboa a desenha, para a necessidade de novas definições e afirmação do caminho a seguir, neste âmbito, pela União Europeia.

O Tratado de Lisboa (TL), assinado pelos Estados Membros da União Europeia, em dezembro de 2007, permitia à UE dotar-se de novas estruturas e instrumentos em matéria de política externa e de segurança que permitiriam densificar o seu papel de ator global, designadamente na política externa e na política de segurança e defesa. Tal facto foi expresso pelas vinte e cinco emendas aos tratados anteriores - o Tratado de Roma e o Tratado de Maastricht- que resultaram em disposições relativas aplicadas à política externa e de segurança.

A nova Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD), renomeada pelo TL, substituiu e ampliou o anterior mandato da Política Europeia de Segurança e Defesa

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(PESD) através da introdução da cláusula de auxílio e assistência mútua, em caso de agressão armada, e da cláusula de solidariedade, através do alargamento do leque de missões, com utilização de meios civis e militares, às operações conjuntas de desarmamento, de estabilização no pós-conflito, podendo contribuir para a luta contra o terrorismo, e através da introdução pelo TL dos mecanismos de Cooperação Reforçada (CR) e Cooperação Estruturada Permanente (CEP) em matéria de defesa.

A Política Europeia de Segurança e Defesa (PESD) assume-se como uma das áreas dinâmicas do processo de integração, consideradas as vicissitudes do mesmo, com expressão: - ao nível político através do consenso dos Estados-Membros (EM) para a aprovação da Política Comum de Segurança e Defesa, processo que inclui, na letra do TL, a definição gradual de uma política de defesa da União Europeia; - no plano estratégico, através da ratificação de uma Estratégia Europeia de Segurança (2003); - no plano operacional através da condução, desde 2003, de mais de vinte missões e operações PESD, civis e militares, mobilizando e empenhando mais de 15 mil homens e mulheres em diferentes regiões do globo.

A tese, com o tema “Uma perspetiva analítica da Política Comum de Segurança e Defesa da União Europeia no pós-Tratado de Lisboa a partir do estudo de caso da Líbia”, tem como questão central: “Quais as implicações da crise Líbia no processo

de definição gradual de uma política de defesa da União Europeia, integrando a

Política Comum de Segurança e Defesa criada pelo Tratado de Lisboa?”.

Para validarmos a questão central levantámos as seguintes questões derivadas:

1. No âmbito da competência da União Europeia em matéria de política externa e de segurança comum, qual a expressão assumida no quadro da crise da Líbia, nos domínios da política externa e nas questões relativas à segurança da União?

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2. No âmbito das políticas nacionais, qual a expressão assumida, no quadro da crise da Líbia, dos domínios das relações externas e de defesa dos Estados-Membros? 3. Qual a ação das instituições – Conselho Europeu, Conselho, Alto Representante

da União para os Negócios Estrangeiros e Política de Segurança, apoiado pelo Serviço Europeu de Ação Externa - fundamentais para a definição dos objetivos políticos e estratégicos?

4. Qual a ação da Organização do Tratado do Atlântico Norte, dos Estados e dos atores fundamentais que se empenharam ao nível político, estratégico e operacional no Teatro de Operações líbio?

5. Quais as lições identificadas a partir da crise na Líbia para uma política comum de segurança e defesa que, de acordo com o Tratado de Lisboa, conduzirá a uma defesa comum garantindo à União uma capacidade operacional apoiada em meios civis e militares?

6. Que conclusão retirar para a definição de um novo contexto e direção estratégica, tornado inadiável no quadro de segurança e defesa da União, designadamente da gestão de crises – parcerias, planeamento estratégico, capacidades civis e militares, e recursos?

Para orientar o nosso trabalho e dar resposta à questão central e às questões derivadas foram construídas as seguintes hipóteses:

HIP 1: O Tratado de Lisboa confere um impulso decisivo no sentido da integração europeia em matéria de segurança e defesa, definindo que a União está dotada dos instrumentos necessários para assumir novas responsabilidades em matéria de segurança a partir do reforço de uma capacidade militar própria.

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HIP 2: A União Europeia e os seus Estados-Membros (EM), em período de crise económica e financeira na Europa, reforçam as políticas europeias fundamentais e a Política Comum de Segurança e Defesa reforça o pilar europeu da Comunidade Transatlântica, materializando uma vontade política de integração mais profunda da segurança e defesa, tornando a União num ator internacional relevante de segurança e defesa.

Atendendo à variedade e complexidade das questões e hipóteses colocadas, temos consciência da limitação do presente trabalho de investigação. Apresentamos uma análise sucinta e objetiva, tendo em atenção a complexidade das relações e dos acontecimentos ocorridos no âmbito da crise líbia. Por outro lado, procuraremos complementar e contextualizar momentos-chave essenciais à análise através de anexos. A tese que se apresenta está dividida em cinco pontos. Colocada na introdução a questão central e as questões derivadas, a trabalhar a partir de duas hipóteses orientadoras, abordaremos num segundo ponto os pressupostos para um enquadramento concetual e jurídico de definição das questões da política, da estratégia e da gestão de crises, fundamentais para a compreensão dos instrumentos consignados no Tratado de Lisboa, e por nós abordados nos planos das instituições, das capacidades e operacional, que visam a construção do novo quadro político, estratégico e operacional, para uma União Europeia relevante como ator internacional de segurança e defesa.

O terceiro ponto consiste na apresentação do ambiente de segurança e da situação regional e tem como objetivo enquadrar e apresentar a crise da Líbia do ponto de vista das atuações dos atores fundamentais empenhados no cenário de conflito – o regime líbio, a União Europeia, os Estados que intervieram ou que pelo seu posicionamento determinaram as ações e as não ações, os Estados Unidos da América, primeira

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potência, a NATO, a ONU, a Liga Árabe, a UA - e assim fornecer os dados necessários para a análise de resultados tratada no ponto quatro do trabalho. Neste procura-se estabelecer um ponto de situação da PCSD a partir do percurso entre a aprovação do TL e o conflito da Líbia e desenhar as premissas para um novo contexto e direção estratégica, no quadro da segurança e defesa europeia e da gestão holística de crises, ao nível das parcerias, do planeamento estratégico, das capacidades e dos recursos.

O ponto cinco, das conclusões, procura tirar ilações dos pontos anteriores e elabora sobre as lições a retirar para uma segurança e defesa europeia, num ambiente estratégico internacional caraterizado por grande imprevisibilidade e globalização das ameaças e riscos transnacionais e, numa época já classificada de transição.

