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Brasil e a República Popular da China no século XXI : inserção internacional e relações bilaterais em perspectiva comparada

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Universidade Federal de Pernambuco - UFPE

Centro de Filosofia e Ciências Humanas - CEFCH

Programa de Pós-Graduação em Ciências Políticas – PPGCP

Diogo Villela Garcia Moura

O Brasil e a República Popular da China no

Século XXI: Inserção Internacional e Relações

Bilaterais em Perspectiva Comparada

Recife, PE

(2012)

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Universidade Federal de Pernambuco - UFPE

Centro de Filosofia e Ciências Humanas - CEFCH

Programa de Pós-Graduação em Ciências Políticas – PPGCP

Diogo Villela Garcia Moura

O Brasil e a República Popular da China no

Século XXI: Inserção Internacional e Relações

Bilaterais em Perspectiva Comparada

Orientador: Prof. Dr. Marcos Ferreira da Costa Lima

Dissertação apresentada como requisito complementar para a obtenção do grau de Mestre em Ciência Política com ênfase em Política Internacional, do Programa de Pós-Graduação em Ciências Políticas da Universidade Federal de Pernambuco.

Recife, PE

(2012)

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M929b Moura, Diogo Villela Garcia

O Brasil e a República Popular da China no século XXI : inserção internacional e relações bilaterais em perspectiva comparada / Diogo Villela Garcia Moura. - Recife: O autor, 2012.

135 f: Il., 30 cm.

Orientador : Prof. Dr. Marcos Ferreira da Costa Lima

Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Pernambuco, CFCH. Pós –Graduação em Ciência Política, 2012.

Inclui bibliografia.

1. Ciência Política. 2. Relações econômicas internacionais. 3. Brasil – China. I. Lima, Marcos Ferreira da Costa. (Orientador). II. Titulo.

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FOLHA DE APROVAÇÃO

Diogo Villela Garcia Moura

O Brasil e a República Popular da China no Século XXI:

Inserção Internacional e Relações Bilaterais em Perspectiva Comparada

Recife, 03 de setembro de 2012.

____________________________________ Prof. Dr. Marcos Costa Lima (UFPE – Orientador)

____________________________________

Profª. Drª. Christine Paulette Yves Rufino Dabat ( UFPE)

____________________________________ Prof. Dr. Fernando Cardoso Pedrão (UFRB)

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Agradecimentos

À minha filha, Nina, e à minha esposa, Julia. Por fazerem os momentos de

dificuldades serem mais amenos e a vida, melhor.

À minha Família, meus pais, irmãs e avós, pelo apoio incondicional.

Ao meu orientador Marcos, pela compreensão e auxílio.

A Deus e ao Destino, por ter me colocado no mundo em meio a pessoas

maravilhosas e lugares interessantes. Se não tivesse tido a experiência de

ter nascido e ser criado no subúrbio do Rio de Janeiro, de viver no Nordeste

brasileiro e ser da periferia do mundo talvez não desenvolvesse um olhar

crítico a respeito das realidades.

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“Triste Bahia! Ó quão dessemelhante Estás e estou do nosso antigo estado! Pobre te vejo a ti, tu a mi empenhado, Rica te vi eu já, tu a mi abundante. A ti trocou-te a máquina mercante, Que em tua larga barra tem entrado, A mim foi-me trocando, e tem trocado, Tanto negócio e tanto negociante. Deste em dar tanto açúcar excelente Pelas drogas inúteis, que abelhuda Simples aceitas do sagaz Brichote.” (Triste Bahia, Gregório de Matos)

“Não interessa se o gato é branco ou preto, desde que pegue ratos é um gato bom.” (Deng Xiaoping, final da década de 1970)

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RESUMO

O presente projeto tem por objetivo central analisar a evolução das relações bilaterais sino-brasileiras, em especial a partir dos anos 2000. As transformações ocorridas no sistema político e econômico internacional na virada do século XX para o XXI tem como fator importante a emergência das regiões chamadas “em desenvolvimento”. Neste contexto a ascensão de países como Brasil e China possibilitaram um aumento das relações Sul-Sul, através de parcerias estratégicas tanto em nível bilateral como no nível multilateral. O argumento central deste trabalho pretende demonstrar que as relações sino-brasileiras entre 2000 e 2010 tenderam a uma concentração apenas no pilar comercial, em detrimento dos pilares de investimento e cooperação. Porém, longe de ser irreversível, tentaremos expor os principais campos de cooperação onde se poderia balancear a preponderância comercial e assegurar uma relação bilateral mais sustentável e estável.

Palavras-Chave: Brasil; China; Relações Bilaterais; Inserção Internacional.

ABSTRACT

This project is aimed to analyze the evolution of Sino-Brazilian bilateral relations, especially since the 2000s. Changes in the international political and economic system at the turn of the twentieth century to XXI is an important factor in the emergence of "developing" regions. In this context the rise of countries like Brazil and China have enabled an increase in South-South relations, through strategic partnerships at both the bilateral and multilateral level. The central argument of this paper aims to demonstrate that the Sino-Brazilian relations between 2000 and 2010 tended to focus only on one trade pillar, to the detriment of the pillars of investment and cooperation. But far from irreversible, try to expose the main fields of cooperation where we could balance the preponderance business and secure a more sustainable and stable bilateral.

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SUMÁRIO Introdução Objetivos e Justificativa, p. 10 Metodologia, p. 12 Capítulo 1: Quadro teórico, p. 15

1.1.Economia Política Internacional, p. 17

1.2.Cepal, Prebisch e Furtado: O lugar da Periferia nas Relações Internacionais. p. 24

1.3.Analise de Politica Externa: A influência das elites políticas e econômicas nacionais na política externa estatal. p. 42

Capítulo 2

2.1. Política Externa e Inserção Internacional Chinesa: A ascensão (ou reinserção) chinesa no sistema internacional (Zhongguo) p. 47

2.1.2. Entendendo nosso parceiro: Uma breve introdução histórica sobre a china contemporânea. p. 48

2.1.3.A política externa da República Popular da China - RPC (1949 em diante) p. 58

2.1.4.Surgimento e desenvolvimento do eixo sino-americano. p. 64 2.2. Politica Externa e Inserção Internacional brasileira nos anos 1990 e 2000: Principais diretrizes, estratégias de inserção internacional e a influência dos grupos dominantes. P. 71

2.2.1. Política Externa Brasileira e inserção internacional no governo FHC p. 71

2.2.2. Política Externa Brasileira e inserção internacional no governo Lula p. 77

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Capítulo 3

3.1.As relações bilaterais sino brasileiras no século XXI p. 88

3.2.Antecedentes históricos e relações embrionárias (1800-19740) p. 89 3.3. Institucionalização das relações (1974-1990) p. 91

3.4. A parceria Estratégica (1993-2003) p. 97

3.5. As relações bilaterais sino-brasileiras no século XXI: Da parceria estratégica à preponderância comercial? P. 102

3.6. A reprimarização da pauta exportadora e a especialização dos acordos bilaterais entre Brasil e China: uma análise comparativa entre as décadas de 1990 e 2000. P. 110

Conclusões, p. 126

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Tabelas

Tabela 3.1: Exportações e Importações Brasil-China (1990-2010)

Tabela 3.2: Brasil. Participação percentual dos dez produtos mais importados e exportados para a China (1990, 2000, 2010).

Tabela 3.3: Atos Bilaterais Brasil-China, separados por Área e década.

Tabela 3.4: Atos Bilaterais Brasil-China em Ciência e Tecnologia, separados por década e Área.