2. ENQUADRAMENTO CONCETUAL E JURÍDICO

2.1.Tratado de Lisboa: Uma Nova Política Externa

As alterações concetuais trazidas pelo Tratado de Lisboa1 incidem essencialmente na personalidade jurídica, possibilitando que a União se exprima como uma única identidade, através do recurso ao procedimento legislativo ordinário da codecisão, com o aumento, por consequência, da legitimidade dos seus Estados-Membros. Possibilita a clarificação das competências da União: as competências exclusivas2; as competências partilhadas com os Estados-Membros3. Nos domínios da Investigação e Desenvolvimento, dos assuntos do espaço, da Cooperação para o Desenvolvimento e da

1 Anexo A (Tratado de Lisboa, Política Externa) 2

Regras de concorrência, política monetária exclusiva dos EM da zona euro – união aduaneira, política comercial comum, conservação dos recursos biológicos do mar, conclusão de acordos internacionais previstos num ato legislativo da União

3

Mercado Interno, Agricultura, Pesca, exceto conservação dos recursos marítimos competência da União em exclusivo, Política Social, Coesão Económica e Social, Ambiente, Proteção dos Consumidores, Transportes da Rede Europeia, Energia, Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça

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Ajuda Humanitária, a União tem competência para agir independentemente, sem retirar aos EM a possibilidade de atuação autónoma.

Ao nível institucional4, a União reconheceu a importância vital do aprofundamento da sua política externa como meio de resposta aos desafios e às ameaças externas, que só podem ser eficazmente enfrentados através da articulação conjunta de recursos dos vários EM sob a alçada de uma entidade para lá das nações. A expressão política desta vontade viria a traduzir-se na ratificação do Tratado de Lisboa, em 2007, após um período imperativo de reflexão resultante do abandono do Tratado Constitucional, em 2003.

A dotação da União Europeia com uma personalidade jurídica ultrapassou uma situação em que a Comunidade Europeia (CE) possuía personalidade jurídica em áreas cuja posição da União era pouco definida. Com o Tratado de Lisboa a Comunidade Europeia é absorvida pela União, e é assim constituído um único ator internacional: a União Europeia5. Foram criados os cargos de Presidente do Conselho Europeu e de Alto Representante para os Negócios Estrangeiros, bem como um Serviço Europeu para a Ação Externa. O cargo de Alto Representante para os Negócios Estrangeiros assume um papel crucial na coordenação entre a vertente económica e política de atuação ao nível externo. Esta nova figura foi investida do designado “duplo chapéu”, na medida em que desempenha funções transversais às duas principais instituições da União, sendo simultaneamente Presidente do Conselho dos Negócios Estrangeiros e Vice-Presidente da Comissão, responsável pelo domínio das relações externas “Soares (2011) ”. O Alto

4 O Tratado define como instituições europeias o Parlamento Europeu, o Conselho Europeu, o Conselho,

a Comissão Europeia, o Tribunal de Justiça, o Banco Central Europeu e o Tribunal de Contas. Com repercussões no domínio institucional, o sistema de pilares criado em Maastricht é abolido com o Tratado de Lisboa.

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Terminou a estrutura dos três pilares em que a União assentava desde Maastricht, tendo como objetivo a separação entre as políticas de cariz supranacional e as políticas de natureza intergovernamental

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Representante para os Negócios Estrangeiros é, na prática, responsável pela condução de todos os grupos de trabalho intergovernamentais que funcionam ao nível do Conselho dos Negócios Estrangeiros.

Relativamente à segurança e defesa, o Tratado de Lisboa veio renovar as missões de

Petersberg, introduzir uma cláusula de solidariedade, que permite a intervenção

conjunta no caso um Estado membro ser alvo de um ataque terrorista, ou vítima de uma catástrofe natural, e institucionalizar a Agência Europeia de Defesa cuja missão consiste em identificar os objetivos de capacidades militares dos EM, promover métodos de aquisição eficazes, assegurar a coordenação de programas de capacidades dos Estados membros, apoiar a investigação tecnológica em matéria de defesa, e identificar medidas que aumentar a eficácia das despesas militares. No âmbito da defesa, as inovações do Tratado encontram-se ao nível: das cooperações reforçadas, alargadas agora à política de segurança e defesa; da criação de uma cooperação estruturada permanente, que constitui um aprofundamento da integração no âmbito da defesa, aberta a Estados membros que demonstrem um maior empenhamento em meios militares, e com firme vontade política de enviar forças de combate para o terreno em situações de crise; e da previsão de uma cláusula de assistência mútua, que prevê o auxílio militar dos Estados membros a um país da UE cujo território tenha sido alvo de agressão armada.

2.2.A Estratégia

A Estratégia Europeia de Segurança (EES), intitulado “A Secure Europe in a Better

World”6, tendo como origem um primeiro rascunho – documento Solana – foi aprovada

6 O documento identifica as principais ameaças à União – terrorismo, proliferação de armas de

destruição massiva, conflitos regionais, Estados falhados, e crime organizado – e necessidade de respostas - promoção da governação regional, em território europeu e fora de fronteiras, aumento dos recursos disponibilizados para a segurança e coerência na ação externa.

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pelo Conselho Europeu7, três meses após a invasão do Iraque pelos Estados Unidos, ação que contribuiu para uma profunda crise política interna na Europa, com fortes reflexos nas relações transatlânticas com os Estados Unidos da América.

Um conceito evolutivo de segurança aponta para duas mutações fundamentais: - a primeira refere que a segurança não é materializada, exclusivamente, pela segurança do Estado8, será também, pela segurança das pessoas, quadro de segurança humana; - a segunda referência coloca-se ao nível das respostas a riscos, ameaças e conflitos transnacionais, que se baseiam numa cooperação internacional alargada, quadro de segurança cooperativa.

Coloca-se à Europa, enquanto ator global e regional no atual ambiente estratégico, a questão fundamental do desenvolvimento de uma cultura estratégica, sendo certamente exigido um período relativamente longo para obtenção de conclusões sólidas sobre a existência de convergência ou divergência para uma construção essencial do pensamento estratégico, como ator relevante na segurança e defesa internacional “Biscop (2005)”9

.

7 Conselho Europeu realizado a 20 de junho de 2003 em Tassalónica. O documento final foi aprovado em

Bruxelas no Conselho Europeu realizado a 12 de dezembro.

8

Anexo B (“Estados Vestefalianos” e “pós-Vestefalianos”: Agendas de Segurança Nacional)

9 Biscop refere as seguintes dimensões estratégicas da segurança europeia: 1. Integração – consiste na

abordagem holística da União utilizando todos os instrumentos de que dispõe para concretizar os fins políticos. Comércio externo, cooperação para o desenvolvimento, ajuda humanitária, política de imigração, política externa, instrumentos militares. Aplicação integrada de instrumentos civis e militares para alcançar os fins (objetivos políticos). Vulnerabilidades: coesão e coordenação do seu emprego; 2. Prevenção – A União procura desenvolver capacidades para intervir no início das crises, são portanto necessários “bens públicos globais”, incorporando aquelas capacidades na PESC; 3. Abordagem Global - estrutura interesses de forma concêntrica, interesses complementares e indivisíveis (Van Staden, 2000); A combinação da partilha de responsabilidades pela segurança com a consciência de que a primeira linha de defesa se encontra fora das fronteiras da União levou coerentemente à efetivação de missões e operações civis e militares fora do território europeu; 4. Multilateralismo - é consequência de uma abordagem holística da segurança, refletindo a adoção do conceito de “Bens Público Globais”, ligada à prevenção, e carece de coordenação das políticas entre a EU e os seus parceiros. A transformação do “outro” estratégico, objeto de intervenção, levando-o a percorrer o caminho da resolução de conflitos e da reconstrução do Estado e da sociedade. Tal não exclui a coação militar como último recurso. De acordo com Robert Cooper são estratégias “pós-modernas” de Estados e sociedades (Cooper 2006, 62-65); 5. Nova Definição de Poder – consiste à construção de poder efetivo, que não o da primeira

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3. A CRISE DA LÍBIA 3.1. “A Primavera Árabe”

O Norte de África, e especificando a região designada como o Magrebe – Argélia, Líbia, Marrocos, Mauritânia e Tunísia – constitui para a Europa uma região vizinha de grande importância dos pontos de vista da geopolítica e da geoestratégia10. Quando em finais de 2010 eclodiram revoltas generalizadas das populações dos Estados da região magrebina do mundo árabe, esta revelou com toda a sua expressão uma importância vital para a segurança e defesa regional e global11.

O ano de 2011 ficou assim marcado pela propagação de uma única mensagem por todo o território árabe: o povo quer abolir os regimes ditatoriais e viver em liberdade. A força desta mensagem atravessou fronteiras fazendo uso dos meios de comunicação, em particular das redes sociais. A força de vontade da juventude do mundo árabe em obter liberdade política e novas oportunidades de melhoria da sua qualidade de vida levou-a a opor-se contra regimes implacáveis, ruindo as bases do Nacionalismo Árabe que perdurava até à data.

A rápida expansão de revoluções democráticas surpreendeu a sociedade internacional. Durante quase duas gerações as ondas da democracia invadiram grande parte do globo – desde o Sul e o Leste da Europa, à América Latina; e do Leste Asiático a África – mas não passaram pelo Médio Oriente. Os regimes ditatoriais desta região afastaram os seus povos do mundo político, fecharam as suas fronteiras e tornaram-se donos dos seus países. Ao fim de décadas as populações estavam saturadas de leis que desrespeitavam os seus direitos individuais e da eterna condenação ao despotismo. A

potência global, os EUA. A expressão poder não aparece na EES no entanto os fatores de poder europeu são dedutíveis saindo do objeto deste trabalho.

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Anexo C (“Antes da Primavera Árabe”)

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particularidade da região do Médio oriente já não era apenas um desastre em termos de respeito pelos direitos humanos, mas também uma vergonha moral “Ajami (2013)”.

A “primavera árabe” é o resultado de um movimento revolucionário. Não foi, por isso, impulsionada por reformas governamentais dos seus níveis cada vez mais baixos de legitimidade política, ou por pressões internacionais. Pelo contrário, os líderes autoritários encontraram nas potências ocidentais o apoio que necessitavam para manter os seus regimes. Em troca, o Ocidente obtinha uma variável estável e previsível no âmbito da sua política externa, uma vez que os interesses dos regimes autoritários estavam bem definidos e serviam de tampão aos grupos extremistas que procuravam controlar a região do Médio Oriente e Norte de África. Realidade que no fundo não se verificou.

3.2.O Regime Líbio

Cimentado sobre uma base tribal e uma população muito reduzida (cerca de 6,3 milhões de habitantes) e dispersa num extenso território rico em hidrocarbonatos, o regime líbio foi, durante décadas, mais conhecido pelas suas ações desestabilizadoras no quadro externo do que pela sua política interna tradicionalmente rodeada de mistérios. De facto, poucos eram os especialistas sobre a Líbia e a ação do seu governo, fruto da própria idiossincrasia do país “Jesús (2012)”.

A oposição ao regime dividia-se entre os poucos dissidentes que conseguiram escapar à sua autoridade – como a Frente Nacional para a Salvação da Líbia (FNSL), que agrupava liberais e monárquicos, islamitas radicais, entre outros – e os que esporadicamente realizavam tentativas de golpes de Estado e ataques armados de carácter islamita.12

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3.3.UE-Líbia: Interesses Comuns

Desde o início do governo de Kadhafi que a Líbia representa um problema para os Estados europeus. Muammar Kadhafi era por natureza anticolonial e nutria uma aversão ao Ocidente, e por isso as suas primeiras medidas passaram por ordenar a retirada dos EUA e do Reino Unido das suas bases no país, e expulsar vários milhares de postos coloniais italianos. Para além disso, tinha consciência da riqueza natural do país, o que o levou a nacionalizar companhias petrolíferas e a aumentar o preço do petróleo.

Criou-se assim um dilema para os Estados europeus, que por um lado necessitavam de acesso às reservas de energia líbias e desejavam celebrar contratos com o governo; e que por outro lado, tinham dificuldades em aceitar e lidar com o regime imposto por Kadhafi que para além de lutar contra o dito imperialismo ocidental, alimentava grupos radicais no Médio Oriente e, inclusivamente, dentro de fronteiras europeias. No entanto, este último argumento foi rapidamente ultrapassado pela crescente dependência energética dos países europeus nas décadas de 70 e 80 “Joffé (2011)”.

Para a UE, a estabilização e democratização da vizinhança era, e continua a ser, algo fundamental, em particular o Norte de África, uma vez que é constituído por Estados frágeis, permeáveis ao crime organizado, ao tráfico de armas e de drogas, e até ao terrorismo. Na presença destes factos, a União vinha desenvolvendo uma Política de Vizinhança Europeia13, recusada pela Líbia.

13 Na Estratégia de Segurança de 2003, impulsionada por Javier Solana, o Mediterrâneo foi identificado

como potencial fonte de instabilidade e conflito: “O Mediterrâneo, que se reveste de primordial

importância e encerra grandes oportunidades para a União Europeia, é ainda uma região que coloca problemas complexos, como a insuficiência das reformas políticas e a migração ilegal.”

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17

Em 2007, a União estabeleceu um Acordo de Enquadramento com o Estado líbio onde este vem a adquirir um papel relevante na manutenção da segurança, estabilidade e controlo dos fluxos migratórios14.