Gráficos

Gráfico 2.1: Intercâmbio comercial brasileiro 1989-2010 Gráfico 3.1: Intercâmbio comercial brasileiro com a China

Gráfico 3.2: exportação brasileira por fator agregado – 1964-2010 (%) Gráfico 3.3: Exportações brasileiras: China e outros países (1990-2010) Gráfico 3.4: Importações brasileiras: China e outros países (1990-2010)

Gráfico 3.5: Brasil: Importações. Produtos agrupados por intyensidade tecnológica, China, anos selecionados (%)

Gráfico 3.7: Principais produtos brasileiros exportados (%), 1990-2010 Gráfico 3.8: Acordos Bilaterais Brasil-China (1990-2010)

Figuras

Figura 2.1: Mapa da China Contemporânea

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Introdução

O cenário político-econômico mundial está testemunhando uma época de constantes incertezas. Enquanto vem ocorrendo uma profunda transformação no equilíbrio de poder entre Estados na economia global, a falta de liderança criou um vácuo a ser preenchido. Se olharmos comparativamente as posições de economias emergentes - como Brasil, Índia, China, Turquia, África do Sul e outras - na participação de composição do PIB mundial entre as décadas de 1990 e de 2000, notam-se mudanças no decurso da última década. O PIB das economias brasileira e Chinesa dobrou ao longo dos anos de 2000 e 2010. Além disso, o crescimento econômico das economias emergentes vem acompanhado de uma mudança relativa no padrão comercial mundial, aonde o peso do comércio Sul-Sul vem aumentando a sua interconexão a cada ano. O aumento do peso e da importância do comércio, cooperação e investimentos Sul-Sul pôde ser bem mais enfatizado no período seguinte à crise financeira de 2008-2009. Neste ínterim, o Brasil ultrapassou o Canadá e agora é a sétima maior economia do mundo, enquanto a China agora ocupa o lugar outrora japonês como segunda maior economia mundial.

Com efeito, a ascensão econômica de potências emergentes como Brasil e China resultam em consequências benéficas para o sistema político internacional (SPI). A tendência que se abaliza indica que, com a ascensão de potências emergentes, as expectativas são para que ocorra um deslocamento das economias ocidentais, em

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direção a um maior equilíbrio no padrão das relações econômicas internacionais1. Por mais impressionante que seja a contribuição das economias emergentes para o ciclo recente de crescimento global, o aumento efetivo no poder de influência na condução de temas ligados à governança global ainda continua desproporcional ao dos países desenvolvidos. Neste sentido, qual seria o papel do Estado brasileiro na constituição de uma nova ordem mundial? Qual o papel da China? Como transformar o aumento de poder econômico em poder político na arena internacional?

O presente projeto tem como tema central as relações mantidas entre a República Federativa do Brasil e a República Popular da China na primeira década do Século XXI. A opção pelo estudo das relações sino-brasileiras justifica-se, primeiramente, pelo fato de as relações políticas e econômico-sociais estabelecidas entre brasileiros e chineses terem sido estudadas nos últimos anos por um reduzido número de estudiosos nacionais e estrangeiros, sendo que, na maioria das vezes, foram enfocadas apenas algumas questões ou áreas dentro da vasta problemática das influências exercidas mutuamente, tendo sido poucos os trabalhos elaborados a partir da visão das relações internacionais. Além disso, o objetivo especifico da elaboração deste projeto é analisar o impacto da cooperação bilateral em seus respectivos projetos nacionais de desenvolvimento, partindo da perspectiva de um contexto geopolítico internacional de grandes incertezas futuras.

A respeito desse tema de interesse para a história comum da China e do Brasil, algumas indagações relevantes servem de guia para o presente estudo: por que o Brasil e a China – tão distantes geograficamente, díspares historicamente e distintos culturalmente – se interessaram um pelo outro a ponto de se proporem o estabelecimento de relações formais entre eles? Quais fatores compeliram o Brasil e a China ao distanciamento ou à aproximação? Após trinta anos de cooperação, podem tais relações ser consideradas estratégicas? Frente aos problemas anteriormente levantados, esta obra coloca-se como objetivo geral compreender como o Brasil e a China reagiram à globalização econômica do fim do século XX e quais mutações provocou no relacionamento externo existente entre os dois países.

1Dentro de uma perspectiva assimétrica de relação economica centro-periferia, o efeito do aumento de

intercambio comercial Sul-Sul pode até ser entendido como um fenômeno interessante do ponto de vista macroeconômico, porém deve ser atrelado a uma mudança no padrão de desenvolvimento econômico do Estado periféricos, no intuito de que o superávit primário oriundo seja reinvestido em políticas de desenvolvimento mais descentralizantes.

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Dentre os objetivos específicos propostos pelo presente trabalho, destaca-se, por um lado, o de revelar como as percepções internas de interesse e oportunidades sistêmicas foram formadas ao longo do período analisado e em que medida condicionaram as relações bilaterais sino-brasileiras e suas respectivas estratégias de Inserção Internacional. Com vistas a orientar a pesquisa proposta e facilitar seu estudo, sugerem-se alguns argumentos a respeito dos fatores anteriormente elencados: i) é considerada importante na caracterização e condução da política externa do Brasil e da China a adequação de suas estruturas político-econômicas e de estratégias de inserção internacional à dinâmica própria do sistema internacional; ii) o interesse mútuo existente entre o Brasil e a China e o estabelecimento e aprofundamento de relações formais, harmoniosas e duradouras entre ambos dependem da capacidade de esta parceria colaborar na consecução dos projetos nacionais destes países e no aproveitamento das oportunidades oferecidas pela ordem global em transformação.

A partir desses argumentos, este trabalho parte do pressuposto de que as relações entre o Brasil e a China tornaram-se possíveis graças à existência de coincidências e convergências entre seus respectivos projetos nacionais. Por sua vez, o que explica o pouco aprofundamento, até o presente momento, das relações bilaterais e não atingimento da maior parte dos objetivos traçados são não apenas fatores ligados às diferenças lingüísticas e sócio-culturais – também existentes nas relações que a China mantém com outros países do mundo ocidental – mas principalmente às condições de desenvolvimento interno e às percepções de interesse, as quais conduzem os dois países a aproveitarem de forma diversa as oportunidades que se apresentam no sistema internacional, a optarem por relações com as grandes potências da época e a negligenciarem o conhecimento mútuo e as realidades nacionais dos parceiros.

Desenho e Metodologia de Pesquisa:

A metodologia que está sendo utilizada pode ser dividida em duas instâncias complementares. Primeiramente, realizamos no um levantamento da literatura especializada na temática em questão, constituindo assim o aporte do quadro teórico em três partes: Bibliografia teórica geral; Livros e artigos de caráter teórico sobre Estados e

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Instituições Internacionais; Bibliografia especializada sobre sistemas políticos internacionais. O modelo a seguir apoia-se numa metodologia fundada em bases teóricas e empíricas de investigação cristalizadas nos últimos anos.

Está-se utilizando técnicas de Política Externa comparada para uma análise dos Governos brasileiro e chinês no recorte temporal estipulado. Através da metodologia de análise de política externa fornecida por Katzenstein (1978) podemos triangular os três campos teóricos elencados acima e partir para uma tentativa de sistematização dos processos decisórios dos governos do Brasil no que tange a sua relação com a China. Tentaremos identificar em quais casos as conduções da política externa manteve-se coerente e obteve os resultados condizentes com os seus objetivos. Adotaremos o modelo de Putnam (1988) para o entendimento das mudanças na política externa. Putnam enfatiza que as mudanças na política externa podem ser enquadradas em uma constante que vai desde pequenos ajustes, passando por modificações de objetivos e de programas, até alterações fundamentais no comportamento internacional dos países. Esses graus de mudanças são examinados buscando identificar suas origens, agrupadas em quatro fatores: a influência dos líderes na política externa (Diplomacia presidencial), a influencia da burocracia (Itamaraty, ministérios ligados às relações internacionais como o Ministério do Comércio Exterior) e por último a influencia de choques externos (crises econômicas , acontecimentos importantes como o 11 de setembro).Para a análise da cena externa e das estruturas de oportunidade e constrangimentos irão se utilizar as abordagens neomercantilistas em Economia Política Internacional (EPI).

Para a construção da presente dissertação, além de noticiários da imprensa e fontes secundárias nacionais e internacionais especializadas em política, teoria e história das relações internacionais e política externa brasileira e chinesa, estão sendo consultados documentos oficiais do Ministério das Relações Exteriores (MRE), no que diz respeito aos Atos Bilaterais acordados entre os países e dados econômicos referentes a balança comercial entre os países.

Esses dados possibilitarão o estudo comparado da inserção brasileira e chinesa no sistema Político internacional. Por último, será feito o processo de análise de conteúdo e triangulação dos dados e análise de casos importantes.

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Quadro Teórico

Os enfoques teóricos que utilizaremos para a análise das políticas externas e estratégias de inserção internacional brasileira e chinesa compõem um conjunto mais amplo das Relações Internacionais, passando por teorias clássicas de interpretação e análise do SPI que se ramificam e se especificam até uma dimensão estritamente nacional de exame do problema. Neste sentido, acreditamos que este quadro teórico pode ser mais bem entendido a partir da sua divisão em três dimensões interconectadas. Em uma primeira dimensão, de escopo mais amplo, estariam as correntes teóricas mais gerais em Economia Política Internacional e Relações Internacionais. Neste primeiro momento serão utilizadas as visões de mundo de dois grandes campos de interpretação do funcionamento da ordem e dos regimes globais. De um lado teríamos os paradigmas dominantes de cunho liberal e neoliberal - correntes institucionalistas, neo-institucionalistas, da interdependência, neorrealistas - que interpretam a transformação do sistema político mundial pós Guerra-Fria como sendo substituídos por novas formas de estruturação da sociedade internacional. Como sugere a teoria da interdependência, os temas dessa nova agenda seriam guiados por relações de poder mais brandas “soft

Power” na arena internacional (KEOHANE & NYE, 1989). Neste sentido os temas

relativos à economia política internacional estariam migrando para serem debatidos mais amplamente em grandes foros e grupos multilaterais que teriam condições de arbitrar mais firmemente as resoluções de conflitos nas áreas econômicas, comerciais e

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políticas, visto que a globalização e a transnacionalização dos mercados e de capitais possibilitou a emergência de novos atores não estatais na arena internacional (WALTZ, 1959; GILPIN, 1981). Este grupo via esta nova estruturação internacional como sendo benéfica, pois possibilitava o debate democrático entre todos os atores - estatais e não-estatais; grandes ou pequenos; poderosos ou não - nestes organismos multilaterais de conversação. Em contrapartida, outros teóricos viam este processo como centralizador do “soft power” nas mãos dos verdadeiros controladores do capital internacional em conluio com os países centrais do sistema internacional (COX, 2002)

Uma segunda dimensão, de escopo regional, estaria ligada a uma análise mais focada na realidade dos países emergentes latino-americanos e asiáticos. Neste campo existem interpretações do pensamento latino-americano aplicado às relações internacionais. A raiz dos estudos de Raúl Prébisch formou-se pensamento do grupo reunido pela Comissão Econômica para a América Latina (Cepal). Esse grupo inspirou derivações expressas por Celso Furtado em sua teoria do desenvolvimento e pelos enfoques da Dependência elaborados por Fernando Henrique Cardoso, entre outros. Na década de 1980, a influência do pensamento liberal fez com que a Cepal adaptasse o seu modo de ver as relações internacionais regionais, inventando a versão do regionalismo aberto. Estas formações teóricas foram influenciadoras da formação do pensamento político internacional dos principais articuladores da política externa do governo Lula, como veremos abaixo.

A análise da Política Externa Brasileira (PEB) pode ser agrupada em dois grandes campos de interpretações. No primeiro campo, estariam as interpretações formuladas pelos próprios fazedores da política externa e as análises de acadêmicos ligados a escola do Itamaraty. Neste campo podemos perceber um consenso sobre as formas de atuação da política externa do governo FHC como sendo uma busca pela

‘Autonomia pela integração’ (LAMPREIA, 1998; VIGEVANI et. al, 2003; ALMEIDA,

2004). De acordo com esta corrente, o governo FHC buscou obter maior controle sobre o seu destino e a resolver melhor seus problemas internos através de uma maior participação das normas e pautas de conduta da ordem mundial. Ao aumentar o seu grau de participação na organização e na regulamentação das relações internacionais, a diplomacia brasileira contribuiria para o estabelecimento de um ambiente favorável ao seu desenvolvimento econômico. Para esta corrente, a perspectiva institucionalista passou a ser vista como favorável aos interesses brasileiros, porque promovia o respeito às regras do jogo internacional, as quais, uma vez estabelecidas deveriam ser respeitadas

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por todos os países, inclusive os mais poderosos, equilibrando a balança de poder internacional e reforçando o seu papel como global trader.

O início do Governo Lula, esperava-se um novo direcionamento da política externa. A nomeação do embaixador Pinheiro Guimarães para secretaria geral do Ministério das Relações Exteriores (MRE), forte crítico da política externa do governo FHC, sinalizaria para mudanças. A literatura acerca da analise da política externa do governo Lula indica a formação de um contexto político internacional onde o Brasil vai tentar se inserir a partir de uma autonomia pela diversificação (ALMEIDA, 2005; VIGEVANI & CEPALUNI, 2007). Neste sentido, enxerga-se a política externa do governo Lula através de uma diversificação das suas articulações internacionais, mantendo o modelo de inserção do governo FHC nas relações com os países desenvolvidos e nos organismos multilaterais, mas buscando uma maior relação com os países subdesenvolvidos, além de uma maior Inserção Internacional através de uma diversificação de parceiros comerciais.

No campo da Economia Política Internacional, as análises do modelo Brasileiro e Chinês de desenvolvimento e das potenciais formas de inserção política Internacional feitas por Celso Furtado (1982, 1987, 2001) e José Luis Fiori (2008), e Gelson Fonseca (2008), Giovanni Arrighi (2007), Shawn Breslin (2007), Rosemary Foot (2009), Zheng Yongnian (et. al. 2010) abarcam uma grande parte do escopo teórico explicitado acima, dando ênfase maior ao Brasil como inserido no sistema Mundial multipolar, mas que ainda mantêm-se como um Estado periférico, ou semiperiférico, que tem procurado aumentar o seu leque de Relações Internacionais através de uma perspectiva de alargamento da cooperação internacional, mas operando economicamente dentro das perspectivas de mercado e financeirização neoliberais. Nas seções abaixo, exploraremos em detalhe os debates.

1.1. Economia Política internacional

Nesta primeira seção, nos concentraremos em expor resumidamente o campo de estudo acadêmico conhecido como Economia Política Internacional (comumente conhecido pela sigla abreviada de EPI). Mais precisamente, faremos uma tentativa de sintetizar como se concretizou ao longo do tempo a construção da EPI como um campo reconhecido e independente de pesquisa acadêmica relevante no qual podemos associar

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com outro quadro – também abrangente – que convencionamos chamar de Relações Internacionais (RI).