Contudo, aquando do início da guerra civil líbia, em 2011, foi do seio do Conselho de Segurança das Nações Unidas que surgiu a primeira iniciativa. A adoção da Resolução 1970, a 26 de Fevereiro, condenou fortemente as ações do regime líbio sobre civis e pôs à disposição dos Estados membros medidas que iam desde o embargo de armas ao congelamento de ativos financeiros de personalidades chave do regime. Por outro lado, ficou estabelecido que os Estados membros das Nações Unidas deveriam apoiar as agências humanitárias na sua ação no terreno, no âmbito da disponibilização de recursos e da criação de canais seguros à ajuda humanitária.15

3.4.A Ação da União Europeia

A repressão e as constantes violações dos Direitos Humanos protagonizadas pelo regime de Kadhafi sobre os que se levantavam contra o governo agitaram a comunidade internacional, em particular a União Europeia, surgindo várias declarações e comunicados16 dos seus representantes: da Alta Representante, do Presidente do Conselho Europeu, e do Presidente da Comissão. De um modo geral, foram rejeitadas as ações do governo líbio, e foi exigida a deposição imediata de Kadhafi do poder17.

14

Este Acordo refletiu a determinação de Bruxelas em estabelecer um controlo sobre a periferia europeia tendo em vista a prevenção das migrações, vindas primeiramente da África Subsaariana e de seguida do Norte de África, bem como a proteção contra o terrorismo transnacional (JOFFÉ, George, Op Cit.,p. 234.)

15

UN Security Council, Resolution 1970, 6491st Meeting, 26 February 2011.

16 Anexo E (A Crise na Líbia: Documentos da União Europeia) 17

Observando mais atentamente as reações dos três representantes da União, verificamos que existem diferentes abordagens e, até, diferentes visões em relação ao papel que a UE deveria desempenhar perante o escalar da gravidade dos acontecimentos na Líbia.

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A Alta Representante Lady Ashton faz duas declarações quase em simultâneo, onde estabelece um forte apelo ao fim da violência exercida pelo governo líbio sobre civis e ao respeito pelos direitos individuais e de expressão dos indivíduos; na segunda declaração, demonstra a disponibilidade da União em providenciar ajuda humanitária onde for necessária e em tomar outro tipo de medidas caso necessário; decidindo ainda suspender as negociações que vinham a ser desenvolvidas no âmbito do Acordo UE-Líbia.18

Na declaração proferida por Herman Van Rompuy, no mesmo dia em que a Alta Representante se pronuncia em nome da União, é posta em perspetiva a política de vizinhança da UE enquanto meio de estabilização do Mediterrâneo, através do fortalecimento das instituições democráticas. Van Rompuy faz já a ponte para o processo de transição que será necessário iniciar na Líbia, especialmente ao nível das reformas políticas e sociais.19

A 2 de Março, o Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, faz também uma declaração onde refere as seguintes ações tomadas pela Comissão: a ativação do Mecanismo de Proteção Civil (MIC) tendo em vista a evacuação de pessoas do território líbio; e o início da operação Hermes (ação conjunta entre o FRONTEX e Itália), cujo objetivo era controlar as fronteiras na região central do Mediterrâneo20.

A declaração de Durão Barroso volta-se para necessidade de construção de um novo paradigma político nas relações com a Vizinhança do Sul, e estabelece a necessidade de

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Council of the European Union, Declaration by the High Representative Catherine Ashton on behalf of

the European Union on Libya (6966/1/11 REV 1 Presse 36), Bruxelas, 23 de Fevereiro 2011.

19 Council of the European Union, Statement by Herman Van Rompuy, President of the European Council,

on the developments in the EU’s Southern neighbourhood (PCE 048/11), Praga, 23 de Fevereiro 2011.

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Esta operação visava sobretudo auxiliar a Itália no controlo do fluxo de refugiados vindos do Norte de África.

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um “Pact for Democracy and Shared Prosperity” que envolveria uma reforma constitucional e democrática; uma reforma judicial; e o apoio a actores não estatais.21

Destas três intervenções é possível verificar duas características principais. A primeira tem que ver com o facto de existirem três abordagens distintas e desfasadas no tempo. Enquanto a Alta Representante enfoca o seu discurso na disponibilização de meios para a ajuda humanitária e a eventual adoção de medidas sancionatórias, o Presidente do Conselho Europeu chama a atenção para a necessidade de aprofundamento e fortalecimento da política de vizinhança europeia para a constituição de instituições democráticas e de um Estado de direito na Líbia. Por outro lado, e já após o Conselho de Segurança das Nações Unidas ter adotado a Resolução 1970, o Presidente da Comissão Europeia apela à reformulação da resposta que a União tem vindo a dar ao tipo de questões que a região do Sul do Mediterrâneo coloca. Os comunicados foram desfasados no tempo e desadequados à realidade dos acontecimentos.

A segunda característica é percetível através da completa ausência de referência aos instrumentos de Política Comum de Segurança e Defesa, numa altura em que a violência, bem como os fluxos migratórios se tornavam cada vez mais ameaças à estabilidade e segurança das fronteiras europeias. Tratava-se de uma questão de segurança e defesa externa que requeria uma resposta rápida e eficaz de gestão de crises, e que apelava à ação do recentemente criado Serviço Europeu de Ação Externa. Os discursos divergentes dos três representantes da União, e a sua limitação a declarações e a medidas diplomáticas, demonstraram assim a ausência de consenso entre Estados-Membros quanto à estratégia a adotar em relação à Líbia.

21

European Commission, Statement by President Barroso on the situation in North Africa (Speech/11/137), Bruxelas, 2 de Março 2011.

(20)

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O contraste entre a violência na Líbia e aos acontecimentos na Tunísia e no Egipto, veio constituir um sério desafio à estratégia europeia. A ação desproporcional do governo líbio sobre os rebeldes poderia não só por em causa o processo de democratização no país, como contagiar os governos que se encontravam em circunstâncias semelhantes. Deste modo, era essencial a tomada de uma posição comum europeia de modo a sustentar a sua vontade em constituir um ator internacional de plenas capacidades.

Na sequência da adoção da Resolução 1970, a União Europeia, em busca de uma resposta comum, reitera no âmbito do Conselho Europeu Extraordinário a intenção de trabalhar em conjunto com as Nações Unidas, a Liga Árabe e a União Africana em resposta à guerra civil líbia; aciona as sanções diplomáticas previstas na nessa Resolução e outras adotadas pelo Conselho (embargo de armas, proibição da exportação de equipamento repressivo, bloqueio de vistos, e congelação de ativos financeiros22); e mobiliza recursos para a ajuda humanitária em cooperação com a OCHA (Gabinete de Coordenação para a Ajuda Humanitária das Nações Unidas).23

No entanto, perante o agravar do conflito, e observando a ineficácia das medidas impostas, o Conselho de Segurança adota, a 17 de Março, a Resolução 1973 após uma votação constituída por 10 votos a favor e 5 abstenções (Brasil, Rússia, China, Alemanha e Índia). A Resolução 1973 estabelecia o território líbio como uma zona de interdição aérea, e autorizava os Estados membros a adotarem as medidas necessárias à

22

Anexo F (Comércio da Líbia com a União Europeia e com o Resto do Mundo)

23 Council of the European Union, Declaration of the Extraordinary European Council, 11 March 2011

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protecção de civis que se encontrassem sob ameaça. Simultaneamente foi excluída qualquer forma de ocupação estrangeira do território.24

3.5. UE: Missão EUFOR Líbia

Na sequência dos esforços internacionais desenvolvidos para a resolução da crise líbia, a União Europeia decide lançar uma missão no âmbito da sua Política Comum de Segurança e Defesa. Esta é aprovada em 1 de Abril e designada EUFOR Líbia.