A arena da Economia Política Internacional nos ensina a pensar sobre as conexões existentes entre as esferas econômicas e políticas que vão além das fronteiras de um Estado Nacional. Do ponto de vista prático, a economia política sempre fez parte das Relações Internacionais. Mas, como um campo de pensamento distinto, a EPI nasceu a poucas décadas atrás2. Economia e Ciência Política eram tratadas como disciplinas completamente diferentes e cada uma dominava sua própria visão e abordagem dos assuntos internacionais.

Atualmente, este campo de pesquisa é amplamente reconhecido como uma verdadeira interdiciplina, em que pese seu alcance e conquistas podem ser percebidos através da construção de pontes de ligação entre disciplinas antigas e estabelecidas e novas perspectivas acerca do estudo da economia mundial. Neste sentido entendemos que o que une os diversos campos interpretativos na EPI é o esforço de seus pesquisadores em tentar fazer uma “ligação” entre os espaços que separam as diferentes especialidades e especificidades da economia internacional e o estudo das Relações Internacionais. O que torna este campo mais interessante seriam as diferentes variedades de “ligações” possíveis dentre os mais variados campos ideológicos.

Com efeito, trataremos de mostrar através de uma análise interpretativa as duas principais escolas e autores de Economia Política internacional – suas visões e interpretações do tema – de forma a explicar o porquê de termos nos aproximado ideológica e empiricamente de umas em detrimento de outras. Dessa forma tentaremos focalizar nas contribuições teóricas – os conceitos abstratos, princípios, proposições e conjecturas que em conjunto ajudaram a moldar o “jargão” convencional da EPI.

A primeira escola a ser abordada neste espaço é talvez a mais conhecida e, em muitos casos, a versão dominante sobre Economia Política Internacional: A “Escola Americana” 3

. De forma bastante simplificada, poderíamos sintetizar a interpretação

2

Não queremos com isso, dizer que não existiram inúmeros autores que se preocuparam e ocuparam suas mentes com as inter-relações entre a “Politica” e o “Mercado”dentre os acadêmicos do mundo Ocidental. Principalmente os Marxistas e outros respeitáveis intelectuais que orbitavam periféricos ao

mainstream.

3

Nosso entendimento de “escola” neste texto é bastante abrangente, não significando que os autores atribuídos à mesma escola tenham necessariamente metas e agendas de pesquisas em comum, mas que existam entendimentos compartilhados tanto no nível ontológico , quanto no nível epistemológico.

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básica do conceito de EPI na Escola Americana através de uma citação bastante compartilhada de um de seus autores mais conhecidos: Para Robert Gilpin, o conceito básico de EPI pode ser definido como “the reciprocal and dynamic interaction in

international relations of the persuit of wealth and the persuit of power” (GILPIN,

1975:43). Em nossa interpretação, o que Gilpin quis dizer com “persuit of wealth” seria a conquista da esfera econômica – o entendimento dos mecanismos e do papel dos mercados no desenvolvimento econômico. Já “the persuit of power” estaria atrelada à esfera política – o papel do estado na gerência dos conflitos (internos e externos), problema central na teoria política realista.

Doravante, a Escola Americana de EPI pode ser entendida como uma correlação entre estas duas disciplinas (Economia e Política), integrando estudos de mercado e análise política em um só campo investigativo. De certa forma, fundamentalmente o estudo da EPI significaria entender a inter-relação complexa entre as atividades políticas e econômicas que acontecem a nível internacional.

E qual seriam as inter-relações econômicas e políticas que contextualizavam o mundo nos anos de 1970, e que impulsionaram as interpretações da Escola Americana? De certo, mudanças fundamentais estavam ocorrendo no campo da economia e da política internacional na época em questão. Em um contexto pós-Segunda Guerra Mundial, de um lado tínhamos a culminação de uma impressionante recuperação econômico-social dos países europeus e do Japão devastados durante a guerra.

Esta recuperação foi possível, em larga escala, pelo auxílio político e econômico dos Estados Unidos via investimentos externos diretos capitaneados por grandes corporações e bancos americanos transnacionais, além de um programa de crédito governamental a baixo custo. Estes massivos investimentos externos acabaram por engendrar um efeito negativo na própria economia interna americana, que passava por período de estagnação econômica e baixo crescimento.

Do outro, temos a crescente pressão internacional para a descolonização, e o consequente debate em torno dos desafios e dilemas do desenvolvimento econômico atrelado aos novos países independentes assim como aos países subdesenvolvidos. Além disso, não podemos esquecer-nos de salientar que, como alinhado a este cenário existia uma intensa briga ideológica entre os Estados Unidos (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), a Guerra Fria.

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Em meio a este conflito entre o “norte” desenvolvido e o “Sul” subdesenvolvido estava a constatação de que as economias nacionais (desenvolvidas ou não) passavam por um contexto de intensa interdependência, influenciados pela adoção por países industrializados de políticas cada vez mais liberalizantes promovidas pelos Estados Unidos através dos recém-criados4 Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) 5 e o Fundo Monetário Internacional (FMI). Em tese, O GATT e o FMI foram criados para garantir que as disputas entre Estados fossem direcionadas e analisadas por questões técnicas amparadas por um arcabouço legal comum a todos os países envolvidos e não por questões de segurança.

Segundo Cohen (2008:23) as questões acima citadas foram culminar, na década de 1970, resumidamente, em duas questões importantes e que estariam ameaçando a proeminência do poder estatal:

1. A crescente interdependência econômica entre os países estaria influindo para que as políticas públicas formuladas pelos países estivessem se tornando cada vez menos eficientes em seu objetivo de garantir o bem-estar econômico e social de suas populações;

2. A crescente interdependência aliada à adoção de políticas econômicas cada vez mais liberalizantes estaria diminuindo o leque de opções políticas dos governos nacionais para a adoção de medidas contracíclicas em caso de “choques” externos.

Na tentativa de compreender o contexto político-econômico citado acima, Keohane e Nye lançam em 19776 um modelo de visão paradigmática de mundo que se faz influente até os dias de hoje: o modelo de Interdependência Complexa (KEOHANE e NYE, 1977).

O modelo de Interdependência Complexa pode ser definido por três características principais: i) múltiplos canais de comunicação; ii) ausência de hierarquia

4 O FMI foi criado em 1944 e o GATT, em 1947. 5

GATT (em inglês: General Agreement onTariffs and Trade), é um conjunto de normas e concessões tarifárias, criado em 1947, com a função de impulsionar a liberalização comercial, combater práticas protecionistas e regular, provisoriamente, as relações comerciais internacionais (MATTKE, Marcos V. O Acordo Geral de Tarifas e Comércio e a construção da hegemonia político-econômica dos EUA após a II Guerra Mundial (1947-1994). Monografia: UniCuritiba: 2010.).

6

KEOHANE, Robert e NYE, Joseph. Power and Interdependence: World Politics in Transition. Boston, Little Brown.

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entre as questões internacionais; iii) a diminuição do papel do poder militar na resolução de conflitos. Esta teoria se contrapunha à clássica visão realista e estatocêntrica dominante até então no universo de estudo das Relações Internacionais nos EUA.

Para os autores, o paradigma realista não teria mais condições de explicar as mudanças em transformação na política e economia mundial. Tampouco foi capaz o realismo de prever os importantes acontecimentos ocorridos na década de 1970, como o colapso do regime de padrão-ouro atrelado ao dólar americano e o “choque do petróleo” causado pelo repentino aumento dos preços do combustível (e consequentemente seus derivados) pelos grandes produtores – nem propor uma resposta política eficaz à estas circunstâncias.

Neste novo contexto, o conceito de interdependência complexa demonstrava que a chave para o entendimento desta situação estava na fragmentação e difusão do poder nos assuntos econômicos oriundos de uma crescente interconectividade entre as economias nacionais. Neste sentido, a centralidade dos Estados como atores no sistema político internacional ainda se mantinha alta, porém, com a expansão e interconexão dos mercados, os Estados perderam a autoridade em determinar e controlar os efeitos e resultados finais.

A liberalização financeira e comercial estava expandindo rapidamente o alcance das relações transnacionais, adicionando novas formas de interação entre os países que ultrapassavam os limites de controle oficiais determinados pelos órgãos de política externa dos governos. A interdependência econômica estava ampliando o número de atores internacionais que participavam ativamente das relações entre os países, atores que o paradigma realista até então não tinha atentado.

Do ponto de vista prático, a ideia proposta por Keohane e Nye não se mostrava “universalizável” – no sentido poder explicar a realidade de todos os países. Porém, como um “tipo-ideal”, este novo paradigma foi bastante eficaz em compreender o processo pelo qual vinha passando as nações mais industrializadas como Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão. O aumento das relações econômicas, a diminuição da ameaça de conflito armado e a expansão de atores não-estatais entre estas nações parecia legitimar o conceito de interdependência complexa.

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No entanto, Robert Gilpin (2002) demonstrava que a emergência do transnacionalismo e de novos atores não necessariamente estaria atrelada ao detrimento do poder central do Estado, nem da teoria realista. Para Gilpin, o transnacionalismo só poderia ser entendido através do contexto histórico do Sistema de Estados tradicional Westphaliano. Sendo assim, “Politics determines the framework of economic activity

and channels it in directions witch tend to serve political objectives.”(GILPIN,

1975:54).

Gilpin vai buscar em três correntes distintas de pensamento nas Relações Internacionais – marxismo, liberalismo e realismo – os modelos clássicos que podem explicar a forma que a política enquadra a atividade econômica e a canaliza em direção na qual tende a servir os objetivos políticos. Resumidamente, para Gilpin, Liberais e Marxistas tem em comum a crença de que a economia tenderia a dominar a política – embora os mesmos divirjam completamente no fato de ser esta dominância uma coisa boa ou ruim. Já os Realistas, em contraste, mantinham a centralidade analítica na questão do poder das relações políticas em adaptar e moldar os sistemas econômicos.

Mas no fim das contas, se as premissas ideológicas podem divergir bastante de autor para autor, qual seria a base em comum que induziria estes autores a se enquadrarem em uma “escola” em comum, a Escola Americana de Economia Política Internacional? A resposta para esta indagação resta na metodologia. Ao longo dos anos, a epistemologia da Escola Americana tornou-se cada vez mais padronizada, e o modelo a ser utilizado cada vez mais semelhante com a metodologia da economia neoclássica – baseado na análise positivista, aplicando modelos formais na coleta e análise sistemática de dados empíricos. O uso de técnicas estatísticas e matemáticas de análise empírica nas pesquisas da Escola Americana tem se tornado fato corriqueiro em qualquer Revista Acadêmica de prestígio editorada nas áreas de Ciência Política, Economia Política ou Relações Internacionais nos Estados Unidos – restando poucas exceções à regra.

Neste sentido, se faz necessário apontarmos agora o “outro lado da moeda” - e do oceano Atlântico: a Escola Britânica de EPI (COHEN, 2008) 7. Para esta escola, o estudo da EPI tende a ser muito mais multidisciplinar em sua finalidade, mais normativo em sua ambição, crítico em relação a ortodoxias estabelecidas e mais

7

Como notamos ao fazer referência à escola americana, utiliza-se o conceito de “escola” de forma bem ampla, apenas no sentido de que seus autores compartilham um entendimento comum geral, e não metas específicas ou agendas de pesquisa em comum (Cohen, 2008:44).

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preocupado com os efeitos da EPI nas questões sociais. Diferente da Escola Americana, suas preocupações metodológicas tendem a ser mais qualitativas do que quantitativas, dando menos importância às evidências empíricas de suas pesquisas. Ligada às linhas de pensamento mais tradicionais de Economia Politica Clássica, a Escola Britânica tende a ser mais institucional e histórica em sua natureza.

Como demonstraremos abaixo, optamos por desenvolver nossa análise através de uma ótica mais “britânica” do que “americana”. Ainda que utilizemos autores das mais variadas correntes para tentar explicar nosso ponto de vista.

De uma forma bastante sintética, podemos resumir o estudo da economia Política Internacional através da integração de perspectivas teóricas das disciplinas da Economia e da Ciência Política no que tangem a compreensão em assuntos como comércio intra, inter e transnacionais e do desenvolvimento econômico dos Estados-Nação, por exemplo. Os conturbados acontecimentos ao longo do século XX obrigaram os estudiosos das Relações Internacionais a focalizar as inevitáveis tensões e interações contínuas entre a economia e a política. Neste sentido, existe uma necessidade imperiosa de integrarmos o estudo da Economia Internacional e da Política Internacional para aprofundarmos as compreensões dessas duas forças e a sua consequente influência no mundo moderno. Durante toda a história, os fatores econômicos têm desempenhado um papel importante nas relações internacionais (ARRIGHI, 1996; FIORI, 2008; FURTADO, 2009; WALLERSTEIN, 1998).

Embora ao longo da história os fatores políticos e econômicos sempre tenham exercido uma influência recíproca, no mundo moderno essa influencia se mostrou transformada de modo importante. Cresceu a interdependência das economias nacionais em virtude do aumento dos fluxos de comércio e do intercambio financeiro e tecnológico. A percepção pública do conteúdo econômico nas disputas políticas também aumentou. A expansão dessa consciência econômica , assim como da democracia política, levou a uma percepção quase universal de que o Estado pode ser usado para produzir resultados econômicos, e, em particular para redistribuir a riqueza entre determinados grupos (GILPIN, 2002)

O Estado nacional vem assumindo, ao longo dos séculos, posição fundamental na ordem política internacional, deslocando as formas pré-modernas de organização política como as cidades-estados, tribos e Impérios. Simultaneamente, o mercado

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tornou-se o meio primário da organização das relações econômicas, afastando outros tipos de intercâmbio. Essas duas formas opostas de organização social, o Estado moderno e o mercado, desenvolveram-se ao mesmo tempo nos últimos séculos, e a sua interação recíproca tornou-se cada vez mais importante para o caráter e para a dinâmica das relações Internacionais.

Grande parte do debate teórico dentro das Relações Internacionais (RI) enfocou a questão do Estado de alguma maneira. Para Fred Halliday (2007), algumas discussões apresentavam o Estado como ator principal nas RI, enquanto outras focavam o debate na relativização da importância do mesmo como principal fiador do que é bom, dentro e entre os Estados. O realismo estatocêntrico reafirmou as posições tradicionais sobre o Estado, e o neorrealismo continuou algumas de suas ideias, principalmente no campo das relações econômicas internacionais. Outros paradigmas desafiaram a primazia do Estado através de duas correntes distintas: as teorias da interdependência e do transnacionalismo e as teorias estruturalistas, que focavam na primazia dos sistemas globais e das estruturas sobre atores específicos.