O verdadeiro cariz da missão25 estava previsto no parágrafo 4º da Decisão do Conselho:

“The Council also expressed the Union’s readiness to provide Common Security and Defence Policy support to humanitarian assistance in response to a request from the United Nations Office for the Coordination of Humanitarian Affairs (OCHA) and under the coordination role of the United Nations.”26

24

UN Security Council, Resolution 1973 (2011), 17 de Março 2011.

25 Missão: 1. No intuito de corroborar os mandatos conferidos através das Resoluções 1970 e 1973

(2011) do Conselho de Segurança das Nações Unidas, se o Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários das Nações Unidas (OCHA) o solicitar, a União conduz, no quadro da Política Comum de Segurança e Defesa, uma operação militar, adiante designada «EUFOR Líbia», a fim de apoiar a prestação de ajuda humanitária na região. A operação deve respeitar integralmente as Orientações relativas à utilização de recursos militares e de defesa civil no apoio às atividades humanitárias das Nações Unidas em emergências com-plexas e as Diretrizes relativas à utilização de recursos militares estrangeiros em apoio às operações de ajuda humanitária no contexto da atual crise no norte de África. 2. Como forma de apoiar esse objetivo político, se o OCHA o solicitar, a EUFOR Líbia deve, respeitando integralmente as orientações e as diretrizes a que se refere o nº 1: — contribuir para que as pessoas deslocadas se movimentem e sejam evacuadas em condições de segurança, — apoiar, com as suas capacidades específicas, as agências humanitárias no exercício das suas atividades.

26

A missão estava dependente de um pedido formal de assistência da ONU e, simultaneamente estava limitada à assistência humanitária. Mais tarde, a União instala um Gabinete de Representação em Bengasi com o objetivo de coordenar a ajuda humanitária e demonstrar o seu apoio político ao Conselho Nacional de Transição líbio.

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3.6.Motivações na constituição da Coligação Anglo-Francesa

Tal como os restantes Estados membros da União, França e Reino Unido defendem o apoio do processo de democratização do mundo Árabe como meio de promoção de valores e interesses estratégicos na região. Contudo, para a França torna-se fundamental manter influência sobre os países do Norte de África por razões históricas e geopolíticas sendo, por isso, necessário acelerar o processo de democratização para que fosse mais facilmente criada uma coligação com o Mediterrâneo.

Por sua vez, o Reino Unido via na intervenção militar na Líbia uma ação de defesa dos seus próprios interesses nacionais. Apesar de, em 2004, as relações entre os dois países terem sido normalizadas, o Reino Unido não podia compactuar com a violência do regime de Kadhafi. Para além disso, o afastamento de Kadhafi era crucial ao Reino Unido, uma vez que só assim poderia participar na crescente economia líbia.

Por outro lado, França e Reino Unido desejavam assumir, em estreita cooperação, a liderança estratégica europeia e atuar enquanto potências globais prontas a intervir com os seus próprios meios militares. Neste contexto, o recente retorno da França à estrutura de comando da NATO e a diminuição de custos da União em armamento altamente tecnológico militar, representaram dois fatores fundamentais à tomada de iniciativa em estabelecer uma cooperação reforçada entre os dois países no âmbito da defesa, já em 2011 (Joint Task Force). Abrindo assim caminho a uma eventual ação conjunta na crise líbia27.

27 Outro forte argumento para a constituição da coligação entre França e Reino Unido, residiu na falta de

consenso entre Estados europeus quanto à estratégia militar comum para a Líbia. Apesar da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, cujo um dos grandes objetivos consistia em caminhar mais rapidamente para o final do processo de integração política europeia, verifica-se que os Estados membros permanecem relutantes em delegar a sua soberania perante assuntos mais sensíveis e complexos como os de política externa e mobilização de recursos militares.

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A 9 de Março, o Primeiro-Ministro inglês Cameron, anunciou no parlamento que o Reino Unido iria liderar o processo de imposição de uma zona de interdição aérea na Líbia, conjuntamente com Sarkozy. No dia seguinte os dois países endereçaram uma carta ao Presidente do Conselho Europeu dando conta aos seus parceiros europeus, aliados árabes e africanos do plano de interdição aérea na Líbia. As reações não foram consensuais. A Liga Árabe demonstrou o seu apoio à ação, por outro lado, a Alta Representante Lady Ashton considerou a medida de alto risco e a Alemanha defendeu a não intervenção militar, optando pela pressão política e económica.

A posição alemã veio condicionar fortemente a ação europeia numa conjuntura que era propícia à utilização dos novos instrumentos e dos novos poderes atribuídos à União, desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa. As circunstâncias eram favoráveis à implementação de uma Missão PCSD, uma vez que existia um conflito regional que ameaçava a estabilidade e a segurança europeias, e por isso existia um forte argumento à intervenção; o perigo de propagação da violência e o ressurgimento de grupos extremistas era latente, conduzindo à mobilização da Liga Árabe, bem como da União Africana, com vista a uma intervenção europeia na Líbia; por fim, a França e o Reino Unido apelavam a uma ação militar. Apesar de alguma disparidade entre os Representantes Europeus e Estados membros, o consenso parecia de certa forma alcançável. No entanto, a relutância alemã quebrou quaisquer expectativas quanto a um consenso europeu. As frustrações resultantes da falta de consenso e apoio europeu traduziram-se numa ação militar conjunta e independente da França e Reino Unido, com o apoio dos EUA28 e o suporte das infraestruturas e recursos NATO.

28

De acordo com a recente estratégia Norte Americana, os EUA estavam determinados em adotar uma posição secundária na resolução do conflito líbio, quer pelo desgaste provocado pelas guerras no Afeganistão e no Iraque, que haviam esgotado recursos e o apoio da opinião pública; quer pela forte

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É neste contexto que a 19 de Março, França, Reino Unido e EUA lançam a operação

“Odisseia Amanhecer”. Trípoli, Bengasi e Misrata foram os alvos primordiais, e a

missão tinha por objetivo neutralizar a defesa antiaérea a fim de proteger civis, conforme o estipulado na Resolução 1973 pela ONU. A força aérea francesa foi a primeira a atuar, e em coordenação com os meios britânicos e americanos utilizaram caças Mirage e Rafale, abastecedores c-135 e Awacs para vigilância aérea eletrónica.29 Conjuntamente, a Itália autorizou o uso de bases militares, e Espanha e Canadá disponibilizaram meios militares.