No debate sobre Economia política Internacional (EPI), o desenvolvimento de perspectivas sobre o lugar dos Estados nas RI tem sido um processo contraditório que nem confirma nem refuta a mais simples das análises realistas e neorrealistas. Neste sentido, se são identificadas inúmeras maneiras nas quais o Estado perdeu a sua preeminência, também são apontadas varias outras que provam a sua manutenção e fortalecimento. Assim, a posição do Estado pode ser analisada desde várias formas e a resolução empírica ou teórica uniforme torna-se dificultosa. Halliday enxerga essa pluralidade de paradigmas como uma indicação de que a disciplina é saudável e não

“um bloco monolítico do qual são excluídos outras perspectivas, programas de pesquisa, conceitos e fatos” (HALLIDAY, 2007:88). Neste sentido, no de pensar a

economia política e as relações internacionais através de outras perspectivas, é que nos leva a inserir neste debate o pensamento Cepalino, através das contribuições de dois de seus grandes colaboradores, Prebisch e Furtado.

1.2. Cepal, Prebisch e Furtado: O lugar da Periferia nas Relações

Internacionais.

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Por proposta do Chile, na recém fundada Organização das Nações Unidas (ONU, 1945), surge a Comissão Econômica para a América Latina e Caribe (CEPAL, 1948). O papel reservado à Instituição era de desenvolver estudos que pudessem apoiar o projeto de industrialização para a América Latina.

A ONU partia do diagnóstico já formulado por alguns economistas do leste europeu e escandinavo – que defendiam a industrialização como processo de modernização das sociedades subdesenvolvidas (entre elas as latino-americanas). Havia já um esboço do diagnóstico de degradação dos preços dos produtos agrícolas. O papel da CEPAL, como uma Comissão provisória da ONU, que funcionaria por apenas três anos, era de levantar mais informações sobre a questão dos preços e esboçar possibilidades de industrialização. Mas, os dados eram escassos e uma das considerações dos técnicos da entidade era de que os países da América Latina precisavam de uma burocracia técnica e especializada que pudesse mensurar minimamente a economia da região.

A chegada do eminente economista argentino Raúl Prebisch, contratado como consultor da Comissão em 1949, para ajudar a preparar o relatório sobre o

desenvolvimento econômico da América Latina e seus principais problemas, a ser

discutido na conferência das Nações Unidas em Havana, 1950, agregou novos elementos às pesquisas cepalinas e deu visibilidade a Entidade. Tamanha foi a presença de Prebisch e tão expressiva foi sua sintonia com os seus dados sobre a América Latina (que se somaram com os da América Latina trazidos por ele), que o autor logo se identificou com o projeto da Comissão e logo se tornou o seu mais importante teórico.

Surpreendente ou não, o relatório da CEPAL escrito para a conferência de Havana, tornou-se um verdadeiro manifesto terceiro-mundista, argumentando em favor da industrialização e fazendo referências à desigual polarização das economias em centro e periferia. O relatório foi alvo de intenso debate no mundo acadêmico, entusiasmou muitos pesquisadores e agregou apoio para a manutenção dos trabalhos da instituição. Afinal era o primeiro trabalho sistematizado de pesquisa econômica, com resultados consistentes e argumentação sustentada fora do eixo dos países desenvolvidos.

Em 1952, mesmo a contragosto da diplomacia norte-americana, a CEPAL foi efetivada como uma Comissão permanente da ONU. Prebisch permaneceu no cargo de secretário executivo da Entidade até 1963, no mais longo mandato da história da Comissão.

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A instituição cepalina ficou tradicionalmente conhecida pela sua heterodoxia econômica, de origem keynesiana e construção estruturalista, que sempre foi vista como uma opção às políticas de cunho neoclássico, tentando construir um pensamento a partir da periferia do capitalismo e não aceitando de bom grado as sugestões de políticas econômicas, que estão relacionadas com o contexto de desenvolvimento europeu ou norte-americano, pouco ligadas aos padrões de vida latino-americanos. A CEPAL representava um pensamento original, voltado para os problemas do subdesenvolvimento, centrado nas preocupações dos países capitalistas periféricos e ligado ao contexto da América Latina. Seus estudos levam em consideração estratégias de desenvolvimento para países atrasados socialmente, em um mundo com fortes assimetrias econômicas e em busca de novos meios, não apenas econômicos, mas também políticos e sociais para alcançar os objetivos da modernização.

Além disso, a CEPAL parecia representar o surgimento de um pensamento efetivamente novo. Cunhou novas teorias. Deu corpo e audiência à teoria de Prebisch de centro/periferia e sobre a degradação dos termos de intercâmbio – contrariando assim as teses ricardianas de "vantagens comparativas". Mostrou que na prática ocorria uma perda de renda real dos trabalhadores em países subdesenvolvidos, que não tinham os mesmos mecanismos de defesa que os proletários dos países centrais desenvolveram. Havia nas publicações institucionais cepalinas um questionamento a respeito da aplicação dos diagnósticos econômicos dos países centrais. Estes não eram razoáveis para explicar a economia dos países subdesenvolvidos. O recado era claro: no lado sul do equador havia uma lógica econômica particular. Assim, a CEPAL promoveu algum tipo de inovação no recente debate da Teoria do Desenvolvimento – explicitando que entre os países centrais e os periféricos havia relações sociais e políticas que deveriam ser levadas em conta nas teorias e nos prognósticos econômicos.

Por tudo isso, que apareceu logo nos primeiros anos de funcionamento da CEPAL, a Instituição se tornou um ponto de referência para os estudos da economia do subdesenvolvimento. Sua abordagem ficou conhecida como heterodoxa, transferindo, por contraste, aos economistas adeptos do pensamento neoclássico a denominação de ortodoxos. Estes não viam diferenças entre as economias de centro e periferia, consideravam para todos os países as mesmas etapas para o desenvolvimento econômico.

O que a CEPAL fez, na verdade, foi provocar uma relativa “cisão” na teoria econômica, questionando a economia política neoclássica, a partir de uma posição

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periférica na divisão internacional do trabalho e das novas teorias keynesianas de formulação de políticas anticíclicas. Tudo isso a tornou uma opção e uma referência fundamental para os governos da América Latina, que viam nas suas recomendações de políticas públicas uma saída inovadora para tratar da pobreza, da miséria e do subdesenvolvimento; assuntos que não eram explorados pela economia política ortodoxa.

Uma linha de pensamento de grande influência para o pensamento de latino americano foi elaborada pelo economista argentino Raul Prebisch. Segundo este, a partir da crise de 1929, alguns países da América Latina iniciaram processos de industrialização, impulsionados pelos efeitos da desorganização da divisão internacional do trabalho e da ordem econômica até então vigente (PREBISCH, 1984). A industrialização “espontânea” que ocorria na América Latina almejava resolver os problemas de demanda e de vulnerabilidade externa advindos da desorganização da economia internacional (PREBISCH, 1984). Contudo, a industrialização, ao longo da primeira metade do século XX, passa a ser vista como uma janela de oportunidade para superar o atraso econômico e social existente. Entretanto, este autor vai observar que estes processos endógenos de industrialização careciam de uma teorização que os guiasse.

No intuito de fornecer esse tipo de teorização, Prebisch lança o que podemos considerar como as três grandes contribuições à teoria sobre as relações entre centro e periferia. Contudo cabe apresentar antes as principais variáveis com que Prebisch trabalhou e que foram aproveitadas posteriormente por Furtado.

Em primeiro lugar, Raul Prebisch tinha uma visão bastante singular do funcionamento do sistema internacional. Ele acreditava que as relações econômicas internacionais eram marcadas por uma ruptura estrutural entre o centro e a periferia do sistema capitalista (FURTADO, 1992). Isso significaria dizer, que na divisão internacional do trabalho haveria uma segmentação clara entre, de um lado, países exportadores de commodities e de outro, exportadores de bens manufaturados. Essa assimetria na distribuição e capacidade de produção de riqueza na ordem internacional seria um dos eventos causais da estruturação de relações de poder econômico entre as nações, no qual a periferia sairia em desvantagem. Essa ideia relativa ao funcionamento do sistema econômico internacional seria posteriormente desenvolvida e remodelada por Celso Furtado.