3.7.O Posicionamento Alemão

Na reunião dos G8, agendada com o fim de discutir as medidas a incluir na Resolução 1973 do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a Alemanha tornou claro que não apoiaria uma intervenção militar na Líbia. Como fundamento, o Ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Guido Westerwelle, declarou que a Alemanha continuava cética em relação à imposição de uma interdição aérea com receio das consequências que daí podiam advir, justificando que o país não desejava ser “arrastado” para uma guerra no Norte de África.30

Esta posição foi reiterada pela Chanceler Angela Merkel que, no Conselho Europeu anterior, considerou o plano potencialmente perigoso, afirmando: "What is our plan if we create a no-fly zone and it

necessidade dos EUA de que a Europa assuma definitivamente o controlo efetivo das suas fronteiras, bem como dos desafios de segurança e defesa a que é chamada a dar resposta.

29

Notícia Euronews: http://pt.euronews.com/2011/03/20/odisseia-amanhecer-comecou/, 20 de Março 2011.

30

TISDALL, Simon, Germany Blocks Plans for Libya No-fly Zone, in The Guardian,15 de Março, 2011: http://www.theguardian.com/world/2011/mar/15/germany-blocks-libya-no-fly-zone. Consultado a 12 de Abril 2013.

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doesn't work? Do we send in ground troops?"; "We have to think this through. Why should we intervene in Libya when we don't intervene elsewhere?"31

Tendo em mente as presentes declarações, é necessário analisar a posição alemã em relação ao conflito líbio com base no passado histórico da sua própria política de segurança.

No final da 2ª Guerra Mundial, o país viu-se ocupado pelos aliados vencedores da guerra, e, por conseguinte, não teve outra alternativa senão abdicar da sua autonomia política e juntar-se aos Estados Unidos da América na contenção do avanço comunista, e na oposição à União Soviética. Esta nova condição, juntamente com o facto de o país se encontrar dividido, limitava a Alemanha nas suas opções de política externa. No entanto, a queda do Muro de Berlim e a implosão da URSS permitiram a unificação do país, bem como a reconstituição da sua autonomia enquanto Estado soberano.

Com efeito, o fim do Pacto de Varsóvia representava igualmente o fim de uma ameaça direta, o início da estabilização na Europa, e por isso o rearmamento alemão iniciado em 1950 perdera o seu sentido. O ambiente securitário sofrera uma profunda alteração. Durante este período, a Alemanha empenhou-se em enviar sinais de pacificação aos seus vizinhos europeus, como forma de afirmar a sua intenção de não regressar ao domínio militar da Europa.

No seguimento desta lógica, tornou-se num lugar-comum a aversão alemã ao exercício do poder militar, bem como a sua preferência pela ação diplomática multilateral. A Alemanha promoveu ao longo do tempo uma cultura de segurança baseada no “poder civil”, protagonizando a mediação com vista à resolução de conflitos

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diplomáticos, também no contexto da Política Comum de Segurança e Defesa “Harnisch & Wolf (2010)”.

Contudo, à luz da teoria das relações internacionais, o crescente aumento de poder de um Estado tende a que este procure autonomizar-se nas políticas adotadas e nas suas tomadas de decisão ao nível externo. Processo pelo qual a Alemanha passou, sendo exemplo o reconhecimento unilateral da Eslovénia e da Croácia (1991); a participação na intervenção conduzida pela NATO no Kosovo sem um Mandato da ONU; e a forte oposição à intervenção no Iraque (2003). E, apesar da relutância no âmbito da política de segurança e intervenção externa, o país tem enviado forças militares para cenários de risco mais elevado “Harnisch & Wolf (2010)”.

Em 1994, o Tribunal Constitucional alemão abriu caminho à mobilização das forças armadas alemãs em cenários internacionais mediante autorização do Parlamento alemão; a consonância com as normas de Direito Internacional; e sob condição de que o recurso aos meios militares deve ser feito por razões primeiramente humanitárias, e contextualizado numa coligação multilateral.

A ambivalência na política externa alemã tem vindo a ser criticada quer ao nível doméstico, quer ao nível externo. Internamente, os grupos pacifistas, o Partido de Esquerda, e membros do Partido Liberal criticam a CDU e o SPD por fomentarem uma política externa militarizada. Na cena internacional, os EUA, bem como os aliados europeus têm pressionado abertamente a Alemanha para que assuma um papel militar mais forte e consequentemente uma maior responsabilidade internacional, contrariamente ao desempenho demonstrado, em prol da descrição e influência.

A resposta alemã às exigências dos seus aliados é dada por via da europeização da sua política de segurança. A viragem dá-se com a intervenção no Kosovo, ganha uma

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maior força com os atentados de 11 de Setembro e é claramente assumida pelo país após a guerra no Iraque conduzida pelos EUA.

No entanto, tal como referem Harnisch e Wolf, a europeização da política de segurança alemã tem implicado uma partilha de recursos e capacidades com os restantes Estados membros, mas não a delegação de competências de soberania à União.

No contexto da crise líbia, a cisão da Alemanha em relação aos seus parceiros europeus e aliados NATO é oficializada com a abstenção na votação da Resolução 1973 do Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU). A decisão foi justificada pelos riscos que uma intervenção na Líbia poderia implicar e pelas suas repercussões para a Alemanha.

A abstenção da Alemanha, bem como as declarações do Ministro dos Negócios Estrangeiros, sugeriram um desnorteamento da sua política externa. No âmbito da Convenção de Paris, Angela Merkel afirmou que a Alemanha não participaria em qualquer ação militar justificando assim a sua abstenção, no entanto deixou claro que a abstenção não deveria ser confundida com neutralidade (Ash: 2011). Simultaneamente Guido Westerwelle reiterou a sua oposição à interdição aérea na Líbia fundamentada na crítica da Liga Árabe à intervenção após três dias de ação militar no país.

Porém, a Alemanha não manifestou desagrado ao avanço da NATO no âmbito da operação Unifed Protector (Protector Unificado) com vista ao bloqueio aéreo e ao ataque de pontos estratégicos do regime líbio.

Ao nível interno, os alemães sabem que o país não se pode abster de participar nos esforços de segurança e defesa internacional, no entanto é difícil para o povo alemão encontrar motivações que justifiquem uma intervenção internacional. Tal como referido anteriormente, esta lógica de raciocínio parte de uma cultura de segurança fortemente

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enraizada ao longo do tempo e fruto do papel do país nas duas guerras mundiais. Apesar de a opinião pública alemã se mostrar mais sensível e envolvida em questões de solidariedade internacional, permanece cética em relação a intervenções militares, verificando-se assim um maior envolvimento do país na ajuda humanitária, na mediação de conflitos, ou na assistência política, técnica e financeira32.

Do ponto de vista financeiro, não existem indicadores que levem a crer que a decisão de não intervenção na Líbia tenha sido tomada devido a questões orçamentais. No entanto, é importante referir que a Alemanha tem vindo a reduzir o seu orçamento em armamento militar e tem-se tornado mais sensível aos custos de missões não prioritárias à defesa dos interesses nacionais “Menon (2011)”. De facto, os custos de uma operação da UE são distribuídos pelos Estados membros de acordo com o seu PIB. Em 2011, a Alemanha representou cerca de 20,35% do PIB da União a 27, por conseguinte teria igualmente um encargo de 20,35% dos custos de uma missão PCSD.33

3.8.A Organização do Tratado do Atlântico Norte: Operação Protetor Unificado

A operação “Odisseia Amanhecer” implementada pela coligação França, Reino Unido e EUA foi, a 31 de Março, transformada na Operação “Protetor Unificado” devido ao seu novo enquadramento. A NATO entrava agora em ação na Líbia a fim de fazer cumprir a Resolução 197334.

O apoio aéreo da NATO facilitou a abertura de frentes de combate para além da Cirenaica, apoiando revoltas lançadas também nas localidades de Tripolitânia, na parte

32

No contexto da crise líbia, a Alemanha apoiava a democratização do país, no entanto a opinião pública não via motivos para uma intervenção direta. De acordo com uma sondagem feita na altura, apenas seis alemães em cada dez concordavam com uma ação militar na Líbia, e na sua generalidade não a viam como uma solução viável à resolução do conflito.

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Source: CIA World Fact Book

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ocidental do país. Os EUA presentes através dos seus meios aéreos e marítimos nos primeiros dias da ofensiva, rapidamente diminuíram a visibilidade, no entanto, foi autorizado pelo Presidente Barack Obama o uso de aviações não tripuladas (drones) que viriam a ter um papel determinante na evolução do conflito35.

Numa tentativa de enfraquecimento das forças de Khadafi, a NATO começou a atingir instalações governamentais em Trípoli. O objetivo principal era impedir o encontro entre o líder líbio e os seus chefes militares e dificultar a transmissão de ordens às forças do regime no terreno, proporcionando deserções, bem como a desmotivação dos defensores de Khadafi. Em Maio, a debilidade das forças do regime era notória e a Aliança realiza um ataque coordenado aos portos de Trípoli, Al Juma, e Sirte, destruindo oito navios de várias classes da frota líbia. No contexto económico do país, fundos do Qatar e do Koweit permitiam cobrir as despesas do governo com a expetativa de retornos assim que os fundos líbios fossem desbloqueados e o país voltasse a exportar hidrocarbonatos (JESÚS: 2011, 34).

Em meados de Julho grande parte da comunidade internacional tinha já reconhecido a legitimidade política do Conselho Nacional de Transição36. As forças aliadas tinham neutralizado os meios de comunicação do regime, e bombardeadas as localidades onde o governo líbio empenhava as suas Forças Armadas. Em Agosto os rebeldes ganham o controlo sobre Trípoli; a família de Khadafi foge para a Argélia; Moscovo reconhece oficialmente o Conselho Nacional de Transição; e é detido o Ministro dos Negócios Estrangeiros líbio. Em Setembro, a União Europeia levanta as sanções contra os portos, bancos e empresas líbias; a China reconhece igualmente o CNT como autoridade

35

O crescente apoio estrangeiro aos rebeldes obrigou Khadafi a combinar táticas de guerra convencional com outras de guerra assimétrica. Recorreu a efetivos instalados em veículos civis e desprovidos de uniforme; camuflou carros de combate, e utilizou avionetas civis violando o bloqueio aéreo, a fim de atacar pontos estratégicos como depósitos de combustível em Misrata

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governante; Sarkozy, Cameron e Erdogan (inicialmente a Turquia era contra a intervenção na Líbia) visitam Bengasi e Trípoli.

A razão de ser da Operação NATO Protetor Unificado termina quando, em Outubro, o Coronel Khadafi é capturado e morto pelos rebeldes pondo fim a um regime com mais de quarenta anos37.

O sucesso da Operação Protetor Unificado estabeleceu-a como um exemplo de eficácia da organização, em particular pela participação limitada dos EUA. Por outro lado, notou-se a fraqueza da coligação ao observarmos que apesar de existir o apoio e assistência dos EUA, a UE ainda tem a “habilidade” de executar intervenções relativamente menores38. A diminuição gradual da vontade política, bem como da disponibilidade financeira dos EUA em apoiar missões de defesa internacionais, vem aumentar a pressão sobre os restantes membros da Aliança. O percurso da NATO será bastante difícil se os seus membros europeus não implementarem os incentivos económicos e políticos necessários à cooperação efetiva no âmbito da defesa.

4. ANÁLISE DE RESULTADOS: A PCSD NO QUADRO DE ATUAÇÃO DA

LÍBIA

Relembrando a questão central do nosso trabalho - Quais as implicações da crise Líbia no processo de definição gradual de uma política de defesa da União Europeia, integrando a Política Comum de Segurança e Defesa criada pelo TL? – a nossa análise

37 Anexo I (Tabela de Acontecimentos em 2011) 38

Robert Gates, ex-Secretário da Defesa dos EUA, declarou que a NATO se tornou numa aliança de dois níveis, dividida entre os aliados capazes de se comprometer em missões militares de alta intensidade, e a maioria dos membros da aliança que apenas contribuem com o seu soft power em missões não orientadas para o combate. Gates apontou o caso líbio como um exemplo dos problemas da NATO resultantes da falta de investimento europeu na defesa (WEITZ: 2011, 52).

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incide sobre a referida questão em função da ideia transmitida pelo Tratado de Lisboa de uma União como ator global relevante e detentor dos instrumentos eficazes de atuação num novo ambiente internacional de segurança.

A nova Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD) reinventava, com um nível de ambição maior, a PESD ao incluir as operações conjuntas de desarmamento, de estabilização no pós-conflito, designadamente em tarefas da luta contra o terrorismo.

No desencadear da crise na Líbia e da respetiva escalada, 18 curtos meses após a entrada em vigor do TL, uma intervenção militar, no quadro instrumental da PCSD, não se constituiu como uma modalidade de ação política e estratégica. Foram a França e o Reino Unido que, Estados-Membros da União, muito relevantes em termos militares que atuaram no quadro de uma operação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) numa área geográfica e estrategicamente incluída na vizinhança próxima da Europa.

A missão EUFOR Líbia, do ponto de vista estratégico e operacional, pode ser interpretada como uma atuação mitigada face às possibilidades oferecidas pela PCSD, no âmbito do TL, e tomando em consideração a posição favorável dos EUA a uma ação militar sob a liderança dos aliados europeus. Ao nível da política ficou evidenciada a falta de consenso político para estabelecer objetivos o que paralisou a ação estratégica da União, que dispunha aparentemente dos instrumentos civis e militares adequados, num quadro que legitimava o emprego da força.