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Uma segunda ideia-força de Prebisch é a “Tese da Deterioração dos Termos de Intercâmbio” (PREBISCH, 1984). A compreensão de uma constante reiteração do lugar da periferia através dos mecanismos do mercado internacional foi de expressiva relevância para a apreensão de uma estrutura de distribuição assimétrica não apenas de riqueza, mas de poder e influência nas relações internacionais entre o centro e a periferia. Com isso, o fenômeno econômico vê-se misturado ao político nas relações de poder e de dominação nas quais se travam as competições interestatais e interempresariais.

Um terceiro legado teórico prebischiano, central para o pensamento cepalino, é a importância do Estado como um ator central para o processo de industrialização tardia e de desenvolvimento. Os mecanismos e prerrogativas institucionais desta instituição, segundo o autor, podem ser de grande valia para um processo de desenvolvimento tardio. Instrumentos como o planejamento, a política industrial e as barreiras alfandegárias seriam apenas alguns mecanismos econômicos, dotados de uma dimensão estratégica de promoção da industrialização e do desenvolvimento, como da defesa da soberania econômica nacional.

A partir do último terço do século XIX, o núcleo industrial do sistema capitalista se ampliou de uma forma bastante importante, sofrendo modificações estruturais relevantes. A preocupação com economias externas dinâmicas (em um nível de sistema nacional) sobrepôs-se, em muitos casos aos critérios das “vantagens comparativas”, passando o sistema industrial nacional a optar pelo respectivo mercado interno, que resultou em uma redução do comércio internacional. Os países que nesse período, não surgiram ou não foram criadas condições para que fosse seguida constantemente uma política de integração nacional permaneceram em uma condição de dependência que condicionou sua evolução econômica posterior.

Neste contexto, a evolução da economia industrial se apresentava sob forma de fluxos de inovações que se apoiam no processo de acumulação de capital. Para Celso Furtado (2003), embora esses processos sejam parte de um mesmo sistema, eles podem ser objeto de transação comercial separadamente. Com isso, as novas técnicas produtivas podem ser adquiridas no mercado e utilizadas para modificar abruptamente as estruturas produtivas de determinada região, enquanto os novos produtos feitos com as novas técnicas são adquiridos á parte e utilizados para modificar a forma de vida de

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uma população. Com o avanço da industrialização, fazem-se mais sofisticadas as técnicas produtivas e mais variado e abundante o fluxo de bens consumo, aumentando paralelamente o nível de acumulação de capital. Dentro deste processo, Furtado entende que a transferência de novas técnicas, entre países com níveis de acumulação de capital distintos, implica em modificações estruturais no país de menor nível.

A estrutura atual do sistema capitalista pode ser entendida em grande parte como um reflexo das disparidades geográficas no processo de acumulação de capital. A mutação do sistema, que Celso Furtado faz referência, significou em os países optarem por formas de crescimento econômico que permitiam maximizar a acumulação ao nível do sistema nacional.

A partir desta análise de Furtado, podemos perceber as consequências do atraso no processo de acumulação. Como a industrialização de um país molda-se pelo grau de acumulação alcançado nos países que lideram o progresso técnico, o esforço requerido para dar os primeiros passos tende a crescer com o tempo. Compreendemos assim, que a partir de certo ponto, a possibilidade de optar por um projeto de sistema econômico nacional se tenha tornado praticamente nula. Para um melhor entendimento deste processo, Celso acredita ser pertinente enquadrar este momento histórico nas teorias de Raúl Prebisch sobre capitalismo central e capitalismo periférico.

Para Prebisch (1984), o sistema capitalista central compreende toda uma constelação de economias que possuem disparidades consideráveis, mas em que o desenvolvimento econômico se apoiou numa forte acumulação de capital, buscando sempre uma forte industrialização e tecnificação da agricultura. Já o sistema capitalista periférico compreende uma constelação de países com disparidades ainda maiores, porém todos os seus membros têm em comum certos traços estruturais que decorrem do fato de que passaram por uma modernização das formas de consumo de uma parte da população antes de engajar-se decididamente no processo de desenvolvimento das forças produtivas.

A ascendência dos interesses industriais dentro das classes dominantes nas economias periféricas deu-se paralelamente à ampliação do Estado como agente econômico. Sendo o principal instrumento de captação de recursos financeiros – através do controle direto de empresas de grande vulto, seja associando-se a grupos internacionais, exercendo o poder regulador, enfim, pretendendo ser o único intérprete

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do interesse público em sociedades onde a maioria da população não está representada no sistema político, o Estado que foi emergindo nos países de capitalismo periférico, na fase de industrialização foi uma instituição um pouco diferente do Estado no sistema capitalista central. Suas responsabilidades diretas no plano econômico são bem maiores do que as que conheceram o Estado no capitalismo central.

Para Celso (1987), a preeminência de um grupo tecnoburocrático nas estruturas do poder constituiu um dos traços mais característicos do capitalismo periférico. Por isso Celso acredita que o capitalismo periférico requer maior concentração de poder e maior interdependência entre o político e o econômico do que foi a regra no capitalismo central. Assim:

“se se tem em conta que a evolução do capitalismo periférico faz-se pela assimilação de padrões de consumo gerados em sociedades que se encontram a um nível de acumulação muito avançado (o que engendra uma agravação das desigualdades sociais inerentes ao capitalismo), compreende-se que surja no mundo periférico o Estado centralizador.”.

(FURTADO, 1987:100)

Para Furtado (2003), a tutela americana não tem condições de assegurar um grau adequado de estabilidade social na área de influência. A política externa formulada pelo governo americano tinha como princípio a ideia de que a estabilidade geopolítica para uma hegemonia americana internacional podia ser encontrada através de uma bem orientada “ajuda externa” aos países subdesenvolvidos, através de um processo de desenvolvimento dos países periféricos orientado de fora para dentro.

Na segunda metade do século XX, o principal problema do Brasil era o de conceber um desenvolvimento em que se pudessem ser alicerçados as bases estruturais sociais, políticas e econômicas que serviriam de base para abrir caminhos para a revolução tecnológica em curso naquele momento. O país se viu diante da necessidade de ter que introduzir profundas modificações no seu marco institucional para evitar que a própria tecnologia viesse a provocar a concentração de renda e deformar a aplicação dos recursos produtivos, aumentando o custo social do desenvolvimento. Para isso seria necessária a tarefa de ampliar as dimensões reais e potenciais dos mercados internos por

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meio de uma maior integração econômica das regiões brasileiras, visando com isso a influir na própria orientação do processo tecnológico a ser recebido das economias centrais em função das exigências específicas da fase do processo de desenvolvimento e de modernização das estruturas sociais nacionais, para com isso modificar a organização agrária e empresarial, a fim de eliminar as formas antissociais de poder econômico.

Porém, couberam as empresas norte-americanas um papel básico no desenvolvimento Latino-Americano como principais intelectuais da política de “ajuda” dos Estados Unidos. Essa política tem suas raízes na própria evolução estrutural do capitalismo americano, no qual o poder econômico tende a concentrar-se ao mesmo tempo em que a estrutura da grande empresa se diversifica funcional e geograficamente. Do ponto de vista estritamente econômico, Furtado (2003) acredita que a grande empresa é um instrumento ineficaz para promover o desenvolvimento em um país subdesenvolvido. Com avançada tecnologia e elevado capitalização, as grandes empresas tendem a provocar desequilíbrios estruturais de difícil correção, como maiores disparidades de níveis de vida entre grupos de população e rápida acumulação de desemprego.