Neste ponto de análise podemos concluir que a operacionalização de uma missão com o enquadramento PCSD seria colocar um nível de ambição demasiado elevado relativamente à aplicação dos instrumentos do TL, considerado o curto espaço de tempo decorrido desde a sua aprovação e as disfunções e insuficiências estruturais da política

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externa e de segurança comum, designadamente quanto ao processo de decisão assente nas políticas nacionais dos Estados-Membros.

Num segundo ponto de análise, centrado em dois constrangimentos políticos e estratégicos - a coerência das decisões e as capacidades disponíveis – refere-se como alguns dos elementos condicionantes:

 Falta de coerência entre as diferentes políticas da União Europeia traduzida nas disputas de espaço e de âmbito, do ponto de vista do planeamento estratégico e da implementação das referidas políticas e dos respetivos instrumentos;

 A falta de capacidades efetivas para uma intervenção militar;

 O domínio político e estratégico, ao nível militar, pelos Estados-Membros, que são os detentores das capacidades militares; a atuação militar da EU depende exclusivamente da vontade política dos governos nacionais;

 Um papel central das instituições, das relações interinstitucionais e das estruturas da União, num quadro em que a vontade dos EM é determinante nos processos de decisão, pode gerar situações duais, designadamente em termos de processo de decisão político e estratégico, colocando nas estruturas da União o ónus da paralisia ou mau desempenho da UE como ator de segurança internacional, quando as políticas nacionais dos Estados-Membros são, como referido, determinantes.

Perante uma crise regional com implicações politico-estratégicas alargadas e globais, como é o caso da Líbia, a afirmação das políticas nacionais dos Estados-Membros acentuou as lacunas em matérias que exigiam uma evolução temporal de médio e longo prazo e inibiu a eficácia das medidas e da implementação do Tratado de Lisboa,

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designadamente em termos de resposta e ação política e estratégica rápida, de acordo com a situação.

Quando se aborda a segurança e a defesa da Europa, o problema das capacidades acaba por ser mais complexo que o da própria coerência política, estando os dois problemas interligados. As missões e operações previstas no Tratado de Lisboa confrontam-se com limitações determinantes na geração de capacidades militares necessárias à execução das mesmas e esse também constituiu um aspeto determinante para a ponderação da utilização do instrumento militar, na crise líbia, no âmbito PCSD, a par dos aspetos de decisão política.

Neste processo genético, a Agência Europeia de Defesa tem uma participação crucial. A Agência é responsável por identificar e, se necessário, implementar medidas úteis para a melhoria da eficácia na despesa militar. Este é no entanto um caminho que se adivinha longo, dada a dificuldade na implementação das intenções, na definição rigorosa dos critérios e na captação dos recursos necessários.

A Questão Central

A política de defesa é a mais afirmativa e sensível quanto aos papéis a desempenhar pelos Estados-Membros. Nesta perspetiva, ao contrário das questões da coerência e das capacidades, o Tratado de Lisboa não apresenta orientações. A PESC e a PESD caraterizaram-se e assentaram nas relações intergovernamentais reservando-se às instituições comunitárias um papel muito limitado.

O Tratado de Lisboa acaba formalmente com a estrutura de pilares introduzida pelo Tratado de Maastricht e, no entanto, as relações e os processos de decisão mantêm o domínio dos Estados-Membros designadamente na regra da unanimidade nas principais matérias. As disposições para a segurança externa e políticas de defesa permanecem

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dentro do Tratado da União Europeia (Tratado de Maastricht) não estando agrupadas com todas as outras políticas da UE no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. Daqui o longo caminho a percorrer para que a PCSD e a função de segurança seja de fato uma política equiparada às outras políticas e abordagens da União Europeia. As prerrogativas dos Estados-Membros são descritas de forma repetida e intensiva em grande medida devido ao Reino Unido e às suas posições nestas matérias de segurança e defesa.

O artigo 11 (1) do Tratado da União Europeia prevê que a Política Externa e de Segurança Comum esteja sujeita a regras e procedimentos específicos. Em defesa própria, o artigo 3-A estabelece que a União deve respeitar as funções essenciais do Estado [dos Estados membros], incluindo a consagração da integridade territorial do Estado, mantendo a lei e a ordem e a proteção da segurança nacional. É explícito e sublinha que “em particular, a segurança nacional continua a ser da exclusiva responsabilidade de cada Estado-Membro”. A "cláusula de assistência mútua" (artigo 42) é de fato limitada dado que qualquer obrigação de assistência "não pode afetar o carácter específico da segurança e de defesa dos Estados-Membros”, sendo que tais obrigações também devem ser "consistentes com compromissos assumidos no âmbito da NATO que, para os Estados que são membros, continua a ser o fundamento da sua defesa coletiva e a instância apropriada para a respetiva implementação. Os membros não-NATO não estão obrigados a fornecer assistência, enquanto os membros NATO devem utilizar a Aliança Atlântica como fórum para qualquer pedido de defesa coletiva.

As operações e missões no âmbito PCSD carecem de acordo unânime. As divisões quanto às posições governamentais são a regra, sobretudo para determinadas regiões e áreas geográficas, o que resulta em consensos precários e em ações por regra fortemente

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limitadas. As capacidades, a existirem, para uma atuação rápida e eficaz, confrontam-se com a necessidade de aprovação e acordo unânime dos Estados-Membros para a sua implementação.

A resistência por parte da Alemanha para a aprovação de uma intervenção militar na Líbia, em oposição às posições da França e do Reino Unido, é um exemplo público da divisão política no âmbito da segurança europeia. Por outro lado, mesmo os Estados que empenham as suas forças armadas em missões, podem introduzir ressalvas restritivas que limitam fortemente a sua eficácia. Nesta matéria o Tratado de Lisboa continua a prever que as operações e missões PESD, desde que não estejam na alçada das cooperações estruturadas permanentes, carecem da aprovação de todos os 27 EM. Deliberações como as tomadas pela NATO, num muito curto espaço de tempo, designadamente em apoio de medidas de embargo ao regime líbio com utilização de navios de guerra, na EU iriam exigir processos de decisão política e estratégica, em regra, muito mais longos.

Outra questão fundamental e complexa é a dos custos. O princípio “costs lie where

they fall’ estabelece um sistema em que os Estados-Membros que disponibilizam forças

para uma missão ou operação da UE suportam os custos das mesmas. Os Estados membros estabeleceram no entanto uma fórmula conhecida como o “Mecanismo Athena”, que prevê alguns "custos comuns" (cerca de 10% do custo total da missão), e segundo o qual todos os Estados membros contribuem na base do respetivo PIB. Os EM contribuintes continuam a suportar a maioria dos custos embora possa haver um fator de diminuição de vontade dos outros Estados-Membros no apoio à implementação de novas missões. É precisamente a Alemanha o maior pagador, em escala com o PIB respetivo, o que a torna mais afirmativa nas suas prioridades políticas.

Referências

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