A consequência das assimetrias que caracterizam as relações centro-periféricas, no sentido da mimetização cultural e tecnológica da periferia, pode ser examinada nas formas de viver e nos valores que prevalecem nos países periféricos, principalmente por suas elites, e mostram o controle das empresas vindas do centro sob os mesmos. Por que uma grande parcela da riqueza que se acumula nos países periféricos é de propriedade ou está sob controle de empresas do centro, o que condiciona um fluxo crescente de recursos reais da periferia para o centro, ocasionando um endividamento estrutural, que aumenta a pressão nas relações internacionais, e enfraquece a posição negociadora dos países periféricos no sistema político internacional.

Neste sentido, para Furtado, o autêntico desenvolvimento econômico e social dificilmente se fará sem uma atitude participativa de grandes massas da população. Pois toda política de desenvolvimento retira a sua força de um sistema de juízos de valor que incluem os ideais coletivos. Se essa coletividade não dispõe de órgãos políticos capacitados para interpretar as suas legítimas aspirações, não está aparelhada para empreender as tarefas do desenvolvimento. Assim:

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“Toda a medida que se venha tomar para enfraquecer os governos como centros políticos capazes de interpretar as ações nacionais e de aglutinar as populações em torno de ideias comuns, resulta na limitação das possibilidades de um autêntico desenvolvimento na região”.

(FURTADO, 2003:41)

A partir desta crítica, podemos indagar: Que tipo de organização política será possível na região, com um sistema econômico tutelado por poderosas sociedades anônimas norte-americanas? A resposta para esta questão pode ser encontrada quando avaliamos historicamente a década de 1990 na América Latina. Período em que poderosas forças capitalistas internacionais se articularam com os centros políticos e econômicos da região, promovendo uma inserção tardia ao modelo neoliberal, abrindo os mercados nacionais de vez aos investidores externos, privatizando empresas estatais e diminuindo imensamente a autonomia dos governos locais.

Segundo Celso (2003), o sistema econômico mundial que surgiu sob a hegemonia americana é estruturalmente diferente do que reinava sob a preeminência britânica. O sistema britânico de baseava em uma divisão internacional do trabalho que exigiu a abertura crescente da economia inglesa. Especializando-se na produção manufatureira, a Inglaterra abria as suas fronteiras à produção estrangeira, formando um sistema econômico que se apresentava como uma articulação de subsistemas nacionais. Já o sistema econômico mundial tutelado pelos Estados Unidos começou a definir-se como um sistema de decisões de âmbito Multinacional, e que a sua coerência é resultado de critérios valorativos, estabelecidos a partir da realidade interna da economia americana. Neste novo sistema, as funções econômicas do Estado e a natureza da empresa privada como centro de decisões e o processo de concentração do poder econômico tendem a passar por profundas alterações.

A tendência de uma empresa controlar totalmente um mercado, como foi observada no começo do século XX, não se manifestou. No seu lugar tenderam a prevalecer as formas de organização oligopolistas dos mercados. Comparáveis com as políticas de preços administrados que convêm às grandes empresas e permite a união de vários grupos num esforço de conjunto para condicionar o comportamento do consumidor sem conflito com a legislação antitruste. Se observarmos em conjunto a

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integração e a diversificação, veremos que uma empresa que se expande nessas direções tende a ser levada a controlar atividades econômicas na aparência totalmente desconectadas umas das outras. A partir de certo momento, as vantagens da diversificação passam a ser de caráter estritamente financeiro: o excesso de liquidez de um setor pode ser utilizado em outro ocasionalmente mais dinâmico. Esse tipo de coordenação pode ser conseguido através de instituições bancárias, que facilmente obtêm informações em todos os setores da atividade econômica e tem pronto acesso aos mercados financeiros. Essa dupla coordenação, obtida através de estruturas oligopolistas e das instituições financeiras, constitui característica fundamental do capitalismo em sua fase atual. A ela se deve, em boa medida, a intensificação do crescimento das economias capitalistas e também a considerável aceleração no processo de concentração do capital. Do ponto de vista da teoria econômica convencional, o conglomerado poderia parecer uma aberração, porquanto não se apoia nem nas economias de escala, nem nas conhecidas vantagens de integração vertical. No entanto, sua vitalidade é evidente, pois já se constitui a forma predominante de organização da produção. Baseia-se em dois princípios: O de investir em múltiplos Baseia-setores com um mínimo de relação, reduzindo o risco e de dispor de poder financeiro, o que seria mais importante do que uma elevada participação no mercado.

Para Celso (1987), existem amplas evidências que estas instabilidades tendem a assumir uma forma de flutuações cíclicas no nível da atividade econômica em geral e do emprego em particular. Daí que o desemprego cíclico se haja transformado, progressivamente, na preocupação central das nações de economia capitalista mais avançada. Assim, o tratamento contra essa instabilidade viria a reforçar a tendência para o fechamento das economias enveredado pelo protecionismo desde a primeira grande guerra. Neste sentido, o conglomerado surge como um fenômeno do capitalismo pós-cíclico. Eliminados os ciclos de prosperidade e depressão, uma inversão (investimentos) que se distribuam entre um grande número de setores produtivos põe-se ao abrigo de riscos maiores. Evitadas as depressões, as perdas ocasionais ocorridas em certos setores são compensadas com ganhos em outros.

Parece-nos fora de dúvida que o fator mais importante na conformação do atual sistema capitalista é o processo de unificação do espaço econômico, o processo de integração crescente dos sistemas econômicos internacionais. Podemos perceber melhor essa unificação aqui:

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“mas a verdade é que as fronteiras dos antigos sistemas econômicos nacionais vão desaparecendo sem que o perfil do novo sistema global tenha se definido com clareza. As grandes empresas, que enfeixam crescente poder dentro das novas estruturas, ainda não possuem estatuto definido. Os recursos líquidos ou semilíquidos de que dispõem essas grandes empresas são hoje muito superiores às reservas de todos os bancos centrais do mundo capitalista, particularmente se levarmos em conta que as reservas de ouro não são operacionais. Os recursos transitam pelo mercado financeiro internacional, e que escapam ao poder de quaisquer autoridades monetárias somam centenas de bilhões de dólares. Existe, portanto, uma esfera de decisões que não se confundem com os quadros institucionais controlados pelos Estados nacionais. Tudo se passa como se houvesse surgido uma nova dimensão no conjunto das decisões econômicas que escapa as formas codificadas de ação dos governos nos planos nacional e Internacional.”

(FURTADO, 1987:70)

O que Celso Furtado quer dizer é que dentro deste quadro institucional, os governos não têm a possibilidade de coordenar a ação que todo um conjunto de poderosos agentes exerce no sistema capitalista. Se alguma coordenação existe, ela realiza no quadro dos oligopólios e dos consórcios financeiros, dentro dos qual a presença dos governos se manifesta através da pressão que ocasionalmente sobre este ou aquele agente.

Podemos perceber que Celso Furtado enfatiza, corretamente, que os primeiros sintomas da instabilidade internacional que se desdobra mundialmente a partir da década de 1970 se manifestam no plano monetário. A partir do momento em que a moeda já não é uma mercadoria produzida como as outras e sim um símbolo criado sem qualquer custo, o controle centralizado do poder de emissão passa a ser condição básica para que um sistema econômico opere com um mínimo de estabilidade.

Na evolução dos sistemas capitalistas nacionais a criação dos bancos centrais constitui um marco decisivo. Poder criar meios de pagamento significa estar em condições de apropriar-se, a todo o momento, de parte dedo fluxo de bens e serviços à

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